sábado, 19 de dezembro de 2009

A Ucrânia, 20 anos depois do socialismo sovietico....

Ucrânia:
Duas décadas após a desintegração da URSS
Mapa UcrâniaNeste texto, Denis Netcheporuk depois de fazer um retrato comparativo da Ucrânia de antes da derrota do socialismo com os dias de hoje conclui: “Todas as reformas de mercado confluíram para o mesmo fim: a privatização da propriedade social, a destruição das explorações colectivas e a implantação sucessiva de um regime liberal ao serviço dos grandes proprietários. Infelizmente tudo foi feito para proporcionar a prosperidade de uma minoria e a pauperização da maioria”.
Denis Netcheporuk* - www.odiario.info


No momento da criminosa desintegração da URSS, consumada em 1991, a Ucrânia estava entre os dez países mais desenvolvidos do mundo. Isto, aliás, é reconhecido até pelos próprios nacionalistas burgueses.

As prestações sociais eram extraordinárias, mas por vezes as pessoas não as valorizavam. A Educação era gratuita e havia um sistema de saúde pública de qualidade e, sobretudo, integralmente gratuito. Segundo os objectivos traçados pelo Partido, no ano 2000 todos deveriam receber gratuitamente uma habitação independente.

Os preços dos principais produtos alimentares, as rendas de casa, os transportes, entre outros, não sofriam alteração há mais de 50 anos. Os serviços comunais, as tarifas do gás e da electricidade custavam kopeques [cêntimos de rublo]. As pessoas consumiam produtos naturais. Só quem vivia fora da URSS sabia o que era o desemprego, a inflação, os sem-abrigo, os despedimentos compulsivos, as falências de bancos e a perda das poupanças, os créditos a juros de 30 por cento, etc..

Para a geração actual isto é pura ficção científica. Em 2009 não conseguem sequer imaginar que tal possa ser possível.

Retrocesso inaudito

Éramos 52 milhões de habitantes. Tínhamos não só armamento nuclear (o terceiro maior arsenal do mundo depois da Rússia e dos EUA), mas também um exército com um milhão de efectivos, capaz de defender a população e destruir qualquer inimigo. O país desenvolvia-se. Nós orgulhávamo-nos do nosso Estado. Mas, de modo inconcebível, em apenas 20 anos, o equivalente a quatro planos quinquenais soviéticos, transformaram-nos num dos países mais atrasados não só da Europa como do mundo. Um dos mais atrasados e desamparados segundo todos os indicadores. Parece irreal, mas a traição e o capitalismo fizeram a sua obra.

Tudo começou com a realização das reformas de mercado e a substituição do regime socialista pelo capitalismo. Este processo foi iniciado por Gorbatchov. Depois da dissolução da URSS, o capitalismo selvagem começou a ser implantado em cada país que a integrava pelos antigos ideólogos do comunismo, que, entretanto, trocaram a foice e o martelo pelo dólar. No nosso país isto foi feito por Kravtchuk, na Rússia foi Iéltsine, na Geórgia, Chevardnádze, etc..

Confiança defraudada

A verdade é que na altura, em inícios dos anos 90, as pessoas ainda confiavam nos governantes. Cada cidadão sabia que os dirigentes do país, os deputados, o Partido, os funcionários deviam por definição trabalhar e trabalhavam em prol do bem-estar do povo e do Estado. Todavia, infelizmente, não tiveram em conta um pormenor importante: no poder tinham-se instalado os chamados democratas-patriotas da fornada europeísta, cujo único objectivo era o lucro e a obtenção de dinheiro à custa dos simples mortais.

Todas as reformas de mercado confluíram para o mesmo fim: a privatização da propriedade social, a destruição das explorações colectivas e a implantação sucessiva de um regime liberal ao serviço dos grandes proprietários. Infelizmente tudo foi feito para proporcionar a prosperidade de uma minoria e a pauperização da maioria.

Todas as desgraças do nosso país são obra de Kravtchuk, de Kutchma, Iuchenko e de todos aqueles que estiveram no poder nos últimos 20 anos. É preciso compreender que ninguém perguntou ao povo se queria ou não mudar para a via capitalista. Tudo foi feito às escondidas, sob a capa de um pretenso amor pela Ucrânia e pela nação, sob o pretexto da democracia e do humanismo europeu.

Os ricos, mais ricos…


Em resultado da contra-revolução capitalista, o povo ucraniano perdeu o poder e o controlo sobre tudo o que se passa no país. Hoje, a minoria governa a maioria. Cinquenta pessoas detêm um terço do Produto Interno Bruto. Os ricos tornam-se mais ricos, os pobres mais pobres.

Pela frente temos a crise económica-financeira. Os capitalistas tentam sair dela à custa da gente simples. O governo de Timochenko endividou todo o povo. O poder «laranja» continua a dedicar-se unicamente à venda de empresas e à contracção de novos créditos. Ainda por cima faz de tal política um mérito seu.

O actual presidente sublinha constantemente que se dirige a uma única nacionalidade da Ucrânia. Poderia parecer que isto é reflexo do grande amor de Iuchenko pelos ucranianos. Com ele faz coro no mesmo sentido outra «obreira» que se muniu da ideologia pró-fascista para atrair o eleitorado.

Mas a verdade é que, em cada dia que passa, com esta equipa de «pseudo-patriotas» no poder, os dirigidos estão a tornar-se cada vez menos. Isto aplica-se também às pessoas que pertencem às chamadas «nacionalidades estrangeiras»… Em geral, todos estão a morrer e a sofrer na Ucrânia.

Números da vergonha

Por mais triste que seja temos de constatar que a composição da «nação» de que eles falam é a seguinte. Restam ao todo na Ucrânia cerca de 46 milhões de pessoas, dos quais:
• cerca de dez milhões de ucranianos vivem abaixo do limiar da pobreza;
• mais de três milhões estão desempregados;
• cerca de 1,5 milhões passam fome;
• cerca de dez milhões de reformados recebem a pensão mínima;
• cerca de 190 mil ucranianos adoecem anualmente de cancro, morrendo 900 em cada 1500 pacientes;
• cerca de 700 mil pessoas sofrem de tuberculose, segundo dados estatísticos do Ministério da Saúde da Ucrânia;
• 440 mil pessoas estão infectadas com o vírus da SIDA;
• cerca de 150 mil pessoas estão na prisão;
• cerca de 900 mil pessoas sofrem de alcoolismo crónico;
• cerca de 500 mil toxicodependentes estão registados oficialmente, segundo dados do Ministério do Interior;
• quase 200 mil crianças vivem na rua;
• cerca de um milhão de pessoas não têm abrigo;
• 19 milhões são fumadores, 66 por cento dos homens e 20 por cento mulheres.

Se a isto acrescentarmos ainda o ressurgimento do analfabetismo e a degradação moral da juventude, o quadro torna-se muito triste.

