sábado, 20 de fevereiro de 2010

O rum cubano não tem segredos


Breve retrospectiva da sua história
 
Lucia Arboláez

A história do rum cubano é tão antiga como a própria colonização, pois é um produto extraído da cana-de-açúcar que o Almirante trouxe à Ilha em sua segunda viagem a este Continente. O que acontece é conhecido; as raízes da cana, procedente das Ilhas Canárias, se enraizaram na virgem e fértil terra cubana, onde encontrou um microclima ideal para crescer principalmente ao redor das aldeias aborígenes e dos rebanhos.
Existem muitas versões sobre as origens do rum, como a que desde 1650 nesta área do Caribe existiria um rum fabricado pelos piratas e corsários que navegavam pela zona ao qual denominaram “rumbillion”
Em Cuba, ao contrario, conta-se que com o extermínio de seus primeiros habitantes, no século 16, e com a chegada dos escravos negros arrancados de suas terras, a história continuou.
Diz-se que os escravos costumavam tomar o que chamaram “garapo”, obtido da fermentação da mandioca e o milho. Depois, passaram a extrair o suco da cana-de-açúcar, que uma vez fermentado, dava origem a um licor forte. Obtinha-se o liquido através de aparatos rudimentares. Mais tarde utilizou-se o trapiche em engenhos e usinas; a garapa se transformou em alcoóis e deles surgiu a aguardente.
Apetecido por sua transparência e cheiro agradável, destilação a destilação veio a surgir o rum. Mas, somente no século 19 se tornou uma bebida de qualidade e aceitação.
Surgem então no país diversas destilarias e marcas. Construíram-se destilarias em Cárdenas, Santiago de Cuba, Cienfuegos e Havana. Várias marcas se impuseram no mundo, entre as quais, as chamadas Matusalén, Jiquí, Bocoy, Campeón, Obispo, San Carlos, Albueme, Castillo, Bacardí e Havana Club.
A Bacardí se estabeleceu como a melhor e maior exportadora, durante quase todo o século 19 e parte do 20. Uma das principais leis do governo revolucionário que triunfou em 1959, foi a nacionalização das grandes empresas privadas. Os donos da Bacardí emigraram e, apesar de levarem a marca, não conseguiram levar nem obter no exterior, o bom sabor do rum cubano, “que ficou em nosso solo, nos canaviais, com o vento, o sol, os méis finais, o álcool, os barris e a herança do processo tecnológico”, no dizer de um reconhecido escritor desta nação do Caribe.
Desde então, se reorganizou e ampliou a indústria do rum cubano; surgiu de novo a antiga marca “Havana Club” – fundada em Cárdenas em 1878 – dedicada à exportação e cujo emblema é a Giraldilla, uma estatueta que simboliza a cidade de Havana.
A partir de 1993, esta marca se apresenta com a firma franco-cubana Havana Club International S.A. – a empresa francesa Pernod-Ricard se encarrega da distribuição mundial – e produz os Añejos Blancos; Tres Años Especial; Reserva sete anos e Quinze Anos, alem das mais recentes Cuban Barrel Proof e o Extra Añejo Máximo, todos de grande aceitação nacional e internacional.
Durante muito tempo, o Havana Club era único no mercado mundial. Atualmente, outras marcas cubanas não menos importantes têm conseguido afirmar-se internacionalmente; entre as quais: Mulata, Caney, Arecha, Legendário, Varadero, Santero e Caney.
 
FABRICAÇÃO ATUAL
 
“Atrás dos segredos de um dos melhores runs do mundo, existe um homem imprescindível, o Maestro Ronero, que conhece cada um dos tonéis como o pastor a suas ovelhas...”(*)
Numa ocasião, conversando com o Primeiro Maestro Ronero do Havana Club, José Navarro, santiagueiro de origem, engenheiro químico de profissão, que trabalhou na indústria ronera de nosso país desde muito jovem, falou-nos de seu trabalho e afirmou que no rum cubano não havia segredo nenhum na sua fabricação, que sua qualidade não se deve a uma formula bem guardada em caixa forte; mas somente a “uma cultura herdada e transmitida de geração a geração, de cubano a cubano, de coração a coração...” .
“Cuba parece ter o dom da cana-de-açúcar e do rum, pois esta gramínea cresce admiravelmente em nossa terra e o melaço que se extrai é de uma qualidade única, com uma microflora natural que faz de nossa aguardente algo verdadeiramente especial”, enfatizou Navarro.
Depois de enumerar as diversas etapas pelas quais passa para chegar ao rum, destacou a contribuição que o homem faz, principalmente a figura do Maestro Ronero.
Alto especialista em seu trabalho, José Navarro reconhece os valores de seus companheiros e assinala que estes possuem elevados conhecimentos técnicos, além de ser capazes de identificar e selecionar as matérias-primas, assim como fazer desenhos de equipamentos e introduzir melhorias tecnológicas, mantendo em cada atividade a qualidade histórica dos runs nacionais, sem essências nem artifícios.
Este identifica, passo a passo o rum, cada etapa do processo de elaboração até chegar à mistura final, realizada com toda a criatividade que nasce de sua identidade, cultura e mestiçagem...
Ao Maestro Ronero em Cuba preferimos chamá-lo Maestro do rum cubano já que esta categoria implica uma identificação permanente e direta com a herança e cultura do rum em nosso país, concluiu.

Entrevista a Chorinis Polychoriou

Os desafios do Socialismo do Século XXI na Venezuela
Na Venezuela “os EUA estão a prosseguir uma estratégia de intervenção (…) que podíamos denominar guerra de atrito. Já vimos esta estratégia em outros países, tais como na Nicarágua na década de 1980, ou mesmo no Chile sob Allende. É o que no léxico da CIA é conhecido como desestabilização, e na linguagem do Pentágono é chamado guerra política – o que não significa que não haja componente militar.”
William I. Robinson* - www.odiario.info

 
William I Robinson (WIR) - Há histórias alarmantes vindas da Venezuela. A fronteira está a aquecer, está a verificar-se infiltração, nova base militar colombiana próxima à fronteira, o acesso dos EUA a várias novas base na Colômbia e subversão constante. Será que o regime se preocupa com uma possível invasão? Se sim, quem está para intervir?
Chorinis Polychroniou (CP) - O governo venezuelano está preocupado acerca de uma possível invasão estado-unidense e certamente uma invasão sem rodeios não pode ser descartada. Contudo, penso que os EUA estão a prosseguir uma estratégia de intervenção mais refinada que podíamos denominar guerra de atrito. Já vimos esta estratégia em outros países, tais como na Nicarágua na década de 1980, ou mesmo no Chile sob Allende. É o que no léxico da CIA é conhecido como desestabilização, e na linguagem do Pentágono é chamado guerra política – o que não significa que não haja componente militar. Isto é uma estratégia contra-revolucionária que combina ameaças militares e hostilidades com operações psicológicas, campanhas de desinformação, propaganda negra, sabotagem económica, pressões diplomáticas, mobilização de forças da oposição política dentro do país, execução de provocações e o atear de confrontações violentas nas cidades, manipulação de sectores insatisfeitos e a exploração de queixas legítimas entre a população. A estratégia é hábil no aproveitamento dos próprios erros e limitações da revolução, tais como corrupção, clientelismo e oportunismo, os quais devemos reconhecer que são problemas sérios na Venezuela. É hábil também em agravar e manipular problemas materiais, tais como escassez, inflação dos preços e assim por diante.

O objectivo é destruir a revolução tornando-a não funcional, pela exaustão da vontade da população em continuar a lutar para forjar uma nova sociedade e, deste modo, minar a base social de massa da revolução. De acordo com a estratégia dos EUA a revolução deve ser destruída fazendo com que entre em colapso por si mesma, pela minagem da notável hegemonia que o chavismo e o bolivarianismo foram capazes de alcançar dentro da sociedade civil venezuelana ao longo da última década. Os estrategas dos EUA esperam provocar Chávez de modo a que tome a posição de transformar o processo socialista democrático num processo autoritário. Na visão destes estrategas, Chávez finalmente será removido do poder através de um certo número de cenários produzidos pela guerra de atrito constante – seja através de eleições, de um putsch militar interno, um levantamento, deserções em massa do campo revolucionário, ou uma combinação de factores que não podem ser antecipados.

