terça-feira, 31 de março de 2009

Mais uma da mídia de esgoto de POA-RS

Novo jeito de investigar


Segundo informa o jornaleco da Azenha - cujos profissionais deram agora para ter melindres e, como diz o vulgo, pitis com análises estéticas e técnico-profisionais tecidas sobre suas suscetíveis atividades -, "Quatro vereadores e dois assessores da Câmara de Guaíba estão desde quarta-feira em uma viagem de quatro dias à Brasília para um curso de aperfeiçoamento profissional".

Um dia inteiro desses quatro, ainda segundo o jornaleco, foi dedicado ao credenciamento dos nobres edis guaibenses.

Cleusa Maria Souza, Luiz Edgar Graboski Leite, Orassi Carlos Nunes Orestes e Antônio Rodrigues dos Santos são os tais vereadores, que receberão R$ 2.750 cada em diárias, ao final dessa odisséia em nome do interesse público.

Que custou, além das diárias e, é claro, das passagens aéreas e demais deslocamentos, módicos 360 contos por cabeça.

Porém, noticiar somente isso, evidentemente, é ficar no nível rasteiro do jornalismo investigativo de ZH, que considera gran cosa, por exemplo, ficar de campana (salve, Ungaretti!) atrás de semianalfabetos políticos.

Estabelecer relações entre atos políticos de subordinados e interesses e estratégias político-eleitorais decididas em gabinetes, como se sabe, é algo que só é feito por ZH quando o PT governa o RS.

Os partidos dos referidos vereadores, que ZH não informa, são PTB (Antônio Rodrigues dos Santos), PMDB (Cleusa Maria Souza), DEM (Luiz Edgar Graboski Leite) e o "Partido da Ética", o PP (Orassi Carlos Nunes Orestes), como facilmente pode ser conferido na página da Câmara de Guaíba.

Todos eles, coincidentemente, integrantes da base de apoio do novo jeito de governar, até agora imune ao jornalismo investigativo de ZH.

Créditos: La Vieja Bruja

Mídia oculta protestos de trabalhadores


Altamiro Borges

No livro “Caminhos para uma comunicação democrática”, editado pelo jornal Le Monde Diplomatique, o sociólogo espanhol Manuel Castells, renomado estudioso da área de comunicação, afirma: “A maior influência que a mídia exerce sobre a política não é proveniente do que é publicado, mas do que não o é, de tudo o que permanece oculto, que passa despercebido. A atividade midiática repousa sobre uma dicotomia: algo existe no pensamento do público se está presente na mídia. O seu poder fundamental reside, portanto, na sua capacidade de ocultar, de mascarar, de omitir”.

O raciocínio de Castells se encaixa perfeitamente à cobertura que a mídia deu ao Dia Nacional de Luta e Mobilizações em Defesa do Emprego e dos Direitos, nesta segunda-feira (30). Na fase dos preparativos, os jornalões e as emissoras de televisão simplesmente não deram qualquer destaque a esta iniciativa histórica, que uniu as oito centrais sindicais e os principais movimentos sociais – como UNE e MST. Nem sequer uma linha do manifesto unitário, que exigiu “emprego e salário, manutenção e ampliação dos direitos, redução dos juros e da jornada de trabalho sem redução salarial, reforma agrária e investimentos em políticas sociais”, foi divulgada à sociedade.

A inutilidade de Sardenberg

A omissão foi ainda mais criminosa no dia do protesto. Ocorreram manifestações em 20 capitais e em várias cidades de porte. Cálculo parcial aponta que mais de 80 mil pessoas participaram da jornada de lutas em todo o país. Na capital paulista, 20 mil pessoas andaram vários quilômetros, realizando paradas em frente à sede da Federação das Indústrias (Fiesp), do Banco Central e da Bolsa de Valores. Ocorreram também bloqueios de estradas promovidos pelo MST, paralisações de escolas organizadas pelas entidades estudantis, ocupações de prédios públicos. Nada disso foi motivo de maior destaque na mídia hegemônica, que preferiu “ocultar, mascarar e omitir”.

Nos jornalões, o ato teve poucas linhas e nenhuma manchete. Virou nota nas páginas internas. Já as emissoras de televisão, que são concessão pública, preferiram desqualificar o protesto. Quase em uníssono, todas criticaram a manifestação em São Paulo, que “congestionou o trânsito”. Seus comentaristas regiamente pagos – talvez de ressaca pela prisão relâmpago de Eliana Tranchesi, a dona da ilícita casa de luxo Daslu – fizeram silêncio ou atacaram os organizadores do ato. Carlos Sardenberg, recentemente promovido na TV Globo, ousou afirmar que “o protesto foi inútil”. Se o que sai na TV é o que realmente existiu, o contundente protesto de 30 de março não existiu.

segunda-feira, 30 de março de 2009

"Escola Estadual Yeda Crusius"

Um contêiner do tipo que está servindo de sala de aula para crianças no Estado foi um dos destaques da manifestação realizada hoje, em Porto Alegre, por representantes de sindicatos, movimentos sociais e entidades estudantis. A mobilização integrou o dia nacional de luta contra a crise. No RS, o protesto pediu também a saída da governadora Yeda Crusius (PSDB) e a investigação sobre as denúncias de corrupção que recaem sobre o governo estadual. Com uma faixa afirmando “Escola Estadual Yeda Crusius”, o contêiner foi levado para a frente do Palácio Piratini, um protesto contra a situação da educação no Estado. O governo Yeda decidiu fechar as escolas itinerantes do MST, mas julgou adequado o uso de contêineres para resolver problemas de falta de salas de aula. No verão gaúcho, com temperaturas que chegam a 35°, é um crime contra as crianças.