É preciso sublinhar que aqueles que conduziram e continuam a conduzir as reformas de mercado capitalistas devem ser responsabilizados por todas estas desgraças. São os partidos de direita, são os políticos liberais. Eles estão hoje no poder. Não existem diferenças entre eles. Os capitalistas são os mesmos independentemente da máscara. Tendo em conta tudo o que atrás foi dito, cada cidadão deve colocar a si próprio as correspondentes perguntas e, sobretudo, esforçar-se por encontrar as respostas lógicas, designadamente à seguinte questão: por que é que em dada altura votou a favor dos milionários e continuará a fazê-lo no futuro?



Publicado no jornal Komunist (06.11), órgão do Partido Comunista da Ucrânia
Disponível em russo em:
http://www.komunist.com.ua/article/27/10381.htm
Tradução, título e subtítulos da responsabilidade da Redacção do Avante!

* Colaborador de Komunist, órgão do Partido Comunista da Ucrânia

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Milton Nascimento – Angelus (1993)


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Créditos: UmQueTenha 











O Manifesto do Hezbollah

Líbano: O Manifesto do Hezbollah


Por Roberto Blum

Now Lebanon – Beirute

BEIRUTE, [capital do Líbano]: O Secretário Geral do Hezbollah, Sayyed Hassan Nasrallah, na noite de segunda-feira [30/11], surgiu numa tela gigante erguida no Al-Jinan Hall nos subúrbios do sul de Beirute e leu o novo manifesto de seu partido. Foi a segunda plataforma política já proposta pelo Hezbollah, que irá nortear seus projetos políticos e ideológicos nos próximos anos.
O primeiro manifesto, lançado em 1985, apelava para o estabelecimento da Lei Islâmica no Líbano, mas o partido desde então tem suavizado seu discurso. Muitos esperavam mudanças mais significativas no novo manifesto devido às muitas mudanças na cena política local e regional, porém, exceto pela cláusula sobre o Estado Islâmico e do partido expressar sua disposição de se envolver mais na cena política libanesa, nada mudou realmente. Pelo contrário, o que Nasrallah descreveu como o nível de envolvimento nos assuntos políticos do Líbano desejado pelo partido não sinaliza nenhuma mudança no seu comprometimento com seus aliados, a Síria e o Irã.
Durante seu discurso, Nasrallah destacou que a Resistência tem descrito a si mesmo como o maior e mais bem sucedido agente político do país. “Através de seu longo caminho e de suas vitórias, a Resistência… tem crescido de um poder de libertação para um poder de defesa e intimidação, em adição ao seu papel político interno como uma influência na construção de um Estado justo e capaz”, disse ele aos repórteres, indicando que seu partido teria um papel protagonista na formulação de qualquer estratégia de defesa nacional.
Embora muitos jornalistas tenham considerado o manifesto como um sinal de que o Hezbollah está “libanizando” – construindo uma identidade nacional para si mesmo – o partido ainda vê a si mesmo como um substituto válido para o Estado e de fato existe como um Estado-dentro-do-Estado. Nasrallah deixou isso claro quando disse: “Todas as decisões políticas deveriam caber ao Estado; o problema é a ausência de Estado.”
No entanto, se realmente muito pouco mudou na plataforma política do partido, por que anunciar isso agora, e por que fazer isso parecer tão importante?
Claro que o momento era significativo. O Hezbollah comunicou seu manifesto imediatamente depois que o governo do Líbano delineou o estatuto ministerial e logo antes de tornar isso público. É quase como se Nasrallah estivesse publicando o próprio estatuto ministerial do Hezbollah ao lado do estatuto do governo nacional. O fato de que os meios de comunicação e a classe política deram muita atenção ao anúncio é um sinal claro de quão importante os libaneses acreditam que a agenda política do Hezbollah é. Eles entenderam que, depois de quatro anos de luta pela independência, a plataforma política do Hezbollah irá moldar o futuro do país, assim como o partido continuará a agir como um representante do Irã e da Síria que exerce grande controle sobre as instituições do Estado e mantém o Líbano como um campo de batalha.
O Hezbollah não foi sempre o maior agente político no país. Por anos, o partido pode se dar o luxo de ser capaz de focar no seu papel de resistência no sul. Porém, o grande divisor de águas do partido, e do Líbano como um todo, veio em 2005, quando o regime da Síria retirou-se do país após quase 30 anos de ocupação e deixou o Hezbollah livre para agir politicamente em seu benefício. O partido herdou o papel de Damasco [capital da Síria] num momento em que os libaneses estavam perturbados pela raiva contra a Síria e determinados em trazer à justiça os responsáveis pelo assassinato do ex-Primeiro-ministro libanês Rafik Hariri.
A primeira atitude do partido foi ir contra o pensamento geral e organizar uma contra manifestação ao 14 de março da Revolução dos Cedros chamada “Obrigado Síria”- uma indicação das intenções do Hezbollah de desafiar a aliança 14 de Março e aqueles que clamam por soberania e independência. E foi exatamente o que eles fizeram nos quatro anos seguintes.
No entanto, o partido sofreu alguns reveses ao longo de seu caminho, por exemplo, os eventos de 7 de maio de 2008, quando atiradores da oposição tentaram tomar Beirute e partes da província de Monte Líbano. Embora a liderança do Hezbollah tenha conseguido convencer seus apoiadores de que os eventos sangrentos e traumáticos de maio representaram uma vitória para a Resistência Islâmica, a reputação do partido foi duramente manchada entre o público maior do Líbano.
A comunidade xiita no Líbano pagou o preço. Muitos xiitas libaneses, especialmente aqueles que viviam em Dahieh [principal distrito xiita ao sul de Beirute] e que trabalhavam em outras áreas de Beirute, foram submetidos à raiva que seus compatriotas sentiam pela tentativa de golpe. Muitos perderam seus empregos. Nos estados do Golfo Pérsico predominantemente sunitas, onde muitos libaneses xiitas têm trabalhado por anos – em alguns casos sustentando mais de uma família – contratos, vistos e permissões de trabalho de repente se tornaram mais difíceis de serem renovados.
O resultado foi um declínio econômico localizado em Dahieh, que tem levado a um preocupante aumento dos pequenos crimes, roubo de carros, prostituição e tráfico de drogas. Essa é uma das principais razões pela qual o Hezbollah pediu que as Forças Internas de Segurança [ISF, sigla do nome em inglês] interviessem e lançassem a campanha “A Ordem vem da Fé”.
O Hezbollah tem procurando então virar a página, por assim dizer, e restabelecer a si mesmo como um partido libanês através de seu novo manifesto, uma série de reuniões de reconciliação, a cooperação com as ISF e com outras facções libanesas.
Porém, enquanto o Hezbollah tenta recuperar suas perdas e fazer um nome para si mesmo na cena política doméstica, Damasco está entrando novamente na equação, seguindo a recente aproximação entre Síria e Arábia Saudita e pode querer tomar de volta o papel que entregou ao partido quatro anos atrás.
Ao mesmo tempo, estão em andamento negociações entre o Irã e o Ocidente a respeito do programa nuclear de Teerã, e independente de como isso termine, o Hezbollah pagará o preço. Um acordo entre o Ocidente e o Irã provavelmente significaria uma diminuição do apoio financeiro e militar para o Hezbollah. Porém, se houver uma guerra com Israel, o partido ainda teria que se envolver para defender o Irã.
Em ambos os casos, o Hezbollah precisa proteger a si mesmo. Por esse motivo, seu novo manifesto foi significativo para sinalizar a “libanização” do partido e sua integração ao sistema libanês, mas ao mesmo tempo reafirma seu papel e poder como uma resistência armada com uma ampla perspectiva.
Hanin Ghaddar