Neste contexto, as bases militares na Colômbia proporcionam uma plataforma crucial para operações de inteligência e reconhecimento contra a Venezuela e também para a infiltração militar contra-revolucionária, a sabotagem económica e grupos terroristas. Estes grupos de infiltração destinam-se a perturbar mas, mais especificamente, a provocar reacções do governo revolucionário e sincronizar a provocação armada com toda a gama de agressões políticas, diplomáticas, psicológicas, económicas e ideológicas que fazem parte da guerra de atrito.

Além disso, a simples ameaça de agressão militar dos EUA que as bases em si próprias representam constitui uma poderosa operação psicológica estado-unidense destinada a elevar as tensões dentro da Venezuela, forçar o governo a posições extremistas ou a «gritar lobo», e fortalecer as forças internas anti-chavistas e contra-revolucionárias.

Entretanto, é importante verificar que as bases militares fazem parte de uma estratégia mais ampla dos EUA em relação a toda a América Latina. Os EUA e a direita na América Latina lançaram uma contra-ofensiva para reverter a viragem para a esquerda ou a chamada «Maré Rosa». A Venezuela é o epicentro de um emergente bloco contra-hegemónico na América Latina. Mas a Bolívia e o Equador e mais generalizadamente os florescentes movimentos sociais e forças políticas de esquerda da região são igualmente alvos desta contra-ofensiva tal como a Venezuela. O golpe em Honduras deu ímpeto a esta contra-ofensiva e fortaleceu a direita e as forças contra-revolucionárias. A Colômbia tornou-se o epicentro regional da contra-revolução – realmente um bastião do fascismo século XXI.

WIR - A "Revolução Bolivariana" de Chávez tem sido muito popular entre os pobres. Poderia delinear como tem mudado a sociedade venezuelana desde que Chávez chegou ao poder?
CP - Em primeiro lugar, vamos reconhecer que a Revolução Bolivariana colocou o socialismo democrático na agenda mundial depois de atravessarmos um período na década de 1990 em que muitos ficavam mesmo alarmados em falar de socialismo, quando parecia que o capitalismo global havia atingido o pico da sua hegemonia e quando alguns na esquerda compravam a tese do «fim da história».

A Revolução Bolivariana deu às massas pobres e em grande medida afro-caribenhas a sua voz pela primeira vez, desde a guerra da independência do colonialismo espanhol. O governo Chávez reorientou prioridades para a maioria pobre. Ele foi capaz de utilizar os rendimentos do petróleo, em particular, para desenvolver saúde, educação e outros programas sociais que tiveram resultados dramáticos na redução da pobreza, eliminando virtualmente a iliteracia e melhorando a saúde da população. Organizações internacionais e agências de recolha de dados têm reconhecido estas notáveis realizações sociais.

Contudo, como alguém que visita a Venezuela regularmente, eu diria que a mudança mais fundamental desde que Chávez chegou ao poder não é a destes indicadores sociais mas sim o despertar político e sócio-psicológico da maioria pobre – um vasto processo popular de mobilização das bases, expressão cultural, participação política e participação no poder. A velha elite e a burguesia foram parcialmente substituídas no Estado e do poder político formal – embora não inteiramente. Mas o medo real e o ressentimento dos velhos grupos dominantes, o pânico e o seu ódio contra Chávez é porque eles sentiram deslizar do seu domínio a capacidade confortável de exercer dominação cultura e sócio-psicológica sobre as classes populares como o fizeram durante décadas, mesmo séculos. Naturalmente, ali ainda há muitos outros mecanismos através dos quais a burguesia e os agentes políticos do ancien regime são capazes de exercer sua influência, particularmente através dos mass media que em grande medida ainda estão nas suas mãos... e eis porque as «batalhas nos media» na Venezuela desempenham um papel tão proeminente.

Dito isto, há toda espécie de problemas e contradições internas na Revolução Bolivariana.

WIR - Quão generalizados são os planos de nacionalização sob Chávez e há alguma evidência até agora de que eles levam aos resultados desejados?
CP - A grande mudança económica óbvia foi a recuperação do petróleo do país para um projecto popular – e mesmo que haja ainda uma burocrática oligarquia PDVSA. Outras empresas chaves, tais como a siderurgia, foram nacionalizadas. E o sector cooperativo – com todos os seus problemas – tem-se estendido. No entanto, vamos ser claros: o poder económico ainda está em grande medida nas mãos da burguesia.

Recordemos que a revolução venezuelana é a única em que o velho Estado reaccionário não foi «esmagado» como em outras revoluções. A estratégia da revolução tem sido erguer novas instituições paralelas e também tentar «colonizar» o velho Estado. Mas o Estado venezuelano ainda é em grande medida um Estado capitalista. A questão chave é como pode um projecto de transformação avançar enquanto opera através de um Estado corrupto, clientelista, burocrático e muitas vezes inerte, legado pelo antigo regime? Se forças revolucionárias e socialistas chegam ao poder dentro de um processo político capitalista como você confronta o Estado capitalista e os travões que ele coloca nos processos transformativos? De facto, na Venezuela, e também na Bolívia e alhures, as instituições do Estado prevalecentes muitas vezes actuam para constrangir, diluir e cooptar lutas de massas vindas de baixo.

Do meu ponto de vista, na Venezuela a maior ameaça à revolução não vem da oposição política de direita mas sim da chamada direita «endógena» ou «chavista» e pertencente ao bloco revolucionário, incluindo elites do Estado e responsáveis partidários, desenvolverão um interesse mais profundo em defender o capitalismo global do que na transformação socialista.

WIR - A revolução tem prosseguido durante mais de uma década. Está a amadurecer ou está a atingir uma etapa de declínio e deformação?
CP - Eu não diria, em resposta à sua pergunta, que a revolução está em «declínio» ou «deformação». De preferência, precisamos ser mais expansivos na nossa análise histórica e mesmo reflexão teórica sobre o que é avançar nesta conjuntura histórica do capitalismo global do século XXI e da sua crise. A viragem à esquerda na América Latina começou como uma rebelião contra o neoliberalismo. Os regimes pós neoliberais empreenderam suaves reformas redistributivas e nacionalizações limitadas, particularmente de recursos energéticos e serviços públicos que anteriormente haviam sido privatizados. Eles foram capazes de reactivar a acumulação. Mas o pós-neo-liberalismo que actualmente não caminha em direcção a uma profunda transformação socialista, está rapidamente a atingir os seus limites.

O processo bolivariano enfrenta contradições, problemas e limitações, tal como todos os projectos históricos! Eu diria que tanto a revolução venezuelana como os processos boliviano e equatoriano podem estar a rebelar-se contra os limites da reforma redistributiva dentro da lógica do capitalismo global, especialmente considerando a actual crise do capitalismo global. O anti-neoliberalismo que não desafia mais fundamentalmente a própria lógica do capitalismo choca-se contra limitações que podem agora ter sido atingidas.

Pode ser que a melhor ou a única defesa da revolução seja radicalizar e aprofundar o processo revolucionário, pressionar pelo avanço de transformações estruturais que vão além da redistribuição. O facto é que a burguesia venezuelana pode ter sido deslocada em parte do poder político mas ainda detém grande parte do controle económico. Romper aquele controle económico implica uma mudança mais significativa na propriedade e nas relações de classe. Isto por sua vez significa romper a dominação do capital, do capital global e dos seus agentes locais. Isto naturalmente é uma tarefa hercúlea. Não há um caminho claro de avanço e cada passo gera novas contradições complexas e nós górdios. É claro que estes são assuntos que toda a Esquerda Global deve encarar.

Recordemos as lições da Nicarágua e de outras revoluções. Alianças multi-classe geram contradições desde que a etapa da lua-de-mel da reforma redistributiva e dos programas sociais fáceis alcancem o seu limite. Então as alianças multi-classe começam a entrar em colapso porque há contradições fundamentais entre distintos projectos e os interesses de classe. Nesse ponto uma revolução deve definir mais claramente o seu projecto de classe; não apenas no discurso ou na política mas na transformação estrutural real.

