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Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
quarta-feira, 30 de dezembro de 2009
O estado da agricultura angolana
Segundo os dados oficiais, a produção agrícola de Angola está
aumentando. Pela primeira vez a barreira de um milhão de toneladas de
cereais foi atingida. Acredita-se que a produção de café tenha chegado
ao dobro da do ano passado. Os rebanhos de gado bovino de raças
importadas ampliaram-se, assim como melhorou o desempenho de alguns
empreendimentos pecuários. Os números de empreendimentos de média e
grande dimensão e de empregos cresceram. O consumo de fertilizantes foi
ampliado e o governo aprovou duas linhas de crédito para investimentos
e custos operacionais da campanha agrícola.
A situação melhorou efetivamente, mas estamos longe, muito longe, do
que deveria ser feito. As estatísticas não são suficientemente
credíveis para se avaliar a real dimensão dessa melhoria. Em Angola não
há práticas de monitoria e avaliação independentes dos empreendimentos
públicos. O mais preocupante é que estas melhorias acontecem de forma
puntual, não constituem reflexo de uma mudança estratégica de fundo e
não estão associadas a reformas estruturantes que possam vir a garantir
a sustentabilidade das ações.
Promessas irrealistas
Por ocasião das eleições de 2008, o MPLA [Movimento Popular de
Libertação de Angola, partido político que dirige o país deste 1975]
prometeu aos angolanos metas de produção agropecuária ambiciosas para
2012. Por exemplo, a produção de cereais passaria de 700 mil toneladas
para 15 milhões, ou seja, aumentaria mais de 20 vezes em quatro anos, o
que seria absolutamente inédito. Foi denunciada a falta de realismo
dessas metas em Maio de 2008.
Após um ano, o panorama não é animador. Principalmente no que se
refere aos aspectos estruturantes, aqueles que condicionam a produção.
A reforma da pesquisa promete muito mas concretiza pouco. Um centro
construído em Malanje [capital da província angolana de mesmo nome,
situado no centro-norte do país] e equipado com três laboratórios desde
2006, em um investimento de mais de dois milhões de dólares, ainda não
entrou em funcionamento. Programas de capacitação de agricultores
aprovados há mais de um ano e com financiamento externo garantido, não
iniciaram por problemas de pormenor. Não há uma estratégia adequada
para estimular a instalação generalizada de provedores de serviços
públicos ou privados nos municípios, em mais de 90% dos quais os
agricultores não conseguem sequer comprar sementes e ferramentas
usuais, nem obter conselhos técnicos elementares. O consumo de
fertilizantes chegou a 30 mil toneladas, quando, segundo a FAO, já há
muito deveríamos ter ultrapassado as 400 mil.
As linhas de crédito aprovadas tardam a ser concretizadas para
desespero dos agricultores e o acesso ao que existe é limitado, quer
por deficiências do sistema bancário, concentrado nas capitais de
província e demasiado exigente nos requisitos para financiamento de
necessidades elementares dos agricultores, quer pela incapacidade
desses agricultores de apresentarem projetos credíveis. Nos últimos
anos foram adquiridos tratores e equipamentos em quantidades e valores
consideráveis que têm uma vida útil média inferior a dois anos,
possivelmente uma das mais baixas do mundo, e não são dados os passos
necessários para a definição de uma política sensata de mecanização,
que tenha em conta o estado atual de organização e as capacidades
institucionais e de recursos humanos, e preveja os níveis de
intensificação, o tipo de equipamento, a formação de técnicos e de
operários especializados e o uso de métodos modernos de planejamento
estratégico e de gestão.
Cooperativas de serviços
As cooperativas de serviços poderiam ser uma solução para estes
problemas, mas a legislação cooperativa está desatualizada e a nova lei
aguarda aprovação há vários anos. Mesmo o ambiente do agronegócio
também não é o melhor, pois a maior parte dos empresários são
agricultores em tempo parcial, colocando à frente dos seus
empreendimentos gestores geralmente pouco qualificados.
Para que serve investir no conhecimento se o petróleo paga tudo,
inclusive o conhecimento que vem de fora para dar respaldo a decisões
políticas sem fundamento? O que as pessoas parecem ignorar, ou, na
esteira de uma outra prática, desejam que não aconteça e confundem tal
desejo com a realidade, é que o petróleo tem os anos contados, o que
torna o conceito de desenvolvimento sustentável para Angola mais
pertinente do que nunca.
E o conhecimento, afinal, está aí à mão. Em meados da década de 90,
uma equipe da FAO explicou ao governo angolano que a sua aposta deveria
ser, prioritariamente, na agricultura familiar. Os pequenos
agricultores constituem a maioria, encontram-se no terreno e já
provaram que podem expandir a produção, de modo a garantir sua
alimentação básica e fornecer bens para o mercado, incluindo o
internacional, o que está estatisticamente comprovado desde antes de
1975. Ademais, o crescimento da produção familiar teria grande impacto
na economia nacional, na geração de emprego e na erradicação da
pobreza, pois a produção acrescida em unidades de pequena dimensão
resulta em uma melhor utilização dos recursos domésticos – sobretudo
terra e trabalho –, exige poucas divisas para maquinaria,
fertilizantes, pesticidas e conhecimento estrangeiro, e por isso
torna-se menos dependente.
Uma política a favor da agricultura familiar assegura desde logo a
alimentação de um número elevado de famílias, resulta numa expansão
mais justa de benefícios do desenvolvimento econômico, contribui para
padrões de vida rural mais elevados e incentiva o consumo, e,
consequentemente, estimula a expansão industrial em Angola, como
aconteceu no passado com o famoso boom econômico dos anos 60
e 70. Enfim, uma economia rural próspera reduziria os fatores de
pressão que induzem a migração para as cidades, e o aumento dos
rendimentos dos pequenos agricultores poderia tornar-se o motor do
desenvolvimento rural e, por conseguinte, a chave para uma redução da
pobreza estrutural.
Parece simples, não é verdade? Mas não é novidade. O agrônomo
francês Renê Dumont já havia sugerido algo semelhante aos governantes
africanos no início dos anos 60 e as suas ideias foram compiladas num
livro que ficou célebre, A África começa mal, que lhe valeu a
interdição de entrada em vários países do continente. Perante o
desastroso desempenho da agricultura africana, nos anos 80 ele voltou à
luta com novo livro, Pela África, eu acuso!, que poderia bem ter outro título: “Eu não vos avisei?”.
O que aconteceu foi que, ao contrário do discurso oficial, o Governo
angolano não foi capaz de implementar ao longo destes anos uma política
justa de desenvolvimento da agricultura familiar, que permitisse a
transformação dos camponeses em pequenos ou médios empresários, a
melhoria tecnológica, o aumento da produtividade da terra e do
trabalho, o aumento da renda familiar e até a garantia da posse da
terra.
Nas áreas rurais não há comércio formal e o informal é intermitente
e penalizante para os produtores. E deste modo não há incentivos. Não
há serviços sociais básicos, como o acesso à água potável, à saúde, à
escola – ou não há com a qualidade desejável – que possam estimular a
presença de jovens nas suas aldeias, preferindo estes partir para as
cidades para viverem de biscates. Serviços estruturados de extensão
rural e de medicina veterinária ainda são uma miragem. Os bancos estão
geográfica e estruturalmente a uma enorme distância. A pesquisa
científica e as instituições públicas em geral quase ignoram a
existência da agricultura familiar. Assim, não poderia contribuir para
a diversificação da economia. Pior que tudo, instalou-se a ideia de que
a agricultura familiar, essa mesma que foi responsável pela alimentação
dos angolanos e pela exportação no passado, era, afinal uma agricultura
de subsistência, e, por isso, condenada à estagnação.