Tradução: Aline Oliveira

Para acessar o texto original, clique aqui.

Fotografia de Bertramz, retirada daqui.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Sexualidade humana....

Sexo, gênero e o bicho homem

Regina Abrahão *

Dois sexos, independente da orientação sexual que possuam, é a regra básica de quase todos os seres vivos existentes na natureza. Tirando algumas espécies como bactérias, fungos, etc., para a reprodução ocorrer é necessário que haja um ser masculino e outro feminino.

As diferenças morfológicas e as relações entre os dois sexos, entretanto, variam a cada espécie, mas não apresentam diferenças entre casais da mesma espécie. A relação entre casais animais são sempre iguais, independente da cor, da raça ou do continente destes.

Entre os seres humanos, porém, a maneira como o casal se relaciona varia de acordo com a época, o local, a religiosidade, a cultura e outros inúmeros fatores. Podendo, inclusive, o casal ser formado por dois seres do mesmo sexo, já que, entre humanos, a procriação não é o eixo central das relações. Portanto sexo como definição biológica e gênero como definição cultural.

Mas o que diferencia homens e animais?

Para o marxismo, é a capacidade que o homem tem de transformar a natureza. Seja em transformar galhos em armas, ou encontrando novas plantas no lugar das sementes enterradas, esta foi a diferença fundamental entre nós, seja do jeito que éramos, e o resto da fauna do planeta.

Da transformação da madeira em apetrecho à agricultura, passando pela descoberta da produção do fogo, muito tempo se passou. O que sabemos destes homens primitivos? Muito pouco. E grande parte de nosso conhecimento foi obtido misturando-se a pesquisa histórica, arqueológica e a observação antropológica, em tribos ou povos em estágios de evolução semelhantes. E como eram as relações familiares entre estes nossos antepassados?

Presume-se que nestas sociedades primitivas, a capacidade gestacional conferia às mulheres a condição de seres superiores, uma vez que o ato sexual não era identificado como fator responsável pela reprodução. Estas primeiras sociedades foram chamadas de matrilineares: A descendência era definida em função da origem materna, e, o cuidado com as crianças era responsabilidade coletiva. As tarefas eram divididas de acordo com a força física.

Quando o ser humano deixa de ser um coletor (que pega da natureza o que precisa), descobre a agricultura e começa a domesticar animais, as relações familiares e sociais também mudam. Com a plantação, surgem as primeiras cercas, delimitando a propriedade. Neste período o homem já entendia que a geração de novos seres dependia não só da mulher, mas do casal. E ao acumular terra e animais, preocupou-se em transmitir sua herança a quem possuísse laços consangüíneos, ou seja, seus filhos. E aí as coisas complicaram-se um pouco mais.

* Funcionária pública, dirigente municipal do PCdoB de Porto Alegre, estudante de ciências sociais da UFRGS. Dirigente da Semapi - RS

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

A luta continua, rumo a vitoria...

Medo da derrota faz governo retirar quórum


Sem ter maioria para votar os projetos que retiram direitos dos servidores públicos, a bancada governista mais uma vez não compareceu ao plenário da Assembleia Legislativa na tarde desta quarta-feira 16. A pressão sobre o governo e sua base no Legislativo será mantida nos próximos dias. Orientado pelo PP para não dar quórum, o deputado Mano Changes permaneceu em plenário e disse que votaria com os educadores e brigadianos.


O acampamento organizado pelos trabalhadores da educação na Praça da Matriz, em Porto Alegre, com o apoio de outras entidades de servidores, será mantido na quinta-feira 17, dia em que os educadores estarão na Assembleia pressionando pela retirada dos projetos.


O governo do estado continua querendo sacrificar os servidores e a população do Rio Grande do Sul. O CPERS/Sindicato fez todos os movimentos para que a greve iniciada ontem pudesse ser finalizada, mas o governo não fez nenhum movimento neste sentido.
João dos Santos e Silva, assessor de imprensa do CPERS/Sindicato
Fotos de Eduardo Seidl

Estamos sendo envenenados???


 
 

O veneno no pão nosso de cada dia

 
Por Tatiana Merlino
 
O Brasil é líder mundial no uso de agrotóxico. As empresas transnacionais comemoram, enquanto o prejuízo fica para os trabalhadores rurais e os consumidores. Fotos Jesus Carlos
 
Do lado esquerdo da estrada de terra vermelha, uma cerca viva impede a visão da fazenda. Do lado direito, é diferente: é possível ver o pomar repleto de árvores de laranja, embora a maioria não dê mais frutos. A época da colheita já passou, foi em agosto. Estamos em outubro. Mais alguns metros percorridos de carro pela estrada da área rural do município de Lucianópolis, interior paulista, ouve-se um som vindo por detrás do pomar. Parece o ronco de um motor. Descemos do carro e cruzamos o limite da fazenda. O som se aproxima. Primeiro quarteirão, nada, segundo, terceiro, quarto. Lá pelo quinto quarteirão de árvores o barulho fica forte e avistamos o trator vermelho,
pilotado por um homem que pulveriza um produto no laranjal. É Luiz Andrade de Souza, que trabalha e mora com a família na fazenda. Ele trabalha sem nenhum Equipamento de Proteção Individual – EPI, dispositivo exigido pela legislação do Ministério do Trabalho para a aplicação de defensivos agrícolas.
 
Luiz Andrade é uma vítima potencial de problemas de saúde decorrentes da manipulação dos agrotóxicos. De acordo com dados divulgados no começo de novembro pelo Censo Agropecuário 2006 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), houve, em 2006, pelo menos 25.008 casos de intoxicação de agricultores. Os dados também indicam que herbicidas, fungicidas e inseticidas foram usados em 1,396 milhão de fazendas.
 
