terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Agropecuária e a resistência da UDR....

A polêmica sobre a atualização dos índices de produtividade da agropecuária

Se a agropecuária brasileira é, como tem sido alardeado amplamente pelos porta-vozes do agronegócio, um exemplo de modernização tecnológica, transformando solos antes considerados inférteis em áreas de altíssima produtividade, porque tantos protestos contra a atualização dos índices?

Em agosto de 2009, chegou à mídia mais uma rodada de discussões sobre a necessidade atualizar os índices de produtividade da agricultura brasileira. O Ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, com o apoio do chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, Luis Dulci, anunciou que a medida seria tomada em breve. Na ocasião, o ministro declarou que os novos índices eram “confortáveis para quem produzia na média regional” e deu alguns exemplos de áreas, reconhecidas como de domínio do agronegócio, que estariam abaixo dos valores efetivamente atingidos em safras anteriores. O ano findou, mas os índices não foram atualizados.

O tema não é novo. Os índices atualmente vigentes, calculados a partir do grau de utilização e de exploração econômica da terra, baseiam-se em números fornecidos pelo Censo Agropecuário de 1975, quando a modernização da agricultura e da pecuária brasileira dava seus primeiros passos. De lá para cá, essas atividades incorporaram muita tecnologia, tanto mecânica quanto química, além de avançarem no terreno das biotecnologias. No entanto, os índices nunca foram recalculados.

Em 2003, o MDA iniciou estudos para que fosse possível essa atualização. Para que os novos valores passem a vigorar, é necessária a oficialização, feita por meio de uma portaria interministerial, que deve ser assinada tanto pelo Ministro do Desenvolvimento Agrário quanto pelo da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Quando o estudo feito pelo MDA foi enviado para análise do Ministério da Agricultura, então dirigido por Roberto Rodrigues, este argumentou sobre a necessidade de novos estudos técnicos. Às vésperas das eleições presidenciais, em 2006, o governo decidiu não tocar mais no assunto, uma vez que logo se evidenciou que a medida proposta tinha um enorme potencial de gerar tensões. Decorridos dois anos do segundo mandato do presidente Lula, cresceu a pressão dos movimentos sociais (principalmente MST, mas também Contag), novos estudos foram feitos, e o governo, mais uma vez, anunciou, em meados de 2009, que iria atualizar os índices.

Como era de se esperar, a necessidade e a pertinência da atualização foi imediatamente contestada pela Frente Parlamentar da Agropecuária, conhecida como Bancada Ruralista, por meio de seu coordenador, deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR). Segundo ele, a atualização era um ato arbitrário, que contrariava os interesses do agronegócio brasileiro, notadamente daqueles que realmente produzem. O deputado afirmou ainda que, às vésperas do plantio de uma nova safra, o campo precisava de paz e tranquilidade. Faz parte dos argumentos sempre utilizados pela Frente a afirmação de que os produtores rurais vivem em dificuldades: pressão da legislação ambiental, dívidas, dificuldades de fechamento de contas em decorrência da política econômica e cambial, que penaliza o setor. Além disso, segundo o deputado Micheletto, o setor foi responsável, no primeiro semestre de 2009, por 26,46% do PIB nacional, 42% do total das exportações e 40,23% dos empregos gerados no país.

As declarações do deputado, na ocasião, foram marcadas por um tom de ameaça velada, típico dos discursos antirreformistas dos anos 1960, de meados dos anos 1980, por ocasião do debate sobre a Proposta do Plano Nacional de Reforma Agrária da Nova República e também das discussões sobre reforma agrária no início do governo Lula: “Caso essa inoportuna e perturbadora medida seja adotada, os agricultores não terão mais condições de continuar produzindo com tranquilidade neste país, surgindo daí um estado de calamidade. Tudo isso é lamentável, mas a FPA, esta bancada numerosa e articulada, formada por deputados e senadores de todas as correntes de opinião, não ficará jamais numa atitude apenas contemplativa diante dessa provocação e afronta aos produtores rurais” (www.noticiasagricolas.com.br/noticias.php?id=53358, 20/08/2009, grifos meus).

À mesma época, a senadora Kátia Abreu, presidente da influente Confederação Nacional da Agricultura, também saiu em defesa de suas bases, com algumas alegações interessantes para se pensar o significado político dos índices de produtividade. Além de considerar a medida um ataque à livre iniciativa, ela costurou argumentos que iam desde a pressão da política ambiental sobre os agricultores até a velha tese de que o governo tem muita terra pública que poderia ser direcionada para a reforma agrária. Trouxe ainda de volta argumentos em torno da importância do uso do Banco da Terra e da legislação que permite a compra de terras para fazer reforma agrária (www.agrosoft.org.br, 22/08/2009).

Desde então foram realizadas algumas audiências públicas no Senado, nas quais os que defendem a revisão afirmam que, em várias regiões do país, a produção atual está bem acima dos índices a serem fixados. Por outro lado, os que são contra alegam que a atualização geraria uma enorme insegurança e uma inédita crise de produção.

O debate se intensificou ao longo do segundo semestre de 2009 e o Ministro Stephanes disse publicamente que não assinaria a portaria. De fato, o ano findou e ela não foi assinada, mostrando a força e grande poder de veto do Ministério da Agricultura. Como o ano de 2010 é eleitoral, dificilmente uma medida tão polêmica entraria em pauta (como já não entrara em 2006).

Cabe perguntar: afinal o que está em jogo numa portaria interministerial, ou seja, um documento que sequer tem o estatuto de lei, não passa pelo Congresso Nacional e tem sustentação legal (a lei nº 8.629 de 1993, conhecida como Lei Agrária, prevê a atualização)? Por que essa portaria atrai tanta oposição e ira?

Um primeiro passo para entender essa polêmica é revisitar a discussão que vem marcando o cenário político brasileiro (e latino-americano) desde há muito: a ligação entre uso da terra/desenvolvimento/reforma agrária. Nos anos 1950, generalizou-se o uso da categoria latifúndio, termo que ganhou várias conotações, principalmente a de improdutividade da terra e de atraso tecnológico, mas também de exploração do trabalho e violência. Todo a polêmica sobre a necessidade de modernização da agricultura ou sobre a necessidade de redistribuição de terras fundava-se na crítica ao latifúndio. O próprio Estatuto da Terra, de 1964, tem seu suporte básico nessa visão, propondo a empresa rural (inclusive a de caráter familiar) como o alvo a ser atingido no processo de modernização das atividades agropecuárias.

Como todos sabemos, a modernização tecnológica se fez no Brasil sem alteração da estrutura fundiária, uma das mais concentradas do mundo, e com uma extraordinária capacidade de permanência e reprodução em áreas de ocupação mais recente, como nos mostram os recém divulgados resultados do último Censo Agropecuário, realizado em 2006.

A vitalidade e a visibilidade que as lutas por terra assumiram no início dos anos 1980 recolocaram o tema da reforma agrária na pauta política, mas num contexto em que o latifúndio, no seu sentido de atraso tecnológico, estava cada vez mais perdendo relevância em favor de uma crescente empresarialização das atividades agropecuárias. Uma transformação veloz, mas que não foi capaz de modernizar essas atividades para além do uso das tecnologias de ponta e da integração sistêmica com as indústrias à montante (máquinas, insumos, sementes) e à jusante (processamento e venda), já que se manteve, por um lado, a relação predatória com o meio ambiente, a qual caracterizou por séculos nossa agricultura, e, por outro lado, a utilização também predatória da força de trabalho, como o demonstram as sucessivas denúncias que chegam à mídia sobre trabalhadores encontrados em situações extremamente precárias, análogas à da escravidão. Nesse contexto, ganha novas cores o debate sobre a relação entre reforma agrária e desenvolvimento: não se trata somente de tecnologias, mas de acesso a direitos, tanto humanos como ambientais, fundamentais.