Agronegócio e agrocombustíveis
O governo angolano caminha, então, no sentido oposto ao indicado
pela FAO e por Dumont. Em vez de aplicar uma política de transformação
gradual de sua agricultura que possa garantir a segurança alimentar,
aposta na “importação” de uma outra agricultura, baseada no agronegócio
e nos agrocombustíveis, para a qual o país ainda não está preparado e
só o voluntarismo e o fascínio dos angolanos pela “modernização” a
qualquer preço explicam essa aposta. Hoje isso é possível, com os meios
técnicos e científicos de que a humanidade dispõe, mas é insuportável
porque os custos de produção são assustadores.
Se a crise financeira trouxe algo de positivo, uma delas foi o
alerta para algumas das opções governamentais e particulares
extremamente dispendiosas e com resultados mais do que duvidosos. Há já
alguns sinais de dificuldades, insucessos e falências que alguns
julgavam impensáveis. Por incrível que possa parecer, algumas das
grandes empresas têm transtornos para vender o milho produzido, pois
não têm organização nem experiência para enfrentar dificuldades
inesperadas. Mas esta é também uma aposta que vai conduzir,
inevitavelmente, à exclusão da maioria dos agricultores angolanos e à
degradação da biodiversidade, o que terá consequências sociais,
políticas e ambientais desastrosas.
Uma aposta que, como diria Mia Couto [célebre escritor moçambicano],
pode produzir ricos ou endinheirados, mas nunca a riqueza de que
necessitamos para sermos um povo desenvolvido.
Fernando Pacheco
Tradução: Roberto Blum
Para acessar o texto original, clique aqui.
Fotografia retirada daqui
Homenagem a Mario Benedetti...
Mario Benedetti | |
Nascimento | 14 de setembro de 1920 Paso de Los Toros, Uruguai |
---|---|
Morte | 17 de maio de 2009 |
Nacionalidade | uruguaio |
Ocupação | escritor, poeta, ensaísta |
Uma pequena homenagem àquele que representou, no ano de 2009, uma das maiores perdas que tivemos no mundo da literatura e do comprometimento politico.
Hagamos un trato
Cuando sientas tu herida sangrar cuando sientas tu voz sollozar cuenta conmigo. (de una canción de Carlos Puebla)
Compañera,
usted sabe
que puede contar conmigo,
no hasta dos ni hasta diez
sino contar conmigo.
Si algunas veces
advierte
que la miro a los ojos,
y una veta de amor
reconoce en los míos,
no alerte sus fusiles
ni piense que deliro;
a pesar de la veta,
o tal vez porque existe,
usted puede contar
conmigo.
Si otras veces
me encuentra
huraño sin motivo,
no piense que es flojera
igual puede contar conmigo.
Pero hagamos un trato:
yo quisiera contar con usted,
es tan lindo
saber que usted existe,
uno se siente vivo;
y cuando digo esto
quiero decir contar
aunque sea hasta dos,
aunque sea hasta cinco.
No ya para que acuda
presurosa en mi auxilio,
sino para saber
a ciencia cierta
que usted sabe que puede
contar conmigo.
usted sabe
que puede contar conmigo,
no hasta dos ni hasta diez
sino contar conmigo.
Si algunas veces
advierte
que la miro a los ojos,
y una veta de amor
reconoce en los míos,
no alerte sus fusiles
ni piense que deliro;
a pesar de la veta,
o tal vez porque existe,
usted puede contar
conmigo.
Si otras veces
me encuentra
huraño sin motivo,
no piense que es flojera
igual puede contar conmigo.
Pero hagamos un trato:
yo quisiera contar con usted,
es tan lindo
saber que usted existe,
uno se siente vivo;
y cuando digo esto
quiero decir contar
aunque sea hasta dos,
aunque sea hasta cinco.
No ya para que acuda
presurosa en mi auxilio,
sino para saber
a ciencia cierta
que usted sabe que puede
contar conmigo.
Desigualdade no campo permanece, aumentando diferenças sociais no Brasil...
ANÁLISE DO CENSO AGROPECUÁRIO DE 2006 - ALGUMAS INFORMAÇÕES IMPORTANTES
*Frei Sergio Gorgen
A cada 10 anos o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – faz um levantamento, uma pesquisa, indo de casa em casa, para saber como está a vida e a produção no meio rural brasileiro.
O último Censo Agropecuário foi feito em 2006 e publicado em 2009.
Esta pesquisa permite fazer um retrato, uma fotografia de como está a
vida e a produção na roça e dá para fazer algumas comparações
importantes sobre as diferenças entres os grandes e pequenos
agricultores, entre o agronegócio e a agricultura camponesa.
Vamos ver alguns números desta pesquisa:
1 – Propriedade e Posse da Terra
Os pequenos agricultores tem 24% de todas as terras privatizadas do Brasil.
Quer dizer, de cada 100 hectares de terras, 24 é de camponês.
Os médios e grandes tem 76% de todas as terras.
De cada 100 hectares, 76 é do agronegócio.
2 – Número de Estabelecimentos – Propriedades, Posses, Lotes
Os camponeses são mais de 4 milhões e 360 mil estabelecimentos.
Os médios e grandes são apenas 807 mil estabelecimentos.
Os grandes proprietários acima de mil hectares são apenas 46.000. E os latifundiários acima de 2 mil ha, são apenas 15 mil fazendeiros que detêm 98 milhões de hectares.
3 – O que Produzem:
Os camponeses produzem 40% da produção agropecuária do Brasil (medida pelo Valor Bruto da Produção Agropecuária Total), apesar de terem apenas 24% das terras, e ainda, nas piores condições de topografia e fertilidade. Alem disso, sabe-se que grande parte da produção do camponês é para auto-sustento, e por tanto não é vendida.
Os médios e grandes produzem 60% da produção agropecuária do país, tendo 76% de todas as terras do país, entre elas as mais planas e ferteis e melhor localizadas para o mercado.
4 – Valor da Produção Por Hectare
1 hectare da agricultura camponesa teve, em média, uma renda de R$ 677,00.
1 hectare do agronegócio teve, em média, uma renda de apenas R$ 368,00.
5 – Quem produz o que o Povo Brasileiro Come:
Daquilo que vai para a mesa dos brasileiros, 70% é produzido pelos pequenos agricultores, pelos camponeses.
Só 30% do que vai para a mesa dos brasileiros vem das grandes propriedades, que priorizam apenas as exportações, ou seja não produzem comida, querem produzir apenas "commodities"!
6 – Trabalho para o Povo:
As pequenas propriedades, dão trabalho para 74% de toda mão de obra no campo brasileiro.
As médias e grandes, o agronegócio, mesmo com muito mais terra, só empregam para 26% das pessoas que trabalham no campo. Pois preferem utilizar mecanização intensiva e muito agrotóxicos. Por isso, o Brasil se transformou na safra de 2008/2009 no maior consumidor mundial de agrotóxicos. São aplicados 700 milhões de litros de veneno por ano!
7 – Quantas pessoas trabalham por Hectare:
Na agricultura camponesa, em cada 100 hectares, trabalham 15 pessoas.
No agronegócio, em cada 100 hectares, dão emprego para apenas 2 pessoas (média real de 1,7 pessoas/ha).
8 – Os recursos do Crédito Agrícola:
Os valores do crédito não estão no Censo Agropecuário, mas no Plano Safra. No Plano Safra 2009/2010 foram destinados R$ 93 milhões para o agronegócio. E 15 bilhões para a agricultura camponesa. Mesmo assim, sabe-se que apesar da crescente oferta de recursos para a agricultura camponesa, apenas 1,2 milhoes de estabelecimentos familiares tem acesso ao credito, e na ultima safra utilizaram apenas 80% do que esta disponível.
Isto significa que os camponeses utilizam apenas 14% do crédito agrícola total ofertado pelos bancos, através das normas e determinações da política do governo federal.