A pesquisa mostra que mais de 1,5 milhão, das 5,2 milhões de propriedades rurais do país, utiliza agrotóxicos. E que 56% destas não recebem orientação técnica. A aplicação manual dos venenos, por meio do pulverizador costal – que é o equipamento que apresenta maior potencial de exposição aos agrotóxicos – é a mais utilizada, presente
em 70,7% dos estabelecimentos agrícolas que fazem uso de algum tipo de defensivo. O Censo aponta também que 20% (296 mil) destas propriedades não utilizam proteção  individual. O Rio Grande do Sul é o Estado que mais aplica agrotóxicos, com 273 mil propriedades.
 
Campeão mundial
Tal cenário é do país que, em 2008, foi “consagrado” com o título de campeão mundial de uso de agrotóxicos. Foram 673.862 toneladas de defensivos, o equivalente a cerca de 4 quilos por habitante. De acordo com o Sindicato Nacional da Indústria de Defesa Vegetal (Sindag), o faturamento da indústria química no ano passado no Brasil foi de
US$ 7,125 bilhões, valor superior aos US$ 6,6 bilhões do mesmo setor dos Estados Unidos. Atreladas ao tamanho da área plantada, as maiores aplicações se deram nas culturas de soja, milho, cana-de-açúcar, algodão e cítricos.
 
De acordo com Gabriel Fernandes, da organização não governamental Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa (AS-PTA), tais números deveriam servir “como um grande sinal de alerta que indica a falência do modelo agrícola das monoculturas. Quanto mais veneno se usa, maior será o desequilíbrio ambiental. E quanto maior o desequilíbrio ambiental, mais veneno se usa”.
 
As consequências do uso dos agrotóxicos são inúmeras: coloca-se a saúde dos trabalhadores e consumidores em risco, e se contaminam o solo e a água. No caso da saúde dos trabalhadores, os riscos variam de acordo com tempo e dose da exposição a diferentes produtos. Assim, os efeitos podem ser agudos ou crônicos. O principal efeito agudo são intoxicações, dores de cabeça, alergias, náuseas e vômitos. “Dependendo do tempo de exposição, pode haver uma intoxicação aguda completamente reversível, mas também pode haver efeitos subagudos que deixarão lesões neurológicas periféricas que podem comprometer tanto a parte da sensibilidade quanto a parte motora”, explica a médica Raquel Rigotto, professora do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC).
 
De acordo com ela, os efeitos crônicos são mais difíceis de se identificar porque podem ser atribuídos a outros quadros clínicos, “mas vão desde infertilidade masculina, má formação congênita, abortamento precoce, recém-nascido com baixo peso, cânceres – especialmente os linfomas –, leucemias, doenças hepáticas crônicas, alterações do sistema imunológico, possibilidade de mutagênese – que é a indução de mudanças genéticas que vão resultar em processos de cânceres ou em filhos com má formação congênita –, problemas de pele e respiratórios, até praticamente todas as doenças neurológicas, tanto centrais quanto periféricas. É um amplo leque de patologias”, explica.
 
Dor de cabeça, olhos ardendo
Quem tem como rotina receber denúncias de trabalhadores reclamando de problemas de saúde decorrentes do manuseio de agrotóxicos é Abel Barreto, presidente do Sindicato dos Empregados Rurais de Duartina, cidade paulista localizada na região de Bauru. “Temos muita reclamação de gente que vai trabalhar na laranja e se sente mal. Eles ligam e dizem: ‘Estamos aqui trabalhando na laranja e o trator está na rua de cima passando veneno’. A maioria fala em dor de cabeça e ardor nos olhos”, relata.
 
Um dos casos que chegou ao sindicato de Duartina foi o das trabalhadoras Lindalva Zulian, de 38 anos, Rosimeire de Araujo, de 35, e Janaína Silva, de 25. As três trabalhavam numa fazenda de laranja no setor de inspeção, buscando localizar as plantas doentes para serem eliminadas.
 
Nascida em Duartina, Lindalva morou em São Paulo por muitos anos. Mas, nos últimos cinco, trabalhava em fazendas de laranja, alternando as funções de colheita e inspeção. O emprego, no entanto, rendeu-lhe problemas de saúde. Durante uma manhã do mês de junho deste ano, Lindalva e suas colegas faziam inspeção numa fazenda de laranja na
cidade paulista de Espírito Santo do Turvo, quando o trator que aplica veneno passou pulverizando a mesma quadra onde as mulheres trabalhavam. “Eu comecei a ter tontura, dor de cabeça, ânsia de vomito. Comecei a chorar de tanta dor. As outras também começaram a vomitar”. Depois de muita insistência, o funcionário da fazenda atendeu o pedido de levar as mulheres ao hospital. “A dor de cabeça era demais, muita ânsia de vomito, o nariz e a boca queimavam por dentro. Falta de ar, não conseguíamos respirar. Na hora, o médico disse: ‘tira essa roupa, toma um banho, nem eu estou aguentando
o cheiro de vocês’. A gente estava toda envenenada”. As mulheres ficaram três dias internadas, e, quando tiveram alta, foram dispensadas pela fazenda. “O médico falou que a gente tinha que fazer tratamento, que não podia voltar a trabalhar onde tinha veneno dentro de três meses”.
 
Desde então, Lindalva está sem trabalhar. “Não posso mais com o cheiro de veneno. Qualquer coisa já começa a me queimar o nariz, me dá tontura e a cabeça começa a doer. O médico disse que a gente pode ter sintoma dentro de vários anos, que pode aparecer algum tipo de doença porque fica tudo no sangue. A gente não sentiu só o cheiro, a gente inalou mesmo”.
 
Assim como Lindalva, Rosemeire também não voltou a trabalhar. “Não quero nem ver laranja”, diz. Já Janaína voltou para a colheita. “Não tem jeito, tenho que trabalhar. Mas até hoje eu sinto muita dor nos olhos. Nossa, quando eu forço a vista, dói para caramba”, diz, tentando segurar seu filho, que brinca com o gravador da reportagem.
 
Lista negra
Apesar de terem denunciado o caso, que está sendo investigado pelo Ministério Público, as mulheres estavam receosas de dar entrevista e serem perseguidas depois. “O medo é de entrar para a ‘lista negra’ das fazendas e nunca mais conseguirem emprego”, relata Abel Barreto, presidente do sindicato de Duartina. Segundo ele, a região é dominada por Cutrale, Coimbra, Citrosuco e Citrovita, as quatro maiores empresas do setor de citricultura. “Se você for nas fazendas dessas empresas, vai ver todo mundo com equipamento de proteção. O problema é que a precariedade está nas fazendas que fornecem laranja para elas. Essa é a maneira de se isentarem de ficar com o nome sujo”, alerta.
 