Os debates em torno do novo ordenamento legal do país, que se realizaram após o fim do regime militar e que resultaram na Constituição de 1988, trouxeram para a nossa Carta Magna um preceito já incorporado por diversas constituições do mundo: o de que a propriedade da terra deve cumprir uma função social, uma vez que não se trata de uma mercadoria como qualquer outra. O conceito de função social adotado não continha grandes novidades: foi apropriado do Estatuto da Terra e remetia tanto à dimensão econômica da exploração, como aos aspectos trabalhista e ambiental. O seu não cumprimento implicaria numa punição: a desapropriação por interesse social. Naquele momento, no entanto, a Bancada Ruralista conseguiu incluir no texto constitucional uma cláusula que instaurou uma contradição com o conceito de função social: terras produtivas não podem ser desapropriadas. Ora, uma propriedade pode ser altamente produtiva, mas não cumprir sua função social, quando se consideram as condições de seus trabalhadores e os custos ambientais envolvidos na atividade desenvolvida. São raros até agora os casos de desapropriação de um imóvel a partir da função social. O critério da produtividade tem se sobreposto, inclusive nos processos judiciais.

No que se refere aos aspectos fundiários, a regulamentação da Constituição de 1988 foi feita por meio da Lei Agrária de 1993, que considera propriedade produtiva aquela que, explorada econômica e racionalmente, atinge, simultaneamente, graus de utilização da terra e de eficiência na exploração, segundo índices fixados pelo órgão federal competente. Segundo essa lei, os índices precisam ser atualizados periodicamente.

Se a agropecuária brasileira é, como tem sido alardeado amplamente pelos porta-vozes do agronegócio, um exemplo de modernização tecnológica, transformando solos antes considerados inférteis em áreas de altíssima produtividade, porque tantos protestos contra a atualização dos índices? À primeira vista parece uma contradição. Certamente, trata-se de um tema para uma pesquisa criteriosa, em diferentes regiões do país.

Todavia, há alguns argumentos dos setores empresariais rurais e seus representantes que podem fornecer pistas interessantes para entender tal oposição ao cumprimento do que estabelece a Lei Agrária. Um deles é a tese de que as próprias leis de mercado têm se encarregado de expropriar os produtores ineficientes e, portanto, a presença reguladora do Estado seria supérflua. Esse argumento aparece, por exemplo, numa carta de 22 de setembro de 2009, assinada por Paulo Skaf, presidente da Fiesp, e por Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura e Presidente do Conselho Superior do Agronegócio dessa importante entidade empresarial paulista.

Segundo eles, “o assunto tornou-se anacrônico, porque foi conceitualmente superado pela história e pela importância dos fatos, que aí estão para condenar a pretendida revisão dos índices de produtividade da agropecuária brasileira” (www.sindiracoes.org.br/index.php).

A medida é condenada também por ser considerada autoritária e atentatória contra o direito de propriedade e liberdade empresarial. Para os que assim argumentam, a definição constitucional de que a terra tem função social é um equívoco. Não faltam os que dizem que ninguém desapropria uma fábrica porque ela não é produtiva.

Compreender as alegações do setor, indo um pouco além dos argumentos que aparecem na imprensa, implica em incorporar à análise a própria lógica da expansão dessa agricultura moderna e empresarial.

A dinâmica da expansão da agropecuária brasileira, cerne do agronegócio, se faz num movimento complexo que tem, de um lado, as terras em produção com, ao que tudo indica, altos índices de produtividade. De outro, terras que estão sendo adquiridas, quer de produtores em crise que vendem sua propriedade para comprar terras mais baratas adiante, quer terras de pecuária, já deflorestadas, “limpas” e prontas para a reconversão produtiva. Trata-se um movimento constante, que envolve tanto a recorrente fracasso de alguns, quanto a prosperidade de outros. Esse movimento tem como um elemento de sua dinâmica a busca de novas áreas para serem incorporadas, mas que não necessariamente são colocadas de imediato em produção. Daí deriva a pressão sobre áreas de florestas, a luta por um afrouxamento nas regras de desmatamento, a crítica à delimitação de reservas indígenas e a oposição à atualização dos índices.

Atentando para essa dinâmica e não para esta ou aquela propriedade, observando os movimentos do mercado de terras em todo o país (que vêm atraindo investimentos de capitais nacionais e estrangeiros), talvez se possa entender melhor por que uma atualização de índices de produtividade, que parece tão simples, é capaz de despertar tanta celeuma. Terras improdutivas ou produzindo pouco fazem parte das necessidades criadas pela expansão das atividades empresariais. Transformá-las em áreas passíveis de desapropriação, com a possibilidade de se transformarem em assentamentos, significa subtraí-las do mercado e excluí-las do cerne desse circuito de reprodução.

Leonilde Ribeiro é Professora do CPDA/UFRRJ, pesquisadora do CNPq, da Faperj e do Observatório de Políticas Públicas para a Agricultura (OPPA).

Internet Segura....

Dia da Internet Segura alerta usuários para uso ético da rede

 
Pense bem: você distribuiria fotos para pessoas desconhecidas na rua? E na internet? É justamente para alertar sobre os riscos e promover o uso seguro e de qualidade na internet que amanhã (9), celebra-se, em mais de 60 países, o Dia da Internet Segura. Neste ano, as discussões se concentrarão em torno do tema "Pense antes de postar". De acordo com Rodrigo Rejm, diretor de prevenção da SaferNet, a iniciativa está presente no Brasil desde o ano passado sob a responsabilidade da SaferNet Brasil, do Ministério Público Federal e do Comitê Gestor da Internet. "A proposta é promover dicas de como navegar na internet com segurança e qualidade", explica.
Para ele, a ideia é alertar e conscientizar as pessoas para os perigos do uso irresponsável da rede. E não é para menos. Apesar de facilitar a comunicação e a troca de informação entre pessoas de várias partes do mundo, a internet, se não utilizada de forma responsável, pode trazer sérias consequências ao usuário. Problemas que podem ir da perda de convívio social a dados roubados e aliciamento de crianças e adolescentes.
Neste ano, o tema central do Dia da Internet Segura é "Pense antes de postar". Para Rejm, mesmo sendo uma proposta abrangente, a ideia é trabalhar principalmente com adolescentes que divulgam fotos íntimas e sensuais na rede. Ele alerta, por exemplo, para o "Sexting", fenômeno no qual adolescentes e jovens produzem e enviam fotos e textos sensuais e insinuantes para amigos e namorados pela internet ou pelo celular. Um dos problemas desse fenômeno é que tais fotos e mensagens colocadas online não são disponibilizadas apenas para amigos e conhecidos. Muitas, de acordo com o diretor de prevenção da SaferNet, acabam nas mãos de redes de pornografia infantil. Além da facilidade de aliciamento sexual, os usuários da rede mais descuidados também estão expostos a outros tipos de crimes, como fraudes, roubos de dados, invasões, vírus e clonagens.
Outro grave problema é a violação aos direitos humanos. Prova disso são os dados da Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos, disponibilizados pela SaferNet. Somente no mês de janeiro de 2010, a Central recebeu 5.541 denúncias de práticas contrárias aos direitos humanos realizadas na rede, como: intolerância religiosa, racismo, homofobia, neonazismo, pornografia infantil, xenofobia, maus tratos contra animais e apologia e incitação a crimes contra a vida.
Dicas de segurança
Para alertar as pessoas sobre os crimes realizados na internet e ajudar os pais a trabalhar o assunto com os filhos, a SaferNet disponibiliza gratuitamente uma cartilha com informações para garantir o uso ético e seguro da rede. Algumas dicas simples, como não disponibilizar dados pessoais, fotos e senhas na internet, trocar periodicamente senhas de e-mails e tomar cuidado ao baixar arquivos, são capazes de prevenir problemas futuros.
De acordo com Rodrigo Rejm, diretor de prevenção da SaferNet, as cartilhas e as dicas de segurança estão disponibilizadas no site: www.denuncie.org.br. No endereço, qualquer pessoa também pode denunciar, anonimamente, crimes contra os direitos humanos na internet.
Rejm lembra que o Dia da Internet Segura é amanhã, mas a organização realizará ações durante todo o mês em várias cidades do País. Para saber mais informações sobre o Dia da Internet Segura e a agenda das atividades, acesse: http://www.diadainternetsegura.org.br

Cinema Nacional na Escola...

Projeto propõe inclusão de filmes nacionais no currículo escolar

Devem os estudantes brasileiros, de 4 a 18 anos, assistirem no período de um mês, nas escolas públicas e privadas, a pelo menos duas horas de filmes nacionais? É essa a polêmica iniciada na Comissão de Educação do Senado pelo projeto de lei do senador Cristovam Buarque (PDT-DF), que está prestes a ser examinado.