Foto: Kiko Machado

domingo, 29 de março de 2009

Denúncias de crimes de guerra atingem imagem do exército de Israel

Dois meses depois da ofensiva de Israel na Faixa de Gaza, deflagrada entre 27 de dezembro e 18 de janeiro, surgem novas denúncias sobre crimes que teriam sido cometidos contra civis palestinos – muitas delas provenientes de jornais e entidades israelenses. Nos últimos dias, o grupo de proteção dos direitos civis Human Rights Watch, o diário inglês The Guardian e o jornal israelense Haaretz publicaram matérias e divulgaram documentos sobre o tema.

Entre as denúncias publicadas pelo The Guardian figuram ataques diretos contra médicos e hospitais, que foram relatados em um documento divulgado dia 22 de março pela organização Médicos pelos Direitos Humanos. Médicos e motoristas de ambulâncias contaram ter sido alvo de disparos israelenses e denunciaram 16 mortes nestas condições, algo estritamente proibido pelas convenções de Genebra. O jornal britânico disse ter provas de ataques contra civis realizados por aviões não-tripulados. No total, a ofensiva teria matado mais de 1000 civis.

O Guardian publicou três vídeos feitos que dão força à chamada internacional para que se investigue a operação israelense contra o Hamas, em Gaza. Dentre os relatos, está o de três irmãos adolescentes da família Al-Attar, que contam terem sido utilizados como escudo humano em frente a carros de combate israelenses. Os irmãos contam também que soldados israelenses os enviaram a casas de famílias palestinas para também servirem de escudo para as primeiras balas. A utilização de escudos humanos foi declarada ilegal em 2005 pela Suprema Corte israelense após vários incidentes do tipo.

Degradação ética
De acordo com a Organização Mundial da Saúde, mais da metade dos 27 hospitais e das 44 clínicas de Gaza foram bombardeadas pelos israelenses. Em relatório publicado esta semana a própria organização Médicos pelos Direitos Humanos de Israel denuncia as violações. "Observamos uma forte degradação ética por parte das Forças de Defesa Israelenses no que se refere ao tratamento da população civil de Gaza, que equivale de fato a um total desprezo pelas vidas dos palestinos", critica a organização.

O Canal 10 da televisão israelense divulgou um documentário com imagens de uma reunião militar, no qual o comandante exigiria “agressividade” aos seus homens. “Se estiver alguém suspeito no andar de cima de uma casa temos de bombardear. Se tivermos uma casa suspeita, temos de botar abaixo”, ordenou o oficial.

As imagens alimentam a polêmica que o Haaretz começou ao divulgar testemunhos de soldados que admitem terem matado civis em Gaza e destruído casas, no cumprimento de ordens. Logo em seguida, a Breaking the Silence, organização de antigos militares, contou ao Guardian ter conseguido o testemunho de 15 soldados que confirmaram as denúncias de mortes indiscriminadas e de vandalismo pelas forças israelenses. “Não estamos falando de algumas unidades que foram mais agressivas do que outras, mas denunciando uma política. De tal forma que os soldados nos disseram que tiveram de refrear as ordens que receberam”, disse um dos ativistas do grupo ao Guardian.

"Um tiro, duas mortes"
O jornalista Uri Blau, do Haaretz, relatou outras práticas habituais entre militares, como a fabricação de camisetas. As encomendas que chegaram nos últimos meses às lojas de estampagem retratam uma violência sem precedentes. Uma camiseta encomendada mostra uma mulher grávida na mira e em baixo os dizeres: “Um tiro, duas mortes”.

Por meio de um porta-voz, o exército de Israel disse desconhecer as denúncias. Também afirmou que a credibilidade das informações será verificada e, se for o caso, será aberta uma investigação. Grupos israelenses de defesa dos direitos humanos pediram uma apuração independente sobre os supostos crimes de guerra. Várias organizações afirmaram em comunicado que a decisão do governo de investigar a morte de civis palestinos não garante a isenção necessária para a tarefa.

O relator das Nações Unidas para os Territórios Palestinos, Richard Falk, também declarou que há indícios de que os israelenses cometeram abusos na ofensiva. Segundo Falk, se não é possível distinguir os alvos militares e os civis, “então lançar os ataques é inerentemente ilegal e poderia constituir um crime de guerra da maior magnitude sob a legislação internacional”. Para Falk, outro agravante é o fato de que a fronteira de Gaza ficou fechada, de forma que “os civis não podiam escapar dos locais atacados”.

As bombas de fósforo branco
Em outra matéria publicada dia 25 de março, o Guardian diz que Israel “atirou bombas de fósforo branco sobre áreas lotadas de Gaza repetidas e indiscriminadas vezes em três semanas, matando e ferindo civis e cometendo crime de guerra”. A matéria também cita o relatório de 71 páginas do Human Rights Watch onde o grupo diz que a repetida utilização de bombas de fósforo branco como artilharia em zonas povoadas de Gaza não foi fortuita ou acidental, “mas revelou um padrão, ou uma política de conduta”. O relatório afirma que os militares israelenses estavam conscientes dos perigos do fósforo branco, não quiseram usar alternativas menos perigosas e, em um dos casos, Israel ignorou repetidas advertências das Nações Unidas sobre o assunto.

"Em Gaza, os militares israelenses não utilizaram apenas fósforo branco em áreas abertas como proteção para suas tropas", afirmou Fred Abrahams, investigador do Human Rights Watch. "Dispararam fósforo branco repetidamente ao longo de áreas densamente povoadas, mesmo quando as suas tropas não estavam na área e bombas mais seguras estavam disponíveis. Como resultado, civis sofreram e morreram desnecessariamente".

Após a publicação do relatório, o Human Rights Watch convocou o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, a lançar uma comissão internacional de inquérito para investigar as violações do direito internacional na Guerra de Gaza pelas forças militares israelenses e do Hamas. Israel defende sua conduta em Gaza e diz que seus soldados não atingiram intencionalmente alvos civis. Ainda segundo o Guardian, quando o uso de fósforo branco por Israel surgiu durante a guerra, os militares primeiro negaram que estariam usando a arma, então disseram que só utilizaram as armas em conformidade com o direito internacional. Mais tarde, anunciaram que um inquérito interno seria realizado.