O sindicalista aponta que uma das dificuldades para sistematizar as denúncias de intoxicação por agrotóxicos ocorre porque, quando as empresas têm equipe médica na fazenda, “muitas vezes os profissionais escondem os exames dos trabalhadores, dão um atestado de um dia quando deviam dar de dois”, explica. “E mesmo alguns médicos da cidade cedem à pressão das fazendas e amenizam os problemas, argumentando com a gente que as empresas são responsáveis por milhares de empregos”, relata.
 
Estudos relacionados aos impactos do manuseio dos agrotóxicos por trabalhadores indicam que mesmo com a utilização dos equipamentos de proteção individual, a aplicação não é segura. “Além do EPI, há uma série de outras exigências que qualificam aquilo que se chama de ‘uso seguro de agrotóxicos’, mesmo que eu esteja falando isso com várias aspas de cada lado, porque eu não acredito nessa possibilidade”, explica Raquel. Um dos pré-requisitos é o respeito ao que se chama de “período de reentrada” após a aplicação do veneno, quando ninguém pode ingressar na área. “Para alguns venenos, o tempo é de três horas; para outros, são sete dias, isso varia. E quando a gente pergunta aos trabalhadores como se trabalha com esse período, que é uma exigência da legislação trabalhista, eles dizem que isso não é respeitado pelas empresas”.
 
Além disso, segundo a médica, a segurança dos equipamentos de proteção individual é muito relativa. “Eles são muito desconfortáveis e, quanto mais baratos, mais mal acabados. Incomodam, espetam, arranham. Nos climas quentes, são ainda mais difíceis de usar. É também muito complicado para as indústrias estabelecerem o ritmo correto da troca dos filtros das máscaras”, avalia. Outro problema recorrente é a absorção dos produtos pela pele: “O uniforme fica encharcado de agrotóxicos. E, em vez de ser levado para a casa do trabalhador e lavado junto com a roupa da família, como acontece muitas vezes, ele deveria ser lavado pela empresa. A família corre grandes riscos de ficar contaminada. Essa proposta do uso seguro é muito relativa”, alerta Raquel.
 
Exemplo dos limites do “uso seguro” dos agrotóxicos é o trabalhador Paulo Sérgio, morador de Duartina. Aos 37 anos, muitos de corte da cana e cinco de colheita de laranja, ele teve uma experiência complicada recentemente. Contratado pela empresa de laranja Coimbra para aplicar defensivos agrícolas, no terceiro dia de trabalho, ao aplicar o veneno Temic, Paulo passou mal. “Eu estava com todos os EPIs”. Mesmo assim, os equipamentos não impediram que o trabalhador sentisse muita ânsia de vômito, aumento da salivação e dor de cabeça. “Passei no médico e ele disse que eu estava intoxicado”, conta.
 
Tatiana Merlino é jornalista
tatianamerlino@carosamigos.com.br
 
Para ler a reportagem completa e outras matérias confira a edição de dezembro da revista Caros Amigos, já nas bancas, ou clique aqui e compre a versão digital da Caros Amigos.

Grande Juremir Machado....

Parece que Juremir Machado está se tornando a única voz,na mídia corporativa do RS, a tomar posicionamento contrário às "alterações" no estatuto do funcionalismo público do estado, promovido pelo governo corrupto de YRC. Chega a ser digno de revolta a falta de profissionalismo dos jornalistas de esgoto que,descaradamente defendemo o indefensável,ou seja, apoiando os "pacotes de bondades" dessa (des)governadora, chefe de uma quadrilha nunca antes visto no RS. Leia na íntegra o que escreveu Juremir em seu blog no Correio do Povo:

Pacote de maldades natalinas

Quatro perguntas e quatro respostas em regime de urgência:
1) Por que uma greve no fim do ano? Porque o governo manda projeto que é uma caixa de maldades no fim do ano, tentando aprová-lo no apagar das luzes, em regime de urgência, jogando com a possibilidade de não haver greve por ser o momento inoportuno. É uma maneira de forçar a aprovação e de jogar a sociedade contra os professores.
2) Por que o governo quer dar mais piso? Para dar menos básico. É sobre o básico que incidem as vantagens da carreira. Só há um ideal: piso e básico serem iguais. De preferência, no teto. Quer dizer, quanto mais alto melhor.
3) Por que o governo quer mudar o plano de carreira? Para diminuir vantagens, tornando menor o que já é pouco.
4) Por que ter um plano de carreira garantindo pequenas vantagens? Para diminuir as enormes desvantagens. As vantagens por tempo de serviço são formas de melhor um pouco a vida das pessoas e incentivá-las, diminuindo a pressão sobre os empregadores, pois são aumentos pulverizados. Afinal, nem todos completam triênios ao mesmo tempo
Quanto ao resto, repito meu texto de ontem. Seu tempo de validade ainda não terminou.
OBS: o governo está sendo democrático: seu pacote de maldades atinge também outros setores, entre os quais os brigadianos. É que os soldados ganham fortunas para morrer por nós nas ruas das grandes cidades.