A medida, de caráter obrigatório, recebeu do mesmo relator, a senadora Rosalba Ciarlini (DEM-RN), dois pareceres totalmente diferentes. Em maio, ela defendeu a rejeição do projeto. Alegou que "esse tipo de norma, por sua rigidez, conquanto possa servir a interesses diversos e
estranhos à escola, pouco ou nada contribui para a melhoria do ensino". Ao contrário, afirmou a senadora, pode diminuir a margem de autonomia e de flexibilidade dos estabelecimentos de ensino."

Já em novembro, coincidindo com o lançamento do filme Lula, o Filho do Brasil, Rosalba só teve
elogios para a proposta, sob a alegação de que a obrigatoriedade das escolas exibirem filmes nacionais "será benéfica para ambos, estudantes e indústria cinematográfica". E vai além, ao dizer que a produção nacional, "com raras exceções, tem qualidade plástica e conteudista irretorquível, diversidade temática e de público-alvo".

"E isso é verdade tanto em relação à produção nacional mais recente, quanto em relação aos nossos clássicos, de valor inestimável na retratação de realidades e personagens da nossa cultura", afirma.

A senadora diz que mudou de opinião, "convencida" pelo autor da proposta. "Não tem sentido pensar que o filme de Lula teve alguma influência", afirma. "Fui procurada pelo autor do projeto e ele me convenceu que era algo bom, pois também serão exibidos documentários e filmes
históricos."

Cristovam Buarque apresentou o projeto em maio de 2008. O texto altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) para incluir nos currículos do ensino fundamental e médio - de 4 a 18 anos - a obrigatoriedade de exibir para os alunos, por no mínimo duas horas mensais, "filmes de produção nacional".

O texto não especifica como os filmes serão selecionados ou quem vai custear sua aquisição. A justificativa anexa à proposta ressalta, sobretudo, a necessidade de apoiar a indústria cinematográfica nacional. 

Cristovam explica que "a única forma de dar liberdade à indústria cinematográfica é criar uma massa de cinéfilos que invadam nossos cinemas, dando uma economia de escala à manutenção da indústria cinematográfica".

Em entrevista ao Estado, Cristovam Buarque foi enfático em defender não a indústria de filmes, como está na justificativa, mas sim os efeitos benéficos para os alunos. Ele afirma que optou pela reserva de mercado de filmes feitos no País porque caso contrário os mesmo seriam preteridos por produções internacionais requintadas.

"Se a gente fosse escolher o único problema das escolas brasileiras, sabe qual seria? Elas são chatas, não mudaram nos últimos 50 anos", argumenta. O senador lembra que a música já faz parte da grade escolar obrigatória. E que caberá aos professores escolherem os filmes.

Quanto à hipótese de serem exibidos filmes violentos ou com cenas apimentadas de sexo,
impróprios para a faixa etária dos alunos, afirma que a probabilidade é a mesma disso ocorrer na indicação de livros. "O professor que fizer isso está sujeito a ser preso, porque não estará cumprindo com a sua obrigação", prevê.

Fonte: O Estado de S. Paulo - Rosa Costa, no vermelho

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Os Estados Unidos lêem erradamente a política mundial do Brasil


Artigo de Immanuel Wallerstein na Agência de notícias Nova Colômbia

“O Grupo de Trabalho recomenda que os Estados Unidos construam sua colaboração existente com o Brasil no que diz respeito ao etanol para desenvolver uma sociedade mais consistente, coordenada e ampla que incorpore um amplo leque de assuntos bilaterais, regionais e globais”, escreve Immanuel Wallerstein em artigo publicado no jornal mexicano La Jornada, 06-02-2010. A tradução é do Cepat.

Quando, por volta de 1970, os Estados Unidos se aperceberam pela primeira vez de que sua dominação hegemônica estava ameaçada pela crescente força econômica (e, consequentemente, política) da Europa ocidental e do Japão, mudou sua postura, buscando evitar que assumissem uma posição muito independente nos assuntos mundiais.

Os Estados Unidos disseram, com efeito, mesmo que não com palavras: até agora os tratamos como satélites, pedimos que nos seguissem sem questionamentos no cenário mundial. Mas agora vocês são mais fortes. Assim que os convidamos para serem sócios, sócios menores, que tomarão parte conosco na tomada de decisões coletivas, sempre e quando não se afastarem muito por conta própria. Esta nova política norte-americana se institucionalizou de múltiplas maneiras – especialmente na criação do G-7, no estabelecimento da Comissão Trilateral e na criação do Fórum Econômico Mundial de Davos como espaço de encontro da amigável elite mundial.

O objetivo principal dos Estados Unidos era desacelerar a decadência de seu poder geopolítico. A nova política funcionou talvez durante 20 anos. Finalmente, os acontecimentos posteriores a desfizeram. O primeiro foi a desintegração da União Soviética em 1989-1991, que desmantelou o argumento principal que os Estados Unidos usaram com seus sócios, de que não deviam ser muito independentes no cenário mundial. E o segundo evento foi o militarismo macho unilateral e autoderrotado do regime de Bush. Em vez de restaurar a hegemonia norte-americana, resultou no devastador fracasso dos Estados Unidos em 2003, quando não conseguiu o respaldo do Conselho de Segurança da ONU para a sua invasão do Iraque. As políticas neoconservadoras de Bush foram um rotundo tiro pela culatra e converteram o lento declinar do poder geopolítico norte-americano em uma queda precipitada. Hoje, quase todos reconhecem que os Estados Unidos já não têm a influência que alguma vez tiveram.

Alguém poderia pensar que os Estados Unidos poderiam ter aprendido algumas lições com os erros do regime de Bush. Mas, parece que hoje estão tentando repetir o mesmo cenário com o Brasil. Não demoraram 20 anos para que esta tentativa se enfraquecesse.

A principal jogada geopolítica que Obama empreendeu foi converter a reunião do G-8 em uma reunião do G-20. O grupo crucial que foi acrescentado à reunião são os chamados países do BRIC, que outros chamaram de países emergentes. O BRIC é a sigla para Brasil, Rússia (já incluída no G-8), Índia e China.

O que os Estados Unidos estão oferecendo ao Brasil é associar-se. Isto está muito claro em um recente relatório de um Grupo de Trabalho do Conselho de Relações Exteriores intitulado US-Latin America Relations: A New Direction for a New Reality [As relações Estados Unidos-América Latina: uma nova direção para uma nova realidade]. O Conselho de Relações Exteriores é a voz do establishment centrista, e este relatório provavelmente reflete o pensamento da Casa Branca.

Há duas frases cruciais neste relatório no que diz respeito ao Brasil. A primeira diz: o Grupo de Trabalho considera que aprofundar as relações estratégicas com o Brasil e o México e reformular os esforços diplomáticos com a Venezuela e Cuba, não apenas estabelecerão uma maior interação frutífera com estes países, mas que também transformará positivamente as relações Estados Unidos-América Latina.

E a segunda frase do documento aborda diretamente o Brasil: o Grupo de Trabalho recomenda que os Estados Unidos construam sua colaboração existente com o Brasil no que diz respeito ao etanol para desenvolver uma sociedade mais consistente, coordenada e ampla que incorpore um amplo leque de assuntos bilaterais, regionais e globais.

Este relatório foi publicado em 2009. Em dezembro, o Centro de Relações Exteriores organizou, junto com a Fundação Getúlio Vargas, um seminário sobre o Brasil emergente. Por coincidência, o Seminário foi realizado exatamente no momento em que ocorria a crise política hondurenha e a visita do presidente Mahmud Ahmadinejad ao Brasil. Os participantes norte-americanos no Seminário não falavam a mesma linguagem que os brasileiros.

Os norte-americanos consideravam que o Brasil deveria agir como uma potência regional, ou seja, como um poder subimperial. Os participantes norte-americanos não podiam entender a desaprovação do Brasil para os nexos militares e econômicos da Colômbia com os Estados Unidos. Pensavam também que o Brasil deveria assumir algumas responsabilidades na manutenção da ordem mundial, o que significava unir-se aos Estados Unidos em sua pressão sobre as políticas nucleares do Irã, enquanto os brasileiros sentiam que a posição norte-americana em relação ao Irã era hipócrita.