Resumo comparativo entre os dois modelos de agricultura vigentes no Brasil
Vamos ver alguns números desta pesquisa:
1 – Propriedade e Posse da Terra
Os pequenos agricultores tem 24% de todas as terras privatizadas do Brasil.
Quer dizer, de cada 100 hectares de terras, 24 é de camponês.
Os médios e grandes tem 76% de todas as terras.
De cada 100 hectares, 76 é do agronegócio.
2 – Número de Estabelecimentos – Propriedades, Posses, Lotes
Os camponeses são mais de 4 milhões e 360 mil estabelecimentos.
Os médios e grandes são apenas 807 mil estabelecimentos.
Os grandes proprietários acima de mil hectares são apenas 46.000. E os latifundiários acima de 2 mil ha, são apenas 15 mil fazendeiros que detêm 98 milhões de hectares.
3 – O que Produzem:
Os camponeses produzem 40% da produção agropecuária do Brasil (medida pelo Valor Bruto da Produção Agropecuária Total), apesar de terem apenas 24% das terras, e ainda, nas piores condições de topografia e fertilidade. Alem disso, sabe-se que grande parte da produção do camponês é para auto-sustento, e por tanto não é vendida.
Os médios e grandes produzem 60% da produção agropecuária do país, tendo 76% de todas as terras do país, entre elas as mais planas e ferteis e melhor localizadas para o mercado.
4 – Valor da Produção Por Hectare
1 hectare da agricultura camponesa teve, em média, uma renda de R$ 677,00.
1 hectare do agronegócio teve, em média, uma renda de apenas R$ 368,00.
5 – Quem produz o que o Povo Brasileiro Come:
Daquilo que vai para a mesa dos brasileiros, 70% é produzido pelos pequenos agricultores, pelos camponeses.
Só 30% do que vai para a mesa dos brasileiros vem das grandes propriedades, que priorizam apenas as exportações, ou seja não produzem comida, querem produzir apenas "commodities"!
6 – Trabalho para o Povo:
As pequenas propriedades, dão trabalho para 74% de toda mão de obra no campo brasileiro.
As médias e grandes, o agronegócio, mesmo com muito mais terra, só empregam para 26% das pessoas que trabalham no campo. Pois preferem utilizar mecanização intensiva e muito agrotóxicos. Por isso, o Brasil se transformou na safra de 2008/2009 no maior consumidor mundial de agrotóxicos. São aplicados 700 milhões de litros de veneno por ano!
7 – Quantas pessoas trabalham por Hectare:
Na agricultura camponesa, em cada 100 hectares, trabalham 15 pessoas.
No agronegócio, em cada 100 hectares, dão emprego para apenas 2 pessoas (média real de 1,7 pessoas/ha).
8 – Os recursos do Crédito Agrícola:
Os valores do crédito não estão no Censo Agropecuário, mas no Plano Safra. No Plano Safra 2009/2010 foram destinados R$ 93 milhões para o agronegócio. E 15 bilhões para a agricultura camponesa. Mesmo assim, sabe-se que apesar da crescente oferta de recursos para a agricultura camponesa, apenas 1,2 milhoes de estabelecimentos familiares tem acesso ao credito, e na ultima safra utilizaram apenas 80% do que esta disponível.
Isto significa que os camponeses utilizam apenas 14% do crédito agrícola total ofertado pelos bancos, através das normas e determinações da política do governo federal.
Resumo comparativo entre os dois modelos de agricultura vigentes no Brasil
Os Camponeses………………………………………………………………………..O agronegócio
14% do Crédito………………………………………………………………………..86% do crédito rural
24% das terras……………………………………………………………………………76% das terras
40% do valor total da produção vendida………………………60% do valor total da produção vendida
70% da produção total de comida do país…………………30% da produção total de comida do país
74% da mão de obra da agricultura brasileira…………..26% da mão de obra na agricultura brasileira
14% do Crédito………………………………………………………………………..86% do crédito rural
24% das terras……………………………………………………………………………76% das terras
40% do valor total da produção vendida………………………60% do valor total da produção vendida
70% da produção total de comida do país…………………30% da produção total de comida do país
74% da mão de obra da agricultura brasileira…………..26% da mão de obra na agricultura brasileira
PERSPECTIVAS SE HOUVESSE UMA REFORMA AGRÁRIA MASSIVA
Usando os dados do Censo 2006 podemos fazer uma projeção de como poderia ser o Brasil se houvesse uma Reforma Agrária, massiva, que democratizasse a propriedade e posse da terra e reorganizasse a produçao agricola para o mercado interno.
Tomando como base só os Estabelecimentos acima de 1.000 hectares.
Com mais de 1.000 hectares são apenas 46.911 estabelecimentos.
Ocupam uma área de 146.553.218 hectares, isto é, mais de 146 milhões de hectares. Dá uma média de 3.125 hectares por propriedade.
Agora vejamos como ficaria esta terra que agora pertence a apenas 47 mil grandes proprietários, se fosse distribuída em lotes com tamanho médio de 50 hectares por família?
- Seriam criados 2 milhões e 920 mil novos estabelecimentos agrícolas, ou seja, quase 3 milhões de novas familias de camponeses.
- Contando que a agricultura camponesa ocupa 15 pessoas a cada 100 hectares, esta reforma agrária criaria trabalho para mais 21 milhões de pessoas, ao contrário de 2 milhões e 400 mil criados hoje através do agronegócio. Que alem do mais, trabalham como assalariados pro agronegócio, recebendo salários ridículos, muitas vezes apenas temporários, e sem direitos trabalhistas ou previdenciários.
- Tomando em conta que na agricultura camponesa, cada hectare gera uma renda média anual de R$ 677,00, a renda gerada nas áreas distribuídas produziria uma nova riqueza no valor aproximado de R$ 99 bilhões por ano.
É só comparar. O latifúndio e o agronegócio não trazem benefícios para a sociedade brasileira, nem social, nem economicamente, e muito menos é sustentável ambientalmente. Pois a sua matriz tecnológica é altamente destrutiva pelo uso intensivo de agrotóxicos.
Uma Reforma Agrária que atingisse apenas os estabelecimentos acima de 1.000 hectares, preservando os médios proprietários, geraria muito mais trabalho, produção, renda e desenvolvimento para todos os Brasileiros.
(*Frei Sergio Gorgen, membro do MPA e da via campesina Brasil, Assentamento de Hulha Negra-RS, dezembro de 2009)
O papel social da verdadeira medicina....
Argentinos formados em Cuba inauguram consultório médico
• ARGENTINOS formados na Escola Latino-Americana de Medicina (Elam), de Havana, inauguraram, em 28 de dezembro passado, a Casa Tatu, um consultório para o atendimento a habitantes dum bairro de extrema-pobreza de Buenos Aires.
A Escola Latino-Americana de Medicinajá formou como médicos mais de 7.200 jovens de 45 países.
|
A secretária-geral do Projeto Tatu, Teresa Singer, destacou em suas palavras de agradecimento aos moradores que construíram o local, que esse sonho leva por nome o pseudônimo de Ernesto Guevara de la Serna, mais conhecido como o Che, quando lutava pela libertação da África.
Após ressaltar o gesto generoso de Cuba, ao formar médicos jovens como ela, de bairros muito humildes, disse que a Elam forma dois mil por ano, procedentes dessas comunidades de todo o mundo, partilhando tudo sem pedir nada em troca.
"Hoje dedicamos" – disse – "a abertura da casa de atendimento integral ao médico argentino-cubano Ernesto Che Guevara, ao povo cubano, a Fidel Castro Ruz e com certeza a vocês companheiros", expressou a jovem doutora, em meio dos aplausos da multidão.
A Proposta Tatu, uma iniciativa nascida em 2001, ao partirem para Cuba a estudar, foi executada em 2007 em bairros degradados bonaerenses, quando ainda não tinham validado seus títulos, por considerarem que não tinham direito a esperar, de acordo com o publicado pelo site Cubadebate.
