quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Elis Regina - DVD Programa Ensaio


A TV Cultura, a gravadora Trama e a TeleImage se uniram para restaurar o acervo de um dos mais importantes programas da televisão brasileira, o 'Ensaio'. O material revitalizado se transformou em DVDs, permitindo aos admiradores da MPB terem a sua disposição registros clássicos de artistas consagrados.
A estréia do projeto acontece com Elis Regina. O ano é 1973, as imagens em preto-e-branco. "Meu pai já previa que eu seria uma cantora ao me dar esse nome", diz, antes de um close nas mãos inquietas denunciar o temperamento forte, daquela que se tornaria a maior cantora do Brasil.

Créditos: Ronaldo - AlmasCorsarias

01. Doente, Morena
02. Ladeira da Preguiça
03. Boa Noite, Amor
04. Preciso Aprender a Ser Só
05. Upa Neguinho
06. Formosa
07. Estrada do Sol
08. Vou Deitar e Rolar (qua qua ra qua qua)
09. Aviso aos Navegantes
10. 20 Anos Blues
11. Atrás da porta
12. Canção do Sal
13. Cais
14. É Com Esse Que Eu Vou
15. General da Banda
16. Águas de Março
17. Meio-de-Campo
18. Folhas Secas

Crises reforçam papel central da agricultura familiar


A demanda pela produção de gêneros alimentícios e o furacão que chacoalha o mercado financeiro - ligado diretamente ao comércio mundial das commodities - reforçam a relevância da produção familiar para o futuro do país.
Por Antônio Biondi, do Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis
Primeiro foi a crise dos alimentos, que elevou os preços de gêneros básicos nas prateleiras mundo afora. Depois veio a crise financeira, que abalou o "coração" do capitalismo globalizado e continua atormentando a tábua das marés do chamado "mercado". Seja pela demanda de aumento da produção familiar ou pela demonstração cabal dos riscos da dependência das commodities agrícolas à roleta especulativa bancária, a conjuntura deste ano contribuiu para reposicionar a agricultura familiar como setor essencial ao equilíbrio nacional, tanto em termos econômicos quanto sociais.
Em entrevista à Repórter Brasil, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, vê "uma re-significação da agricultura familiar para o país" no período recente. "A agricultura familiar tinha passado a ser vista pela sociedade como espaço de atraso, de problemas, de pobreza. Conseguimos resgatar o significado e conseguimos resgatar o setor economicamente, um setor que é muito relevante para o país", coloca o ministro. Para ele, "a visão que estava se estabelecendo era uma visão errada".
Um dos nós do amplo debate gerado a partir da crise dos alimentos se concentra no uso de terras e da força produtiva para as culturas ligadas aos agrocombustíveis, em concorrência com a produção de alimentos. Em alguns casos, estimativas chegaram a atribuir 75% da alta do preço dos alimentos aos agrocombustíveis. Em que pese os possíveis exageros nos números (e os interesses camuflados por trás deles), a inflação dos preços alimentícios tem ajudado a ampliar as discussões sobre o que é prioridade na economia rural. Além de reafirmar que toda febre — inclusive a dos agrocombustíveis — exige contrapesos e cuidados, a crise reafirmou a importância da agricultura familiar e da produção de alimentos.
De olho neste cenário, o governo federal pretende destinar à agricultura familiar cerca de R$ 13 bilhões na safra 2008/2009. Um aumento de R$ 1 bilhão frente ao período anterior. Os números são do próprio Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), que estima que a produção familiar é responsável por 70% dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros.
A crise financeira, por sua vez, reaquece as críticas à desregulamentação da economia, ao frenesi das bolsas de valores, mercadorias e futuros, à especulação da economia virtual, no mais das vezes sem base na economia real. A transposição desta lógica financeira à agricultura, que favorece apenas o retorno financeiro das commodities (soja, milho, carne etc.), passou a ser alvo de pesadas críticas — assim como a atuação das empresas do agronegócio que controlam os preços desses produtos.
Nos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, pequenos agricultores buscam alternativas frente ao atual cenário. Em viagem realizada com o objetivo de estudar os impactos econômicos, sociais e ambientais que os agrocombustíveis têm gerado no campo brasileiro, a Repórter Brasil se deparou com importantes experiências de agricultores familiares — confira a íntegra do estudo "O Brasil dos Agrocombustíveis - Palmáceas, Algodão, Milho e Pinhão-Manso - 2008" (em pdf) .
Nos quase 5 mil quilômetros percorridos pela reportagem, foi possível aferir o conjunto das pressões e dificuldades enfrentadas pelos pequenos produtores. E, ao mesmo tempo, como encontram soluções válidas não somente para a realidade de cada um deles, mas para o conjunto do setor.