Finalmente, mesmo que os participantes dos Estados Unidos olhassem para a Venezuela de Chávez como longe de ser democrática, os brasileiros faziam eco à caracterização da Venezuela feita pelo presidente Lula ao dizer que sofre de um excesso de democracia.

Em janeiro de 2010, Susan Purcell, uma analista norte-americana conservadora, publicou no Miami Herald uma crítica à política de seu país sobre o Brasil, e o chamou de pensamento ilusório. Bem, ela pode ter razão. Do seu ponto de vista, Washington necessita repensar suas suposições acerca do grau em que pode depender do Brasil para enfrentar problemas políticos e de segurança na América Latina em modos que sejam compatíveis com os interesses norte-americanos.

Também em janeiro, Valter Pomar, secretário de Relações Internacionais do Partido dos Trabalhadores, o partido de Lula, disse que a intenção norte-americana de constituir um G-20 era “uma tentativa de absorver e controlar os pólos alternativos de poder... uma tentativa de manter a multipolaridade sob controle”. Ele insistiu em que, diante do conflito entre respaldar os interesses capitalistas no mundo como poder subimperial e respaldar os interesses democrático-populares, o Brasil terminaria assumindo esta segunda postura.

Dada a maior força da Europa ocidental e do Japão no começo dos anos 1970, os Estados Unidos lhes ofereceram promovê-los ao status de sócios menores. França e Alemanha optaram por continuar ainda mais em um papel independente no mundo em 2003. E o Japão, em suas eleições nacionais de 2009 e sua eleição de prefeitos em Okinawa em 2010, parece optar pelo mesmo caminho.

Dado seu crescimento em força, oferecerão ao Brasil ser sócio menor apenas em 2009. Parece que insistirá em um papel independente no mundo, quase de imediato.

Japão, entre a estagnação e a deflação – Um retrato do sistema capitalista mundial


Do blog da Marcia, da revista o militante


Durante os anos 70 e 80 do século passado era habitual ouvir-se falar do «milagre» japonês.
A economia japonesa crescia a uma taxa média anual de quase 5% (1) , a taxa de desemprego rondava os 2% e as exportações cresciam quase 8% ao ano.
«Milagre» que causava admiração nas fileiras governantes do sistema capitalista mundial, mas também receios, sobretudo nos EUA, para onde se dirigia o grosso das exportações nipónicas, do aço ao automóvel passando pela electrónica de consumo. Receios que levaram à tomada pela Administração Reagan de medidas comerciais de restrição à entrada de produtos japoneses no mercado dos EUA e à imposição dos denominados Acordos de Plaza (1985) aos seus principais concorrentes da Tríade (Alemanha e Japão), impondo uma desvalorização concertada do dólar, com vista a melhorar os termos de troca e as condições de rentabilidade das suas empresas multinacionais.Mas no início dos anos 90, após o rebentar da bolha financeira gerada nos mercados financeiro e sobretudo imobiliário (1992), o Japão entrou num período de estagnação e deflação (Gráfico 1), com uma taxa média de crescimento anual inferior a 1%, pontuado com recessões (1998-1999 e 2008-2009) e por um forte aumento do desemprego – com a taxa de desemprego média a aumentar cinco vezes face aos anos 60, ou seja, mais de 2,5 milhões de desempregados (Gráfico 2). Período no qual ainda se encontra e cujas previsões económicas apontam para que permaneça.

 

Um caso de estudo
O Japão tornou-se um caso de estudo para os economistas e comentadores da praça, tornando-se para muitos, como Paul Krugman, um exemplo de uma economia que caiu na «armadilha da liquidez» (2) , exemplo que podemos encontrar se recuarmos para a economia dos EUA nos anos 30, na altura da Grande Depressão. Apesar de taxas de juro reais muito baixas (quer de curto, quer de longo prazo), mesmo em alguns anos próximas do zero, o motor do crédito não «arrancou», o investimento continuou a regredir (-1,4% ao ano em média nos últimos 20 anos) e o crescimento do consumo continuou quase estagnado (1,1% ao ano em média nos últimos 20 anos).
Mas como no actual episódio de crise, já nos anos 90, o Japão utilizou o investimento público para tentar relançar a economia, entre 1992 a 1996, passou de um superavit para um défice orçamental de 5,1% do PIB, com a dívida pública a aumentar 45% e o seu valor a representar 100% do PIB em 1996. E apesar disso, o crescimento económico médio anual cifrou-se em apenas 1,3% e na primeira tentativa de controlo do défice por parte do governo nipónico, a economia paulatinamente mergulhou na recessão.
Em 1998, tal como agora em 2008, o Japão voltou a tentar relançar a economia por via do investimento público e pela injecção directa de dinheiro na recapitalização do sistema bancário (cerca de 500 mil milhões de dólares, o equivalente face ao PIB a 2 milhões de milhões de dólares de injecção nos EUA), o défice atingiu um valor histórico de 11,2% do PIB, mas a economia cresceu de forma anémica, apesar do estímulo interno.
O estímulo externo, por via do crescimento das exportações para os EUA e a China, entre 2004 e 2007, o período que mediou a bolha financeira do «dot.com» (2000-2003) e a acumulação da bolha financeira do «subprime» (2007-?) voltou a trazer taxas de crescimento na ordem dos 2% ano. Contudo, acabado o estímulo, a recessão voltou, com o recuo estimado do produto de 5,8% em 2009, uma das recessões mais severas da Tríade e a maior contracção do produto desde os anos 50. Com a dívida pública a atingir 190% do PIB em 2009 e o défice orçamental os 8%.
É por isso que o exemplo japonês carece de reflexão particular, não só no contexto da análise da resposta do sistema capitalista à crise que atravessa, mas pelo retrato que tece sobre a profundidade dessa mesma crise e da sua natureza sistémica. Retrato da crise que teve o seu regresso visível no final nos anos 60, mas sobretudo com o denominado «primeiro choque petrolífero» (1974-1975), mas que se encontrava em gestação com o dissipar das condições que permitiram relativamente elevadas taxas de acumulação de capital no centro do sistema capitalista mundial, sobretudo nos anos 50 e 60.
Da expansão à estagnação
Finda a ocupação pelos EUA em 1952, o Japão encetou uma rápida industrialização, com uma forte restauração monopolista apoiada pelo Governo, a par de um investimento na reconstrução de infra-estruturas de base. Taxas de câmbio favoráveis e elevadas taxas de produtividade do trabalho potenciaram as exportações e o aprofundamento do mercado interno, com a indústria do aço e depois a automóvel a terem rápido crescimento, apesar da forte dependência do Japão de alimentos, matérias-primas e energia.
Nos anos 60, a economia crescia em média mais de 10% ao ano, a produtividade do trabalho quase 9%, o que, mesmo com o crescimento dos salários reais de mais de 7%, permitia a transferência de ganhos de produtividade do trabalho para o capital, que se reflectia na redução dos custos salariais unitários reais em média de 1,2% ao ano e o crescimento do volume de lucros em média de 26,7% ao ano.
O exemplo do Japão nos anos 60 poderia ser em grande medida transposto, para a Coreia do Sul nos anos 80, ou para a China desde os anos 90, que tem mantido uma taxa média anual de crescimento do produto superior a 10%.
 O caso da Coreia do Sul é interessante, pois tendo atingido uma taxa média anual de crescimento do produto de quase 9% nos anos 80, desde então as taxas de crescimento médias tem vindo a desacelerar de década para década, seguindo um padrão equivalente aos países capitalistas mais avançados.
Contudo, no final dos anos 60 o crescimento económico começou a não ser suficiente para cobrir o crescimento da capacidade produtiva. A pressão para a baixa das taxas de lucro crescia na medida do ritmo de elevação da composição orgânica do capital, devida ao aumento da eficiência e escala da produção, a par de um crescimento médio de 4,8% ao ano do stock de capital líquido por pessoa empregada. A rápida industrialização da Alemanha contribuía também para o excesso de capacidade produtiva, tornando mais visível a sobreprodução de amplos segmentos industriais do sistema capitalista mundial. A pressão para a queda das taxas de lucro acentuava a crescente concorrência intercapitalista pela obtenção de quotas de mercado, fontes de matérias-primas e «stocks» de força de trabalho barata a nível mundial.
O retorno visível da crise dos anos 70 é, assim, precedido por um declínio da rentabilidade das empresas capitalistas nas potências do centro do sistema capitalista mundial, particularmente no Japão, acentuado depois pelo forte aumento do preço das matérias-primas e da energia, nomeadamente do preço do petróleo. Crise de rentabilidade da qual ainda não houve recuperação cabal, apesar da intensificação da exploração do trabalho, da crescente internacionalização da produção, da expansão das relações sociais de produção capitalistas a quase todos os pontos do globo e da progressiva financeirização do capital, que permitiu o crescimento exponencial do crédito e do capital fictício, nos últimos 30 anos.
Sendo a taxa de lucro o orientador do processo de acumulação, a não obtenção de taxas de lucro esperadas por parte do capitalista provoca um declínio no investimento (logo do ritmo de acumulação) e consequentemente do consumo (logo da realização da mais-valia), provocando a prazo a interrupção do processo de valorização de capital. Por outras palavras, existe um esgotamento progressivo das oportunidades de investimento rentáveis para a aplicação da massa de mais-valias extraída e acumulada, o que se manifesta pela tendência para a queda das taxas médias de lucro no longo prazo. Entre 1950-1970 e 1970-1993, as taxas médias de lucro líquida na indústria transformadora no Japão reduziram-se quase 50%, continuando mesmo assim a ser mais elevadas que no resto da Tríade (3) .
Na altura em que a ocidente se falava do «milagre japonês», já a economia japonesa crescia a uma taxa média anual que era menos de metade da dos anos 60, inferior a 5%, para depois confirmar a tendência para estagnação verificada, não só nos outros pólos da Tríade, mas no sistema capitalista mundial, com a desaceleração das taxas de crescimento do produto de década para década, demonstrativas do abrandamento do «motor» de acumulação de capital.
O excesso de capacidade fazia-se notar, não só com o aumento estrutural do desemprego de década para década (Gráfico 2), mas por uma evolução do produto abaixo do produto potencial, com excepção dos períodos de bolha financeira, de inflação artificial do preços dos activos mobiliários e imobiliários assentes no crédito (como 1969-1973, 1988-1992 e 2004-2007). Excesso de capacidade e esgotamento de oportunidades de investimento que também se traduziram na contracção acumulada do investimento em quase 26% nos últimos 20 anos.
Com uma tendência inversa ao desemprego, as taxas de crescimento dos salários reais desaceleram fortemente, para um crescimento médio anual de 0,5%, mas inferior ao crescimento médio anual da produtividade do trabalho. Facto que mostra a pressão do crescimento do exército industrial de reserva na baixa dos salários. Esta transferência de ganhos de produtividade do trabalho para o capital permitiu continuar a redução dos custos unitários do trabalho e é um indicador do aumento da taxa de exploração do Japão, com o peso médio dos salários no produto a reduzir-se de década para década. Em termos médios, desde os anos 70, o peso médio dos salários reduziu quase 12 pontos percentuais (Gráfico 3).
Isto num quadro de estímulos externos, com a manutenção de excedentes comerciais nas trocas com os EUA, e internos, com o défice orçamental e a dívida pública a aumentarem sistematicamente de década para década. Esta substituição de dívida privada por dívida pública, levou a que o peso da dívida pública passasse, em termos médios, de cerca de 28% nos anos 70 para mais de 178% na última década. A questão que se coloca é da sustentabilidade desta política de «estímulos», quando têm sido estes «défices» a sustentar, mesmo assim, o parco crescimento económico.