Desde então, abriram 14 pontos de atendimento, dirigidos prioritariamente às crianças.
Um dos ativistas de mais destaque, o doutor Alejo Moreira, graduado da Elam, nasceu e foi criado num bairro-da-lata, a maioria cabanas de madeira e de chapas, agora com 20 mil habitantes, dos quais sete mil são crianças.
Na jornada, à qual assistiu Carlos Calica Ferrer, amigo da infância e companheiro de Ernesto Guevara, em sua segunda viagem pela América Latina, em 1953, se entregaram brinquedos e guloseimas às crianças, doados pela gestão de Proposta Tatu perante associações comerciais e sociais. •
Créditos: granma.cu
Genocidio em Gaza.....
terça-feira, 29 de dezembro de 2009
Chico mendes - O preço da floresta - 2008
SINOPSE
Foi
o primeiro documentário sobre Chico Mendes dirigido por um brasileiro e
realizado no local onde os fatos aconteceram. Com muita pesquisa,
entrevistas e boas imagens, o documentário atualiza uma história de
vinte anos atrás para a realidade de hoje de Xapuri e do Acre. Merece
ser projetado mais vezes, principalmente na Reserva Chico Mendes, em
Xapuri, e em Rio Branco, para que as pessoas que ajudaram a contar a
história também vejam o alcance, no presente, do que ajudaram a
construir.
DADOS DO ARQUIVO
Áudio: Português
Duração: 43 min.
Qualidade: DVDRip
Tamanho: 370 MB
Servidor: Rapidshare (3 partes)
segunda-feira, 28 de dezembro de 2009
Uma nova explosão na Palestina
Nicola Nasser, Counterpunch
Nicola Nasser é jornalista. Trabalha em Bir Zeit, Cisjordânia, Território Palestino Ocupado
“Ante a ausência de qualquer esperança, imponhamos o nosso grito de esperança”. Com essa frase, os líderes cristãos palestinos de várias igrejas e organizações ligadas a elas, reunidos em Belém, dia 11/12, concluíram o documento final do encontro, intitulado “Kairos Palestine – 2009: A Moment of Truth”.
O documento pode ser lido (em inglês) em “Teologia da Libertação”. Ali, os cristãos de todo o mundo são convocados para lutar contra a ocupação israelense dos territórios palestinos. O grito desses católicos simboliza ao mesmo tempo uma disposição popular e o status quo político.
Os palestinos sobrevivem e lutam, divididos entre a Cisjordânia governada pelo Fatah (apoiado pelos EUA, com deputados intimidados pelo poder de Israel, potência ocupante, com quem o Fatah coordena suas ações ‘de paz’ e ‘de segurança’, via pela qual o ‘processo de paz’ chega aos 16 anos em impasse total; e prosseguem as construções ilegais de colônias israelenses em territórios ocupados) e a Faixa de Gaza governada pelo Hamas.
Na Faixa de Gaza, o Movimento de Resistência Islâmica (Hamas)
dedica-se a manter o cessar-fogo, ao mesmo tempo em que participa de
negociações mediadas pelo Egito e pela Alemanha sobre troca de
prisioneiros. Até agora, falharam todas as vias tentadas, sejam
militares sejam políticas; e sucessivas negociações fracassadas fizeram
abortar qualquer perspectiva de paz. A paz parece ser miragem –
perfeita metáfora do futuro de uma comunidade internacional liderada
pelos EUA de Obama. Se se examina o futuro, a única certeza é que a
Palestina está à beira de explodir.
“Não há solução bilateral. O caminho mais curto até o próximo round de violência passará agora pelo fracasso de mais um ‘processo de paz’, que sim, certamente fracassará. Talvez aconteça em 2010. A Palestina está madura para explodir” – disse Gershon Baskin do Israel-Palestine Center for Research and Information, em debate patrocinado pelos russos na Jordânia, semana passada.
“Não há solução bilateral. O caminho mais curto até o próximo round de violência passará agora pelo fracasso de mais um ‘processo de paz’, que sim, certamente fracassará. Talvez aconteça em 2010. A Palestina está madura para explodir” – disse Gershon Baskin do Israel-Palestine Center for Research and Information, em debate patrocinado pelos russos na Jordânia, semana passada.
O “perigoso impasse” exige que se organize “missão de resgate”,
disseram os palestrantes, segundo a Agência Reuters. O
ex-primeiro-ministro russo Evgeny Primakov alertou para a evidência de
que “uma crise real” acontecerá, se a comunidade internacional não
intervier; acrescentou que o chamado “Quarteto para o Oriente Médio”
(EUA, ONU, Rússia e União Europeia) deixou de operar. Dia 15/12, o
presidente Mahmoud Abbas da Autoridade Palestina disse, em reunião do
Conselho Central da OLP em Ramallah: “Agora, a bola está no campo da
comunidade internacional. A bola está com os EUA.”
Abbas parece estar batendo à porta errada. Barack Obama entrará para a história como o primeiro presidente dos EUA que arrastou um tradicional aliado dos EUA, como Abbas, a declarar publicamente que “a Palestina está desapontada com os EUA”, que fracassaram no papel de mediadores no conflito Israel-Palestina.
Abbas parece estar batendo à porta errada. Barack Obama entrará para a história como o primeiro presidente dos EUA que arrastou um tradicional aliado dos EUA, como Abbas, a declarar publicamente que “a Palestina está desapontada com os EUA”, que fracassaram no papel de mediadores no conflito Israel-Palestina.
Isso, apesar da ‘euforia’ que, segundo Obama, teria tomado os
palestinos quando Abbas foi ungido com a honra de receber o primeiro
telefonema de Obama, no instante em que pisou na Casa Branca como
presidente. O governo Obama até agora obteve “avanço zero. Não falhou
apenas ao não conseguir manter ativas as negociações. Falhou também
porque ninguém espera que Obama consiga, mais tarde, o que não
conseguiu no pico de popularidade, nos primeiros dias de governo.” –
Essa é a opinião de Barry Rubin, diretor do Global Research in
International Affairs (GLORIA) Center, Interdisciplinary University,
publicada em Global Politician, edição de 19/12.
Obama detonou a missão de seu próprio enviado especial ao Oriente Médio, George Mitchell, ao mandar para lá a secretária de Estado Hilária Clinton, em março, aparentemente para que reunisse líderes palestinos e israelenses para que reiniciassem as negociações. Fato é que a visita de Hilária Clinton levou a resultado exatamente oposto e marcou completa inversão dos objetivos de quem, para os palestinos, seria negociador honesto e equilibrado. Depois da passagem de Hilária Clinton pela região, deixou de haver mediador e mediação; e os interesses de Israel passaram a dominar todos os contextos; e as negociações foram imediatamente suspensas.
Evento seguinte foi a operação coordenada entre EUA e Israel para matar na manjedoura o Relatório Goldstone – alegadamente porque o relatório criaria “obstáculo substancial” entre os dois lados (nas palavras do secretário de Estado assistente P.J. Crowley, dia 10/12). Com isso, viu-se que o fracasso da missão Clinton não foi apenas resultado das trapalhadas de Hilária Clinton, mas fracasso de toda uma política ideada pelo governo Obama cujo primeiro movimento foi ‘exigir’ “congelamento” de todas as construções de colônias israelenses.
Obama detonou a missão de seu próprio enviado especial ao Oriente Médio, George Mitchell, ao mandar para lá a secretária de Estado Hilária Clinton, em março, aparentemente para que reunisse líderes palestinos e israelenses para que reiniciassem as negociações. Fato é que a visita de Hilária Clinton levou a resultado exatamente oposto e marcou completa inversão dos objetivos de quem, para os palestinos, seria negociador honesto e equilibrado. Depois da passagem de Hilária Clinton pela região, deixou de haver mediador e mediação; e os interesses de Israel passaram a dominar todos os contextos; e as negociações foram imediatamente suspensas.