Alternativas
Região Sul possui uma tradição histórica em termos de agricultura familiar. Aproveitando as novas oportunidades trazidas pelos agrocombustíveis e por outras culturas com força no campo brasileiro, os pequenos agricultores também se desdobram para superar os desafios colocados. Com isso, a necessidade de viabilização de alternativas exige prudência e criatividade. Essencialmente, buscam adotar uma lógica com base na diversificação de culturas, no respeito ao trabalhador, ao meio ambiente, entre outros aspectos.
No Paraná, por exemplo, pequenos agricultores familiares empreendem uma verdadeira batalha para manter vivas as espécies crioulas do grão. No município de Bituruna (PR), a trincheira está erguida no Assentamento Rondon III. No lote do assentado Anísio Francisco da Rosa, cinco famílias participaram de um longo processo para preservar as sementes crioulas. A área do seu Anísio é também pródiga na diversidade de culturas e no auto-consumo.
Com a liberação de diversas variedades transgênicas no Brasil, as sementes crioulas conseguiram na atual safra o reconhecimento do governo federal. Por meio de um certificado emitido pelo MDA, os produtores que trabalham com este tipo de sementes poderão ter acesso ao crédito e seguro oficiais.
Em Porto Barreiro (PR), a força motriz dos pequenos agricultores é a organização coletiva da produção e da comercialização. Com apostas variadas - que vão de itens de cesta básica à produção de biodiesel, passando pela implementação de agroflorestas — os agricultores criaram a Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa do Paraná (CPC-PR). De acordo com Valter Israel da Silva, integrante da direção nacional do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) no Paraná, a cooperativa se dedicará a cuidar em nível estadual dos produtos da marca "Do Campesinato", do MPA Nacional.
De acordo com o dirigente, o movimento tem buscado estudar e recuperar a lógica da produção camponesa, inclusive com o lançamento de livros a respeito. "O pequeno produtor estava entrando na lógica do agronegócio".
Na região de Palmeira das Missões (RS), Romário Rossetto, da direção nacional do MPA no Estado, frisa que, embora o pequeno produtor sempre tenha diversificado o plantio, "nos anos 90, muitos chegaram a plantar quase só na lógica da monocultura". Segundo ele, "conseguimos reverter isso somando a lógica da diversificação às da segurança e da soberania alimentar".
Valter, do Paraná, concorda com o colega do Rio Grande do Sul e estima que, atualmente, "cerca de 20% das famílias com quem dialogamos começaram a utilizar a lógica que defendemos". Antes, diz, "lutávamos pelo crédito, mas a liberação de recursos atuava contra nós, pois incentivava a inclusão do agricultor no sistema, no uso das sementes, adubos, tudo das transnacionais". De acordo com o dirigente paranaense, as propostas do MPA nunca foram tão bem aceitas entre os agricultores quanto agora. "O discurso, que sempre pareceu somente ideológico, se torna claramente econômico com a atual crise". O projeto do MPA no Paraná, explica Silva, busca respostas integradas às crises ambiental alimentar e energética.
Edgar Kramer, presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Agricultura Familiar em Chapecó e Região (Sintraf), mostra, contudo, que inúmeros problemas continuam rondando o setor. Segundo ele, a população rural de Chapecó (SC), um dos centros do agronegócio na região, vem caindo significativamente. "As pessoas perdem o emprego na agroindústria, diante das exigências de mão-de-obra mais qualificada. O jovem está indo para a cidade. As novas famílias também". Segundo ele, quem vai para o núcleos urbanos "muitas vezes acabam no crime, no desemprego, nas favelas".
O cenário atual para a agricultura familiar é de completa insegurança, analisa Edgar. Entre outros motivos, porque as parcerias entre os agricultores e as grandes empresas da região e — como a Aurora, Sadia, Perdigão e outras — "só beneficiam os grandes", ao passo que os pequenos "entram com toda estrutura física e de trabalho". Na região, de Chapecó e outras próximas, é comum que a entrada de cada propriedade seja "carimbada" por uma dessas empresas. São os chamados "integrados", produtores que já têm sua atividade e produção ligadas diretamente a uma das empresas. Mais do que o nome da propriedade ou do seu dono, as placas destacam os logos das indústrias. E criam uma sensação de que os donos são outros...
Os apontamentos destacados pelo dirigente da Sintraf não são isolados, e encontram eco na posição de importantes entidades. E a Região Sul do país, mesmo com sua história de força no setor da agricultura familiar, não escapa às dificuldades — conforme se pode constatar nos relatórios produzidos pela Repórter Brasil sobre a soja e a mamona, e sobre o dendê, algodão, milho, babaçu e pinhão-manso que demonstram a existência na região de problemas de grilagem, de violência, problemas ambientais entre outros conflitos.
Leia o relatório "O Brasil dos Agrocombustíveis - Palmáceas, Algodão, Milho e Pinhão-Manso - 2008 (na íntegra, em pdf)", segundo de uma série de documentos sobre o tema em http://www.reporterbrasil.org.br/documentos/
o_brasil_dos_agrocombustiveis_v2.pdf