O jornal britânico também afirma ter encontrado, em janeiro, uma cápsula de fósforo branco ainda queimando vários dias após ter sido despejada, fora da casa da família Abu Halima, em Atatra. Uma bomba de fósforo branco atingiu diretamente a casa, matando o pai e quatro dos filhos da família. A esposa ficou gravemente queimada. O mesmo caso foi relatado pelo Human Rights Watch. As novas denúncias estão produzindo um significativo abalo na imagem do exército de Israel, inclusive dentro do próprio país.

sábado, 28 de março de 2009

Outro JONALISTA de fundamento...(em espanhol)

Conjura contra Cuba

Sin duda el modelo político cubano levanta todo tipo de pasiones encontradas entre la comunidad internacional. Para unos, el mayor ejemplo de dignidad y compromiso con los pueblos oprimidos; para otros, la única dictadura comunista que persiste en el continente. Fidel Castro ha sido el líder más aclamado en las cumbres al tiempo que el que más furibundos detractores ha tenido. La caída del Muro de Berlín y el derrumbe de la Unión Soviética aún provocaron más expectación política hacia la evolución de Cuba, convertida en el único país socialista del continente americano. Sería así para sus opositores la próxima ficha del dominó en caer, mientras que para sus defensores se trataría del pueblo numantino que resiste la embestida neoliberal que domina al mundo.

Sin embargo, esa división no se refleja en los grandes medios, todos están alineados en el grupo de críticos contra el gobierno cubano. No se trata de considerar a Cuba como el sistema político ideal ni presentarlo como el paraíso socialista, pero sí de dejar en evidencia las falsedades, tópicos y desinformaciones que dominan la agenda informativa contra su revolución. Porque si en algo coincidimos todos es en que la verdad nos hace libres. Apartemos los periódicos y las televisiones, y busquemos entonces la verdad sobre Cuba.

Este libro es la versión ampliada del apartado dedicado a Cuba de la obra «Desinformación. Cómo los medios ocultan el mundo» (Editorial Península 2009), donde Pascual Serrano repasa la distancia entre los sucedido en los últimos años en América Latina, Europa, Estados Unidos, África y Asia y la información que han difundido los grandes medios de comunicación. Tanto el autor como la editorial han cedido los derechos de este apartado para Cubainformación y la asociación Euskadi–Cuba. La difusión y distribución de este libro se realizará a través del Movimiento de Solidaridad con Cuba (MSC) en todo el territorio del Estado español. Asimismo, los ingresos obtenidos en la venta revertirán al MSC en su labor de apoyo y defensa de la Revolución Cubana.

Sobre al autor:

Pascual Serrano.
Periodista especializado en política internacional y análisis de medios de comunicación. En 1996 fundó junto con un grupo de periodistas la publicación electrónica Rebelión (www.rebelion.org), que hoy funciona como diario alternativo en Internet. Durante 2006 y 2007 fue asesor editorial de Telesur, un canal de televisión promovido por Venezuela con la participación de Cuba, Argentina, Uruguay y Bolivia, que pretende ser un modelo de comunicación contrapuesto a los medios dominantes del primer mundo. Colabora habitualmente en una decena de publicaciones españolas y latinoamericanas, entre ellas, el diario Público, el quincenal Diagonal y los mensuales Mundo Obrero y Le Monde Diplomatique. Es miembro del consejo de redacción de varias revistas alternativas. Gran conocedor de Cuba, ha viajado a la isla en decenas de ocasiones y vivido allí largos períodos de tiempo.

Entre sus libros destacan Perlas (2006) y Perlas 2. Patrañas, disparates y trapacerías en los medios de comunicación (2007). En febrero de 2007 fue Primer Premio del Concurso Internacional de Ensayo "Pensar a contracorriente", por su trabajo "Violencia y medios de comunicación". De él surgiría la obra “Medios violentos. Palabras e imágenes para el odio y la guerra” (El Viejo Topo. Barcelona. Mayo 2008). Su último libro es “Desinformación. Cómo los medios ocultan el mundo” (Península 2009).

Su página web es www.pascualserrano.net

Serrano, Pascual. Conjura contra Cuba. Edición de Euskadi Cuba. Marzo 2009

Para más información y pedidos:
Por email directo: distribucion@cubainformacion.tv Esta dirección de correo electrónico está protegida contra los robots de spam, necesita tener Javascript activado para poder verla

Asociación Euskadi-Cuba
tf: 944151107
www.euskadicuba.org
Cubainformación
www.cubainformacion.tv

Elaine Tavares, uma JORNALISTA comprometida....

Porque é preciso romper as cercas: Do MST ao jornalismo de libertação

Será no dia 16 de abril, no Auditório do Centro Sócio-Econômico da UFSC, em Florianópolis,às 19h, o lançamento do livro da jornalista Elaine Tavares: “Porque é preciso romper as cercas: Do MST ao Jornalismo de Libertação”. Neste trabalho, Elaine narra uma histórica ocupação do MST, a da Fazenda Anonni, no interior do Rio Grande do Sul, ocorrida em 1985/86. E, nesse contar das lutas das gentes, ela desvela a sua própria trajetória na busca de um jornalismo que se compromete e toma posição, sem perder o foco na realidade objetiva.

São os primeiros passos da discussão do que mais tarde Elaine veio a cunhar como Jornalismo Libertador, conceito no qual se ampara o jornalismo que não é servil, nem porta-voz dos poderosos, mas que narra a vida desde o olhar da comunidade das vítimas, como ensina o filósofo da libertação, Enrique Dussel.

Hoje, falar deste acampamento que existiu no interior de Sarandi, com mais de seis mil pessoas acampadas, é recuperar o caminho histórico do MST, atualmente acossado por agressões de toda sorte, como a que obriga o fechamento de suas escolas no Rio Grande do Sul. Então, o lançamento do livro acaba sendo também um momento de justo apoio a este movimento que tem sido um sendero de luta e transformação.