Como gosta de dizer Edgar Morin, citando Pascal, o contrário de uma verdade profunda pode não ser um erro ou uma mentira, mas outra verdade profunda. O magistério estadual entrará em greve na próxima terça-feira. É verdade que essa medida extrema trará prejuízos para alunos e pais. Mas é verdade também que o magistério não tem saída. Se a sociedade não se mobiliza para valorizar o magistério, resta ao magistério se mobilizar para interpelar a sociedade. O governo tenta jogar pais e alunos contra professores numa chantagem clara e banal.
Os salários do magistério são baixíssimos. É inadmissível que aqueles que devem alfabetizar e formar nossas crianças e jovens ganhem tão pouco. Muita gente ataca o CPERS para desqualificar as demandas dos professores alegando que as ações do sindicato têm viés político-partidário. Pode ser. Mas essas criticas, em geral, também têm viés político-partidário. São motivadas por um antipetismo ou por um antiesquerdismo visceral que não perde oportunidade para se manifestar e não quer entrar no mérito das questões em jogo. Desta vez, o CPERS tem razão. O plano de valorização do governo para o magistério é, na verdade, um plano de desvalorização. Em lugar de adotar um piso (salário inicial sobre o qual devem incidir todas as vantagens da carreira), prefere um abono, o que levará parte da categoria para um salário maior e deixará outra parte com salários congelados.
O governo tem usado uma estratégia pesada de comunicação, apoiado por boa parte da mídia conservadora, com o objetivo de desqualificar os ganhos do magistério. Por que pagar vantagens por tempo de serviço? Para estimular as pessoas ao longo do tempo. Professores, assim como jogadores de futebol, são pessoas que precisam de incentivos. Essas vantagens servem, ao mesmo tempo, para melhorar parte dos salários, que são baixos, sem precisar melhorar o todo. É uma maneira homeopática de corrigir o que é apresentado como incorrigível. Talvez a licença-prêmio tenha ficado anacrônica. Ela pode muito bem ser substituída por licenças para cursos de atualização. É preciso que isso seja regulamentado, valha para todos e não dependa da boa vontade dos chefes.
Por enquanto, o governo quer transformar o pouco em menos ainda. Aproveita-se da mídia amiga para jogar a população contra os professores, a quem não dá alternativa e nos quais tenta colar o rótulo de radicais ou até de vagabundos. Ao jogar com a palavra piso, que não entende como salário inicial sobre o qual se acrescentam as vantagens da carreira, contrariando lei federal, induz a sociedade a pensar que pretende dar um piso de R$ 1500 enquanto o CPERS, num surto de birra, estaria lutando por R$ 950. Ou seja, o CPERS estaria propondo greve para ter menos. O único argumento plausível do governo seria provar que não pode dar o piso (salário inicial) de R$ 950. Não basta dizer que isso quebraria o governo. Precisa discutir prioridades.
Para quem está achando isso abstrato, aqui vai o e-mail que me enviou a professora Lea Camelo: “O básico hoje, já incluindo a lei Britto, é de 640,00 para 40 horas. O governo paga como piso R$ 860,00, que passará para 1500,00. Acontece que todas as vantagens são calculadas sobre esse básico miserável de R$ 640,00. Veja bem: eu tenho pós graduação, tendo 100% sobre o básico, que fica em R$ 1280,00, abono de R$ 85,00, mais três triênios de R$ 192,00. Então eu com pós e 10 anos de magistério recebo bruto R$ 1557,00. Um professor só com segundo grau, em inicio de carreira, receberá R$ 1500,00 Esta sendo feito um nivelamento por baixo. O Plano de Carreira foi criado para estimular o professor a se qualificar, mas, te pergunto, que estimulo é esse se todos vão ganhar quase o mesmo? O governo argumenta que o CEPRS não quer o aumento. Eu sei que eles só fazem politicagem, mas agora eles estão com a razão. O governo argumenta que quer aproximar os salários de quem ganha mais dos que ganham menos e que não mexe com o plano de carreira, mas é uma mentira, pois o básico continuará nos mesmos R$ 640,00. Os R$ 1500,00 serão completados com uma parcela autônoma e nesse governo não recebemos nem um tostão de aumento fora a lei Britto”. Está claro?
Em resumo, o governo gaúcho que dar um abono para que nenhum professor ganhe menos de R$ 1500. Quem estiver ganhando isso ou mais do que isso não terá um centavo de aumento. O governo estadual chama de “piso”, algo que aparece até na linguagem da professora Lea Camelo, o básico (atualmente em R$ 640 para 40 horas) mais um abono (resultando em R$ 860), mas as vantagens incidem apenas sobre o básico (R$ 640). O piso estabelecido por lei federal (salário inicial sobre o qual incidem as vantagens) é de R$ 950. Yeda Crusius foi ao STF para não pagar esse piso-básico. Não poderia agora querer pagar R$ 1500. Quer manter o básico em R$ 640 e aumentar o abono, o que, embora melhorando a vida de uma parcela do magistério, representará uma enorme economia para os cofres públicos às custas do professores. Simples assim.
Com o abono do governo a professora Lea Camelo não ganhará um centavo de aumento. Se o piso-básico saltasse de R$ 640 para R$ 950, valor sobre o qual incidiriam as vantagens, a professora Lea, que ganha atualmente R$ 1557, passaria a ganhar quanto? Calculem vocês. Uma pista: apenas os 100% de acréscimo sobre o básico (que tem de ser visto como piso) por ter pós-graduação já fariam o salário dela saltar para R$ 1900. Sacaram?

A guerra dos minaretes no centro da Europa






A Suíça é um país encantador, com calendários de paisagens bucólicas, floridas e/ou nevadas que fizeram felizes milhões de brasileiros durante gerações, um recanto de paz onde as guerras não entram, cujo lema (não oficial) é um manifesto pela solidariedade, a famosa frase dos três mosqueteiros (que eram quatro) de Alexandre Dumas Pai, "um por todos, todos por um", certo? Errado.
A Suíça é um país estremecido por uma vaga de intolerância que ameaça projetá-la internacionalmente como um território ocupado por políticas e propaganda de inspiração racista, ondas de xenofobia, perseguições contra minorias étnicas e culturais, voltada para a defesa de uma "pureza européia" como raramente se viu desde as sinistras campanhas de arianismo dos anos 20 e 30 que levaram ao nazismo no mundo germânico. Errado? Não, certo.
Infelizmente, certo. Mas felizmente não é toda a Suíça (assim como não foi todo o mundo germânico que mergulhou na sandice nazista). Há ainda quem manifeste indignação, perplexidade, repúdio diante do que aconteceu.
E o que, afinal, aconteceu?
No domingo, 29 de novembro, houve um plebiscito na democrática Suíça, onde tudo pode ser plebiscitado, desde que seja objeto de uma petição com um certo número de assinaturas. O tema do plebiscito era se a construção de minaretes (as torres com sacadas circulares, junto às mesquitas muçulmanas, de onde o muezzim anuncia as preces) deveria ser proibida em território suíço, ou não. Autoridades, religiosos de todas as religiões, o Vaticano, militantes dos direitos civis, ecologistas, até políticos conservadores e de direita se posicionaram contra a proibição, a favor dos minaretes. Ademais, a população muçulmana na Suíca é pequena (400 mil em 7,75 milhões, cerca de 5,1%) e, na maioria, não provem de países árabes, mas da Turquia, da Albânia e da Bósnia; em todo o país há apenas 4 minaretes.
Cartaz da campanha contra os minaretes