O «espelho» da crise
O Japão constitui assim o cenário que os «governantes» do centro do sistema capitalista mundial pretendem a todo custo evitar. Hoje, quando se afirma que a crise bateu no fundo, apontando uma lenta e insípida «retoma económica», a verdade é que o exemplo do Japão vem sempre à memória. Apesar dos meios que o sistema possui para responder à crise, nomeadamente por via do peso e papel do Estado na economia, apesar de 20 anos de consenso de Washington, a verdade é que depois da maior operação de «salvamento» do sistema concertada a nível mundial, com a descida para níveis históricos das taxas de juros, com a injecção de milhões de milhões de dólares no sistema financeiro (também para sustentar o consumo) e com o forte aumento do investimento e consumo público, não só a recessão mundial não foi «evitada», como o crescimento económico previsto para os próximos anos será anémico, confirmando a tendência para a desaceleração das taxas médias de crescimento do produto mundial de década para década.
O Japão demonstra também que o sistema poderá sobreviver mesmo num estado letárgico de crescimento, com crescente desemprego e renovada violência na exploração da força de trabalho. O sistema não cairá por si. O capitalismo já deu mostras da sua capacidade de adaptação e de sobrevivência, nomeadamente com a alteração dos seus paradigmas produtivos, tecnológicos e energéticos.O Japão, não negando as condições objectivas próprias que caracterizam o desenvolvimento do capitalismo neste país, torna-se assim um «espelho» da evolução desta crise de rentabilidade desde os anos 70, mas também da ineficácia das respostas política e económica do sistema à crise, sejam elas de índole keynesiana ou neoclássica/neoliberal, num quadro de sobre-acumulação de capital sobre todas as formas, de sobre-extensão do sistema a nível planetário, com o esgotamento progressivo de recursos naturais não renováveis.
A questão central continua por isso a ser qual o grau de destruição de capital sobre todas as formas necessário para garantir as condições de valorização do capital, para garantir um novo ciclo de expansão da acumulação capitalista. A «saída» da Grande Depressão dos anos 30 só se verificou com o eclodir da II Guerra Mundial, entre respostas políticas que conduziram ao surgimento do fascismo e do nazismo. O desenvolvimento do militarismo a nível mundial e o progressivo rearmamento da Alemanha e do Japão têm que ser enquadrados neste contexto, como também das «arrumações» geopolíticas a nível mundial, com a afirmação de «novas» potências económicas e militares, como a China, o Brasil, a Índia e a Rússia, num quadro de declínio económico da potência hegemónica central – os EUA.
Contudo, hoje, a delapidação dos recursos naturais atingiu um tal nível, em consequência da irracionalidade e anarquia do modo de produção capitalista, assente no pressuposto da acumulação ilimitada de capital, que a superação do sistema se torna uma condição sin qua non para a Humanidade.
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A centralidade da lei do valor escapa às ferramentas dos economistas convencionais, presos a um modelo de equilíbrio de longo prazo e de racionalidade perfeita, que só existe nos manuais de economia. Lei da qual decorre a tendência para a queda das taxas de lucro demonstrativa do limite do sistema e da sua principal contradição, entre uma crescente socialização da produção e apropriação privada das condições de produção. Esta é a causa da crise sistémica em que nos encontramos.
Para pôr a satisfação das necessidades humanas como a principal prioridade da organização económica, do trabalho social de uma sociedade, a questão da propriedade e da apropriação privada das condições de produção tem de ser posta em causa, ou seja, pôr em causa a relação social (de exploração) que o capital corporiza. Qualquer outro caminho será sempre uma «fuga para a frente», que conjunturalmente poderá apresentar uma «saída», mas não resolverá os limites e as contradições internas no sistema. Este é o limite do reformismo.
O Japão encontra-se há vinte anos mergulhado numa depressão de crescimento da qual não encontra saída, preso entre a estagnação e a deflação. Este microcosmos do sistema capitalista dá-nos uma imagem de um sistema preso numa crise de rentabilidade para qual ainda não encontrou resposta, mas entre os riscos de derivas destrutivas do sistema e a certeza do aprofundamento da ofensiva de classe contra o trabalho torna-se cada vez mais urgente a tomada de consciência dos trabalhadores das causas profundas da crise e das desigualdades, da destruição ambiental e da barbárie que grassam a nível local e planetário. O sistema só será superado pela luta. Como sempre o resultado da história dependerá da luta de classes e na continuação da construção da alternativa que germina nos limites do sistema – o socialismo.
Notas
(1) Todos os valores apresentados no presente artigo correspondem a cálculos próprios efectuados a partir de valores extraídos da base de dados macroeconómicos AMECO da Comissão Europeia, que teve a última actualização em Novembro de 2009 com a publicação das previsões económicas de Outono.
(2) Krugman, Paul, «The return of depression economics and the crisis of 2008», Norton, 2009.
(3) Brenner, Robert, «The economics of global turbulence», Verso, 2006.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