Assim, o encontro terá o poema de Cesinha, a música de Rafael Galcer e José Amorim, a fala de Vilson Santin, produtos da reforma agrária para serem degustados (vinho, queijo e salame) e o livro da Elaine. Uma noite para homenagear o MST e conhecer suas origens.

Sobre a autora: Elaine Tavares, jornalista e pesquisadora no IELA/UFSC, é gaúcha nascida em Uruguaiana, Rio Grande do Sul. Viveu sua infância em São Borja, na barranca do rio Uruguai e, depois, foi virar mulher às margens do "Velho Chico", em Pirapora, Minas Gerais. Das heranças ribeirinhas que amealhou, estão a paixão pela vida dos que andam nas estradas secundárias e o amor pela narração das histórias. Contar das gentes tem sido sua sina. Vivendo em Florianópolis desde 1987, também aprendeu com o mar que, às vezes, é preciso se jogar barulhento nos penhascos para capturar a beleza de se ser quem se é.

Dia 16. 19h

Auditório do CSE/UFSC

créditos: Desacato

A propósito das “reflexões” de Fidel


Por Miguel Urbano Rodrigues. Portugal

www.odiario.info


A minha admiração por Fidel Castro remonta ao início dos anos 50, quando a Portugal chegaram ecos do assalto ao Quartel Moncada.

Eu era um jovem jornalista sem formação politica. Nessa época o culto dos heróis era inseparável do meu olhar sobre a Historia. Aquele moço cubano que numa louca aventura desafiara o poder de uma ditadura corrupta tomou lugar naturalmente no meu panteão de heróis carlilianos.

Transcorridos quatro anos, quando, iniciada a epopeia da Sierra Maestra, o nome de Fidel voltou às manchetes da imprensa internacional, a minha admiração pelo guerrilheiro barbudo que se propunha a destruir o exército de Batista e esboçava da Sierra os contornos de uma revolução humanista ampliou-se muito.

Qual será o desfecho deste desafio? - perguntava-me.

Somente anos depois ganhou transparência a certeza de que o grande desafio não terminou com a entrada em Havana do Exército Rebelde. A Revolução Cubana, acossada pelo imperialismo, avançou torrencialmente rumo ao socialismo, assumindo as proporções de um terramoto social e político que deixaria marcas profundas na América Latina.

A grande vaga romântica guerrilheira dos anos 60 foi derrotada na América Latina. Mas a herança da Revolução Cubana fortaleceu a consciência anti- imperialista de sucessivas gerações de latino-americanos. Sem o exemplo da resistência cubana não teriam sido possíveis as conquistas dos governos progressistas de Torres na Bolívia e de Velasco Alvarado no Peru e, dez anos depois, a vitória da Frente Sandinista na Nicarágua, e o combate travado em El Salvador pela Frente Farabundo Marti de Libertação Nacional. Embora menos perceptíveis, as lições da saga cubana são também identificáveis nas lutas sociais que, em contextos muito diferentes, levaram à Presidência da Venezuela, do Brasil, do Uruguai, da Bolívia, do Equador, do Paraguai presidentes com programas iniciais moderadamente anti imperialistas e antineoliberais.

A presença cubana na luta dos movimentos de libertação africanos não foi somente importante. Ela assumiu em alguns casos um papel decisivo. Sem a ajuda cubana, Angola teria sucumbido. Nelson Mandela reconheceu aliás a grande contribuição de Cuba para a independência da Namíbia e o fim do apartheid na Africa do Sul.

Quando Fidel adoeceu, escrevi em Agosto de 2006 um artigo em que o defini como o Aquiles Comunista por identificar nele a coragem do herói aqueu no desafio ao impossível.

Recordei então que Fidel, ao discursar em Havana em 1960 num Congresso dos Trabalhadores Cubanos, sublinhara ser perigoso que um homem dispusesse de tanta autoridade como a concentrada na sua pessoa. Não podia então imaginar que, por circunstâncias da história independentes da sua vontade, tal situação iria manter-se durante décadas.

Ele exerceu porém um imenso poder como comunista desambicioso que partia do nacional para o universal num combate em que a defesa da pequena Cuba se inseriu numa batalha maior pela transformação revolucionária da humanidade.

Na segunda metade do século XX não houve talvez outro dirigente do Terceiro Mundo que pela palavra e pela acção tenha desempenhado um papel tão importante no rumo de acontecimentos que assinalaram o processo de descolonização e as lutas contra o imperialismo de povos por este oprimidos e agredidos.

Residi em Cuba durante quase oito anos, precisamente após o fim da União Soviética. Formei ali a convicção de que foi nessa época que Fidel, num processo de ascese, superou como estratego e estadista tudo o que até então realizara na defesa da Revolução. A sobrevivência da Ilha socialista, bloqueada e atingida por uma guerra não declarada, num mundo em que de Washington a Paris se festejava (prematuramente) o fim do socialismo, trouxe-me então à memória as epopeias dos antigos gregos, cantadas por Homero e Xenofonte.

Sem petróleo, sem acesso ao crédito internacional, Cuba, cujo comércio externo dependia em mais de 85 % da URSS e dos países do Leste Europeu, foi forçada a integrar-se gradualmente num mercado capitalista cujos dirigentes não escondiam o desejo de destruir o seu regime.

Por haver tido a oportunidade de viver no dia a dia o chamado Período Especial e as semanas da crise dos balseros sei que a sobrevivência da Revolução foi amassada em sofrimento, coragem e privações que dificilmente outro povo teria suportado sem capitular. Mas Cuba sobreviveu.