Acesse em http://www.reporterbrasil.org.br/agrocombustiveis/ o site do Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis
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Agência Envolverde/IPS

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Pablo Neruda

Canto Geral

Pablo Neruda


Aqui eles trouxeram os fuzis repletos
de pólvora, eles comandaram o acerbo extermínio,
eles aqui encontraram um povo que cantava,
um povo por dever e por amor reunido,
e a delgada menina caiu com a sua bandeira,
e o jovem sorridente girou a seu lado ferido,
e o estupor do povo viu os mortos tombarem
com fúria e dor.

Então, no lugar
onde tombaram os assassinados,
baixaram as bandeiras para se empaparem do sangue
para se erguerem de novo diante dos assassinos.

Por estes mortos, nossos mortos,
peço castigo.

Para os que salipicaram a pátria de sangue,
peço castigo.

Para o verdugo que ordenou esta morte,
peço castigo.

Para o traidor que ascendeu sobre o crime,
peço castigo.

Para o que deu a ordem de agonia,
peço castigo.

Para os que defenderam este crime,
peço castigo.

Não quero que me dêem a mão
empapada de nosso sangue.
Peço castigo.

Não vos quero como embaixadores,
tampouco em casa tranqüilos,
quero ver-vos aqui julgados,
nesta praça, neste lugar.

Quero castigo.

Créditos: Ronaldo

Quem é o terrorista?

Quem é o terrorista?

Blog do Bourdoukan

Alguém se lembra desde a ultima vez em que os palestinos cometeram algum ato de libertação?

Ato de libertação é o ato que a mídia denomina de “terrorista”.

Já faz tempo não?

Pois é. Mas Israel continua sitiando Gaza.

Isto significa que os palestinos continuam vivendo num campo de concentração.

Significa que os palestinos continuam impedidos de procurar atendimento médico.

Significa que continuam sem receber combustível.

Significa que continuam vivendo às escuras.

Significa que pacientes continuam morrendo por falta de atendimento médico.

Enquanto isso...

As tropas de Israel continuam invadindo, matando e prendendo.

Continuam roubando as colheitas de azeitona dos palestinos.

E os palestinos é que são terroristas?

Eduardo Galeano

da série de Eduardo Galeano, "A Vida Segundo Galeano"

Parte I



Parte II



Parte III



Parte IV

A desigualdade global tem de acabar
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Jayati Ghosh - economista indianaOs pobres têm subsidiado os ricos desde há muito tempo. Um maior envolvimento do estado na actividade económica é agora necessário. O mais importante é que o sistema financeiro internacional fracassou em encontrar duas exigências óbvias: prever instabilidades e crises e transferir recursos das economias ricas para as pobres. A análise é da economista indiana Jayati Ghosh.

Artigo publicado originalmente no jornal britânico The Guardian, em 24 de Outubro de 2008, traduzido por Carta Maior.