1º Festival Virtual Lagrima Psicodélica

Para vc acessar a Rádio Web Underground Lágrima Psicodélica clique em: http://www.lagrimapsicodelica.blogspot.com/
Banner by Gerald - gveneroso@hotmail.com

Nos dias 13 e 14 de fevereiro de 2010 vai rolar o nosso 1º Festival Virtual Lágrima Psicodélica. Todas as bandas convidadas confirmaram que vão participar. São elas:

Dia 1: Sábado 15:00 a 16:00 - Led Zeppelin by Barata 16:00 a 17:00 - The Cure by Cacá 17:00 a 18:00 - Jimi Hendrix - JH II 18:00 a 19:00 - Pink Floyd - Johnny F 19:00 a 20:00 - Mutantes - Lola Brochaska 20:00 a 21:00 - Frank Zappa - Juliano Rosa 21:00 a 22:00 - Grobschnitt by Gäel 22:00 a 23:00 - Eric Clapton - Minduim Mateus Dia 2: Domingo 15:00 a 16:00 - Rush - Marcio CS 16:00 a 17:00 - Deep Purple - Ricardo Magrão 17:00 a 18:00 - Jethro Tull - Dexx 18:00 a 19:00 - Neil Young - Pedro 19:00 a 20:00 - Janis Joplin by Loirinha 20:00 a 21:00 - Budgie by Ande S 21:00 a 22:00 - Joy Division - Rabablues 22:00 a 23:00 - AC/DC - Fireball 23:00 a 24:00 - Blue Oyster Cult - Sara_Evil

Todos os ingressos já foram vendidos... hehehehe, nem os cambistas estão vendendo mais. Porém, nossa Rádio WULP HD vai transmitir os 2 dias do 1º Festival Virtual Lágrima Psicodélica na íntegra e com qualidade High Definiton. As camisetas ainda estão á venda, mas só restam poucas unidades: Pedido de Camisetas no site a Barata
Caranaval uma porra! Eu quero é Rock!

Vinheta 1º Festival Virtual Lagrima Psicodelica - By Rabablues by Rabablues Estamos buscando parceria com Blogs & Sites para transmissão de nossa Rádio WULP. Temos hoje na nossa rede 90 parceiros. Nosso email para contato é: lagrimapsicodelica@gmail.com

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Exploração sexual infantil no carnaval.....

Campanha incentiva denúncias de exploração sexual infantil no carnaval 


 Karol Assunção * Adital


"Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes é Crime. Denuncie! Procure o Conselho Tutelar de sua cidade ou disque 100". É com esse slogan que a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH/PR) lançará, na próxima segunda-feira (8), no Rio de Janeiro, a 5ª edição da campanha de Enfrentamento da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes no Carnaval. A escolha do Rio de Janeiro para sediar o lançamento da campanha em 2010 não foi por acaso. No ano passado, o estado aumentou em 4% o número de denúncias em relação ao ano de 2008. Para a coordenadora do Programa Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual de Crianças e Adolescentes da SEDH, Leila Paiva, o objetivo da campanha é justamente este: aumentar o número de denúncias durante o carnaval. Segundo ela, antes da realização da campanha, constatou-se que era no carnaval quando as denúncias mais caíam. "Normalmente, em feriados, o número de violações [aos direitos das crianças e dos adolescentes] tende a aumentar. No carnaval, festa onde tudo pode, é mais propício a acontecer violência sexual, porque é quando há muita festa, muita bebida", explica. Por conta disso, a coordenadora comenta que a queda brusca de denúncias nesse período não era compatível com o que acontecia na realidade. Constatação comprovada após o início da mobilização. "Os números [de denúncias no carnaval] voltaram a crescer após a campanha", revela. De acordo com ela, agora, a quantidade de denúncias no feriado momino não cai tanto quanto antes. E a intenção da campanha é realmente não diminuir, e sim aumentar: "A gente não quer que diminua [o número de denúncias], a gente quer é que as pessoas continuem denunciando, mesmo no carnaval", afirma. Para chamar ainda mais a atenção da sociedade para o problema, durante o carnaval, serão distribuídos abanadores, adesivos, camisetas, tatuagens temporárias e cartazes com o slogan da campanha. A ideia é também fazer um alerta aos turistas estrangeiros. Para isso, além do material em português, também foram produzidas peças em espanhol e inglês. A campanha de Enfrentamento da Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes no Carnaval estará presente durante os festejos carnavalescos nas seguintes cidades: Rio de Janeiro, Belém, Belo Horizonte, Brasília, Campo Grande, Corumbá, Fortaleza, Florianópolis, Manaus, Porto Alegre, Porto Velho, Recife, Salvador, São Paulo e Vitória. Disque 100 As denúncias de exploração sexual de crianças e adolescentes podem ser feitas ao Disque 100. O serviço, realizado pela SEDH em parceria com a Petrobras e o Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes (Cecria), funciona diariamente - inclusive nos finais de semana e feriados - de 8h as 22h. A ligação pode ser feita de qualquer cidade do país, é gratuita e o informante não precisa se identificar. Somente no ano passado, o Disque 100 realizou 220.676 atendimentos e recebeu e encaminhou 29.756 denúncias. No total, entre maio de 2003 e novembro de 2009, o Disque Denúncia Nacional realizou mais de 2 milhões de atendimentos, tendo recebido e encaminhado 111.926. Além do Disque 100, as denúncias de violência sexual contra crianças e adolescentes podem ser feitas aos Conselhos Tutelares Municipais ou enviadas por e-mail, através do endereço disquedenuncia@sedh.gov.br

Documentário de John Pilger sobre a América Latina...

A guerra contra a democracia

Documentário de John Pilger sobre as agressões estado-unidenses à América Latina

(legendado em português do Brasil)

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Este documentário encontra-se em http://resistir.info/ .

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Estão roubando nossa água....


Navios-tanque traficam água de rios da Amazônia

Por Chico Araújo, da Agência Amazônia



BRASÍLIA – É assustador o tráfico de água doce no Brasil. A denúncia está na revista jurídica Consulex 310, de dezembro do ano passado, num texto sobre a Organização Mundial do Comércio (OMC) e o mercado internacional de água. A revista denuncia: “Navios-tanque estão retirando sorrateiramente água do Rio Amazonas”. Empresas internacionais até já criarem novas tecnologias para a captação da água. Uma delas, a Nordic Water Supply Co., empresa da Noruega, já firmou contrato de exportação de água com essa técnica para a Grécia, Oriente Médio, Madeira e Caribe.

Conforme a revista, a captação geralmente é feito no ponto que o rio deságua no Oceano Atlântico. Estima-se que cada embarcação seja abastecida com 250 milhões de litros de água doce, para engarrafamento na Europa e Oriente Médio. Diz a revista ser grande o interesse pela água farta do Brasil, considerando que é mais barato tratar águas usurpadas (US$ 0,80 o metro cúbico) do que realizar a dessalinização das águas oceânicas (US$ 1,50).

Há trás anos, a Agência Amazônia também denunciou a prática nefasta. Até agora, ao que se sabe nada de concreto foi feito para coibir o crime batizado de hidropirataria. Para a revista Consulex, “essa prática ilegal, no então, não pode ser negligenciada pelas autoridades brasileiras, tendo em vida que são considerados bens da União os lagos, os rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seus domínio (CF, art. 20, III).

Outro dispositivo, a Lei nº 9.984, de 17 de julho de 2000, atribui à Agência Nacional de Águas (ANA), entre outros órgãos federais, a fiscalização dos recursos hídricos de domínio da União. A lei ainda prevê os mecanismos de outorga de utilização desse direito. Assinado pela advogada Ilma de Camargos Pereira Barcellos, o artigo ainda destaca que a água é um bem ambiental de uso comum da humanidade. “É recurso vital. Dela depende a vida no planeta. Por isso mesmo impõe-se salvaguardar os recursos hídricos do País de interesses econômicos ou políticos internacionais”, defende a autora.

Segundo Ilma Barcellos, o transporte internacional de água já é realizado através de grandes petroleiros. Eles saem de seu país de origem carregados de petróleo e retornam com água. Por exemplo, os navios-tanque partem do Alaska, Estados Unidos – primeira jurisdição a permitir a exportação de água – com destino à China e ao Oriente Médio carregando milhões de litros de água.