Fidel, lúcido, advertiu insistentemente o seu povo de que essa sobrevivência era inseparável da introdução de mecanismos do capitalismo que iriam contaminar franjas do tecido social. E isso aconteceu. Ameaçada pelo inimigo externo, a Revolução teve de encontrar forças e imaginação para se defender do perigo interno. Este não resultava de uma oposição caricatural, mas da própria dinâmica da mudança social num contexto em que o Estado e o Partido demonstraram dificuldade em encontrar respostas adequadas para novos desafios.

A Doença do Herói


Era inevitável que a doença de Fidel provocasse uma sensação que ia da angústia ao alarme não apenas no seu povo mas em milhões de revolucionários de todo o mundo, solidários com a Revolução Cubana.

Os heróis são mortais, como todos os humanos, mas aqueles que em Cuba – a maioria do povo – se habituaram durante muitos anos a esperar de Fidel as decisões que permitiam ao barco da Revolução navegar com segurança em aguas tempestuosas, sentiram algo semelhante a uma orfandade anunciada quando se aperceberam de que ele não poderia retomar o leme.

Raúl assumiu com lucidez e firmeza a Presidência do Conselho de Estado, ou seja a governação dos país. Isso ocorreu num momento em que, na fidelidade à opção socialista, o próprio Fidel, antes de adoecer, afirmara a necessidade de medidas de combate à burocratização e de ruptura com a tendência para o imobilismo.

Não cabe neste artigo apreciar o que Raúl e a equipa dirigente fizeram e não fizeram desde o afastamento, primeiro temporário e depois definitivo, do irmão. Intelectuais amigos de Cuba têm, sob perspectivas diferentes, escrito muito sobre a nova situação existente na Ilha, tal como a vêem, no campo da economia, da cultura, das relações sociais.

Revisitei Cuba em Novembro de 2007. Decidi não escrever sobre o que vi e ouvi em conversas com camaradas.

Abro hoje uma excepção. A admiração e o respeito que Fidel me inspira como revolucionário e personagem histórico impõem-me o dever de escrever, como comunista, este texto motivado pelos os últimos acontecimentos de Cuba. Não para comentar a Nota Oficial do Conselho de Estado que desencadeou uma chuva de especulações, mas apenas para abordar uma questão, que me parece fulcral, mas ignorada pelos exegetas do processo cubano.

Refiro-me às consequências da situação de ambiguidade resultante de Fidel, tendo renunciado, por incapacidade física, à chefia do Estado, permanecer como primeiro secretário do Comité Central do Partido Comunista de Cuba. Essa função confere-lhe toda a legitimidade para se pronunciar sobre qualquer tema que se lhe afigure merecedor da sua atenção, como máximo responsável de um Partido que se situa acima do governo como responsável pelo rumo da Revolução.

E Fidel tem exercido esse direito na coluna de “Reflexões” que “Granma”, o órgão central do Partido tem publicado com alguma regularidade e esses textos são reproduzidos em dezenas de media estrangeiros, alguns adversários da Revolução.

Mais de uma vez, “reflexões” de Fidel sobre questões internas e internacionais suscitaram polémica e sobretudo especulações mal intencionadas.

Os seus comentários à Nota Oficial do Conselho de Estado publicada pelo “Granma”, no dia 3 de Março, chamaram de modo especial a atenção de camaradas e inimigos, tornando-se tema de manchetes, por iluminarem a ambiguidade acima referida.

Na Nota as informações sobre o afastamento de Carlos Lage e de Felipe Perez Roque dos Ministérios que chefiavam não eram acompanhadas de qualquer crítica. O primeiro mantinha a sua posição no Conselho de Estado como vice-presidente e o segundo permanecia como membro do Comité Central.

Fidel na coluna que dedicou ao assunto não se limitou a elogiar as decisões tomadas, Dirigiu duras criticas a ambos, sem os nomear explicitamente, qualificando-os de indignos.

A boataria assumiu grande amplitude. Uma vaga de especulações varreu Cuba e o mundo.

A reacção de Lage e Perez Roque foi imediata. Em cartas publicadas pelo “Granma”, muito parecidas, reconheciam e lamentavam erros cometidos, informaram que renunciavam a todos as funções que desempenhavam no Estado e à condição de membros do Comité Central e expressavam a sua admiração por Fidel e Raúl.

Fidel desautorizou o Conselho de Estado, embora não fosse essa a sua intenção.

Abstenho-me de criticar o seu gesto. Mas a ambiguidade da situação criada pela sua permanência no cargo de primeiro secretário do PCC que, pela sua condição física, não pode exercer plenamente, cria constrangimentos no Estado e no Partido e está a ser utilizada pelos inimigos de Cuba para denegrir a imagem do revolucionário comunista que marcou a História do século XX.

Nestes dias, recordando a trajectória luminosa de Fidel, penso em Álvaro Cunhal, Volodia Teitelboim e Harilaos Florakis, eles também grandes revolucionários que, ao afastarem-se das responsabilidades que tinham como dirigentes dos seus partidos, não foram confrontados pela história com problemas como aquele que volta a colocar Cuba no centro da atenção mundial.

Fidel repetiu insistentemente ao longo da vida que o dever do revolucionário é fazer a revolução. Ele a sentiu e vê como infinito absoluto. Ninguém contribuiu tão positivamente como ele para romper na América Latina a submissão ao imperialismo encarada como fatalidade, ninguém conseguiu com tanto êxito contrariar a lógica aparente da História. E talvez também nenhum outro revolucionário tenha na sua intervenção como estadista revelado uma consciência tão permanente de que, por mais sábio que seja, dirigente algum pode sobrepor-se ao colectivo como sujeito transformador da História.

Interrogo-me se o Partido não terá nos últimos meses contribuído pela sua omissão para o avolumar da ambiguidade da posição actual de Fidel que não favorece o prestígio da Revolução Cubana.

Acredito que no seu quarto de doente, Fidel medita sobre o tema.