A um nível mais técnico, poderíamos dizer que as contradições geradas pela tentativa de romper a dominação do capital global não são uma falha da revolução. A Venezuela ainda é um país capitalista no qual a lei do valor, da acumulação de capital, está operativa. Esforços para estabelecer uma lógica contrária – uma lógica da necessidade social e da distribuição social – chocam-se contra a lei do valor. Mas numa sociedade capitalista violar a lei do valor lança tudo na loucura, gerando muitos problemas e novos desequilíbrios que a contra-revolução é capaz de aproveitar. Isto é o desafio para qualquer revolução orientada para o socialismo dentro do capitalismo global.


* William I Robinson é Professor de Sociologia na Universidade da Califórnia – Santa Bárbara; Chorinis Polychroniou é editor do diário grego Eleftherotypia

Esta entrevista foi publicada em www.zmag.org/znet/viewArticle/23797

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Sobre a sociedade industrial e seus beneficios.....

Benefícios da sociedade industrial
Escrito por Wladimir Pomar  - Correio da Cidadania 
 
A construção de uma sociedade industrial, como se viu, não diz respeito apenas ao capital. Ela diz respeito também ao pólo oposto, aos trabalhadores assalariados que movimentam os meios de produção, assim como aos demais segmentos sociais do país. E diz respeito ainda à correlação política real de forças.
 
Sob o prisma do desenvolvimento das forças produtivas, isto é, dos meios de produção e da força de trabalho, a industrialização, e os investimentos nas grandes obras de infra-estrutura, indispensáveis àquele desenvolvimento, são ou não necessários para o desenvolvimento social e nacional?
 
Somente os adeptos do agrarismo e da sociedade utópica pós-industrial podem afirmar que elas são desnecessárias e que apenas beneficiam ao capital. Mesmo nos governos nacional-desenvolvimentistas de Vargas, JK e do regime militar, nos quais o desenvolvimento social foi relegado, na melhor das hipóteses, a um tópico indesejado da agenda política, o desenvolvimento econômico trouxe consigo o crescimento da classe de trabalhadores assalariados industriais, comerciais e rurais.
 
Dessa forma, o crescimento da sociedade industrial colocou em cena um ator econômico, social e político de primeira ordem. Um ator que se libertava do latifúndio dispersivo para subordinar-se à disciplina fabril do capital, mas de forma concentrada. Isso tudo sob uma relação de trabalho que lhe arrancava o véu do paternalismo, que até então o mantinha sob a suposição de trabalhar pela boa vontade do senhor de terras. O desenvolvimento industrial serviu para clarificar a situação de classe de grandes contingentes da população brasileira.
 
O salário mensal e outros "benefícios", conquistados por sucessivas gerações de assalariados, apresentavam-se como um progresso em relação à vida anterior de camponês agregado. Apesar disso, as ondas de migrantes rurais tornados trabalhadores industriais, tanto nos anos 1930 e 1940, quanto nos anos 1960 e 1970, se transformaram em ondas de combatentes trabalhistas. As primeiras, nas grandes greves operárias dos anos 1950 e início dos anos 1960. As segundas, nas greves e movimentos políticos dos anos 1970 e 1980.
 
Em outras palavras, na pior das hipóteses, o desenvolvimento industrial fornece o ator principal que pode modificá-la no futuro, à medida que o capitalismo demonstrar que esgotou seu papel histórico e deve ser substituído por uma nova formação econômica e social. O problema, como a experiência tem demonstrado em muitas partes do mundo e no Brasil, é que a história adora pregar peças nas utopias.
 
Revoluções anticapitalistas foram vitoriosas apenas em países em que o capitalismo era pouco desenvolvido. Essas revoluções construíram um novo Estado e fortes instrumentos de interferência na economia, como as empresas estatais. Porém, mesmo assim, alguns dos países que sobraram da segunda onda revolucionária do século 20 estão sendo obrigados a praticar economias socialistas de mercado.
 
A experiência demonstrou que a tese de Marx, sobre o surgimento e esgotamento histórico dos modos de produção, era uma lei natural a ser observada. Não é possível abolir as formas capitalistas de produção antes que elas esgotem seu papel histórico. Nessas condições, para desenvolver as forças produtivas, aqueles países socialistas estão se desenvolvendo com a participação de capitais estatais e privados, tanto nacionais quanto estrangeiros, num complexo processo de cooperação e conflito, em que o Estado tem papel orientador e disciplinador.
 
No Brasil, os anticapitalistas não acharam condições para revolucionar a sociedade, mas sim para galgar uma parte do Estado. Foram eleitos para a presidência da República, assim como para governos estaduais e municipais, numa situação política de divisão no seio da burguesia, em virtude da política neoliberal haver feito regredir o parque industrial e tecnológico do país e quebrado o papel do Estado como indutor econômico.
 
Para complicar, grande parte das empresas estatais havia sido privatizada, sob o argumento de que empresas estatais seriam ineficientes, idéia que se tornou senso comum em amplos setores da população. E o neoliberalismo também havia estendido a pobreza e a miséria a níveis desconhecidos dos períodos anteriores.
 
Num quadro como esse, supor que um governo, mesmo de viés revolucionário, possa romper com o sistema econômico e social vigente, ou mesmo redirecionar os investimentos apenas para programas sociais, não passa de um sonho. O que ele pode fazer, diferentemente dos governos tipicamente burgueses, consiste em ampliar a participação popular nos benefícios dos investimentos e desenvolver programas sociais que cresçam à medida que o desenvolvimento das forças produtivas ocorra.
Em outras palavras, ao invés de esperar o bolo crescer para depois dividir, velha promessa da burguesia, um governo popular ou socialista pode ir aumentando a participação popular no bolo à medida que ele cresça. Mas, uma das condições necessárias é que o bolo cresça e gere riqueza.
 
Se olharmos o que o governo Lula vem fazendo, apesar da composição pouco homogênea de seu governo, é justamente isso. No entanto, seus críticos consideram que, além de não significar qualquer ruptura com o status quo anterior, a chegada do PT ao Estado teria significado a desconstrução da hegemonia que havia conquistado na sociedade. O que nos remete da sociedade industrial para a sociedade política.
 
Wladimir Pomar é escritor e analista político.

Pobre do povo que tem que aguentar isso.....

Viver a Vida: o que os olhos não veem na novela da Globo

Não há nada melhor que viver a vida neste meu Brasil brasileiro onde o coqueiro dá coco. Ao menos na teoria, viver a vida é bom. Ora, ninguém pode afirmar que o bom é viver a morte, e se existe vida há que se viver. Nada mais óbvio.


Por Washington Araújo*, no Observatório da Imprensa

Marca do novelista global Manoel Carlos, a obra em andamento conta também com histórias reais de superação e tudo contado na eternidade dos 60 segundos logo após o último bloco do capítulo diário de Viver a Vida, a novela.

Em breve a novela seguirá para seu fim e até o momento quase nada tem sido escrito por especialistas da mídia sobre as aberrações que o folhetim apresenta. Mau-caratismo, traição, adultério, ciúme, inveja, alcoolismo e uso de drogas se apresentam no horário nobre toda santa noite como aperitivo antes do desbunde geral em que se transformou o que já não era bom, o famigerado Big Brother Brasil.

As “vinhetas de superação” trazendo ao horário nobre gente sofrida, abandonada, envolvida nas drogas ou no crime, pessoas portadoras de necessidades especiais e vítimas de todo tipo de violência, testemunham como foi bom ter dado a volta por cima. Porque nesse horário somente essas pessoas sabem como é viver a vida, enfrentar os desafios, superar as debilidades. Na novela tudo é caricato, tosco e apelativo. Personagens quando choram parecem estar gargalhando por dentro, e quando falam de amor optam pelo desamor, focam as desilusões e nossas pequenas tragédias humanas.

A realidade no folhetim é absolutamente virtual. Basta ver a favela de Viver a Vida. Tem até jantar à luz de velas. Balas perdidas? Existe isso? Onde? Quem? O hospital do Dr. Moretti é imenso pátio de diversões onde os médicos estão sempre na lanchonete, colocando em dia seus problemas amorosos e nunca incomodados por pacientes alquebrados, gente entre a vida e a morte como é tão comum e mesmo rotineiro em hospitais.