Evento seguinte foi a operação coordenada entre EUA e Israel para matar na manjedoura o Relatório Goldstone – alegadamente porque o relatório criaria “obstáculo substancial” entre os dois lados (nas palavras do secretário de Estado assistente P.J. Crowley, dia 10/12). Com isso, viu-se que o fracasso da missão Clinton não foi apenas resultado das trapalhadas de Hilária Clinton, mas fracasso de toda uma política ideada pelo governo Obama cujo primeiro movimento foi ‘exigir’ “congelamento” de todas as construções de colônias israelenses.
Dado que Obama ‘exigiu’, Abbas também teve de ‘exigir’. Nessa
operação, Abbas converteu-se em refém de uma ‘exigência’ que Obama
‘exigiu’, não conseguiu impor e não obteve, em jogada na qual Obama...
perdeu. Com Obama, perdeu também Abbas, que pagou caro pelo erro de
deixar todos os seus ovos na cesta de Obama.
Obama e seu governo não dão sinais de arrependimento e seguem os passos da aliança estratégica tradicional entre EUA e Israel, na contramão de todas as ‘mudanças’ que Obama-candidato prometeu aos eleitores. Semana passada, Obama assinou o orçamento da ajuda para segurança que os EUA distribuirão aos seus aliados em 2010; a quota de Israel subiu, para o próximo ano, para US$2,775 bilhões; dos 2,500 bilhões de 2009, alcançará em 2013 $3,1 bilhões.
Obama e seu governo não dão sinais de arrependimento e seguem os passos da aliança estratégica tradicional entre EUA e Israel, na contramão de todas as ‘mudanças’ que Obama-candidato prometeu aos eleitores. Semana passada, Obama assinou o orçamento da ajuda para segurança que os EUA distribuirão aos seus aliados em 2010; a quota de Israel subiu, para o próximo ano, para US$2,775 bilhões; dos 2,500 bilhões de 2009, alcançará em 2013 $3,1 bilhões.
Árabes, inclusive os palestinos, veem aí o dinheiro de que Israel
precisa para alimentar intransigência cada vez mais absoluta contra
qualquer paz. Os $500 milhões alocados para a Autoridade Palestina (nos
quais estão incluídos os 100 milhões do general Keith Dayton), são
suficientes, no máximo, para que a Autoridade Palestina mantenha o
nariz fora d’água e possa continuar operando como força auxiliar do
exército israelense.
Nunca antes, nem em tempos melhores, muito antes de os palestinos dividirem-se entre Fatah e Hamas, antes da reocupação militar em 2002 do território da AP na Cisjordânia e antes do bloqueio imposto a Gaza, a Autoridade Palestina dependeu tanto de patrocinadores. O processo começou, de fato, quando foi assinado em Washington, em 1993, a “Declaração de Princípios” entre a OLP e Israel, pela qual Israel conseguiu livrar-se de todos os deveres e obrigações que, como exército ocupante, a lei internacional lhe impunha.
Confusa, mas muito agradecida, a OLP aceitou o dinheiro que lhe davam como arranjo temporário, à espera de negociações que seriam retomadas e só seriam dadas por concluídas com a criação de um Estado palestino independente que existiria ao lado de Israel, com liberdade e segurança. Essa foi a promessa que os EUA (e a comunidade internacional liderada pelos EUA) fizeram aos palestinos, primeiro em 1999, depois em 2005, depois novamente em 2008 e que, agora, o governo Obama está ‘re-prometendo’!
Mas o dinheiro dos patrocinadores internacionais converteu-se, de arranjo temporário em prática permanente. Assim, o orçamento de Israel foi aliviado, dentre outras despesas, de boa parte de seus gastos com a ocupação militar; e de boa parte de seus gastos com ‘prêmios’ dados a qualquer ação de provocação que possa servir de pretexto para novos atos de violência contra palestinos. Não bastasse, a Autoridade Palestina e a OLP caíram na armadilha e, hoje, tornaram-se reféns das condições políticas que interesse aos patrocinadores impor.
A desilusão com o uso dado ao dinheiro dos patrocinadores internacionais cresce entre os palestinos, tanto quanto cresce a desesperança em relação a qualquer ‘processo de paz’. Os palestinos, que contribuíram muito substancialmente para a construção do Estado em termos regionais e nacionais, e que ainda contribuem significativamente em várias economias regionais e locais, são povo cheio de recursos, de capital, de conhecimento, de competências e talentos para trabalho manual e intelectual, perfeitamente capazes de construir a sociedade que desejem ser e ter.
Nunca antes, nem em tempos melhores, muito antes de os palestinos dividirem-se entre Fatah e Hamas, antes da reocupação militar em 2002 do território da AP na Cisjordânia e antes do bloqueio imposto a Gaza, a Autoridade Palestina dependeu tanto de patrocinadores. O processo começou, de fato, quando foi assinado em Washington, em 1993, a “Declaração de Princípios” entre a OLP e Israel, pela qual Israel conseguiu livrar-se de todos os deveres e obrigações que, como exército ocupante, a lei internacional lhe impunha.
Confusa, mas muito agradecida, a OLP aceitou o dinheiro que lhe davam como arranjo temporário, à espera de negociações que seriam retomadas e só seriam dadas por concluídas com a criação de um Estado palestino independente que existiria ao lado de Israel, com liberdade e segurança. Essa foi a promessa que os EUA (e a comunidade internacional liderada pelos EUA) fizeram aos palestinos, primeiro em 1999, depois em 2005, depois novamente em 2008 e que, agora, o governo Obama está ‘re-prometendo’!
Mas o dinheiro dos patrocinadores internacionais converteu-se, de arranjo temporário em prática permanente. Assim, o orçamento de Israel foi aliviado, dentre outras despesas, de boa parte de seus gastos com a ocupação militar; e de boa parte de seus gastos com ‘prêmios’ dados a qualquer ação de provocação que possa servir de pretexto para novos atos de violência contra palestinos. Não bastasse, a Autoridade Palestina e a OLP caíram na armadilha e, hoje, tornaram-se reféns das condições políticas que interesse aos patrocinadores impor.
A desilusão com o uso dado ao dinheiro dos patrocinadores internacionais cresce entre os palestinos, tanto quanto cresce a desesperança em relação a qualquer ‘processo de paz’. Os palestinos, que contribuíram muito substancialmente para a construção do Estado em termos regionais e nacionais, e que ainda contribuem significativamente em várias economias regionais e locais, são povo cheio de recursos, de capital, de conhecimento, de competências e talentos para trabalho manual e intelectual, perfeitamente capazes de construir a sociedade que desejem ser e ter.
Para tanto, precisam obter o direito à autodeterminação, liberdade,
direito de fazer e de ir e vir, e plena soberania. À medida que cresce
a desilusão, o papel dos patrocinadores políticos internacionais gera
cada dia maiores suspeitas, criando humilhações, exacerbando a
frustração e a desesperança. Em resumo, os patrocínios e o mau uso
dados a essas verbas enfraquecem, na sociedade palestina, todas as
forças e os argumentos da conciliação e da prudência. É como se já
ninguém conseguisse manter tampada a panela, enquanto, dentro, a
pressão só aumenta. O desespero transitório vai-se convertendo em
realidade do dia a dia, em status quo que não se altera.
A frustração dos palestinos em relação à comunidade internacional não é novidade; nasceu na assembleia geral da ONU de 1947, da Resolução n. 181 – que determinou a divisão da terra dos palestinos em dois Estados – e da Resolução n. 194, de 1948. O mesmo sentimento de terem sido traídos encontrou expressão forte na Cisjordânia, no “desapontamento” de que falou Abbas. Em seguida, o presidente da AP anunciou que não concorreria às eleições presidenciais: “Para mim, todos os caminhos estão fechados. Decidi não me candidatar a novo mandato. Não sou otimista nem quero cultivar ilusões” – disse Abbas ao jornal Ash-Sharq Al-Awsat editado em árabe, em Londres.