Vila Nova de Gaia, 13 de Março de 2009.

sexta-feira, 27 de março de 2009

Está no Le Monde - Brasil

Turbulências na zona do Euro

Durante sua primeira década, a moeda europeia não correspondeu às expectativas iniciais: experimentou um crescimento enfraquecido e uma taxa de desemprego elevada. Além disso, o déficit orçamentário de várias das suas economias superou, com frequência, o teto estabelecido em 3% do PIB

Laurent Jacque

Até que ponto a tormenta financeira que está assolando a economia internacional poderia ameaçar a perenidade do Euro? Os seus defensores estão convencidos de que isso jamais acontecerá, muito pelo contrário. Argumentam que no espaço de dez anos a zona do Euro, que é a segunda economia mundial, tornou-se um refúgio de paz e segurança apoiado em uma moeda forte ou, no pior dos casos, estável.

Em 1º de janeiro de 2009, a Eslováquia tornou-se o 16º país a adotar o Euro. Ainda mais significativo é o fato de que importantes estados europeus como Dinamarca, Reino Unido e Suécia, que ficaram de fora na ocasião do lançamento da moeda única, em 1999, estariam agora reconsiderando sua posição. Os partidários da moeda única defendem que o Banco Central Europeu (BCE), que sempre se mostrou ferozmente independente dos poderes políticos, deu mostras de competência na tarefa de controlar a expansão da massa monetária, reduzindo a inflação para cerca de 2%; as taxas de juros nominais foram mantidas em 2,5% em média, enquanto as taxas de juros reais não eram tão baixas desde os anos 1960.

Ao eliminar os riscos inerentes ao câmbio [1] e aos custos das transações, a supressão de 15 moedas nacionais dinamizou o comércio e os investimentos no interior da zona do Euro, os quais constituem um terço do seu Produto Interno Bruto (PIB).

Dez anos depois do seu lançamento, a divisa europeia alcançou uma valorização recorde em relação ao dólar e colocou os países membros da zona do Euro numa posição vantajosa frente à libra esterlina e à coroa islandesa.

A zona do euro passou a representar uma alternativa à zona do dólar, até então todo-poderoso; o Euro “forte” constitui mais de um quarto das reservas dos bancos centrais e vai se afirmando como a divisa mais indicada para lastrear os títulos financeiros emitidos nos mercados internacionais.

Conforme resume com entusiasmo o presidente do BCE, Jean-Claude Trichet, “nós contribuímos dia após dia para criar um nível de prosperidade sempre mais elevado, e estamos desempenhando desta forma um papel importante no processo de unificação da Europa” [2].

A zona do Euro, no entanto, teve sua primeira década marcada por um crescimento enfraquecido, uma taxa de desemprego elevada e, além disso, o déficit orçamentário de várias das suas economias superou com frequência o teto, determinado pelo Pacto de estabilidade e de Crescimento (PEC) [3], de 3% do PIB.

O contraste é espantoso quando comparamos essa situação com as do Reino Unido, da Suécia e da Dinamarca, três países situados fora da zona do Euro que apresentaram nesse período taxas de desemprego reduzidas, taxas de crescimento mais elevadas e déficits limitados (ou até mesmo excedentes orçamentários).

Superar a crise

Até hoje, a moeda única contribuiu muito pouco para debelar as dificuldades econômicas europeias, causadas principalmente por problemas estruturais contra os quais o Euro nunca teve a pretensão de constituir uma panaceia. As promessas de aceleração da atividade e de redução do desemprego que a moeda trazia praticamente não se concretizaram. Terá sido o euro responsável, em parte, pelas dificuldades econômicas da década que se encerrou, e conseguirá ele sair incólume de uma crise que se apresenta como arrasadora?

As transações comerciais efetuadas internamente representam cerca de 15% do PIB da zona do Euro, o que é muito pouco se comparado ao que ocorre nos Estados Unidos

O lançamento da moeda única, em 1999, estava fundado numa vontade política e não na teoria econômica da zona monetária ideal (ZMI). Segundo essa teoria, um grupo de países ou de regiões pode constituir uma ZMI quando as suas economias estão fortemente articuladas, tanto no que diz respeito aos intercâmbios de bens e de serviços, quanto à mobilidade dos fatores de produção (trabalho e capital).

As transações comerciais que são efetuadas internamente representam cerca de 15% do PIB da zona do Euro, o que é muito pouco se comparado ao que ocorre do outro lado do Atlântico, nos EUA. enquanto a mobilidade do capital no âmbito da zona do Euro aumentou consideravelmente, a mobilidade do trabalho permanece muito limitada em relação à dos Estados Unidos.

Ignorando essas questões essenciais, o tratado de Maastricht, assinado em 1992, criou uma política monetária única cuja gestão foi entregue ao BCE. Nesse tratado foram retiradas de cada país duas das suas três ferramentas de gestão econômica: a da condução de uma política monetária nacional independente e aquela da manutenção da flexibilidade do preço da sua moeda. A terceira ferramenta, a da política orçamentária, que permanece uma competência nacional, é comprometida, por sua vez, pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento. Este determina que o déficit de cada país membro não pode ser superior a 3% do seu PIB e que a dívida nacional de cada um desses países está limitada a 60% do PIB. Na prática, porém, essa regra andou sofrendo notáveis distorções, principalmente por parte da Itália e da Grécia, onde a dívida pública já alcança, respectivamente, 104% e 95% do PIB.

Em razão dessas diferenças de desempenho econômico entre os Estados membros, a autonomia das suas políticas econômicas torna-se uma questão preocupante, principalmente no caso de algum deles sofrer um choque particular que não tenha repercussão no restante da zona do Euro.

Se a zona do Euro fosse efetivamente uma ZMI, o país em dificuldade se ajustaria por meio das seguintes medidas: a mobilidade da sua mão-de-obra em relação ao restante da zona do euro; a flexibilidade dos salários e dos preços; e uma transferência orçamentária equilibradora, partindo de Bruxelas em benefício do membro em dificuldade.