As pesquisas de opinião davam uma confortável maioria para o "não". Talvez isso tenha contribuído para afrouxar o ímpeto dos que defendiam a liberdade para os minaretes e para todos os cultos religiosos. O fato é que o "sim" venceu, com 57% dos votos, e mergulhou o país numa crise de credibilidade e também de temor.
Crise de credibilidade: a Suíca deixou de ser aquela "terra de tolerância" descrita no primeiro parágrafo desse "post". Aliás, já vinha deixando de ser. Em campanhas eleitorais anteriores, um poster racista, em que três ovelhinhas brancas chutavam uma negra para fora da bandeira suíça, já chamara a atenção. Agora o poster principal da campanha pró "sim", ou seja, contra os minaretes, mostrava uma mulher com trajes muçulmanos, ao lado de minaretes negros sobre a bandeira suíça, cuja forma (a das torres) se confundia com a de mísseis. Tão ameaçador e intolerante era o poster, que ele chegou a ser proibido em algumas cidades.
Crise de temor: teme-se agoras que haja represálias por parte dos países de predominância muçulmana, não propriamente sob a forma temida do terrorismo, mas sim sob a forma apavorante da retirada de investimentos e de depósitos em bancos.
Segundo a revista Der Spiegel (artigo de Michel Soukup), por trás de ambas as propagandas (a das ovelhinhas e a das torres/mísseis), está um alemão residente na Suíça, Alexander Segart, de 46 anos, que se declara um defensor ardoroso do cristianismo.  Mas a campanha, cujo efeito na Europa é temido e pode de fato ser ameaçador, parece ter um tipo de apelo diverso do que o religioso. A sua base de propagação, também manifesta em vídeos e outros meios da mídia (inclusive no Brasil) difundidos pela internet, é uma suposta "islamização" da Europa e do mundo. Essa "islamização" teria como armas uma taxa de crescimento populacional maior entre os muçulmanos e uma militância religiosa e cultural mais empenhada do que aquela dos "frouxos" cristãos e ocidentais. Em tempos recentes uma acirrada polêmica marcou a licença para a construção de uma grande mesquita em Colônia, na Alemanha, e um dos argumentos brandidos pelos opositores era o de que a "cultura muçulmana" não "pertence à Europa", seja lá que insensatez isso queira traduzir. Insensatez? Sim, além de intolerância absurda, insensatez. Por exemplo: não fossem os sábios muçulmanos, os europeus e outros povos teriam "esquecido" quase todo o seu mundo da antigüidade grega.
Parlamentares e ativistas suíços estão se mobilizando para averiguar a possibilidade de declarar o resultado do plebiscito inconstitucional, além de pretenderem levar o caso à consideração do Parlamento e do Tribunal da União Européia em Estrasburgo, numa medida, na verdade, preventiva, já que a Suíça não faz parte da UE.
A adesão de movimentos de direita à campanha da proibição não surpreendeu. O que trouxe mais mal estar à história toda foi a adesão de grupos que se consideram "de esquerda" ou "militantes dos direitos humanos", argumentando com sua preocupação diante da "posição da mulher" nas culturas muçulmanas. Essa posição, disfarçada de "progressismo", esconde na verdade um ranço neo-colonial, baseado na idéia de que "como sou mais adiantando eu sei o que é melhor para você". Uma coisa é debater posições autoritárias ou machistas na cultura islâmica - aliás, em todas as culturas e sociedades. Outra é sair proibindo, barrando, impedindo a liberdade de expressão (é disso que se trata)  em nome de que "nós" somos "o" modelo para o mundo, o que no mínimo revela a arrogância de quem nào consegue se focar no espelho.
Infelizmente, a proibição dos minaretes, como também aponta o artigo do Der Spiegel, têm precedentes em outros tipos de proibição: na Arábia Saudita torres de igrejas cristãs são proibidas, o que apenas prova que a insensatez não tem fronteiras.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Genocidio em Gaza...



Direito à educação: Israel expulsa estudante de Gaza que estudava na Cisjordânia

Por:Vinicius Valentin Raduan Miguel

Faltando apenas dois meses para concluir seu bacharelado em Administração, estudante foi presa e expulsa para casa sem nenhuma acusação.
"A educação e a propaganda palestina são mais perigosas para Israel do que as armas palestinas." - Ariel Sharon, então primeiro-ministro israelense (1)
O Caso Berlanty Azzam
Na última quarta-feira (09 de dezembro de 2009), a Alta Corte de Israel negou permissão para uma estudante palestina de Gaza continuar seus estudos na cidade palestina de Belém, que fica situada na Cisjordânia, território palestino ocupado ilegalmente por Israel.
A estudante Berlanty Azzam de 22 anos cursa administração e lhe faltam apenas dois meses para concluir seu curso. No entanto, no dia 28 de outubro deste ano, ao retornar de uma entrevista de emprego, ela foi detida pelas autoridades da força de ocupação israelense.
Após a detenção, ela foi algemada, teve os olhos vendados e foi removida na mesma noite para Gaza, apesar da promessa explícita feita ao seu advogado de que ela teria direito de se encontrar com ele. A força de ocupação israelense alega que ela estava ilegalmente na Cisjordânia - ignorando que ninguém pode ser considerado habitante ilegal de seu próprio país.
Assistida por uma ONG (GISHA - Centro Jurídico para a Defesa da Liberdade de Ir e Vir), ela recorreu ao judiciário da força de ocupação contra a decisão, mas o Tribunal acatou a decisão do governo israelense e manteve a expulsão, mesmo tendo reconhecido que a expulsão imediata da estudante violava o seu direito a prestar declarações para a Corte.
O Judiciário da Ocupação havia também solicitado as autoridades israelenses que permitissem que a estudante concluísse seus estudos, uma vez que faltavam apenas dois meses para tal, mas não emitiu uma ordem ao ter o pedido recusado pelas autoridades coatoras.
Contrariando os Acordos de Oslo, que determinam que a alteração de endereço deve ser comunicada à Autoridade Palestina e essa última apenas notifica Israel, as autoridades da ocupação se recusaram a aceitar os vários pedidos de Berlanty Azzam para alteração de seu endereço.
Azzam não é acusada de nenhum crime e mesmo as autoridades militares da força de ocupação israelense não apresentaram razões de segurança para sua expulsão. O comandante militar israelense da área de Azzam havia concedido uma permissão para que ela entrasse na Cisjordânia após o extremamente rígido procedimento de investigação.
Após a decisão ela declarou que estava desapontada: "Eu estou profundamente desapontada e não entendo porque Israel está me impedindo de continuar meus estudos. Eles não alegam que meu retorno à Universidade de Belém é uma ameaça à segurança, não havendo, portanto motivos para a expulsão. Estudar em uma universidade palestina é meu direito e o direito de todo estudante palestino".
Desde 2000, Israel se recusa a permitir que estudantes de Gaza possam sair para estudar em outros lugares. O número estimado por organizações de direitos humanos é de 25.000 estudantes palestinos nascidos em Gaza tenham ido para a Cisjordânia e hoje estão em situação de risco e constante ameaça, podendo ser aprisionados e "enviados" para Gaza a qualquer momento.