A pousada de Búzios tem clima de Copacabana Palace. Tudo na pousada é muito limpo, decoração de primeira, natureza exuberante, ninguém parece trabalhar mas tudo está sempre nos trinques e hospedes que é bom, se existem, não dão as caras. Faltou a Manoel Carlos a vivência de um feriadão em pousada de Salvador, Porto Seguro, Natal ou Florianópolis.

Trabalho infantil

Viver a Vida é um vale de lágrimas do início ao fim. As pessoas choram sem parcimônia. E com gosto. Há aquela que chora porque não consegue parar de beber. Há aquela outra que chora porque está tetraplégica. Outra chora porque não consegue consumar o adultério. Há quem chore porque é abandonada pelo noivo a poucas horas do casamento. Outra chora porque o marido não aceita conviver em harmonia com os enteados, filhos do primeiro casamento. Tem quem chore porque a irmã tetraplégica recebe mais atenção da mãe e das irmãs. Há quem chore porque os filhos gêmeos estão apaixonados pela mesma pessoa. Tem quem chore por acreditar que uma pessoa tetraplégica não pode fazer ninguém feliz. É o folhetim dos vilões-fashion, gente descolada, rica e que prefere viver a vida na base de quanto mais fútil for a vida, melhor.

Até aqui nada de muito novo. O que não entendo é as autoridades responsáveis pela proteção da infância e da adolescência deixarem uma graciosa menina de apenas 8 anos de idade interpretar uma vilã. É o que acontece com a Rafaela interpretada pela espertíssima Klara Castanho. Vemos todas as noites sua infância sendo roubada. Assistimos impassíveis ao sequestro de uma inocência que deveria ser preservada, inicialmente por seus pais, depois por esse veículo de comunicação que é uma concessão pública chamada televisão e depois pelo pessoal do judiciário, das tais varas da Criança e do Adolescente.

Rafaela se pinta com as cores da vida adulta, se veste insinuante como é comum aos jovens, é a cara do consumo-mirim sempre instigando sua mãe a comprar isso e aquilo mesmo que não tenha rendimento para tal. O pior nem é isso. O pior é o retrato de criança manipuladora e sensual, chantagista e dona de opinião sobre assuntos bem complexos para mente em formação como é o caso de aborto, mãe esperando segundo filho, vida de mãe solteira e testemunha de tórrida cena de adultério.

Será que ninguém observa nada disso? Será que ninguém vai trazer à mesa a discussão sobre trabalho infantil em programas para público adulto como é uma novela das oito? Será que toda e qualquer manifestação artística é passível de ser exercida por crianças e adolescentes? Pelo andar da carruagem não me causará espanto se em capítulo futuro a pequena Rafaela se transformar em psicopata-mirim.

Mercado e audiência

É que ninguém está nem aí para colocar em prática dispositivos como o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069, de 13/7/1990), calhamaço que conta com impressionantes 267 artigos. Destes faço questão de enunciar apenas seu Artigo 3º:

“A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.”

 

A caracterização dada à personagem Rafaela faculta à atriz-mirim Klara Castanho seu desenvolvimento “mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade”? A meu ver, se dá exatamente o contrário. Rafaela é tratada como coisa a ser transportada na vida cheia de peripécias de sua mãe Dora; interpõe-se com protagonismo principal na relação de sua mãe com quem poderia ser seu bisavô, o romântico Maradona, dono da pousada; os diálogos de Dora com Rafaela se sustentam em mentiras escancaradas e em meias verdades; os olhares de “brinquedo assassino” de Rafaela ao iniciar sua precoce carreira de chantagista mirim com a principal protagonista do folhetim, Helena, não deixam dúvidas que coisa muito mais escabrosa vem pela frente.

Enquanto a trama se desenrola, Rafaela passa a frequentar com maior insistência o imaginário de milhões de crianças da mesma idade vindo a se tornar um modelo infantil a ser seguido com toda sua carga de manipulação e astúcia poucas vezes vista em personagens adultas. E não encontramos contraponto. Isso acontece porque levantar qualquer bandeira que vise proteger a integridade moral e a dignidade de uma criança explorada por um folhetim global é quase cometer crime de lesa-pátria. E não faltarão pessoas a torcerem o nariz para esse meu texto sob o pretexto de que seria incitação à censura. Nada mais ridículo que isso.

O ponto é que enquanto o Deus-Audiência estiver em seu trono nada poderá mudar. Nem que preceitos constitucionais sejam violados e que sejam arquivadas no baú das coisas imprestáveis imagens de crianças inocentes, bondosas, cheias de compaixão, educadas, inteligentes, respeitadoras dos mais velhos... e tantos outros predicados do tempo em que andar a pé era novidade.

* Washington Araújo é jornalista, escritor e professor da UnB

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Compra de eleições por parte das empresas corporativas....

A apropriação da democracia dos EUA pelas empresas
Noam ChomskyCom a decisão do Supremo Tribunal dos EUA de 21 de Janeiro deste ano, os gestores das empresas podem passar a comprar eleições directamente. Por Noam Chomsky