Quanto à Faixa de Gaza, o último capítulo da traição da Palestina pela comunidade internacional foi enunciado em Paris, dia 22/12, por 16 grupos de direitos humanos, dentre os quais Anistia Internacional, Oxfam e Christian Aid: “A comunidade internacional traiu o povo de Gaza quando não uniu ação aos discursos contra o bloqueio israelense (...). As potências mundiais falharam e traíram o povo comum que sobrevive em Gaza. Houve reuniões e declarações, mas praticamente nenhuma ação contra Israel” – diz o documento final daquela reunião em Paris.
A consciência de terem sido traídos e abandonados é fermento explosivo na Palestina, sobretudo por causa do bloqueio político imposto pela ocupação militar direta dos territórios – o cerco contra a OLP e a Autoridade Palestina na Cisjordânia; e o violento bloqueio israelense imposto na Faixa de Gaza. Todas as condições estão maduras para a eclosão da violência mais brutal: uma 3ª intifada palestina na Cisjordânia, e novo ataque militar por Israel contra os cidadãos em Gaza.
Abbas, em entrevista ao The Wall Street Journal dia 22/12, alertou para a intifada iminente. De fato, disse que “enquanto eu estiver no governo não admitirei que ninguém deflagre uma nova intifada, nunca, nunca. Mas depois que me afastar do governo as coisas mudarão. Não posso oferecer quaisquer garantias.”
Simultaneamente, na Faixa de Gaza, o Hamas – às vésperas do primeiro aniversário da invasão pelo exército israelense (Operação Chumbo Derretido) – alerta para o risco iminente de nova invasão israelense.
O indicador mais visível de que Israel prepara-se para novo ataque é um novo muro de aço, uma muralha que o Corpo de Engenheiros do Exército dos EUA está construindo para cercar toda a área na qual se estima que haja 1.500 túneis operados por palestinos – ao longo dos 14 quilômetros da fronteira Sinai-Gaza. Em janeiro de 2008, milhares de árabes palestinos conseguiram entrar em território egípcio – no momento em que pelo menos um governo árabe conseguiu manifestar alguma solidariedade com o sofrimento dos palestinos que se acumulavam na fronteira à espera de água, comida, remédios, socorro médico. Imediatamente, Israel fechou todas as fronteiras. Então os palestinos começaram a construir túneis.
Agora, soldados dos EUA estão construindo um muralha com placas de aço de 18 metros, testadas em laboratórios norte-americanos para resistirem a bombas e armas de alto calibre, que penetram no solo até uma profundidade de 30 metros. Essas placas de aço, além do mais, desviarão o curso e contaminarão os reservatórios naturais de água subterrânea. Quando a barreira estiver concluída – no máximo dentro de 18 meses –, toda a região perderá acesso a 60% da água hoje existente, segundo Karen Koning AbuZayd, comissária-geral da UNRWA.
Para AbuZayad, que falou em fórum organizado na American University no Cairo, a nova muralha de aço é mais resistente que a Linha Bar Lev, construída pelo exército de Israel na costa leste do Canal de Suez depois de ter ocupado a Península do Sinai, do Egito, em 1967.
Nenhum povo ou país no mundo toleraria esse tipo de muralha ‘defensiva’ em suas fronteiras – caso não conhecido no mundo moderno –, ou deixaria de considerar a construção da muralha como ato de guerra. A muralha de aço só interessa aos objetivos políticos e militares de Israel, embora a muralha, de fato, seja ‘made in USA’ – segundo depoimento de AbuZayd – e esteja sendo construída por soldados da guarda de fronteira egípcia.
A frustração dos palestinos em relação à comunidade internacional não é novidade; nasceu na assembleia geral da ONU de 1947, da Resolução n. 181 – que determinou a divisão da terra dos palestinos em dois Estados – e da Resolução n. 194, de 1948. O mesmo sentimento de terem sido traídos encontrou expressão forte na Cisjordânia, no “desapontamento” de que falou Abbas. Em seguida, o presidente da AP anunciou que não concorreria às eleições presidenciais: “Para mim, todos os caminhos estão fechados. Decidi não me candidatar a novo mandato. Não sou otimista nem quero cultivar ilusões” – disse Abbas ao jornal Ash-Sharq Al-Awsat editado em árabe, em Londres.
Quanto à Faixa de Gaza, o último capítulo da traição da Palestina pela comunidade internacional foi enunciado em Paris, dia 22/12, por 16 grupos de direitos humanos, dentre os quais Anistia Internacional, Oxfam e Christian Aid: “A comunidade internacional traiu o povo de Gaza quando não uniu ação aos discursos contra o bloqueio israelense (...). As potências mundiais falharam e traíram o povo comum que sobrevive em Gaza. Houve reuniões e declarações, mas praticamente nenhuma ação contra Israel” – diz o documento final daquela reunião em Paris.
A consciência de terem sido traídos e abandonados é fermento explosivo na Palestina, sobretudo por causa do bloqueio político imposto pela ocupação militar direta dos territórios – o cerco contra a OLP e a Autoridade Palestina na Cisjordânia; e o violento bloqueio israelense imposto na Faixa de Gaza. Todas as condições estão maduras para a eclosão da violência mais brutal: uma 3ª intifada palestina na Cisjordânia, e novo ataque militar por Israel contra os cidadãos em Gaza.
Abbas, em entrevista ao The Wall Street Journal dia 22/12, alertou para a intifada iminente. De fato, disse que “enquanto eu estiver no governo não admitirei que ninguém deflagre uma nova intifada, nunca, nunca. Mas depois que me afastar do governo as coisas mudarão. Não posso oferecer quaisquer garantias.”
Simultaneamente, na Faixa de Gaza, o Hamas – às vésperas do primeiro aniversário da invasão pelo exército israelense (Operação Chumbo Derretido) – alerta para o risco iminente de nova invasão israelense.
O indicador mais visível de que Israel prepara-se para novo ataque é um novo muro de aço, uma muralha que o Corpo de Engenheiros do Exército dos EUA está construindo para cercar toda a área na qual se estima que haja 1.500 túneis operados por palestinos – ao longo dos 14 quilômetros da fronteira Sinai-Gaza. Em janeiro de 2008, milhares de árabes palestinos conseguiram entrar em território egípcio – no momento em que pelo menos um governo árabe conseguiu manifestar alguma solidariedade com o sofrimento dos palestinos que se acumulavam na fronteira à espera de água, comida, remédios, socorro médico. Imediatamente, Israel fechou todas as fronteiras. Então os palestinos começaram a construir túneis.
Agora, soldados dos EUA estão construindo um muralha com placas de aço de 18 metros, testadas em laboratórios norte-americanos para resistirem a bombas e armas de alto calibre, que penetram no solo até uma profundidade de 30 metros. Essas placas de aço, além do mais, desviarão o curso e contaminarão os reservatórios naturais de água subterrânea. Quando a barreira estiver concluída – no máximo dentro de 18 meses –, toda a região perderá acesso a 60% da água hoje existente, segundo Karen Koning AbuZayd, comissária-geral da UNRWA.
Para AbuZayad, que falou em fórum organizado na American University no Cairo, a nova muralha de aço é mais resistente que a Linha Bar Lev, construída pelo exército de Israel na costa leste do Canal de Suez depois de ter ocupado a Península do Sinai, do Egito, em 1967.
Nenhum povo ou país no mundo toleraria esse tipo de muralha ‘defensiva’ em suas fronteiras – caso não conhecido no mundo moderno –, ou deixaria de considerar a construção da muralha como ato de guerra. A muralha de aço só interessa aos objetivos políticos e militares de Israel, embora a muralha, de fato, seja ‘made in USA’ – segundo depoimento de AbuZayd – e esteja sendo construída por soldados da guarda de fronteira egípcia.