Agora todo mundo reconhece a necessidade de reformar o regime económico internacional. Mas a ideia não deveria simplesmente ser consertar um sistema que está obviamente quebrado: precisamos mudá-lo para um modelo melhor. Porque a arquitectura financeira fracassou em alguns aspectos muito importantes.

O mais importante é que o sistema financeiro internacional fracassou em encontrar duas exigências óbvias: prever instabilidades e crises e transferir recursos das economias ricas para as pobres. Não apenas experimentamos uma volatilidade muito maior e a propensão ao derretimento financeiro em mercados emergentes e agora até mesmo nos países industrializados, mas mesmo os períodos de expansão económica estiveram baseados no subsídio global dos países ricos pelos países pobres.

Esses fracassos globais são tão imensos que constituem razão suficiente para abandonar este sistema. Mas eis outros fracassos associados em que o regime esteve implicado no interior das economias nacionais: ele encorajou a pró-ciclicidade; tornou impossível regular os sistemas financeiros nacionais; encorajou bolhas e o fervor especulativo no lugar do investimento produtivo para crescimento futuro; permitiu a proliferação de transacções paralelas através de paraísos fiscais e da perda de controle nacional; reduziu o papel crucial do desenvolvimento do crédito directo.

Por isso nós claramente necessitamos de um novo sistema, mesmo que com os mesmos objectivos do original Bretton Woods: assegurar a estabilidade das transacções financeiras através da cooperação monetária internacional; encorajar a expansão do comércio internacional de um modo estável e promover o desenvolvimento com a facilitação do investimento produtivo.

Para alcançar isso no actual contexto, quatro elementos são cruciais. Em primeiro lugar, a crença na auto-regulação, sustentada com a classificação de risco por agências como modo adequado de administrar um sistema financeiro se desmanchou no ar. Não há alternativa, portanto, a uma sistemática regulação estatal da finança.

Segundo, uma vez que os actores privados vão inevitavelmente tentar contornar a regulação, o coração do sistema financeiro - bancos - deve ser protegido, e isso só é possível através da apropriação social. Portanto, algum grau de socialização dos bancos (e não somente socialização dos riscos inerentes à finança) também é inevitável. Nos países em desenvolvimento também é importante porque isso permite o controle público do crédito, sem o qual nenhum país foi industrializado.

Em terceiro, para superar os efeitos perversos desta crise na economia real, estímulo fiscal é essencial tanto em países desenvolvidos como naqueles em vias de desenvolvimento. O aumento do gasto público é necessário para prevenir que a actividade e económica e o emprego caiam abruptamente, para coordenar os efeitos da mudança climática e promover tecnologias verdes e para que o projecto de desenvolvimento do sul do planeta avance.

Quarto, precisamos de um sistema económico internacional que sustente isso, o que em outras palavras significa que o fluxo de capitais deve ser controlado e regulado, pois assim ele não desestabiliza nenhuma dessas estratégias.

Pode-se argumentar que um sistema internacional desses, baseado na regulação estatal, reduzirá a possibilidade dos países em desenvolvimento terem acesso ao capital de que tanto se precisa para a expansão das suas economias. Mas esta percepção é errada, porque na verdade o actual sistema liberalizado não propiciou uma rede de transferência de recursos para o mundo em desenvolvimento. Nos últimos 6 anos, houve uma rede de recursos financeiros flutuantes de todas as regiões desenvolvidas do planeta para o norte, especialmente para os EUA, e mesmo com o aumento do lucro global, as disparidades aumentaram. E no interior dos países, a ideia de que a finança desregulada poderia pôr mais recursos nas mãos dos pobres (como nos empréstimos subprime) mostrou-se insustentável.

Portanto, um maior envolvimento do estado na actividade económica é agora tanto necessário como desejável. O tempo para arguir se isso é ou não o caso já passou. Agora, deveríamos estar a pensar em como tornar esse envolvimento mais democrático e responsável, no interior dos nossos países e internacionalmente.

Tradução: Katarina Peixoto

Jayati Ghosh é economista e professora, especialista em globalização, finança internacional, padrão de emprego nos países em desenvolvimento, política macroeconómica e questões relativas a género e desenvolvimento. É professora na JNU - Jawaharlal Nehru University e é uma das fundadoras da Economic Research Foundation em Nova Deli, uma fundação sem fins lucrativos especializada em investigação em desenvolvimento económico. Publicou, com C.P.Chandrasekhar "Crisis as Conquest: Learning from East Asia" (2001) e "The Marke that Failed: A Decade of Neoliberal Economic Reforms in India" (2002). Foi a autora principal do West Bengal Humam Development Report, com o qual ganhou o Prémio UNPD (United Nations Development Program) em análise.