O dia 21 de Janeiro de 2010 irá permanecer como um dia sombrio na história da democracia dos EUA e do seu declínio.
Nesse dia, o Supremo Tribunal dos EUA decidiu que o governo não poderá impedir as empresas de fazer gastos políticos nas eleições - uma decisão que afecta profundamente a política governamental, quer interna quer externa.
A decisão marca ainda mais a apropriação pelas empresas do sistema político dos EUA. Para os editores do The New York Times, a decisão "atinge o coração da democracia" tendo "aberto caminho para as empresas usarem as suas vastas tesourarias para dominar as eleições e pressionar os políticos eleitos a cumprir as suas ordens."
O Tribunal estava dividido, 5-4, com os quatro juízes reaccionários (erradamente designados "conservadores") a receber o apoio do Juiz Anthony M. Kennedy. O Presidente do Supremo, John G. Roberts Jr., escolheu um caso que poderia ter sido facilmente resolvido em esferas mais baixas e manobrou o tribunal, usando-o para impor uma decisão de grande alcance, que derruba um século de precedentes restringindo as contribuições das empresas para campanhas federais.
Agora, os gestores das empresas podem efectivamente comprar eleições directamente, ultrapassando meios indirectos mais complexos. É bem sabido que as contribuições das empresas, embrulhadas por vezes em formas complexas, podem inclinar a balança nas eleições, conduzindo dessa forma a política. O tribunal acabou de atribuir muito mais poder ao pequeno sector da população que domina a economia.
A "teoria do investimento político" do economista político Thomas Ferguson é um prognóstico bastante eficaz da política do governo durante um longo período. A teoria interpreta as eleições como ocasiões em que segmentos do poder do sector privado se unem para investir no controlo do Estado.
A decisão de 21 de Janeiro apenas reforça os meios para minar o funcionamento da democracia.
O contexto é esclarecedor. No seu voto de vencido, o juiz John Paul Stevens reconheceu que "há muito que sustentamos a ideia de que as empresas estão cobertas pela Primeira Emenda" - a garantia constitucional da liberdade de expressão, que incluiria o apoio aos candidatos políticos.
No início do século XX, os teóricos de Direito e os tribunais implementaram a decisão do tribunal de 1886 pela qual as empresas - "estas entidades legais colectivistas" - têm os mesmos direitos que as pessoas de carne e osso.
Este ataque ao liberalismo clássico foi duramente condenado por uma espécie de conservadores em extinção. Christopher G. Tiedeman descreveu o princípio como "uma ameaça à liberdade do indivíduo e à estabilidade dos Estados norte-americanos enquanto governos populares."
Morton Horwitz escreve na sua história do Direito que o conceito de personalidade empresarial evoluiu paralelamente à mudança do poder dos accionistas para os gestores, e finalmente para a doutrina em que "os poderes do conselho de administração são idênticos aos poderes da empresa." Anos mais tarde, os direitos das empresas foram expandidos muito além das pessoas, nomeadamente pelos mal designados "acordos de livre comércio." Segundo esses acordos, por exemplo, se a General Motors instalar uma fábrica no México, pode exigir que seja tratada como qualquer negócio mexicano ("tratamento nacional") - ao contrário de um mexicano de carne e osso que procure "tratamento nacional" em Nova York, ou mesmo os direitos humanos mínimos.
Há um século atrás, Woodrow Wilson, na altura um académico, descreveu uma América na qual "grupos comparativamente pequenos de homens," gestores empresariais, "detêm um poder e controlo sobre a riqueza e as operações de negócios do país," tornando-se "rivais do próprio governo."
Na verdade, estes "pequenos grupos" tornaram-se cada vez mais os donos do governo. O tribunal de Roberts deu-lhes um alcance ainda maior.
A decisão de 21 de Janeiro chegou três dias depois de uma outra vitória para a riqueza e o poder: a eleição do candidato republicano Scott Brown para substituir o falecido senador Edward M. Kennedy, o "leão liberal" de Massachusetts. A eleição de Brown foi descrita como uma "vaga populista" contra as elites liberais que lideram o governo.
Os dados da votação revelam uma história bastante diferente.
Elevados índices de participação nos subúrbios ricos, e baixos nas áreas urbanas maioritariamente democratas, ajudaram a eleger Brown. "Cinquenta e cinco por cento dos eleitores republicanos afirmaram estar 'bastante interessados' na eleição", informou a sondagem do Wall St. Journal/NBC, "comparado com os 38% dos democratas."
Assim, os resultados foram de facto um acto de revolta contra as políticas do presidente Obama: para os ricos, ele não estava a fazer o suficiente para enriquecê-los ainda mais, enquanto que para os sectores mais pobres estava a fazer demasiado para atingir esse fim.
A irritação popular é bastante compreensível, dado que os bancos estão a prosperar, graças às ajudas do governo, enquanto o desemprego aumentou para 10%.
No sector industrial, uma em cada seis pessoas está desempregada - um desemprego ao nível da Grande Depressão. Com a financiarização crescente da economia e o esvaziamento da indústria produtiva, as perspectivas são sombrias para a recuperação dos empregos perdidos.
Brown apresentou-se a si mesmo como o 41º voto contra o sistema de saúde - ou seja, o voto que poderia minar a maioria do Senado dos EUA.
É verdade que o programa de cuidados de saúde de Obama foi um factor importante na eleição de Massachusetts. Os títulos dos jornais estão correctos quando se lê que a população está a voltar-se contra o programa.
As sondagens explicam porquê: o projecto de lei não vai suficientemente longe. A sondagem do Wall St. Journal/NBC demonstra que a maioria dos eleitores desaprova a forma como tanto os republicanos quanto Obama têm lidado com a reforma do sistema de saúde.
Estes números estão de acordo com as recentes sondagens nacionais. A opção do sistema público foi apoiada por 56% dos entrevistados, e a adesão ao Medicare aos 55 anos de idade foi apoiada por 64%; ambos os programas foram abandonados.
Oitenta e cinco por cento acreditam que o governo deveria ter o direito de negociar o preço dos medicamentos, como acontece noutros países; Obama garantiu à indústria farmacêutica que não irá seguir em frente com essa opção.
Largas maiorias são a favor da redução de custos, o que faz todo o sentido: os custos per capita dos EUA para o sistema de saúde são cerca do dobro relativamente a outros países industrializados, e os resultados da saúde estão a regredir.
Mas a redução de custos não pode ser levada a cabo seriamente quando as indústrias farmacêuticas são agraciadas, e o sistema de saúde está nas mãos das seguradoras privadas praticamente desreguladas - um sistema peculiar bastante caro aos E.U.A.
A decisão de 21 de Janeiro levanta novas barreiras significativas para ultrapassar a grave crise no sistema de saúde, ou para lidar com questões críticas como as ameaçadoras crises ambiental e energética. O hiato entre a opinião pública e a política pública avizinha-se crescente. E o prejuízo para a democracia norte-americana dificilmente pode ser sobrevalorizado.

Publicado em Znet
 
Traduzido por: Sara Vicente

Blowback: o legado da CIA no Irã, Afeganistão e Paquistão




O mínimo que se pode dizer é que no Irã, Afeganistão e Paquistão os EUA colhem hoje o que a CIA plantou com a colaboração de gente como o deputado Charlie Wilson. Osama Bin Laden foi treinado pela CIA para atacar os russos; gostou e atacou depois o World Trade Center em Nova York. E as bombas atômicas do Paquistão (real) e do Irã (hipotética) devem-se, ao menos em parte, à igual cortesia da CIA. A situação atual destes três países reflete o passado irresponsável da espionagem dos EUA. O artigo é de Argemiro Ferreira.

A imagem do herói no cavalo branco a salvar a mocinha das garras do vilão, seja este assaltante de banco ou índio em defesa de suas terras invadidas, é recorrente na ficção de Hollywood. O deputado Charlie Wilson morreu, aos 76 anos, no dia 10 de fevereiro, certo de que era herói na vida real. Motivo: no Congresso injetou bilhões de dólares para financiar os que lutavam contra os russos no Afeganistão.

Ao morrer do coração Wilson já estava aposentado. Mas ele representou o Texas por 14 mandatos sucessivos na Câmara. Um livro (“Charlie Wilson’s War - The Extraordinary Story of the Largest Covert Operation in History”, de George Crile) e um filme (“Charlie Wilson’s War”, de Mike Nichols, com Tom Hanks no papel-título) o retrataram como herói.

A semana marcou ainda o 31° aniversário da revolução dos aiatolás do Irã, ocorrida apenas alguns meses antes da invasão do Afeganistão. Os iranianos derrubaram o regime do xá Reza Pahlevi, instalado em 1953 graças a golpe planejado pela mesma CIA que usou as verbas secretas do deputado Wilson para recrutar e armar os radicais islâmicos do lado paquistanês da fronteira com o Afeganistão.

O mínimo que se pode dizer é que no Irã, Afeganistão e Paquistão os EUA colhem hoje o que a CIA plantou com a colaboração de gente como o deputado Wilson. Osama Bin Laden foi treinado pela CIA para atacar os russos; gostou e atacou depois o World Trade Center em Nova York. E as bombas atômicas do Paquistão (real) e do Irã (hipotética) devem-se, ao menos em parte, à igual cortesia da CIA.

A lambança atual no Afeganistão (largamente nas mãos dos radicais islâmicos usados pela CIA a partir de 1979), no Paquistão (onde a CIA instalou acampamentos para os ataques aos russos no país vizinho e encorajou o sonho paquistanês da bomba nuclear islâmica) e no Irã (que se nega hoje a abandonar o enriquecimento de urânio) reflete o passado irresponsável da espionagem dos EUA.

No Irã o golpe da CIA instalou o xá no lugar do premier nacionalista Mohamed Mossadegh, anulou a nacionalização do petróleo e com faustosa coroação em 1967 impôs a ficção do “trono de 2.500 anos”. As corporações anglo-americanas ganharam mais um quarto de século para explorar o petróleo do Irã, já que a CIA ainda concebeu a tenebrosa Savak, serviço secreto celebrizado pelas câmaras de tortura.

Ainda naquela década de 1950 o Irã foi premiado pelo governo do presidente Eisenhower com relações muito especiais - que incluiram “acordo de cooperação nuclear para fins pacíficos”, deixando o país com alguma base para, em seguida à revolução dos aiatolás, assustar os EUA com a disposição de ampliar o programa nuclear e rumar para o enriquecimento de urânio.

Para o Irã submisso de Reza Pahlevi, nada era bom demais: além de favorecer o desenvolvimento nuclear, Washington ainda dotou o país de armas sofisticadas e modernizou a máquina da repressão - tudo pago com a receita do petróleo, que regalou nos EUA as indústrias bélica, aeronáutica, nuclear e de segurança. Só que hoje, tomado pelos rebeldes radicalizados nas câmaras de tortura, o Irã é outro.