Assim, do ponto de vista dos palestinos, a muralha é vista como
parte da ocupação israelense e ato de agressão – e, claro, como alvo
possível de ataque. Contudo, os palestinos, pelo menos na Faixa de
Gaza, estão em estado de guerra contra Israel, mas não contra o Egito.
Consequentemente, qualquer ato violento que se materialize contra a
muralha deverá ser entendido como ato das hostilidades entre palestinos
e israelenses.
Segundo as análises feitas pelo Hamas, o Egito ter-se-ia precavido contra a reação palestina, árabe, muçulmana e internacional ante mais esse ato de punição coletiva de 1,5 milhão de palestinos, a menos que o Cairo já esteja contando com uma invasão israelense, que levantará “os protestos de sempre”, ante os quais mal se ouvirão protestos específicos contra a muralha.
Israel está trabalhando para desviar a atenção do mundo e ocultar a iminente explosão na Palestina. Por isso, tanto tem falado a respeito de uma “ameaça iraniana” que não poderia ser deixada sem resposta. Tudo indica que o governo Obama já deu luz verde para a agenda sionista e já arrastou consigo os aliados europeus. Pelo que se vê, tudo se passa como se não houvesse outro problema no mundo... além da “ameaça iraniana” e, claro, como sempre, a ‘ameaça’ palestina.
Segundo as análises feitas pelo Hamas, o Egito ter-se-ia precavido contra a reação palestina, árabe, muçulmana e internacional ante mais esse ato de punição coletiva de 1,5 milhão de palestinos, a menos que o Cairo já esteja contando com uma invasão israelense, que levantará “os protestos de sempre”, ante os quais mal se ouvirão protestos específicos contra a muralha.
Israel está trabalhando para desviar a atenção do mundo e ocultar a iminente explosão na Palestina. Por isso, tanto tem falado a respeito de uma “ameaça iraniana” que não poderia ser deixada sem resposta. Tudo indica que o governo Obama já deu luz verde para a agenda sionista e já arrastou consigo os aliados europeus. Pelo que se vê, tudo se passa como se não houvesse outro problema no mundo... além da “ameaça iraniana” e, claro, como sempre, a ‘ameaça’ palestina.
O "Feliz Natal" numa outra perspectiva...
Moises Diniz - EcoDebate
Fico impressionado com o comportamento das pessoas nestes dias de resguardo de Natal e aguardo de Ano Novo. É como se uma luz incandescente emergisse de cada veia e de cada neurônio. É um espetáculo o que acontece no cérebro de cada pessoa.
As pessoas ficam mais alegres, acreditam mais, reduzem os seus medos. Acreditam que o 13º salário vai quitar todas as dívidas e que, de uma hora para outra, a vida vai ser bem melhor no ano que vai nascer.
Aquele que te fez sofrer aperta a tua mão e tu respondes com ternura ao mesmo aperto de mãos. O carrasco que te algemou recebe um abraço teu, mesmo que não tenhas mãos.
O menino da periferia, de cor negra e já sem dentes básicos, aguarda inquieto aquele embrulho que vai lhe trazer alegria. O seu pobre pai, alcoolizado na esquina, não percebe o tamanho do sonho do filho. E se percebe se alcooliza para não perceber.
A menina adolescente acredita que são verdadeiras aquelas palavras lindas que ouviu no celular, que só liga a cobrar, e que não vai demorar a chegada daquele príncipe encantado.
Ela não sabe que aquele calhorda quer apenas se aproveitar de sua carne tenra. Que do outro lado da vila, da vida, da palafita ele dorme numa mansão inconsolável e que o seu sonho juvenil vai acordar com os gritos da primeira briga de rua do ano.
O dono do boteco na ponta da rua acredita que todo o bairro esquecido pelos homens do poder vai se lembrar de quitar as suas dívidas. Ele sonha encher, no ano que vem e que chega sob as primeiras luzes e nos mais sutis apertos de mão, as prateleiras com mais feijão e açúcar, bolacha, sardinha e arroz, palito de fósforo, pouco papel, goiabada e cibalena, muito sal, farinha e pão dormido, lâmina de barbear semanal.
O homem do boteco é como a gente que vende sonhos a prazo, não exige assinatura, não cobra a fatura e nem digital. Tudo fica aguardando o Natal, o Ano Novo que vai chegar como búfalo, locomotiva e temporal.
Esses dias especiais vão trazer de volta o meu emprego, a minha alegria, o meu pão, a mulher perdida, a conta esquecida que o vizinho não pagou. Vai ter leite em toda mama, vergonha em todo homem, beleza em toda dama.
Não serei mais tão estúpido a ponto de não perceber os olhares do povo que exige mais abrigo, escola e pão. Vou abraçar o amanhecer e ver que a vida não passa de um pedaço do universo que também se partiu.
Verei que a felicidade humana é como um pouco de carne na boca sempre faminta de um rico qualquer. E que cada um alimenta o seu animal a partir do tamanho da alma do seu próprio dono.
Por isso me incomodam esses abraços, que parecem laços, pedaços de sonhos que não vão se realizar, como se uma serpente engolisse a outra que também lhe quer bem.
Neste Natal as serpentes de cada mente humana vão abraçar as outras serpentes. Será um abraço de quem come e dorme, veste e acorda a custa do trabalho humano, dos outros trabalhos que não são os seus.
Neste final de ano incerto eu vou abraçar meus amigos que ainda não conheci. Pois sei o quanto é fácil abraçar o meu irmão, minha filha, meu parente. Como abraçar os que choram nas ruas nas quais eu não ando, nas periferias que me fazem medo?
Como dizer ‘Feliz Natal’ para quem não nasceu e ‘Feliz Novo Ano’ para quem envelheceu? Por que abraçar as serpentes que cultivamos e fingir que não vemos a dor que elas produzem lá mais distante, onde meus olhos não alcançam, minha solidariedade não atinge e minha voz não leva nenhum acalanto?
Um Natal assim me deixa doente, é como uma doença antiga, do tempo em que o meu coração se partiu em três, quatro pedaços colossais, a amar meus desejos pequenos e a esquecer os desejos gigantes da humanidade.
Queria um Natal diferente, onde o homem amasse de fato a si mesmo e aos outros. Que as árvores não fossem sufocadas pelos coronéis do carbono, nem as águas, nem o ar, nem as larvas, nem as sementes, nem os pássaros sadios, os doentes, nem as raízes, nem os lagos, nem os homens, nem os peixes, nem os animais de pele, de escama, de asas, nem as lagartas, nem a terra.
Nenhum pedaço de sol eu posso dar, nenhuma esmola que não agüenta uma investigação. Por isso eu vou proteger o sol neste Natal, a única beleza natural que eu posso cuidar. Abraçar a lua não me deixará em conflito com os donos do poder.
Acho que vou acabar abraçando a chuva aqui nesta Amazônia indecente, que fica nua nas aldeias indígenas e não se preocupa com a cretinice dos apóstatas do verde e apóstolos do medo e da moral divina.
Vou abraçar o vento, vou falar com os pedaços soltos de asfalto, porque sei que eles são restos mortais milenares de nossos antepassados, de nossas árvores, animais, tudo que se acumulou no subsolo invisível do planeta. Com eles conversarei.
Pedirei perdão aos entes da floresta, aos meninos pobres e às adolescentes convertidas à prostituição, aos desempregados do capital, aos negros, aos povos indígenas, aos homossexuais, aos africanos, palestinos, aos latinos e iraquianos.
Feliz Natal ao homem das margens dos igarapés amazônicos, às mulheres que não lhe deram a oportunidade de pintar o cabelo, os lábios, usar um bracelete, um vestido de moda, aos pássaros que não se vestem contra o frio ou para adornar a noite.