Como Israel impede o direito à educação palestina?
A temática da educação de árabes-palestinos ou árabes-israelenses em Israel também é ampla e marcada por fortes violações aos direitos humanos promovidas pela força ocupante, mas para delimitação do texto, iremos nos deter as questões concernentes à educação palestina nos territórios palestinos serão consideradas.
O Estado de Israel, que ocupa ilegalmente desde 1967 os territórios palestinos, impede o acesso de estudantes árabes-palestinos à educação por variadas estratégias. A primeira delas é através de barreiras físicas, como os incontáveis pontos de checagem instalados no território palestino e estradas cujo trânsito é proibido para palestinos, impedindo a liberdade de movimento. Podemos colocar o Muro do Apartheid de Israel nesta categoria de bloqueios físicos.
Outras barreiras materiais são (i) os obstáculos não-permanentes como os cercos e toques de recolher militares e (ii) incursões (incluindo em universidades e acomodações estudantis que são fechadas por tempo indeterminado). Israel também controla a entrada de livros e certos periódicos, mantendo um banimento aos livros produzidos nos países árabes vizinhos, como Síria e Líbano, livros que poderiam ser adquiridos a menores custos para os acadêmicos palestinos. O intercâmbio de acadêmicos é severamente prejudicado e Israel controla rigorosamente a concessão de vistos de trabalho para pesquisadores estrangeiros.
Por fim, não podemos esquecer-nos dos bombardeios constantes promovidos por Israel na infra-estrutura civil e governamental (pontes, rodovias, ruas) que, destruídos, impedem o deslocamento da população.
Israel usa persistentemente força bruta e injustificada contra instituições de ensino palestinas. Apenas como exemplo, em janeiro desse ano, durante a Operação Chumbo Fundido (Operation Cast Lead), Israel destruiu duas escolas palestinas mantidas pela ONU, sendo um centro de formação e uma escola para meninas e bombardeou o Departamento de Ciências da Universidade de Gaza. Na guerra de junho de 2006, em que Israel atacou simultaneamente o Líbano e Gaza, a Universidade de Gaza foi atacada.
A destruição da infra-estrutura educacional é acompanhada pelas constantes prisões "administrativas" de intelectuais, jornalistas e professores, sem nenhum direito à defesa e sem acusação alguma (Hammond, 2006) e que podem durar mais de três anos.
Os dados são muitos: em dezembro de 2007, o presidente do diretório dos estudantes da Universidade de Birzeit foi preso por um ano por pertencer à organização estudantil. Ao menos outros 21 estudantes estão na mesma condição. Pelo menos 30% dos estudantes dessa universidade já foram sujeitos a interrogatórios arbitrários. Na mesma instituição, em 2006-2007, 13 estudantes estrangeiros foram impedidos de entrar para fazerem cursos ligados à língua e cultura árabe. Em 2008, oito estudantes foram impedidos de realizarem os mesmos cursos e, no ano acadêmico de 2008-2009, outros dois estudantes tiveram vistos negados.
Essa estratégia para impedir a maturação político-social e a reprodução de seus valores culturais elegeu o patrimônio educacional e intelectual palestino como inimigo prioritário da segurança israelense.
Essas medidas israelenses visam atacar a história e identidade árabe-palestina para impedir o desenvolvimento do seu capital humano e assegurar a atual condição de subdesenvolvimento, negando o direito fundamental ao acesso à educação de gerações inteiras. A tentativa de cercear direitos sociais e culturais causa impacto imediato nas possibilidades de desenvolvimento econômico e de soberania política de uma nação. Deixando bem simples, a prática israelense é uma tentativa de destruição de uma sociedade inteira e como tal deve ser denunciado.

Nota
(1) Em inglês, "The Palestinian education and propaganda are more dangerous to Israel than Palestinian weapons". A notícia foi divulgada em 18 de novembro de 2004 pelo próprio Ministério de Relações Exteriores de Israel sob a acusacao de que o textos educacionais palestinos são apologia ao terrorismo.


Referências
BIRZEIT UNIVERSITY. R2E fact sheet. RIGHT TO EDUCATION CAMPAIGN. 30 de abril de 2009. Disponível em . Acesso em 09/12/2009.
GISHA: Legal Center for Freedom of Movement. Israel's High Court Decides: Berlanty Azzam Not Allowed to Finish Her BA at Bethlehem University. 09/12/2009. Disponível em . Acesso em 09/12/2009.
HAMMOND, Keith. Palestinian Universities and the Israeli Occupation. 2006. Texto fornecido pelo autor.
HASS, Amira. High Court: Gaza student cannot complete studies in West Bank. Haaretz. 09/12/2009. Disponível em . Acesso em 09/12/2009.
Ministry of Foreign Affairs. PM Sharon: Palestinian education and propaganda are more dangerous to Israel than their weapons. Press Release - Embassy of Israel in London. Disponível em . Acesso em 09/12/2009.

Vinicius Valentin Raduan Miguel é Cientista Social pela Universidade Federal de Rondônia e Mestre em Ciência Política pela Universidade de Glasgow; é tradutor do Marxists Internet Archive.

Greve do magistério do RS...

Aumenta pressão sobre o Palácio Piratini e a Assembleia Legislativa

A pressão sobre o Palácio Piratini e a Assembleia Legislativa aumentou desde as primeiras horas desta terça-feira 15. Trabalhadores da educação e de outras categorias do funcionalismo instalaram dezenas de barracas na Praça da Matriz. Os servidores exigem a retirada ou a rejeição dos projetos de Yeda, que atacam direitos dos trabalhadores e destroem os serviços públicos.
Circular pelos corredores da Assembleia Legislativa era um desafio. Centenas de pessoas discputavam o espaço. Tudo para dizer aos deputados que os servidores não têm acordo com os projetos encaminhados pelo governo. Enquanto isso, do lado de fora do Legislativo, cerca de três mil servidores ocupavam a praça. Com bandeiras, faixas, pirulitos e sinetas, os trabalhadores deram um recado ao governo e aos deputados: a retirada dos projetos é a única solução.
A greve aprovada pelos educadores no último dia 9 tem o governo do estado como único responsável. Foi a irresponsabilidade da governadora que levou a categoria a aprovar a paralisação. Yeda repetiu em 2009 o mesmo comportamento irresponsável de 2008, quando forçou a categoria a entrar em greve também no final do ano.
“Cada trabalhador que está nesta praça é um heroi, um guerreiro, pois às vésperas do Natal e do fim do ano letivo está lutando por si e pelos colegas, pelo povo deste estado”, lembrou Erico Correa, presidente do Sindicaixa. Já o presidente da Associação dos Servidores de Nível Médio da Brigada Militar, Leonel Lucas, deixou claro que a categoria não quer acordo e nem emendas aos projetos que atacam os brigadianos. “Se os projetos não forem retirados, os deputados precisam ter coragem para derrubá-los”, destacou Lucas.
Ao ver a praça tomada por servidores, a presidente do CPERS/Sindicato, Rejane de Oliveira, destacou a disposição de luta das categorias que estão sendo atacadas pelo governo do estado. Segundo Rejane, os deputados precisam dizer que não votam projetos que retiram direitos dos trabalhadores. “Este povo que aqui se encontra certamente vai escrever uma outra página da nossa bonita história”, sublinhou a dirigente sindical. Para Rejane, a Assembleia Legislativa terá que consertar os erros do governo.
No período da tarde, os servidores acompanharão, nas galerias do Plenário do Legislativo, a votação dos projetos relacionados à Brigada Militar, caso os mesmos não sejam retirados.
João dos Santos e Silva, assessor de imprensa do CPERS/Sindicato
Fotos de Caco Argemi