De tal forma o Irã do xá era criatura da CIA que, no final de 1973, o presidente Nixon concluiu que ninguém melhor para ser embaixador em Teerã do que o próprio diretor da central de espionagem, Richard Helms - “dada a intimidade dele com o xá”, explicou. Como se fosse o posto final de uma carreira de sucesso na CIA, dirigida por Helms durante quase sete anos, antes dos três que passou no Irã.

Com a contribuição do deputado Charlie Wilson, anticomunista meio fanático, o capítulo Afeganistão-Paquistão foi ainda mais vivo, excitante e insólito - ou “colorful”, para usar adjetivo talvez mais apropriado à conduta do parlamentar excêntrico que quando não estava “salvando o mundo” da suposta “ameaça vermelha” dedicava-se ao consumo de álcool e drogas com prostitutas de luxo.

Ele ficou obviamente encantado com os relatos do livro e do filme que o tornaram celebridade. Seu papel pode ter sido singular pelo conhecimento de sutilezas do processo legislativo na Câmara, onde integrava a comissão de verbas (appropriations) e sua subcomissão sobre operações no exterior - além de cultivar contatos na comissão que supervisiona a espionagem.

Não só estava familiarizado com mecanismos e artifícios para ocultar a destinação de recursos. Também revelara-se mestre na troca de favores com colegas interessados em abocanhar verbas para projetos de seus distritos eleitorais. Certos especialistas acham que hoje teria mais dificuldades: o processo legislativo sofreu reformas depois, reduzindo - em nome da transparência - a prática do sigilo.

O fato é que Wilson começou por canalizar uma verba de US$ 5 milhões para os radicais do Afeganistão. E, no fim da década de 1980, aqueles recursos elevavam-se a nada menos de US$ 750 milhões por ano. Pode ter sido ajudado por pertencer ao partido da oposição (Democrata) numa década dominada por governos republicanos (Reagan e Bush I) obstinados em estender ainda mais as ações militares dos EUA pelo mundo.

No Afeganistão e Paquistão, sabe-se hoje, a lambança foi bipartidária - devido a uma armadilha do governo do presidente democrata Jimmy Carter. Seu assessor de segurança nacional na Casa Branca, Zbigniew Brzezinski, confessaria 20 anos depois ter atraído a URSS para a idéia de invadir o Afeganistão. A invasão veio a 24 de dezembro de 1979, após seis meses de ajuda crescente da CIA aos rebeldes radicais.

Em entrevista à revista francesa “Nouvel Observateur”, em 1998, Brzezinski vangloriou-se de seu papel: “Carter assinou a 3 de julho de 1979 a primeira diretiva (à CIA) para a ajuda secreta aos opositores do regime pro-soviético de Kabul. Naquele dia eu tinha enviado nota ao presidente na qual expliquei que, na minha opinião, tal ajuda americana iria levar a uma intervenção militar soviética”.

Quando o jornalista perguntou se a ação clandestina dos EUA tivera a intenção de provocar a invasão russa, Brzezinski amenizou: “Não provocamos os russos para que invadissem, mas ampliamos conscientemente a probabilidade de que isso viesse a ocorrer”. No dia em que os russos cruzaram a fronteira, disse, escreveu de novo a Carter: “Agora temos a oportunidade de dar aos soviéticos o Vietnã deles”.

Brzezinski contestou, assim, a tese republicana que atribui a Reagan a glória pelo fim da URSS. “Durante quase 10 anos a URSS amargou guerra insuportável - um conflito que trouxe a desmoralização e, afinal, a dissolução do império soviético”, alegou. Mas o exagero é comparável ao do mérito republicano. O desfecho, após meio século, deveu-se aos dois partidos e muita gente mais - inclusive os que erraram na própria URSS.

As avaliações atuais tentam ignorar os efeitos negativos das ações da espionagem. Ao financiar, treinar e armar (até com mísseis Stinger, capazes de destruir aviões em vôo) os radicais que batizou de “combatentes da liberdade” a CIA extremou as ambições deles. Hoje ela os repudia como “terroristas”, indiferente ao fato de que aprenderam na CIA a pensar o impensável - como atacar o coração do império americano.

Com os russos fora do Afeganistão os EUA deixaram o país para os radicais que a CIA diplomou em terrorismo. Com armas como o Stinger, os talibãs tomaram o poder e ficaram até 2001. Bin Laden, saudita de nascimento, ainda dirige de lá a rede al-Qaeda, que opera no mundo a partir do território afegão. E a CIA ainda tenta “recomprar” Stinger mas nem sabe quantos distribuiu - a estimativa vai de 500 a 2.000.

O deputado Wilson, ao invés de herói, foi cúmplice das trapalhadas. Livro e filme dizem que atuava com assistência da CIA. A culpa dos EUA e sua agência ia mais longe na relação promíscua com o general-ditador paquistanês Zia-ul-Haq, que em troca do apoio à operação na fronteira afegã obteve luz verde e deu carta branca ao construtor da bomba atômica islâmica, o cientista Abdul Qadeer Khan.

No desdobramento, a receita da bomba-A do Paquistão foi parar no Irã, Coréia do Norte, Líbia e talvez outros. Assim, além de fazer a “guerra (sem fronteiras) ao terrorismo” e lutar no Afeganistão contra os que antes chamava de “combatentes da liberdade”, os EUA hoje têm de vigiar o Dr. Khan, o serviço secreto (ISI) do Paquistão, os progressos nucleares do Irã e da Coréia do Norte e sabe-se-lá-mais-o-que.

A própria CIA adotou a expressão “blowback” para designar os efeitos opostos ao que pretendia em cada uma de suas operações clandestinas. A palavra apareceu pela primeira vez em relatório secreto de 1954 sobre o golpe da CIA no Irã. O “blowback” da derrubada de Mossadegh foi a tirania de 25 anos e a revolução (antiamericana) dos aiatolás. Já no Afeganistão os ataques do 11/9 nos EUA tendem a ficar como exemplo maior.

Blog de Argemiro Ferreira


Fotos: Deputado Charlie Wilson em 1987, entre os radicais islâmicos do Afeganistão.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Serra e Kassab têm sorte de não serem argentinos...

Na capa, a cidade inundada e o Prefeito Maurício Macri

Por Brizola Neto no blog Tijolaço

A capa de hoje do diário argentino Pagina 12 é uma mostra do quanto pode ser criativo e irreverente um jornal, quando o quer ser. Ontem Buenos Aires, a capital argentina, sofreu uma inundação, provocada por chuvas intensas, esgotos insuficientes e obstruídos e obras hidráulicas atrasadas. O prefeito Maurício Macri, um engenheiro civil, de direita, que derrotou o candidato peronista Hugo Cocarro em 2007 e desponta como um possível candidato à presidência, disse que a enchente foi um fenômeno climático “raro” e que o vento provocou uma cheia no Rio da Prata. No entanto, há 90 dias, a Auditoria Geral da Cidade havia expedido um memorando a diversas autoridade dizendo que a rede de drenagem estava em péssimo estado e o governo municipal não tinha o menor controle sobre as empresas contratadas para sua manutenção e desentupimento.As bombas de drenagem não funcionaram, um túnel viário inundou, 50 mil pessoas ficaram sem luz.
Isso lembra alguma coisa? Você já viu isso em algum lugar aqui?
A única coisa que você não viu é um jornal brasileiro fazer uma capa genial como essa.

Entrevista com Chronis Polychroniou, editor do diário grego Eleftherotypia



Os desafios do socialismo no século 21 na Venezuela
 
 
Por William I. Robinson - via CarosAmigos
 
Há histórias preocupantes vindo da Venezuela. A situação na fronteira está tensa, há uma nova base militar colombiana próxima à fronteira, o acesso dos EUA a várias novas bases na Colômbia... Será que o regime se preocupa com uma possível invasão? Se sim, quem está para intervir?