Nenhuma dessas três condições estava preenchida na criação do Euro e foram implementadas, desde então, apenas algumas poucas reformas estruturais destinadas a tornar o mercado de trabalho mais “maleável”, no sentido de se criar uma ZMI. A terceira e mais simples de todas torna necessária certa dose de federalismo fiscal, além de um poder econômico centralizado que contrabalançaria a independência do BCE.

Esses objetivos permanecem muito distantes porque ameaçam a soberania de cada Estado. De fato, a União Europeia, que dispõe de recursos bastante limitados – um orçamento mantido teoricamente em 1,27% do seu PIB, mas que na prática permanece estagnado em 1,23% –, não está habilitada a proceder transferências orçamentárias para amortecer os choques que atingem as economias nacionais.

Isso contrasta fortemente com a situação dos Estados Unidos, onde 60% das despesas públicas são realizadas no nível federal e onde a mobilidade do trabalho e a flexibilidade dos salários são muito superiores às normas europeias. Nem mesmo a Alemanha unificada – que em 1991 fusionou o marco do Leste com o do oeste – conseguiu criar uma ZMI para a moeda. Apesar de ter havido uma transferência maciça (de 200 bilhões de Euros) a partir de 1991, a taxa de desemprego na parte oriental do país se mantém em mais de 20%.

No decorrer da sua primeira década de existência, o Euro teve de enfrentar ao menos dois choques “assimétricos”, assim chamados por não atingirem os países membros da mesma maneira: o dólar que se manteve “caro” ou supervalorizado de 1999 a 2002 e, mais recentemente, no período de 2005 a 2008, a disparada dos preços do petróleo.

No primeiro caso, os Estados que estavam direcionados em demasia para o comércio internacional (em vez de darem preferência para transações com os outros países da zona do Euro), foram atingidos por uma inflação importada – custo elevado das importações em razão da carestia do dólar. E isso ocorreu de forma muito mais rápida do que nos países cujas transações comerciais ou estavam voltadas principalmente para a zona do euro.

Nem mesmo a Alemanha conseguiu criar uma zona monetária ideal. Apesar de uma transferência maciça de Euro, a taxa de desemprego na parte oriental está em 20%

Assim, entre 1999 e 2002, a Irlanda viu sua taxa de inflação alcançar 4,1%, ao passo que a Alemanha, mais orientada para o comércio com os outros membros da UE do que com o resto do mundo, manteve essa taxa em 1,2%. Da mesma forma, a alta dos preços do barril de petróleo, que teve seu custo multiplicado por quatro nesse período não prejudicou o crescimento nem estimulou a inflação dos países membros de maneira uniforme: a França, por exemplo – em função da sua decisão de priorizar a energia nuclear –, depende em apenas 35% do petróleo para garantir seu abastecimento de energia, diferentemente da Grécia, da Espanha e da Itália, onde esse número é superior a 55%.

A combinação de uma política monetária centralizada com uma política orçamentária descentralizada resulta, infelizmente, em diferenças entre os níveis de inflação de cada país, as quais instauram disparidades no poder aquisitivo do euro e geram competitividade entre os Estados membros. No quadro de um sistema de moedas “nacionais”, esse efeito seria facilmente corrigido por meio da valorização ou da desvalorização “competitiva” da moeda. Mas isso deixou de ser possível, uma vez que a moeda única paralisa a ferramenta das taxas de câmbio, anulando, ao mesmo tempo, a independência das políticas monetárias nacionais.

Tarefa difícil

Em razão dessa impossibilidade de se corrigir as discrepâncias inflacionárias, o poder aquisitivo da moeda europeia vai sendo corroído em muitos países, particularmente na Alemanha, em relação à média dos demais estados da zona do Euro. entre janeiro de 1999 e setembro de 2008, por exemplo, levando-se em conta as diferenças entre os custos salariais, o Euro na Itália sofreu uma valorização de cerca de 40% em relação ao Euro na Alemanha. o mesmo ocorreu com a Espanha e a Grécia, que não estão muito atrás da Itália.

As tentativas de corrigir essas discrepâncias cumulativas constituem uma tarefa difícil porque toda diminuição das remunerações parece ser politicamente explosiva. Apenas a obtenção de ganhos de produtividade pode reverter essa tendência; a Alemanha e a Holanda foram bem-sucedidas ao implementar essa política. Portanto, não surpreende que muitas empresas, no afã de resolverem seu “problema”, tenham optado por transferir (ou tenham ameaçado fazê-lo) suas atividades para países da Europa central e oriental.

Um fator complicador da situação é a mais completa falta de sintonia entre as agendas eleitorais (dos pleitos presidencial, legislativo e municipal) dos membros da União, o que exacerba a falta de sincronia entre os ciclos econômicos nacionais, na medida em que as eleições são geralmente precedidas por uma política orçamentária expansionista.

No momento em que o mundo está se atolando numa crise profunda, a tarefa de deter o forte aumento da taxa de desemprego, que pode superar rapidamente o nível crítico de 10% a 12%, vai se tornar o objetivo primordial. Esse já é o caso na Espanha, onde a taxa de desemprego disparou repentinamente para 13% nos últimos seis meses.

A tarefa de combater o desemprego resultará inevitavelmente em déficits fiscais maciços, os quais abrirão brechas no Pacto de Estabilidade e Crescimento difíceis de serem controladas e acabarão ameaçando a estabilidade da moeda única. Isso porque os planos de recuperação costumam estourar os limites máximos do déficit orçamentário (de 3% do PIB) e da dívida pública (60% do PIB), o que consiste também em uma ameaça à independência do BCE.

Os Subcompetitivos

Para certos países, cujas economias já estão muito fragilizadas pelas disparidades inflacionárias, isso não será sequer suficiente, o que pode levá-los facilmente a ceder à tentação de seguir o exemplo da recente e brutal desvalorização da libra esterlina.