Nesse comércio, até uma nova tecnologia já foi introduzida no transporte transatlântico de água: as bolsas de água. A técnica já é utilizada no Reino Unido, Noruega ou Califórnia. O tamanho dessas bolsas excede ao de muitos navios juntos, destaca a revista Consulex. “Sua capacidade [a dos navios] é muito superior à dos superpetroleiros”. Ainda de acordo com a revista, as bolsas podem ser projetadas de acordo com necessidade e a quantidade de água e puxadas por embarcações rebocadoras convencionais.

Há seis anos, o jornalista Erick Von Farfan também denunciou o caso. Numa reportagem no site eco21 lembrava que, depois de sofrer com a biopirataria, com o roubo de minérios e madeiras nobres, agora a Amazônia está enfrentando o tráfico de água doce. A nova modalidade de saque aos recursos naturais foi identificada por Farfan de hidropirataria. Segundo ele, os cientistas e autoridades brasileiras foram informadas que navios petroleiros estão reabastecendo seus reservatórios no Rio Amazonas antes de sair das águas nacionais.

Farfan ouviu Ivo Brasil, Diretor de Outorga, Cobrança e Fiscalização da Agência Nacional de Águas. O dirigente disse saber desta ação ilegal. Contudo, ele aguarda uma denúncia oficial chegar à entidade para poder tomar as providências necessárias. “Só assim teremos condições legais para agir contra essa apropriação indevida”, afirmou.

O dirigente está preocupado com a situação. Precisa, porém, dos amparos legais para mobilizar tanto a Marinha como a Polícia Federal, que necessitam de comprovação do ato criminoso para promover uma operação na foz dos rios de toda a região amazônica próxima ao Oceano Atlântico. “Tenho ouvido comentários neste sentido, mas ainda nada foi formalizado”, observa.

Águas amazônicas

Segundo Farfan, o tráfico pode ter ligações diretas com empresas multinacionais, pesquisadores estrangeiros autônomos ou missões religiosas internacionais. Também lembra que até agora nem mesmo com o Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam) foi possível conter os contrabandos e a interferência externa dentro da região.

A hidropirataria também é conhecida dos pesquisadores da Petrobrás e de órgãos públicos estaduais do Amazonas. A informação deste novo crime chegou, de maneira não oficial, ao Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM), órgão do governo local. “Uma mobilização até o local seria extremamente dispendiosa e necessitaríamos do auxílio tanto de outros órgãos como da comunidade para coibir essa prática”, reafirmou Ivo Brasil.

A captação é feita pelos petroleiros na foz do rio ou já dentro do curso de água doce. Somente o local do deságüe do Amazonas no Atlântico tem 320 km de extensão e fica dentro do território do Amapá. Neste lugar, a profundidade média é em torno de 50 m, o que suportaria o trânsito de um grande navio cargueiro. O contrabando é facilitado pela ausência de fiscalização na área.

Essa água, apesar de conter uma gama residual imensa e a maior parte de origem mineral, pode ser facilmente tratada. Para empresas engarrafadoras, tanto da Europa como do Oriente Médio, trabalhar com essa água mesmo no estado bruto representaria uma grande economia. O custo por litro tratado seria muito inferior aos processos de dessalinizar águas subterrâneas ou oceânicas. Além de livrar-se do pagamento das altas taxas de utilização das águas de superfície existentes, principalmente, dos rios europeus.  Abaixo, alguns trechos da reportagem de Erick Von Farfan:

O diretor de operações da empresa Águas do Amazonas, o engenheiro Paulo Edgard Fiamenghi, trata as águas do Rio Negro, que abastece Manaus, por processos convencionais. E reconhece que esse procedimento seria de baixo custo para países com grandes dificuldades em obter água potável. “Levar água para se tratar no processo convencional é muito mais barato que o tratamento por osmose reversa”, comenta.

O avanço sobre as reservas hídricas do maior complexo ambiental do mundo, segundo os especialistas, pode ser o começo de um processo desastroso para a Amazônia. E isto surge num momento crítico, cujos esforços estão concentrados em reduzir a destruição da flora e da fauna, abrandando também a pressão internacional pela conservação dos ecossistemas locais.

Entretanto, no meio científico ninguém poderia supor que o manancial hídrico seria a próxima vítima da pirataria ambiental. Porém os pesquisadores brasileiros questionam o real interesse em se levar as águas amazônicas para outros continentes. O que suscita novamente o maior drama amazônico, o roubo de seus organismos vivos. “Podem estar levando água, peixes ou outras espécies e isto envolve diretamente a soberania dos países na região”, argumentou Martini.

A mesma linha de raciocínio é utilizada pelo professor do Departamento de Hidráulica e Saneamento da Universidade Federal do Paraná, Ary Haro. Para ele, o simples roubo de água doce está longe de ser vantajoso no aspecto econômico. “Como ainda é desconhecido, só podemos formular teorias e uma delas pode estar ligada ao contrabando de peixes ou mesmo de microorganismos”, observou.

Essa suposição também é tida como algo possível para Fiamenghi, pois o volume levado na nova modalidade, denominada “hidropirataria” seria relativamente pequeno. Um navio petroleiro armazenaria o equivalente a meio dia de água utilizada pela cidade de Manaus, de 1,5 milhão de habitantes. “Desconheço esse caso, mas podemos estar diante de outros interesses além de se levar apenas água doce”, comentou.

Segundo o pesquisador do Inpe, a saturação dos recursos hídricos utilizáveis vem numa progressão mundial e a Amazônia é considerada a grande reserva do Planeta para os próximos mil anos. Pelos seus cálculos, 12% da água doce de superfície se encontram no território amazônico. “Essa é uma estimativa extremamente conservadora, há os que defendem 26% como o número mais preciso”, explicou.

Em todo o Planeta, dois terços são ocupados por oceanos, mares e rios. Porém, somente 3% desse volume são de água doce. Um índice baixo, que se torna ainda menor se for excluído o percentual encontrado no estado sólido, como nas geleiras polares e nos cumes das grandes cordilheiras. Contando ainda com as águas subterrâneas. Atualmente, na superfície do Planeta, a água em estado líquido, representa menos de 1% deste total disponível.

A previsão é que num período entre 100 e 150 anos, as guerras sejam motivadas pela detenção dos recursos hídricos utilizáveis no consumo humano e em suas diversas atividades, com a agricultura. Muito disto se daria pela quebra dos regimes de chuvas, causada pelo aquecimento global. Isto alteraria profundamente o cenário hidrológico mundial, trazendo estiagem mais longas, menores índices pluviométricos, além do degelo das reservas polares e das neves permanentes.

Sob esse aspecto, a Amazônia se transforma num local estratégico. Muito devido às suas características particulares, como o fato de ser a maior bacia existente na Terra e deter a mais complexa rede hidrográfica do planeta, com mais de mil afluentes. Diante deste quadro, a conclusão é óbvia: a sobrevivência da biodiversidade mundial passa pela preservação desta reserva.

Mas a importância deste reduto natural poderá ser, num futuro próximo, sinônimo de riscos à soberania dos territórios panamazônicos. O que significa dizer que o Brasil seria um alvo prioritário numa eventual tentativa de se internacionalizar esses recursos, como já ocorre no caso das patentes de produtos derivados de espécies amazônicas. Pois 63,88% das águas que formam o rio se encontram dentro dos limites nacionais.

Esse potencial conflito é algo que projetos como o Sistema de Vigilância da Amazônia procuram minimizar. Outro aspecto a ser contornado é a falta de monitoramento da foz do rio. A cobertura de nuvens em toda Amazônia é intensa e os satélites de sensoriamento remoto não conseguem obter imagens do local. Já os satélites de captação de imagens via radar, que conseguiriam furar o bloqueio das nuvens e detectar os navios, estão operando mais ao norte.

As águas amazônicas representam 68% de todo volume hídrico existente no Brasil. E sua importância para o futuro da humanidade é fundamental. Entre 1970 e 1995 a quantidade de água disponível para cada habitante do mundo caiu 37% em todo mundo, e atualmente cerca de 1,4 bilhão de pessoas não têm acesso a água limpa. Segundo a Water World Vision, somente o Rio Amazonas e o Congo podem ser qualificados como limpos.
(Envolverde/Agência Amazônia)
© Copyleft - É livre a reprodução exclusivamente para fins não comerciais, desde que o autor e a fonte sejam citados e esta nota seja incluída.