Chronis Polychroniou - O governo venezuelano está preocupado acerca de uma possível invasão estadunidense. Contudo, penso que os EUA estão seguindo uma estratégia de intervenção mais refinada que podíamos denominar guerra de atrito. Já vimos esta estratégia em outros países, tais como na Nicarágua na década de 1980, ou mesmo no Chile sob Allende. É o que no léxico da CIA é conhecido como desestabilização, e na linguagem do Pentágono é chamado guerra política – o que não significa que não haja componente militar. É uma estratégia que combina ameaças militares e hostilidades com operações psicológicas, campanhas de desinformação, propaganda, sabotagem econômica, pressões diplomáticas, mobilização de forças da oposição política dentro do país, manipulação de setores insatisfeitos e a exploração de queixas legítimas entre a população. A estratégia é hábil em aproveitar dos próprios erros e limitações da revolução, tais como corrupção, clientelismo e oportunismo, os quais devemos reconhecer que são problemas sérios na Venezuela. É hábil também em agravar e manipular problemas materiais, tais como escassez, inflação dos preços e assim por diante.
 
O objetivo é destruir a revolução tornando-a não funcional, pela exaustão da vontade da população em continuar a lutar para forjar uma nova sociedade e, deste modo, minar a base social de massa da revolução. De acordo com a estratégia dos EUA a revolução deve ser destruída fazendo com que entre em colapso por si mesma, minando a notável hegemonia que o chavismo e o bolivarianismo foram capazes de alcançar dentro da sociedade civil venezuelana ao longo da última década. Os EUA esperam provocar Chávez de modo a que tome a posição de transformar o processo socialista democrático num processo autoritário. Na visão deles, Chávez finalmente será removido do poder através de um cenário produzido pela guerra de atrito constante – seja através de eleições, de um putsch militar interno, um levantamento, deserções em massa do campo revolucionário, ou uma combinação de fatores que não podem ser antecipados.
 
Neste contexto, as bases militares na Colômbia proporcionam uma plataforma crucial para operações de inteligência e reconhecimento contra a Venezuela e também para a infiltração militar contra-revolucionária, a sabotagem econômica e grupos terroristas. Estes grupos de infiltração destinam-se a provocar reações do governo e sincronizar a provocação armada com toda a gama de agressões políticas, diplomáticas, psicológicas, econômicas e ideológicas que fazem parte da guerra de atrito.
 
Além disso, a simples ameaça de agressão militar dos EUA que as bases representam constitui uma poderosa operação psicológica estadunidense destinada a elevar as tensões dentro da Venezuela, forçar o governo a posições extremistas ou a fortalecer as forças internas anti-chavistas e contra-revolucionárias.
 
Entretanto, é importante verificar que as bases militares fazem parte de uma estratégia mais ampla dos EUA em relação a toda a América Latina. Os EUA e a direita na América Latina lançaram uma contra-ofensiva para reverter a guinada para a esquerda ou a chamada "Maré Rosa". A Venezuela é o epicentro de um emergente bloco contra-hegemônico na América Latina. Mas a Bolívia, Equador e os movimentos sociais e forças políticas de esquerda da região são igualmente alvos desta contra-ofensiva tal como a Venezuela. O golpe em Honduras deu ímpeto a esta contra-ofensiva e fortaleceu a direita e as forças contra-revolucionárias. A Colômbia tornou-se o epicentro regional da contra-revolução – realmente um bastião do fascismo século 21.
 
A "Revolução Bolivariana" de Chávez tem sido muito popular entre os pobres. Poderia explicar como a sociedade venezuelana tem mudado desde que Chávez chegou ao poder?
Em primeiro lugar, vamos reconhecer que a Revolução Bolivariana colocou o socialismo democrático na agenda mundial depois de atravessarmos um período na década de 1990 em que muitos ficavam mesmo alarmados em falar de socialismo, quando parecia que o capitalismo global havia atingido o pico da sua hegemonia e quando alguns na esquerda compravam a tese do "fim da história".
 
A Revolução Bolivariana deu às massas pobres e em grande medida afro-caribenhas a sua voz pela primeira vez desde a guerra da independência do colonialismo espanhol. O governo Chávez reorientou prioridades para a maioria pobre. Ele foi capaz de utilizar os rendimentos do petróleo, em particular, para desenvolver saúde, educação e outros programas sociais que tiveram resultados dramáticos na redução da pobreza, eliminando virtualmente o analfabetismo e melhorando a saúde da população. Organizações internacionais e agências têm reconhecido estas notáveis realizações sociais.
 
Contudo, como alguém que visita a Venezuela regularmente, eu diria que a mudança mais fundamental desde que Chávez chegou ao poder não é a destes indicadores sociais mas sim o despertar político e sócio-psicológico da maioria pobre – um vasto processo popular de mobilização das bases, expressão cultural, participação política e participação no poder. A velha elite e a burguesia foram parcialmente substituídas no Estado e do poder político formal – embora não inteiramente. Mas o medo real e o ressentimento dos velhos grupos dominantes, o pânico e o seu ódio contra Chávez é porque eles sentiram deslizar do seu domínio a capacidade confortável de exercer dominação cultura e sócio-psicológica sobre as classes populares como o fizeram durante décadas, mesmo séculos. Naturalmente, ali ainda há outros muitos mecanismos através dos quais a burguesia e os agentes políticos do antigo regime são capazes de exercer sua influência, particularmente através dos meios de comunicação que em grande medida ainda estão nas suas mãos.
 
Quão avançados são os planos de nacionalização de Chávez? Há alguma evidência de que eles levam aos resultados desejados?
A grande mudança econômica óbvia foi a recuperação do petróleo do país para um projeto popular – e mesmo que haja ainda uma burocrática oligarquia PDVSA. Outras empresas chave, tais como a siderurgia, foram nacionalizadas. E o setor cooperativo – com todos os seus problemas – tem se ampliado. No entanto, o poder econômico ainda está em grande medida nas mãos da burguesia.
 
A estratégia da revolução tem sido erguer novas instituições paralelas e também tentar "colonizar" o velho Estado. Mas o Estado venezuelano ainda é em grande medida um Estado capitalista. A questão chave é: como pode um projeto de transformação avançar enquanto opera através de um Estado corrupto, clientelista, burocrático e muitas vezes inerte legado pelo antigo regime? Se forças revolucionárias e socialistas chegam ao poder dentro de um processo político capitalista como você confronta o Estado capitalista e os entreves que ele coloca nos processos de transformação? De fato, na Venezuela, e também na Bolívia, as instituições do Estado muitas vezes atuam para constranger, diluir e cooptar lutas de massas vindas de baixo.
 
Do meu ponto de vista, na Venezuela a maior ameaça à revolução não vem da oposição política de direita, mas sim da chamada direita "endógena" ou "chavista" e pertencente ao bloco revolucionário, incluindo elites do Estado e responsáveis partidários, desenvolverão um interesse mais profundo em defender o capitalismo global do que na transformação socialista.
 
A revolução tem mais de uma década. Está amadurecendo ou está chegando a uma etapa de declínio e deformação?
Eu não diria que a revolução está em "declínio" ou "deformação". A guinada à esquerda na América Latina começou como uma rebelião contra o neoliberalismo. Os regimes pós neoliberais empreenderam suaves reformas redistributivas e nacionalizações limitadas, particularmente de recursos energéticos e serviços públicos que anteriormente haviam sido privatizados. Eles foram capazes de reativar a acumulação. Mas o pós-neo-liberalismo que atualmente não caminha em direção a uma profunda transformação socialista, está rapidamente a atingir os seus limites.
 
O processo bolivariano enfrenta contradições, problemas e limitações, tal como todos os projetos históricos. Eu diria que tanto a revolução venezuelana como os processos boliviano e equatoriano podem estar a rebelar-se contra os limites da reforma redistributiva dentro da lógica do capitalismo global, especialmente considerando a atual crise do capitalismo global. O anti-neoliberalismo que não desafia mais fundamentalmente a própria lógica do capitalismo choca-se contra limitações que podem agora ter sido atingidas.
 
Pode ser que a melhor ou a única defesa da revolução seja radicalizar e aprofundar o processo, pressionar pelo avanço de transformações estruturais que vão além da redistribuição. O fato é que a burguesia venezuelana pode ter sido deslocada em parte do poder político, mas ainda detém grande parte do controle economico. Romper tal controle implica uma mudança mais significativa na propriedade e nas relações de classe. Isto por sua vez significa romper a dominação do capital, do capital global e dos seus agentes locais.
 