Daniel Bensaïd em Porto Alegre

Está iniciando a temporada de mais uma Feira do Livro de Porto Alegre, com uma série de debates e lançamentos de livros já marcados. Um deles ocorrerá no dia 5 de novembro com Daniel Bensaïd, ativista político francês e professor de Filosofia na Universidade de Paris VIII. Autor de vários ensaios sobre o debate marxista contemporâneo, Bensaid estará no Brasil para uma série de encontros de lançamento de seu novo livro “Os irredutíveis: teoremas da resistência para o tempo presente” (Editora Boitempo). Em Porto Alegre, o encontro ocorrerá no dia 5 de novembro, quarta-feira, a partir das 19 horas, na Sala dos Jacarandás, Memorial do Rio Grande do Sul, na Praça da Alfândega. Daniel Bensaid fará uma conferência sobre seu livro, com a mediação de Ronan Prigent, adido cultural da França. O livro integra a coleção Marxismo e Literatura, publicada pela Boitempo sob a coordenação de Leandro Konder.

Nesta obra, ele procura rebater o que considera ser reduções simplistas da filosofia política pós-moderna. Para ele, ser irredutível hoje significa, entre outras coisas, não perder a noção de que a globalização financeira, que representa os interesses do grande capital, e as degenerações burocráticas de cunho stalinista não são as únicas formas de organizar o pensamento político e o mundo. As alternativas, ele as apresenta em um texto aforismático e provocador. Alguns dos títulos dos teoremas apresentados no livro são: “A política é irredutível à ética e à estética”, “A luta de classes é irredutível às identidades comunitárias”, “A dominação imperial não é solúvel nas beatitudes da globalização mercantil”, “Quaisquer que sejam as palavras para expressá-lo, o comunismo é irredutível às suas falsificações burocráticas”, “A dialética da razão é irredutível ao espelho quebrado da pós-modernidade”.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Peço desculpas





Frei Betto

Estou gravemente enfermo. Gostaria de manifestar publicamente minhas escusas a todos que confiaram cegamente em mim. Acreditaram em meu suposto poder de multiplicar fortunas. Depositaram em minhas mãos o fruto de anos de trabalho, de economias familiares, o capital de seus empreendimentos.

Peço desculpas a quem assiste às suas economias evaporarem pelas chaminés virtuais das Bolsas de Valores, bem como àqueles que se encontram asfixiados pela inadimplência, os juros altos, a escassez de crédito, a proximidade da recessão.

Sei que nas últimas décadas extrapolei meus próprios limites. Arvorei-me em rei Midas, criei em torno de mim uma legião de devotos, como se eu tivesse poderes divinos. Meus apóstolos – os economistas neoliberais – saíram pelo mundo a apregoar que a saúde financeira dos países estaria tanto melhor quanto mais eles se ajoelhassem a meus pés.

Fiz governos e opinião pública acreditarem que o meu êxito seria proporcional à minha liberdade. Desatei-me das amarras da produção e do Estado, das leis e da moralidade. Reduzi todos os valores ao cassino global das Bolsas, transformei o crédito em produto de consumo, convenci parcela significativa da humanidade de que eu seria capaz de operar o milagre de fazer brotar dinheiro do próprio dinheiro, sem o lastro de bens e serviços.

Abracei a fé de que, frente às turbulências, eu seria capaz de me auto-regular, como ocorria à natureza antes de ter seu equilíbrio afetado pela ação predatória da chamada civilização. Tornei-me onipotente, supus-me onisciente, impus-me ao planeta como onipresente. Globalizei-me.

Passei a jamais fechar os olhos. Se a Bolsa de Tóquio silenciava à noite, lá estava eu eufórico na de São Paulo; se a de Nova York encerrava em baixa, eu me recompensava com a alta de Londres. Meu pregão em Wall Street fez de sua abertura uma liturgia televisionada para todo o orbe terrestre. Transformei-me na cornucópia de cuja boca muitos acreditavam que haveria sempre de jorrar riqueza fácil, imediata, abundante.