Lutarei contra os meus medos e as minhas antipatias ao novo, ao desconhecido e a tudo aquilo que maltrata e provoca dúvida, preconceito e aversão. Uma idéia nova, uma pessoa doente, sem lar e esperança, uma nódoa na minha blusa de linho, um desvio no meu caminho, um medo de repartir, de amar.
Feliz Natal aos homens de sonho nobre, de idéias encantadas e coletivas. Que cada silêncio de rua faça nascer uma fogueira de sonhos.
Feliz Natal à humanidade que não se rende ao atraso de acumular sempre as mesmas dores no costado dos fracos e as mais iluminadas alegrias nas almas de poucos.
Feliz Natal!
Moises Diniz é neto de nordestinos de Riacho do Sangue e índios ashaninkas das margens do Rio Amônia, no Acre.
Fico impressionado com o comportamento das pessoas nestes dias de resguardo de Natal e aguardo de Ano Novo. É como se uma luz incandescente emergisse de cada veia e de cada neurônio. É um espetáculo o que acontece no cérebro de cada pessoa.
As pessoas ficam mais alegres, acreditam mais, reduzem os seus medos. Acreditam que o 13º salário vai quitar todas as dívidas e que, de uma hora para outra, a vida vai ser bem melhor no ano que vai nascer.
Aquele que te fez sofrer aperta a tua mão e tu respondes com ternura ao mesmo aperto de mãos. O carrasco que te algemou recebe um abraço teu, mesmo que não tenhas mãos.
O menino da periferia, de cor negra e já sem dentes básicos, aguarda inquieto aquele embrulho que vai lhe trazer alegria. O seu pobre pai, alcoolizado na esquina, não percebe o tamanho do sonho do filho. E se percebe se alcooliza para não perceber.
A menina adolescente acredita que são verdadeiras aquelas palavras lindas que ouviu no celular, que só liga a cobrar, e que não vai demorar a chegada daquele príncipe encantado.
Ela não sabe que aquele calhorda quer apenas se aproveitar de sua carne tenra. Que do outro lado da vila, da vida, da palafita ele dorme numa mansão inconsolável e que o seu sonho juvenil vai acordar com os gritos da primeira briga de rua do ano.
O dono do boteco na ponta da rua acredita que todo o bairro esquecido pelos homens do poder vai se lembrar de quitar as suas dívidas. Ele sonha encher, no ano que vem e que chega sob as primeiras luzes e nos mais sutis apertos de mão, as prateleiras com mais feijão e açúcar, bolacha, sardinha e arroz, palito de fósforo, pouco papel, goiabada e cibalena, muito sal, farinha e pão dormido, lâmina de barbear semanal.
O homem do boteco é como a gente que vende sonhos a prazo, não exige assinatura, não cobra a fatura e nem digital. Tudo fica aguardando o Natal, o Ano Novo que vai chegar como búfalo, locomotiva e temporal.
Esses dias especiais vão trazer de volta o meu emprego, a minha alegria, o meu pão, a mulher perdida, a conta esquecida que o vizinho não pagou. Vai ter leite em toda mama, vergonha em todo homem, beleza em toda dama.
Não serei mais tão estúpido a ponto de não perceber os olhares do povo que exige mais abrigo, escola e pão. Vou abraçar o amanhecer e ver que a vida não passa de um pedaço do universo que também se partiu.
Verei que a felicidade humana é como um pouco de carne na boca sempre faminta de um rico qualquer. E que cada um alimenta o seu animal a partir do tamanho da alma do seu próprio dono.
Por isso me incomodam esses abraços, que parecem laços, pedaços de sonhos que não vão se realizar, como se uma serpente engolisse a outra que também lhe quer bem.
Neste Natal as serpentes de cada mente humana vão abraçar as outras serpentes. Será um abraço de quem come e dorme, veste e acorda a custa do trabalho humano, dos outros trabalhos que não são os seus.
Neste final de ano incerto eu vou abraçar meus amigos que ainda não conheci. Pois sei o quanto é fácil abraçar o meu irmão, minha filha, meu parente. Como abraçar os que choram nas ruas nas quais eu não ando, nas periferias que me fazem medo?
Como dizer ‘Feliz Natal’ para quem não nasceu e ‘Feliz Novo Ano’ para quem envelheceu? Por que abraçar as serpentes que cultivamos e fingir que não vemos a dor que elas produzem lá mais distante, onde meus olhos não alcançam, minha solidariedade não atinge e minha voz não leva nenhum acalanto?
Um Natal assim me deixa doente, é como uma doença antiga, do tempo em que o meu coração se partiu em três, quatro pedaços colossais, a amar meus desejos pequenos e a esquecer os desejos gigantes da humanidade.
Queria um Natal diferente, onde o homem amasse de fato a si mesmo e aos outros. Que as árvores não fossem sufocadas pelos coronéis do carbono, nem as águas, nem o ar, nem as larvas, nem as sementes, nem os pássaros sadios, os doentes, nem as raízes, nem os lagos, nem os homens, nem os peixes, nem os animais de pele, de escama, de asas, nem as lagartas, nem a terra.
Nenhum pedaço de sol eu posso dar, nenhuma esmola que não agüenta uma investigação. Por isso eu vou proteger o sol neste Natal, a única beleza natural que eu posso cuidar. Abraçar a lua não me deixará em conflito com os donos do poder.
Acho que vou acabar abraçando a chuva aqui nesta Amazônia indecente, que fica nua nas aldeias indígenas e não se preocupa com a cretinice dos apóstatas do verde e apóstolos do medo e da moral divina.
Vou abraçar o vento, vou falar com os pedaços soltos de asfalto, porque sei que eles são restos mortais milenares de nossos antepassados, de nossas árvores, animais, tudo que se acumulou no subsolo invisível do planeta. Com eles conversarei.
Pedirei perdão aos entes da floresta, aos meninos pobres e às adolescentes convertidas à prostituição, aos desempregados do capital, aos negros, aos povos indígenas, aos homossexuais, aos africanos, palestinos, aos latinos e iraquianos.
Feliz Natal ao homem das margens dos igarapés amazônicos, às mulheres que não lhe deram a oportunidade de pintar o cabelo, os lábios, usar um bracelete, um vestido de moda, aos pássaros que não se vestem contra o frio ou para adornar a noite.
Lutarei contra os meus medos e as minhas antipatias ao novo, ao desconhecido e a tudo aquilo que maltrata e provoca dúvida, preconceito e aversão. Uma idéia nova, uma pessoa doente, sem lar e esperança, uma nódoa na minha blusa de linho, um desvio no meu caminho, um medo de repartir, de amar.
Feliz Natal aos homens de sonho nobre, de idéias encantadas e coletivas. Que cada silêncio de rua faça nascer uma fogueira de sonhos.
Feliz Natal à humanidade que não se rende ao atraso de acumular sempre as mesmas dores no costado dos fracos e as mais iluminadas alegrias nas almas de poucos.
Feliz Natal!
Moises Diniz é neto de nordestinos de Riacho do Sangue e índios ashaninkas das margens do Rio Amônia, no Acre.
O arco - 2005
SINOPSE
Em
um barco de pesca no mar, um homem de 60 anos tem criado uma menina
desde que ela era um bebê. O combinado é que eles se casariam quando
ela completasse 17 anos, e falta apenas um ano para isso. Eles vivem
uma existência tranqüila e reclusa, rezando e alugando o barco para
pescadores, até que suas vidas são alteradas com o embarque de um
estudante adolescente.
DADOS DO ARQUIVO
Áudio: Japonês
Legendas: Português
Duração: 90 min.
Qualidade: DVDRip
Tamanho: 305 MB
Servidor: Rapidshare (3 partes)
Créditos: Bukowski - Laranja Psicodelica
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