A Espanha, a Grécia, a Itália e Portugal (cujas taxas de desemprego superaram com frequência a faixa dos 10% no decorrer dos últimos dez anos) não aceitarão permanecer eternamente “subcompetitivos” por conta da supervalorização do “seu” Euro. Por mais delicada que seja a tarefa de restaurar sua moeda nacional, o risco é de que certos países optem por abandonar o euro com o objetivo de recuperar sua competitividade econômica. É pouco provável que tais guinadas ocorram a curto prazo – entre outras razões, seria muito caro para um país que acaba de se despedir da zona do Euro financiar a dívida nacional (contraída em Euros) por meio de uma moeda novamente restaurada e desvalorizada. Entretanto, toda deterioração do ambiente social já frágil (conforme demonstra a violência das recentes manifestações populares na Grécia [4]) e prejudicado ainda mais por uma aceleração brutal do desemprego, poderia, em alguns países, aumentar a tentação de se adotar dessa solução extrema.



[1] Riscos vinculados à variação da taxa de câmbio das divisas. Antes da unificação monetária, investidores especulavam com frequência com o franco francês, a lira italiana ou a libra esterlina. Em setembro de 1992, George Soros acumulou mais-valias consideráveis apostando na desvalorização da libra, no momento em que o Reino Unido se atolava na crise econômica.

[2] Jean-Claude Trichet, entrevista concedida a Die Zeit, Hamburgo, 23 de julho de 2007.

[3] O Pacto de Estabilidade e de Crescimento retoma os critérios de convergência definidos pelo Tratado de Maastricht; ele mantém, entre outros, o objetivo da redução dos déficits públicos, um compromisso que todo membro deve assumir tendo em vista a sua incorporação na União Econômica e Monetária (UEM).

[4] Ler Valia Kaimaki, “A recusa do futuro”, Le Monde Diplomatique Brasil, edição 18, janeiro de 2009.

quinta-feira, 26 de março de 2009

Jornalistas têm alergia à crítica?


Alguns jornalistas que trabalham na chamada grande imprensa de Porto Alegre parecem ter alergia à crítica. Com o crescimento da rede de sites e blogs que acompanham e comentam a cobertura diária da mídia, tem crescido também o número de processos contra os autores destes textos. O alvo mais recente desta alergia foi o jornalista Wladimir Ungaretti (foto), professor da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

A Justiça determinou que Ungaretti retirasse do site Ponto de Vista todo conteúdo que pudesse ser considerado ofensivo ao repórter fotográfico Ronaldo Bernardi, do jornal Zero Hora. Na ação que moveu contra Ungaretti, Bernardi reclamou, entre outras coisas, de sua identificação pelo apelido de “Fotonaldo”. A Justiça acolheu em primeira instância o pedido do fotógrafo e Ungaretti resolveu suspender temporariamente as atividades do site que faz uma análise crítica diária do jornal Zero Hora.

Outro caso é o do blog Nova Corja, que após sofrer processos do jornalista Políbio Braga, agora sofre uma ação judicial do jornalista Felipe Vieira, da Rede Bandeirantes. Ele reclama de constrangimentos que estaria sofrendo por causa de posts publicados há quase um ano no blog. A queixa-crime, por injúria e difamação, é dirigida contra Rodrigo Oliveira Alvares, Leandro Demori, Walter Valdevino Oliveira Silva, Mário Camera e Jones Rossi.

Durante décadas, os profissionais da chamada grande imprensa trabalharam sem o tipo de acompanhamento crítico diário que ocorre hoje na internet. E sempre tiveram posição contrária à censura de seus trabalhos. Agora, aparentemente, jornalistas podem engrossar a onda daqueles que querem impor “limites mais rígidos à internet. A linguagem adotada pela maioria dos blogs e sites alternativos é irreverente por natureza. Pois agora, a irreverência e o sarcasmo estão sendo tipificados criminalmente.

Estes jornalistas costumam reclamar dos “excessos” cometidos na internet, mas silenciam a respeito dos “excessos” cometidos diariamente pelos veículos em que trabalham. Consideram-se, muitas vezes, como paladinos da verdade, desvinculados dos esquemas de poder nos quais estão inseridas as empresas onde trabalham. A possível dimensão negativa da irreverência e do sarcasmo da linguagem na internet, com todos seus excessos e, por vezes, erros, é infinitamente menor do que o dano que muitos destes paladinos causam com seu trabalho deslumbrado e submisso a um esquema de poder ao qual, ingenuamente ou não, eles afirmam não servir.

Tigre céltico virou gatinho banguela


Irlanda resvala para o abismo econômico em 2009

O gráfico acima foi publicado pelo jornal francês “Le Monde”, de alguns dias atrás. Mostra a previsão da Comissão Européia de desempenho econômico de vários países da zona do euro-moeda. Chama a atenção a bancarrota anunciada da República da Irlanda, com crescimento negativo de 11% para o corrente ano.

Em pensar que a Irlanda já foi proclamada pela imprensa neoliberal como o “Tigre Céltico”, quando logrou crescer cerca de 9% ao ano, no período de 1995 a 2001.

Evidentemente um crescimento insustentável, episódico, artificial, porque baseado no receituário clássico do neoliberalismo mais ortodoxo: desregulação selvagem, radical encolhimento do Estado, liberação à entrada de capitais predadores, flexibilização total das leis trabalhistas, privatização de setores estratégicos, altas taxas de endividamento interno, hipertrofia no consumo de supérfluos, financeirização da economia produtiva, etc. Só um elemento dinâmico pode salvar a Irlanda, o fato de ter estimulado a alta tecnologia, em detrimento das indústrias de tecnologia obsoleta. Essa talvez seja a saída do velho tigre agora desdentado.

A propósito: gostaríamos muito de ouvir a voz doutoral do “comunicador” Lasier Martins, que ainda recentemente cantava a Irlanda em prosa e verso em suas “inteligentes” locuções no rádio e na tevê da RBS.