Peço desculpas por ter enganado a tantos em tão pouco tempo; em especial aos economistas que muito se esforçaram para tentar imunizar-me das influências do Estado. Sei que, agora, suas teorias derretem como suas ações, e o estado de depressão em que vivem se compara ao dos bancos e das grandes empresas.

Peço desculpas por induzir multidões a acolher, como santificadas, as palavras de meu sumo pontífice Alan Greenspan, que ocupou a sé financeira durante dezenove anos. Admito ter ele incorrido no pecado mortal de manter os juros baixos, inferiores ao índice da inflação, por longo período. Assim, estimulou milhões de usamericanos à busca de realizarem o sonho da casa própria. Obtiveram créditos, compraram imóveis e, devido ao aumento da demanda, elevei os preços e pressionei a inflação. Para contê-la, o governo subiu os juros e a inadimplência se multiplicou como uma peste, minando a suposta solidez do sistema bancário.

Sofri um colapso. Os paradigmas que me sustentavam foram engolidos pela imprevisibilidade do buraco negro da falta de crédito. A fonte secou. Com as sandálias da humildade nos pés, rogo ao Estado que me proteja de uma morte vergonhosa. Não posso suportar a idéia de que eu, e não uma revolução de esquerda, sou o único responsável pela progressiva estatização do sistema financeiro. Não posso imaginar-me tutelado pelos governos, como nos países socialistas. Logo agora que os Bancos Centrais, uma instituição pública, ganhavam autonomia em relação aos governos que os criaram e tomavam assento na ceia de meus cardeais, o que vejo? Desmorona toda a cantilena de que fora de mim não há salvação.

Peço desculpas antecipadas pela quebradeira que se desencadeará neste mundo globalizado. Adeus ao crédito consignado! Os juros subirão na proporção da insegurança generalizada. Fechadas as torneiras do crédito, o consumidor se armará de cautelas e as empresas padecerão a sede de capital; obrigadas a reduzir a produção, farão o mesmo com o número de trabalhadores. Países exportadores, como o Brasil, verão menos clientes do outro lado do balcão, portanto, trarão menos dinheiro para dentro de seu caixa e precisarão repensar suas políticas econômicas.

Peço desculpas aos contribuintes dos países ricos que vêem seus impostos servirem de bóia de salvamento de bancos e financeiras, fortuna que deveria ser aplicada em direitos sociais, preservação ambiental e cultura.

Eu, o mercado, peço desculpas por haver cometido tantos pecados e, agora, transferir a vocês o ônus da penitência. Sei que sou cínico, perverso, ganancioso. Só me resta suplicar para que o Estado tenha piedade de mim.

Não ouso pedir perdão a Deus, cujo lugar almejei ocupar. Suponho que, a esta hora, Ele me olha lá de cima com aquele mesmo sorriso irônico com que presenciou a derrocada da torre de Babel.

Frei Betto é escritor, autor de "Cartas da Prisão" (Agir), entre outros livros.

domingo, 26 de outubro de 2008

Mares Da Espanha
(Ângela Rô Rô)

Nem que eu caminhasse às três da manhã
Nem que eu me enganasse prá ver o que é bom
Nem que eu caminhasse até o Leblon
Não iria encontrar

Você navegando os mares da Espanha
Tecendo prá outra seu corpo com manha
Você navegando o vazio da Espanha
E eu no Leblon

Loucura é loucura não me compreenda
Loucura é loucura pior é a emenda
Loucura é loucura não me repreenda
Eu amei demais

Você quando acorda tem gente do lado
Mas eu quando durmo é um sono abafado
De uísque e vergonha
Por nunca encontrar você...
Ainda insiste na experiência
Pensando que o amor é como a ciência
Amantes diversas não vão trazer nada a mais

Nem que eu caminhasse de volta prá casa
Deixando as mentiras e os sonhos prá trás
Tentando viver o real de um amor
Que se deu demais

Nem que eu caminhasse às seis da manhã
Nem que eu me cegasse prá ver o que é bom
Nem que eu rastejasse até o Leblon
Não iria encontrar....

Loucura é loucura não me compreenda
Loucura é loucura pior é a emenda
Loucura é loucura não me repreenda
Eu amei demais

sábado, 25 de outubro de 2008