Repensando a esquerda...

Esquerda necessita reencontrar diálogo para denunciar ‘bizarro pacto social lulista’
Escrito por Paulo Passarinho no Correio da Cidadania  
 
Neste ano voltaremos a ter novas eleições presidenciais. Trata-se de mais uma oportunidade que teremos de avaliar os rumos do país, a partir das campanhas dos diversos candidatos, de suas proposições e de suas posições críticas em relação ao governo de Lula, nosso presidente nos últimos oito anos.
 
Será uma eleição que apresentará a novidade de não contar com a presença, como candidato, do próprio Lula, político que disputou todas as eleições do gênero desde 1989, quando foi restabelecida a eleição direta para o posto de primeiro mandatário do país.
 
As circunstâncias em que vai se dar essa disputa política também apresentarão uma outra novidade. Esta novidade relaciona-se à mudança programática a que a maior parte da esquerda brasileira se submeteu, a partir justamente da eleição de Lula, em 2002.
 
Como é do conhecimento de todos, até aquela ocasião Lula e seus aliados sustentaram a crítica ao modelo neoliberal e se colocavam como os principais opositores do modelo econômico em curso no país, desde a eleição de Collor.
 
As principais características desse modelo se inscrevem dentro da lógica de retirar o Estado do seu papel de principal indutor do desenvolvimento econômico do país e de se adotar uma política macroeconômica de favorecimento à livre movimentação de capitais e de incentivo ao capital financeiro. É um modelo que objetiva a criação das melhores condições possíveis à plena utilização do nosso espaço econômico como um apêndice à ação global de empresas transnacionais, em sua maioria de controle acionário estrangeiro, mas que conta também com a atuação de grupos nacionais, particularmente em setores como o de bancos, mineradoras, siderúrgicas, construtoras e agroindústrias.
 
Como sabemos, a partir de uma alegada condição política que poderia comprometer a governabilidade do governo eleito em 2002, Lula e seus aliados optaram por não alterar a política econômica adotada desde o segundo mandato de FHC. Nomearam para o comando do Banco Central um dos principais executivos de um grupo financeiro internacional e procuraram seguir a cartilha recomendada pelo FMI e pelas assessorias econômicas de bancos e multinacionais.
 
Ao mesmo tempo, em decorrência da excepcional condição do comércio internacional – puxada pelo dinamismo da economia chinesa, demandante de produtos agrícolas e minérios, itens de importância em nossa pauta de exportações -, o saldo de nossa balança comercial aumentou de forma contínua e, a partir do ano de 2003, passamos a obter saldo positivo em nossas transações correntes com o exterior.
 
Esta foi uma situação que nos permitiu crescer a taxas um pouco mais elevadas a partir de 2004, ampliou a oferta de empregos, facilitou a captação de recursos financeiros das empresas brasileiras no exterior – a taxas de juros muito inferiores às praticadas internamente – e permitiu que mecanismos de crédito fossem estendidos a faixas da população até então não contempladas.
 
Pelo lado das iniciativas do governo, a ampliação dos programas de transferência de renda, como é o caso do Bolsa Família; a política de reajustes reais do salário-mínimo; a reposição de vagas de trabalho no serviço público, através da realização de concursos; a própria política de reajustes de vencimentos dos servidores, repondo parte das imensas perdas acumuladas desde o governo anterior; bem como a adoção de políticas como o Luz para Todos ou o questionável Prouni, o programa de bolsas em faculdades particulares, tiveram grande impacto positivo junto a diversos setores da população, fortalecendo a popularidade do governo, particularmente junto aos setores mais carentes.
 
A maior parte da esquerda que sempre acompanhou Lula com ele se manteve ao longo do seu governo, procurando se aproveitar de sua popularidade e das facilidades que o acesso ao poder federal lhe confere, abrindo mão de qualquer crítica mais substantiva aos rumos do governo.
 
Politicamente, assistimos, assim, à evolução e fortalecimento, na prática, de uma proposta que sempre foi combatida pela esquerda, mas que agora se materializa com força, sob o comando de partidos da própria (ex) esquerda: um verdadeiro pacto social de diversas e diferentes correntes de pensamento, em torno das "virtudes" do modelo liberal-periférico, tão ao gosto de bancos e transnacionais.
 
É um pacto absolutamente inimaginável há alguns anos, mas que hoje une figuras aparentemente tão distintas como Emílio Odebrecht, José Dirceu, Blairo Maggi, Haroldo Lima, Roberto Setúbal, José Sarney, junto com centrais sindicais, setores do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra e intelectuais que ainda se dizem de esquerda.
 
Há, contudo, evidentes fissuras nesse modelo que aparentemente agrada e unifica setores anteriormente tão heterogêneos.
 
A folga em nossas contas externas, a que me referi, deixou de existir desde 2007, quando o saldo de nossa conta corrente caiu para apenas US$ 1,7 bilhão (em 2006 havia sido de US$ 13,6 bilhões), e que passou novamente a ser negativo em 2008 (-US$ 28,3 bilhões) e 2009 (-US$ 24,3 bilhões).
 
A economia produtiva do país encontra-se em níveis inéditos de desnacionalização, com volumes cada vez mais expressivos de transferências anuais de lucros e dividendos para o exterior, ao mesmo tempo em que o grau de concentração econômica de vários setores industriais e de infra-estrutura avança, sob os auspícios do BNDES.
 
Mas, particularmente, há dois aspectos que devem ser mais bem explorados na denúncia do modelo que, agora, agrada a "gregos e troianos".
 
Refiro-me, primeiramente, à absoluta falência das políticas públicas voltadas para o dia-a-dia da população. Vivemos uma crise sistêmica gravíssima no SUS – Sistema Único de Saúde; a qualidade do sistema de educação pública se degrada aceleradamente, em especial nos segmentos do ensino fundamental; o sistema de transportes públicos nas grandes metrópoles está falido; a segurança pública nunca esteve tão questionada; os preços das tarifas dos serviços públicos essenciais, em especial os de energia elétrica, são verdadeiros escândalos.
 
Enfim, há uma situação de evidente insegurança social para milhões de brasileiros que dependem de um Estado atuante e diligente na defesa do interesse público.
 
Porém, em função da política econômica, o orçamento público é comprometido com o pagamento de juros, que consome mais de 30% dos gastos da União, amplia o endividamento público – hoje, com um montante em títulos superior a R$ 2 trilhões (!) - e retira recursos justamente dessas áreas sociais, que deveriam ser privilegiadas.
 
Por outro lado, vivemos uma crise urbana de grandes proporções. A acelerada e irresponsável urbanização e concentração populacional em algumas das nossas grandes cidades chegou a um estágio intolerável.
 
O melhor exemplo é a cidade de S. Paulo. Recente pesquisa de opinião, divulgada às vésperas do aniversário dessa que é a maior e mais rica cidade brasileira, apontou que mais de 50% dos pesquisados opinaram que gostariam de se mudar imediatamente de cidade, caso houvesse essa possibilidade.
 
A crise urbana desnuda a absoluta necessidade de discussão e políticas que, de fato, democratizem o acesso à terra em nosso país, com seu imenso e magnífico território continental.
 
O campo brasileiro é hoje ocupado por um modelo agrícola que exaure e envenena a terra com suas monoculturas extensivas, bem como os alimentos e nossos organismos com toneladas de agrotóxicos, defensivos e fertilizantes; e que acaba por expulsar e inviabilizar a vida no campo para milhões de brasileiros, que hoje vivem em cidades sem a adequada rede de serviços essenciais à vida urbana.
 
Recolocar, portanto, a importância da reforma agrária e da mudança do modelo agrícola é tarefa essencial para a próxima campanha presidencial.
 
Contudo, essas são bandeiras que apenas a oposição de esquerda ao governo Lula poderá sustentar. E essa esquerda precisa encontrar os seus caminhos de unidade.
 
Enfraquecida e dividida, muitas vezes perdida em pequenas questões, essa esquerda poderá reencontrar o caminho do diálogo e da luta com os setores populares. Esta oportunidade poderá se situar na capacidade de se explorar as gritantes contradições entre o modelo que fornece a base para o bizarro pacto social lulista e as imensas aflições e angústias que continuam a fazer parte do cotidiano da esmagadora maioria de brasileiros.
 
Paulo Passarinho, economista, é presidente do Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro.