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sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

“A ANP está comprometida com Israel”


“A ANP está comprometida com Israel”

Companheira de líder da resistência palestina preso revela que polícia palestina se comporta como guarda do exército israelense

José Coutinho Júnior
enviado especial à Palestina pelo BRASILDEFATO
“Tenho que trabalhar, cuidar da família e lutar pela libertação do meu marido”. Assim Abla Sa’dat define sua luta. Abla é esposa de Ahmad Sa’adat, líder do partido marxista palestino Frente Popular pela Libertação da Palestina, segundo homem mais influente na Organização Para a Libertação da Palestina (OLP), entidade que reúne os diversos partidos palestinos que buscam uma solução para a questão palestina e a principal liderança da esquerda palestina atualmente.
Por sua influência, Ahmad sempre foi perseguido pelo exército de Israel, vivendo como um fugitivo durante anos. Em 2002, já vivendo na clandestinidade, foi convocado pelo então presidente do governo da Autoridade Nacional da Palestina (ANP), Yasser Arafat. Ao chegar no local da reunião, foi emboscado e preso pelo governo. Os salários dos funcionários da Autoridade Palestina vêm da ONU, mas são entregues para Israel, que então repassa para o governo. Arafat alegou que Israel exigia sua prisão, senão reteria os salários. Sa’adat ficou em uma prisão palestina em Jericó até 2006, quando tropas israelenses invadiram o local, o capturaram e o levaram para uma prisão israelense. Desde então, está preso em Israel, sem saber se será solto algum dia. Abla é uma das principais vozes na luta pela liberação dos presos políticos palestinos, realizando campanhas internacionais de solidariedade e denunciando os abusos das autoridades Israelenses. Confira entrevista de Abla Sa’dat:
Brasil de Fato – Abla, onde o Ahmad está hoje, e como está a saúde dele?
Abla Sa’dat – Ele está preso na região do norte de Israel, ocupada em 1948. O Ahmad ficou isolado numa cela individual de 2009 a 2012, sem conexão e contato com as pessoas. Ele só saiu de lá porque os prisioneiros fizeram uma greve de fome para tirar 23 presos da solitária e acabar com a política de isolamento. Ele está bem de saúde. Se cuida fazendo exercícios físicos e parou de fumar. Se ele ficar doente e tiver de ir a uma clínica militar, voltará pior do que foi. Ele sofre com alergias, então mudam ele de celas constantemente de propósito para que ele pegue alergias e fi que doente.
Que motivos Israel alega para ter realizado a prisão e mantê-lo cativo?
Ahmed está preso por ser o líder da Frente Popular, essa é a única queixa, não há uma condenação concreta contra ele. Inclusive, a alegação do juiz para isolá-lo foi a de que “essa pessoa pode fazer os palestinos se voltarem contra Israel só com o olhar”.
As prisões são ilegais, pois os presos políticos lutam pela liberdade de uma terra ocupada. Mesmo as leis israelenses não justificam a prisão de Ahmad. É uma questão puramente política e ideológica. Realizamos de 17 a 24 de outubro deste ano uma campanha internacional de solidariedade, na qual organizações e pessoas solidárias enviaram cartas a ele e às autoridades israelenses, para pressionar por sua libertação.
Depois que Ahamad foi preso, como é sua vida, seu dia a dia?
Nos casamos em 1983 e vivi em paz com ele até 1985 apenas. Nos anos seguintes, ou ele estava na cadeia ou foragido. Temos duas filhas e dois filhos, que eu criei praticamente sozinha. Quando ele foi preso em 1987, fui presa também.
Tínhamos um fi lho de nove meses na época. Em 2003, fui presa novamente, quando ia para o Fórum Social Mundial em Porto Alegre – fiquei na prisão por quatro meses. Nesses períodos, nossa família viveu sem pai e mãe. É uma vida muito difícil. Tenho que trabalhar, cuidar da família e lutar pela libertação do meu marido. Mas como mulher palestina, é minha função com todo o povo.
Qual é a posição da ANP em relação à prisão de Ahmad?
Quem realizou a prisão foi a ANP [Autoridade Nacional Palestina], em Ramallah. Ahmad ficou três anos em Jericó, até o exército israelense invadir a prisão e o levar para Israel. O discurso do governo é de que se deve libertar os presos, mas na verdade eles estão comprometidos com Israel.
No começo de outubro, o exército israelense invadiu o campo de refugiados de Geni e prendeu cinco ativistas da Jihad islâmica. A polícia palestina não faz nada contra o exército, são guardas de Israel, que ajudam a prender os militantes que discordam e se opõem às políticas do governo, como os do Hamas, da Jihad e a esquerda palestina.
Como é o processo de visitas na prisão?
A humilhação começa antes de fazer a visita. De toda a nossa família, só eu e meu filho mais velho podemos visitá-lo, porque nós temos um cartão de identidade de Jerusalém. Os presos que são do norte são levados para cadeias do sul e vice-versa, para dificultar as visitas dos familiares. Temos que ir junto com a Cruz Vermelha, senão não entramos.
Quando chegamos, ficamos do lado de fora da prisão, não tem lugar para sentar. Preenchemos ali uma lista com os nomes de quem vamos visitar. Quando entramos, passamos por um detector de metais e uma revista corporal.
Não podemos levar comida ou mesmo cigarros conosco; existe uma loja na prisão, e se quisermos dar essas coisas aos presos, temos de comprar lá a preços muito altos, e se algum preso quiser assinar um dos três jornais de Jerusalém para se manter informado, deve pagar 800 dólares pela assinatura de um jornal que não custa nem um dólar. E os jornais geralmente chegam atrasados; os assinantes recebem todas as edições no final do mês.
É permitido levar livros, mas todos são lidos para checar se existe material subversivo antes de ser entregues. Como Ahmad gosta dos livros perigosos, eles costumam fi car retidos. Geralmente levo uns seis livros comigo e distribuo entre os outros visitantes. Caso os outros presos consigam receber, eles passam para o Ahmad. Só podemos levar roupas novas para eles duas vezes ao ano, quando as estações mudam.
Na hora da visita, 11 pessoas entram juntas na sala. Lá dentro, existe um vidro que separa o visitante do prisioneiro, a conversa é gravada, e depois de 45 minutos, a janela fecha e o telefone é desligado. Muitas vezes não dá nem para se despedir.
Fotos: Brigada Gassan Kanafani

terça-feira, 31 de dezembro de 2013

50 verdades sobre Nelson Mandela


As grandes potências ocidentais se opuseram até o último instante a sua luta e apoiaram o governo racista de Pretória


O herói da luta contra o apartheid marcou para sempre a história da África. No crepúsculo de sua existência, Nelson Mandela é venerado por todos. Ainda assim, as grandes potências ocidentais se opuseram até o último instante à sua luta pela emancipação humana e apoiaram o governo racista de Pretoria.
1.       Nascido no dia 18 de julho de 1918, Nelson Rolihlahla Mandela, apelidado de Madiba, é o símbolo por excelência da resistência à opressão e ao racismo na luta pela justiça e pela emancipação humana.
2.       Procedente de uma família de treze filhos, Mandela foi o primeiro a estudar em uma escola metodista e a cursar direito na Universidade de Fort Hare, a única que aceitava, então, pessoas de cor no governo segregacionista do apartheid.
3.       Em 1944, aderiu ao Congresso Nacional Africano (CNA) e, particularmente, à sua Liga da Juventude, de inclinação radical.
4.       O apartheid, elaborado em 1948 depois da vitória do Partido Nacional Purificado, instaurava a doutrina da superioridade da raça branca e dividia a população sul-africana em quatro grupos distintos: os brancos (20%), os índios (3%), os mestiços (10%) e os negros (67%). Esse sistema segregacionista discriminava 4/5 da população do país.
5.       Foram criados “bantustões”reservas territoriais destinadas às pessoas de cor, para amontoar as pessoas não brancas. Assim, 80% da população tinha de viver em 13% do território nacional, muitas vezes sem recursos naturais ou industriais, na total indigência.
6.       Em 1951, Mandela se transformou no primeiro advogado negro de Johanesburgo e assumiu a direção do CNA na província de Transvaal um ano depois. Também foi nomeado vice-presidente nacional.
7.       À frente do CNA, lançou a defiance campaign, contra o governo racista do apartheid, e utilizou a desobediência civil contra as leis segregacionistas. Durante a manifestação do dia 6 de abril de 1952, data do terceiro centenário da colonização da África do Sul pelos brancos, Mandela foi condenado a um ano de prisão. De sua prisão domiciliar em Johanesburgo, criou células clandestinas do CNA.

Leia mais:

8.       Em nome da luta contra o apartheid, Mandela preconizou a aliança entre o CNA e o Partido Comunista Sul-africano. Segundo ele, “o CNA não é um partido comunista, mas um amplo movimento de libertação que, entre seus membros inclui comunistas e outros que não o são. Qualquer pessoa que seja membro leal do CNA, e que respeite a disciplina e os princípios da organização, tem o direito de pertencer às suas filas. Nossa relação com o Partido Comunista Sul-Africano como organização é baseada no respeito mútuo. Nos unimos ao Partido Comunista Sul-Africano em torno daqueles objetivos que nos são comuns, mas respeitamos a independência de cada um e sua identidade visual. Não houve tentativa alguma por parte do Partido Comunista Sul-Africano de subverter o CNA. Pelo contrário, essa aliança nos deu força política.”
9.       Em dezembro de 1956, Mandela foi preso e acusado de traição com mais de uma centena de militantes antiapartheid. Depois de um processo de quatro anos, os tribunais o absolveram.
10.   Em março de 1960, depois do massacre de Sharperville, perpetrado pela polícia contra os manifestantes antisegregação, que custou a vida de 69 pessoas, o governo do apartheid proibiu o CNA.
11.   Mandela fundou então o Umkhonto we Sizwe (MK)  e preconizou a luta armada contra o governo racista sul-africano. Antes de optar pela doutrina da violência legítima e necessária, Mandela se inspirou da filosofia da não violência de Gandhi: “Embora tenhamos pegado em armas, não era nossa opção preferida. Foi o governo do apartheid que nos obrigou  a pegar em armas. Nossa opção preferida sempre foi a de encontrar uma solução pacífica para o conflito do apartheid.”
12.   O MK multiplicou, então, os atos de sabotagem contra os símbolos e as instituições do apartheid, preservando ao mesmo tempo as vidas humanas, lançou com sucesso uma greve geral e preparou o terreno para a luta armada com o treinamento militar de seus membros.
13.   Durante sua estada na Argélia, em 1962, depois da intervenção do presidente Ahmed Ben Bella, Mandela aproveitou para aperfeiçoar seus conhecimentos sobre a guerra de guerrilhas. A Argélia colocou à disposição do CNA campos de treinamento e deu apoio financeiro aos residentes antiapartheid. Mandela recebeu ali uma formação militar. Inspirou-se profundamente na guerra da Frente de Libertação Nacional do povo argelino contra o colonialismo francês. Quando libertado, Mandela dedicaria sua primeira viagem ao exterior à Argélia, em maio de 1990, e renderia tributo ao povo argelino: “Foi a Argélia que fez de mim um homem. Sou argelino, sou árabe, sou muçulmano! Quando fui ao meu país para enfrentar o apartheid, me senti mais forte”. Recordaria ter sido “o primeiro sul-africano treinado militarmente na Argélia.”

Agência Efe

14.   Mandela estudou minuciosamente os escritos de Mao e de Che Guevara. Transformou-se em um grande admirador do guerrilheiro cubano-argentino. Depois de ser libertado, declararia: As “façanhas revolucionárias [de Che Guevara] — inclusive no nosso continente — foram de tal magnitude que nenhum encarregando de censura na prisão pôde escondê-las. A vida do Che é uma inspiração para todo ser humano que ame a liberdade. Sempre honraremos sua memória.”
15.   Cuba foi uma das primeiras nações que deu sua ajuda ao CNA. A esse respeito, Nelson Mandela destacou: “Que país solicitou a ajuda de Cuba e lhe foi negada? Quantos países ameaçados pelo imperialismo ou que lutam pela sua libertação nacional puderam contar com o apoio de Cuba? Devo dizer que quando quisemos pegar em armas nos aproximamos de diversos governos ocidentais em busca de ajuda e somente obtivemos audiências com ministros de baixíssimo escalão. Quando visitamos Cuba fomos recebidos pelos mais altos funcionários, os quais, de imediato, nos ofereceram tudo o que queríamos e necessitávamos. Essa foi nossa primeira experiência com o internacionalismo de Cuba.”
16.   No dia 5 de agosto de 1962, depois de 17 meses de vida clandestina, Mandela foi levado à prisão em Johanesburgo, graças à colaboração dos serviços secretos dos Estados Unidos com o governo de Pretoria. A CIA deu às forças repressivas do apartheid a informação necessária para a captura do líder da resistência sul-africana.
17.   Acusado de ser o organizador da greve geral de 1961 e de sair ilegalmente do território nacional, ele foi condenado a cinco anos de prisão.
18.   Em julho de 1963, o governo prendeu 11 dirigentes do CNA em Rivonia, perto de Johanesburgo, sede da direção do MK. Todos foram acusados de traição, sabotagem, conspiração com o Partido Comunista e complô destinado a derrubar o governo. Já na prisão, Mandela foi acusado das mesmas coisas.
19.   No dia 9 de outubro de 1963, começou o famoso julgamento de Rivonia na Corte Suprema de Pretoria. No dia 20 de abril de 1964, frente ao juiz africâner Quartus de Wet, Mandela desenvolveu sua alegação brilhante e destacou que, frente ao fracasso da desobediência civil como método de combate para conseguir a liberdade, a igualdade ou a justiça, frente aos massacres de Sharperville e à proibição de sua organização, o CNA não teve outro remédio senão recorrer à luta armada para resistir à opressão.
20.   No dia 12 de junho de 1964, Mandela e seus companheiros foram declarados culpados de motim e condenados à prisão perpétua.

Leia mais:

21.   O Conselho de Segurança das Nações Unidas denunciou o julgamento de Rivonia. Em agosto de 1963, condenou o governo do apartheid e pediu às nações do mundo que suspendessem  o fornecimento de armas à África do Sul.
22.   As grandes nações ocidentais, como Estados Unidos, Grã-Bretanha e França, longe de respeitarem a resolução do Conselho de Segurança, apoiaram o governo racista sul-africano e multiplicaram o fornecimento de armas.
23.   De Charles de Gaulle, presidente da França de 1959 a 1969, até o governo de Valéry Giscard d'Estaing, presidente da França de 1974 a 1981, a França foi um fiel aliado do poder racista de Pretoria e se negou sistematicamente a dar apoio ao CNA em sua luta pela igualdade e pela justiça.
24.   Paris nunca deixou de fornecer material militar para Pretoria, provendo até mesmo a primeira central nuclear da África do Sul, em 1976. Sob os governos de De Gaulle e de Georges Pompidou, presidente entre 1969 e 1974, a África do Sul foi o terceiro maior cliente da França em matéria de armamento.
25.   Em 1975, o Centro Francês de Comércio Exterior (CFCE) disse que “a França é considerada o único verdadeiro apoio da África do Sul entre os grandes países ocidentais. Não apenas fornece ao país o essencial em matéria de armamentos necessários para sua defesa, mas também tem se mostrado benevolente, ou, mais ainda, um aliado nos debates e nos votos das organizações internacionais.”
26.   Preso em Robben Island, com o número 466/64, Mandela viveu 18 anos de sua existência em condições extremamente duras. Não podia receber mais de duas cartas e duas visitas ao ano e esteve separado de sua esposa Winnie — que não tinha permissão para visitá-lo — durante 15 anos. Foi condenado a realizar trabalhos forçados, o que afetou seriamente a sua saúde, sem conseguir jamais quebrar sua força moral. Dava cursos de política, literatura e poesia a seus camaradas de destino e clamava pela resistência. Mandela gostava de recitar o poema Invictus de William Ernest Henley: “It matters not how strait the gate/How charged with punishments the scroll./I am the master of my fate:/I am the captain of my soul”. (Não importa quão estreito é o portão/ E quantas são as punições listadas/ Eu sou o mestre do meu destino/ Eu sou o capitão da minha alma)
27.   No dia 6 de dezembro de 1971, a Assembleia Geral das Nações Unidas qualificou o apartheid como crime contra a humanidade e exigiu a libertação de Nelson Mandela.
28.   Em 1976, o governo sul-africano propôs a Mandela sua libertação em troca de que ele renunciasse à luta. Madiba negou firmemente a proposta do governo segregacionista.

Agência Efe

29.   Em novembro de 1976, depois das revoltas de Soweto e da sangrenta repressão que o governo do apartheid desatou, o Conselho de Segurança das Nações Unidos impôs um embargo sobre as armas destinadas à África do Sul.
30.   Em 1982, Mandela foi transferido para a prisão de Pollsmoor, perto de Cape Town.
31.   Em 1985, Pieter Willen Botha, presidente de fato da nação, propôs libertar Mandela se ele se comprometesse, em troca, a renunciar à luta armada. O líder da luta antiapartheid recusou a proposta e exigiu a democracia para todos: “um homem, um voto.”
32.   Frente ao recrudescimento das operações de guerrilha do MK, o governo segregacionista criou esquadrões da morte com a finalidade de eliminar os militantes do CNA na África do Sul e no exterior. O caso mais famoso é o de Dulci September, assassinada em Paris no dia 29 de março de 1988.
33.   A mobilização internacional a favor de Nelson Mandela culminou em um show em Wembley, em junho de 1988, em homenagem aos 70 anos do resistente sul-africano, que foi assistido por 500 milhões de pessoas pela televisão. 

34.   O elemento decisivo que pôs fim ao apartheid foi a estrepitosa derrota militar que tropas cubanas infringiram ao exército sul-africano em Cuito Cuanavale, no sudeste de Angola, em janeiro de 1988. Fidel Castro enviou seus melhores soldados a Angola depois da invasão do país pelo governo de Pretoria, apoiada pelos Estados Unidos. A vitória de Cuito Cuanavale também permitiu à Namíbia, até então ocupada pela África do Sul, conseguir sua independência.

Leia mais:

35.   Em um artigo intitulado “Cuito Cuanavale: a batalha que acabou com o apartheid”, o historiador Piero Gleijeses, professor da Universidade John Hopkins, de Washington, especialista na política africana de Cuba, aponta que “a proeza dos cubanos nos campos de batalha e seu virtuosismo na mesa de negociações foram decisivos para obrigar a África do Sul a aceitar a independência da Namíbia. Sua exitosa defesa de Cuito foi o prelúdio de uma campanha que obrigou o exército sul-africano a sair de Angola. Essa vitória repercutiu para além de Namíbia.”
36.   Nelson Mandela, durante sua visita história a Cuba, em julho de 1991, lembrou-se daquele episódio: “A presença de vocês e o reforço enviado para a batalha de Cuito Cuanavale têm uma importância verdadeiramente histórica. A derrotada esmagadora do exército racista em Cuito Cuanavale constituiu uma vitória para toda a África! Essa contundente derrota do exército racista em Cuito Canavale deu a Angola a possibilidade de desfrutar da paz e de consolidar sua própria soberania. A derrota do exército racista permitiu que o povo combatente da Namíbia alcançasse finalmente a sua independência! A decisiva derrota das forças agressoras do apartheid destruiu o mito da  invencibilidade do opressor branco! A derrota do apartheid serviu de inspiração para o povo combatente da África do Sul! Sem a derrota infringida em Cuito Cuanavale nossas organizações não teriam sido legalizadas! A derrota do exército racista em Cuito Cuanavale possibilitou que hoje eu possa estar aqui com vocês! Cuito Cuanavale é um marco na história da luta pela libertação da África austral! Cuito Cuanavale marca a virada da luta para libertar o continente e nosso país do flagelo do apartheid! A decisiva derrota infringida em Cuito Cuanavale alterou a correlação de forças da região e reduziu consideravelmente a capacidade do governo de Pretoria para desestabilizar seus vizinhos. Este feito, em conjunto com a luta do nosso povo dentro do país, foi crucial para fazer Pretoria entender que tinha de se sentar à mesa de negociações.”
37.   No dia 2 de fevereiro de 1990, o governo segregacionista, moribundo depois da derrota de Cuito Cuanavale, viu-se obrigado a legalizar o CNA e aceitar as negociações.
38.   No dia 11 de fevereiro de 1990, Nelson Mandela foi finalmente libertado, depois de 27 anos de prisão.
39.   Em junho de 1990 foram abolidas as últimas leis segregacionistas depois da pressão feita por Nelson Mandela, pelo CNA e pelo povo.
40.   Eleito presidente do CNA em junho de 1991, Mandela recordou os objetivos: “No CNA sempre estaremos ao lado dos pobres e dos que não têm direitos. Não apenas estaremos junto deles. Vamos garantir antes cedo que tarde os pobres e sem direitos rejam a terra onde nasceram e que — como expressa a Carta da Liberdade — seja o povo que governe.”
41.   Fortemente criticado por sua aliança com o Partido Comunista Sul-Africano por causa das potências ocidentais que seguiam apoiando o governo do apartheid durante o processo de paz, Mandela replicou de modo contundente. “Não temos a menor intenção de fazer caso aos que nos sugerem e aconselham que rompamos essa aliança [com o Partido Comunista]. Quem são os que oferecem esses conselhos não solicitados? Provêm, em sua maioria, dos que nunca nos deram ajuda alguma. Nenhum desses conselheiros fez jamais os sacrifícios que fizeram os comunistas pela nossa luta. Essa aliança nos fortaleceu e a tornaremos ainda mais estreita.”
42.   Em 1991, Mandela condenou o persistente apoio dos Estados Unidos ao governo do apartheid:  “Estamos profundamente preocupados com a atitude que a  administração Bush adotou sobre esse assunto. Este foi um dos poucos governos que esteve em contato habitual conosco para examinar a questão das sanções e lhe fizemos ver claramente que eliminar as sanções seria prematuro. No entanto, essa administração, sem nem nos consultar, simplesmente nos informou que as sanções estadunidenses seriam anuladas. Consideramos isso totalmente inaceitável.”

Agência Efe

43.   Em 1993, Mandela recebeu o Prêmio Nobel da Paz por sua obra a favor da reconciliação nacional.
44.   Durante a primeira votação democrática da história da África do Sul, no dia 27 de abril de 1994, Nelson Mandela, de 77 anos, foi eleito presidente da República com mais de 60% dos votos. Governou até 1999.
45.   No dia 1 de dezembro de 2009, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou, em votação unânime de seus 192 membros, uma resolução que decreta o dia 18 de julho como Dia Internacional Nelson Mandela, em homenagem à luta do herói sul-africano contra todas as injustiças.
46.   Se hoje Mandela é cumprimentado por todos, por décadas as potências ocidentais o consideraram um homem perigoso e o combateram apoiando o governo do apartheid.
47.   Estados Unidos, França e Grã-Bretanha foram os principais aliados do governo do apartheid, o qual apoiaram até o último momento.
48.   Se os Estados Unidos veneram hoje em dia Nelson Mandela, de Clinton a Bush passando por Obama, é conveniente lembrar que ele foi mantido na lista de membros de organizações terroristas até o dia 1 de janeiro de 2008.
49.   Nelson Mandela lembrou varias vezes dos lanços inquebrantáveis que atavam a África do Sul a Cuba. “Desde seus primeiros dias, a Revolução Cubana tem sido uma fonte de inspiração para todos os povos amantes da liberdade. O povo cubano ocupa um lugar especial no coração dos povos da África. Os internacionalistas cubanos deram uma contribuição para a independência, para a liberdade e a justiça na África que não tem paralelo pelos princípios e pelo desinteresse que a caracterizam. É muito o que podemos aprender da sua experiência. De modo particular, nos comove a afirmação do vínculo histórico com o continente africano e seus povos. Seu invariável compromisso com a erradicação sistemática do racismo não tem paralelo. Somos conscientes da grande dívida que existe hoje com o povo de Cuba. Que outro país pode mostrar uma história mais desinteressada que a que teve Cuba em suas relações com a África?
50.   Thenjiwe Mtintso, embaixadora da África do Sul em Cuba, lembrou-se da verdade histórica a propósito do compromisso de Cuba na África. “Hoje a África do Sul tem muitos amigos novos. Ontem, estes amigos se referiam aos nossos líderes e aos nossos combatentes como terroristas e nos acusavam enquanto apoiavam a África do Sul do apartheid. Esses mesmos amigos hoje querem que nós denunciemos e ilhemos Cuba. Nossa resposta é muito simples, é o sangue dos mártires cubanos e não destes amigos que corre profundamente na terra africana e nutre a árvore da liberdade em nossa pátria.”
 

*Doutor em Estudos Ibéricos e Latino-americanos da Universidade Paris Sorbonne-Paris IV, Salim Lamrani é professor-titular da Universidade de la Reunión e jornalista, especialista nas relações entre Cuba e Estados Unidos. Seu último livro se chama The Economic War Against Cuba. A Historical and Legal Perspective on the U.S. Blockade [A Guerra Econômica contra Cuba. Uma Perspectiva Histórica e Legal do Bloqueio dos EUA], New York, Monthly Review Press, 2013, com prólogo de Wayne S. Smith e prefácio de Paul Estrade.

domingo, 22 de dezembro de 2013

CARTA ABERTA À REDE GLOBO CONTRA A MENTIRA SOBRE OS PALESTINOS


CARTA ABERTA À REDE GLOBO CONTRA A MENTIRA SOBRE OS PALESTINOS


Federação Árabe Palestina do Brasil
A REDE GLOBO, DIREÇÃO E AUTOR DA NOVELA "AMOR À VIDA", PRESTAM UM TRIBUTO AO ÓDIO E PRECONCEITO AO EXIBIR CENA ONDE TRANSMITE O CONCEITO DE QUE TODOS OS PALESTINOS SÃO TERRORISTAS.
ISSO DEMONSTRA O QUANTO ESSA EMISSORA ESTÁ TOTALMENTE DESCONECTADA COM A REALIDADE DO CONFLITO PALESTINO ISRAELENSE OU ESTÁ CONECTADA COM SETORES MINORITÁRIOS DA SOCIEDADE BRASILEIRA QUE PREGAM A DISCRIMINAÇÃO RACIAL, ÉTNICA E RELIGIOSA COMO FILOSOFIA DO AGIR E PENSAR.
MAL SABEM ESSES SENHORES DESSA EMISSORA QUE OS PALESTINOS SÃO ÁRABES E QUE NO BRASIL HÁ MAIS DE 12 MILHÕES DE ÁRABES E SEUS DESCENDENTES(LIBANESES, SÍRIOS, LIBANESES, EGÍPCIOS, JORDANIANOS E OUTRAS NACIONALIDADES ÁRABES).
MAL SABEM ESSES SENHORES QUE AO OFENDER E DISCRIMINAR O POVO PALESTINO ESTÃO DISCRIMINANDO NÃO SÓ OS BRASILEIROS ÁRABES, MAS TODA A NAÇÃO BRASILEIRA QUE RECEBEU DE BRAÇOS ABERTOS ESSES ÁRABES QUE SEMPRE CONTRIBUIRAM PARA O DESENVOLVIMENTO E CONSTRUÇÃO DO BRASIL.
A HISTÓRIA DA PRESENÇA ÁRABE NO BRASIL ESTÁ PRESENTE DESDE A CHEGADA DE PEDRO ÁLVARES CABRAL. EM TODOS OS RAMOS DA ATIVIDADE HUMANA ESTÃO PRESENTES OS BRASILEIROS DE ORIGEM ÁRABE: CULTURA, CULINÁRIA, ECONOMIA,MEDICINA, ENGENHARIA, POLITICA, COMÉRCIO E TANTAS OUTRAS ATIVIDADES.
EM VEZ DE PREGAR A PAZ ENTRE ISRAELENSES E PALESTINOS, ENTRE ÁRABES E JUDEUS NO BRASIL, A DIREÇÃO DA REDE GLOBO PREGA O CONFLITO, IMPORTA O CONFLITO DE MANEIRA IRRESPONSÁVEL E ENGAJADA. ÁRABES E JUDEUS NO BRASIL NUNCA TIVERAM NENHUM TIPO DE PROBLEMA DE CONVIVÊNCIA E DIÁLOGO AQUI NO BRASIL. A DIREÇÃO DA GLOBO NÃO QUER QUE CONTINUE ASSIM? A QUEM ESTÁ PRESTANDO ESSE SERVIÇO DE GERAR ÓDIO E CONFLITO?
REPUDIAMOS, CONDENAMOS TAL LINHA DE AÇÃO E EXIGIMOS QUE OS RESPONSÁVEIS PELA CENA SE RETRATEM E SE SE DESCULPEM COM OS PALESTINOS E OS ÁRABES. É O MINIMO QUE PODERÃO FAZER PARA REPARAR ESSA DESASTROSA CENA VISTA POR MILHÕES DE BRASILEIROS.
FEDERAÇÃO ÁRABE PALESTINA DO BRASIL
Representante da comunidade palestino brasileira

Eu não sou terrorista - I am not a  terrorist
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PARA QUEM QUISER E PUDER ENVIAR SEU PEDIDO DE RETRATAÇÃO POR PARTE DO AUTOR DA NOVELA EM RELAÇÃO A EPISÓDIO LAMENTÁVEL, LIGAR PARA A GLOBO, O TELEFONE É 400-22884, SEM DDD. É SÓ CHAMAR DIRETO E FAZER A CRÍTICA.
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PARA ENTENDER MELHOR O FATO:
Não costumo assistir televisão e confesso que não é raro eu me surpreender com algum tipo de discussão envolvendo algum episódio,personagem ou desinformação sendo difundida de forma no mínimo leviana pela televisão brasileira. Se considerarmos que as telenovelas também são possuidoras de uma importância cultural e política, tendo em vista sua grande audiência e o fato de que elas deixaram de ser apenas voltadas para o lazer para se tornarem um espaço cultural de intervenção para a discussão e introdução de hábitos e valores, talvez seja possível percorrer mais um caminho para se compreender a forma como os árabes - e mais recentemente, os muçulmanos, são vistos no Brasil.
Em 2010, realizei um levantamento exploratório com o intuito de verificar a quantidade de novelas em que havia presente um ou mais personagens árabes. O objetivo foi averiguar possíveis mudanças na forma como eles estão presentes no imaginário social da população brasileira. Tal levantamento permitiu constatar que entre 1967 e 2009 personagens árabes apareceram com algum destaque em cerca de 10 telenovelas nacionais. Desse total, os árabes adquiriram status de protagonistas principais em apenas duas delas, a saber: "O Sheik de Agadir" (1967) e "O Clone" (2001).
Um dos aspectos que mais chamou a atenção foi que após 2001, ou seja, período correspondente àquele do atentado de 11 de setembro ao World Trade Center nos EUA, a teledramaturgia brasileira levou quase uma década até contar novamente com algum personagem de origem árabe.
Curiosamente – ou não-, em 2009, a emissora de televisão Record lançou "Poder Paralelo",uma novela que contou com dois personagens de origem árabe, os quais inauguraram uma nova forma de representá-los na teledramaturgia brasileira aos caracterizá-los como terroristas.
De lá para cá, eu não pude acompanhar com a devida atenção o eventual aparecimento de personagens árabes (e/ou muçulmanos) em novelas brasileiras, mas hoje me surpreendi ao ver uma discussão no grupo Somos Árabes sobre um episódio ocorrido em um folhetim exibido atualmente: "Amor à vida".
Como eu desconhecia atrama, tentei ler os comentários deixados no grupo enquanto que me situava um pouco melhor em relação ao assunto que teria gerado a polêmica. Por fim, após pesquisar um pouco - provavelmente não com a atenção necessária, pois meu dia foi super corrido, eu percebi que novamente a televisão brasileira tem prestado um desserviço à população disseminando uma série de desinformações e estereótipos, caricaturas e contribuindo para reforçar aquilo que o intelectual palestino Edward Said já chamava atenção no final da década de 1970: o fato de que cada vez mais o árabe aparece por toda a parte como algo ameaçador.
Se no Brasil esse imaginário demorou algumas décadas até ganhar força, atualmente, parece que a nossa televisão brasileira não tem se esforçado muito para esclarecer à população o quão prejudiciais esses imaginários criados a respeito de culturas estrangeiras, religiões etc. podem ser.
Lamento muito que o autor da novela exibida atualmente, o senhor Walcyr Carrasco, não tenha sido capaz de romper com esse ciclo de preconceito e desinformação a respeito do povo palestino. Inacreditável pensar que cenas como essa que pode ser vista clicando no link entre parênteses (http://extra.globo.com/tv-e-lazer/telinha/amor-vida-persio-revela-que-foi-terrorista-cogitou-ser-homem-bomba-10926733.html)sejam exibidas de forma irresponsável, e que não gerem no mínimo um repúdio por parte de uma sociedade como a nossa, que convive com distintas presenças árabe sem tantas esferas do cotidiano e, a meu ver, deveria possuir esclarecimento suficiente para compreender que o sofrimento de um povo e as dramáticas consequências devem ser tratadas com o devido cuidado e respeito.
Do contrário,enquanto continuarem difundindo desinformação, mais ódio nascerá nos corações das pessoas e mais distante da paz esse povo ficará.
Deixo aqui, em nome do Presença Árabe no Brasil esta nota de repúdio ao autor da novela, sugerindo ainda, que este senhor pesquise melhor sobre aquilo a que se propõe escrever,tratando com respeito e responsabilidade assuntos sérios que envolvem tanto sofrimento e dor. Demonizar uma religião ou um povo é um ato grave,irresponsável e possui consequências desastrosas.
Patricia El-moor –Presença Árabe no Brasil

sábado, 21 de dezembro de 2013

E ainda falam mal de Cuba....


Cuba apresenta vacina contra câncer de pulmão


O lançamento oficial foi realizado em Buenos Aires e, agora, segue viagem para Córdoba



O lançamento oficial da segunda vacina contra o câncer de pulmão, desenvolvida e registrada por autoridades sanitárias de Cuba, foi realizada na última sexta-feira (14/07) em Buenos Aires e terá continuação na próxima sexta-feira (28) em Córdoba, também na Argentina

Em 2008, Cuba registrou a vacina contra o câncer pulmonar e agora tenta comercializar o produto na Argentina graças a uma colaboração iniciada em 1994. Em março, a agência regulatória de Buenos Aires aprovou o registro da Racotumomab.

Com este medicamento, Cuba espera transformar o câncer avançado em uma doença crônica que possa ser controlada por períodos prolongados, como o diabetes e a hipertensão arterial.

A vacina, chamada Racotumomab (Vaxira) e desenvolvida pelo CIM (Centro de Imunologia Molecular de Cuba) foi aplicada com resultados favoráveis em pacientes da ilha caribenha entre os anos 2008 e 2011.

Ainda não foi possível precisar se a vacina é uma solução à doença, mas ela aumenta a esperança de vida dos pacientes, ao estimular o sistema imunológico do corpo humano.

O câncer de pulmão é considerado um dos mais mortais que existem, causando por volta de 1,4 milhões de mortes por ano, segundo estimativas da OMS (Organização Mundial da Saúde)

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Chora por Mandela, mas acha um absurdo pobre querer os mesmos direitos



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Precisamos de mais pessoas como Mandela.
Pessoas que são capazes de usar a força quando necessário e adotar uma atitude conciliadora quando preciso. Mas que não descartam qualquer uma das duas acões políticas.
Por conta da morte de Mandela, estamos sendo soterrados por reportagens que louvam apenas um desses lados e esquece o outro, como se as folhas de uma árvore existissem sem o seu tronco e os galhos. O apartheid não morreu apenas por conta do sorriso bonito e das falas carismáticas do líder sul-africano, mas por décadas de luta firme contra a segregação coordenada por uma resistência que ele ajudou a estruturar.
É fascinante como regimes execrados pelo Ocidente foram, muitas vezes, os únicos que estenderam a mão a Mandela e à luta contra o apartheid. E como, décadas depois, muitos países prestam suas homenagens a ele, sem um mísero mea culpa por seu papel covarde durante sua prisão. Ou, pior: como veículos de comunicação desse mesmo Ocidente ignoram a complexidade da luta de Mandela, defendendo que o pacifismo foi o seu caminho.
Desculpem, mas a necessária conciliação para curar feridas ou a tolerância são diferentes de injustiça. E ser pacifista não significa morrer em silêncio, em paz, de fome ou baioneta. A desobediência civil professada por Gandhi é uma saída, mas não a única e nem cabe em todas as situações em que um grupo de pessoas é aviltado por outro.
“Eu celebrei a ideia de uma sociedade livre e democrática, na qual todas as pessoas vivam juntas em harmonia e com oportunidades iguais. É um ideal pelo qual espero viver e o qual espero alcançar. Mas, se for necessário, é um ideal pelo qual estou pronto para morrer'', disse ele, ao ser condenado a 27 anos de prisão.
As histórias das lutas sociais ao redor do mundo são porcamente ensinadas. Ao ler o que os jovens aprendem nas carteiras escolares ou no conteúdo trazido por nós jornalistas, fico com a impressão que a descolonização da Índia, o fim do apartheid na África do Sul ou a independência de Timor Leste foram obtidas apenas através de longas discussões regadas a chá e um pouco de desobediência. Dessa forma, a interpretação dos fatos, passada adiante, segue satisfatória aos grupos no poder.
Muitos que hoje lamentam por Mandela detestam manifestações públicas e mudanças no status quo.
Adoram um revolucionário quando este é reconhecido internacionalmente e aparece em estampas de camisetas, mas repudiam quem ocupa propriedades, por exemplo, “impedindo o progresso''.
Leio reclamações da violência de protestos quando estes vêm dos mais pobres entre os mais pobres – “um estupro à legalidade” – feitas por uma legião de pés-descalços empunhando armas de destruição em massa, como enxadas, foices e facões. Ou contra povos indígenas, cansados de passar fome e frio, reivindicando territórios que historicamente foram deles, na maioria das vezes com flechas, enxadas e paciência. Ou ainda professores que exigem melhores salários e resolvem ir às ruas para mostrar sua indignação e pressionar para que o poder público mude o comportamento. Todos eles são uns vândalos.
Daí, essa pessoa que ama Mandela, mas não sabe quem ele é, pensa: poxa, por que essa gente maltrapilha simplesmente não sofre em silêncio, né?
Muitas das leis criticadas em protestos e ocupações de terra ou mesmo no apartheid não foram criadas pelos que sofrem em decorrência de injustiça social, mas sim por aqueles que estavam ou estão na raiz do problema e defendem regras para que tudo fique como está. Nem sempre a legalidade é justa. E essa frase assusta muita gente.
Mandela é a inspiração. Com ele, é possível acreditar que manifestações populares e ocupações resultem nos pequenos vencendo os grandes. E, com o tempo, os rotos e rasgados sendo capazes de sobrepujar ricos e poderosos.
Por isso, o desespero inconsciente presente em muitas reclamações sobre a violência inerente ou involuntária desses atos. Ou na tentativa de reescrever a história editando aquilo que não interessa.
Enquanto isso, mais um indígena foi morto no Mato Grosso do Sul. Mas tudo bem. Devia ser apenas mais um vândalo, não um homem de bem como Mandela.
Enfim, precisamos de mais pessoas como Mandela. Pois os bons do século 20 estão morrendo antes que realmente entendamos suas mensagens.