Recordemos as lições da Nicarágua e de outras revoluções. Alianças multi-classe geram contradições desde que a etapa da lua-de-mel da reforma redistributiva e dos programas sociais fáceis alcancem o seu limite. Então as alianças multi-classe começam a entrar em colapso porque há contradições fundamentais entre distintos projetos e interesses de classe. Nesse ponto, uma revolução deve definir mais claramente o seu projeto de classe; não apenas no discurso ou na política mas na transformação estrutural real.
 
A um nível mais técnico, poderíamos dizer que as contradições geradas pela tentativa de romper a dominação do capital global não são uma falha da revolução. A Venezuela ainda é um país capitalista no qual a lei do valor, da acumulação de capital, está operativa. Esforços para estabelecer uma lógica contrária – uma lógica da necessidade social e da distribuição social – chocam-se contra a lei do valor. Mas numa sociedade capitalista violar a lei do valor lança tudo na loucura, gerando muitos problemas e novos desequilíbrios que a contra-revolução é capaz de aproveitar. Isto é o desafio para qualquer revolução orientada para o socialismo dentro do capitalismo global.
 
William I. Robinson é professor de Sociologia, Universidade da Califórnia – Santa Bárbara
 
(Publicado originalmente em http://www.zmag.org/znet/ viewArticle/23797)

FILME BASEADO NA OBRA DE JANE AUSTEN

CINEMA INGLES
MINE SÉRIE BBC
FILMES BASEADOS NA OBRA DE JANE AUSTEN
MISS AUSTEN REGRETS
2008
DIREÇÃO JEREMY LOVERING
OLIVIA WILLIAMS
SAMUEL ROUKIN
GRETA SACCHI
IMOGEN POOTS
PHYLLIDA LAW
PIP TORRENS
AVI LEGENDADO
BY SSRJ





Sinopse:

O filme é sobre uma parte da vida da famosa escritora britânica Jane Austen.
Nos últimos anos de sua vida, quando ela se aproxima dos 40, Jane Austen ajuda sua sobrinha Fanny a encontrar um marido.
Créditos: BaixarLivre

Crítica:

Miss Austen Regrets - Os últimos anos de uma das maiores escritoras inglesas.

Da mesma maneira que suas heroínas, a escritora Jane Austen enfrentou muitas das convenções de sua época lutando em busca do final feliz que todas alcançaram em sua obra, mas que infelizmente, a autora não conseguiu para si mesma.

É nesta premissa que se baseia o roteiro de "Jane Austen Regrets" (2008), um filme para a TV produzido pela emissora BBC 1, que já está disponível em DVD importado e faz parte da coleção "Jane Austen´s Sense & Sensibility Collector´s Set".

O foco desta biografia é nos últimos anos de vida da escritora, que morreu em 1817, aos 41 anos de idade, depois de passar por um longo período doente. Dirigido por Jeremy Loving, o filme é um verdadeiro achado para quem se encantou pelo romantismo de "Amor e Inocência" (2007), mas sentiu nele a ausência de melhores expicações para o fato de uma mulher que tanto valorizou o amor, descrevendo-o em sua obra como a maior das realizações humanas, aquela que tem força para vencer tudo; acabou sozinha, de uma forma tão melancólica; em uma época e sociedade em que permanecer solteira tinha um peso enorme e significava uma verdadeira condenação social para uma mulher.

O roteiro, desenvolvido por Kevin Hood, foi baseado na correspondência entre Jane (Olivia Williams), sua irmã Cassandra (interpretada por Gretta Scacchi) e sua sobrinha Fanny (Imogen Potts) e mostra a escritora como uma mulher inteligente, que tem uma visão muito clara e crítica e por isso é muito bem resolvida, apesar de sofrer com as restrições que suas decisões significavam.

Mas as piores críticas partem da própria casa da autora, sua mãe interpretada por Phyllida Law, mostra-se um "poço de amarguras" sempre despejando suas frustrações sobre a filha, a quem acusa de ser a causa de tudo de ruim pelo que passa e passou a família.
Uma atitude que deixa clara para qualquer pessoa a razão das mães mostradas em seus livros serem, em geral, figuras tão negativas.

As diversas chances que Jane teve para casar-se são mostradas em flashback e entre elas, um relacionamento com o Reverendo Brook Bridges (Hugh Bonneville) chama atenção por ser o mais próximo do que poderia ter sido um casamento bem sucedido; mesmo assim, a autora deixa claro que não conseguiria abrir mão de suas obras para viver ao lado de ninguém, nem mesmo de seu grande amor. Gerações e gerações de ávidos leitores agradecem.

Elenco:

Samuel Roukin...Harris Bigg
Olivia Williams...Jane Austen
Greta Scacchi...Cassandra Austen
Imogen Poots...Fanny Knight
Phyllida Law...Mrs. Austen
Pip Torrens...Edward Austen Knight
Harry Gostelow...Rev. Charles Papillon
Tom Hiddleston...Mr. John Plumptre
Hugh Bonneville...Rev. Brook Bridges
Tom Goodman-Hill...Mr. Lushington MP
Adrian Edmondson...Henry Austen
Sylvie Herbert...Mme. Bigeon
Jack Huston...Doctor Charles Haden

Informações Técnicas:

Título Original: Miss Austen Regrets
País de Origem: Inglaterra,USA
Gênero: Drama.Biografia
Tempo de Duração: 85 minutos
Ano de Lançamento: 2008
Estúdio/Distrib.: BBC
Direção: Jeremy Lovering
IMDb...7.4

Dados do Arquivo:

Formato: AVI Legendado
Tamanho: 1.57 GB
Qualidade: DVDRip
Legenda: Pt-Br [Separada]
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terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

HOMENAGEM A GEORGES LABICA NA UNIVERSIDADE DE ARGEL


GEORGE LABICA Publicamos hoje a comunicação apresentada em Argel por Miguel Urbano Rodrigues no Colóquio Internacional de Homenagem a Georges Labica, promovido pela Universidade daquela cidade.
Miguel Urbano Rodrigues - www.odiario.info

Numa carta de despedida a Fidel Castro que correu pelo mundo, o Che lamentou não ter tomado desde o início da luta consciência da dimensão do seu camarada, comandante-chefe da Revolução.
Relendo recentemente livros de Georges Labica, recordei o desabafo do Che. Amigo do autor do «Dictionnaire Critique du Marxisme» e admirador do seu talento e firmeza revolucionária, senti ter-me apercebido tardiamente da grandeza do cidadão, do pensador revolucionário. Georges Labica foi muito mais do que um eminente filósofo marxista.

Foi pelo telefone que falamos pela primeira vez há uns doze anos. Eu estava em Paris com Henri Alleg e pedira-lhe que ajudasse a encontrar editor para o livro de uma amiga chilena.

Henri comentou: vais expor o caso a um camarada mais indicado do que eu para tratar do caso. Ligou para Georges Labica, trocaram algumas palavras e passou-me o telefone.

Eu conhecia dois ou três livros de Labica, admirava-o, mas senti algum acanhamento. Mas tive imediatamente a sensação de falar com alguém muito próximo, pelo tom de intimidade que ele imprimiu ao nosso breve diálogo. Foi o prólogo de uma amizade futura.

Em 2004 convidei Georges a participar no I Encontro Civilização ou Barbárie em Serpa, Portugal.

A pequena cidade da Margem Esquerda do Guadiana produziu nele um efeito de deslumbramento.

As muralhas medievais, o caminho de ronda, as ruelas tortuosas, o casario branco, a transparência do céu azul, o silêncio dos montados, a atmosfera humana fascinaram-no. Nadya, a sua mulher, uma argelina que aos 72 anos continua a ser muito bela sentiu-se também enfeitiçada.

Georges e Nadya voltaram duas vezes a Serpa.

«Sabes – confidenciou uma tarde, sorvendo com prazer um chá no pátio da residencial onde estava hospedado, sentir-me numa cidade governada há três décadas por comunistas, onde a fraternidade nos envolve de manhã à noite, mergulha-me num mundo sonhado cujas portas não fomos capazes de abrir. Os comunistas do teu Alentejo fazem-me regressar à juventude quando acreditava que iríamos transformar o mundo e concretizar o projecto de Marx.»

A TEORIA DA VIOLENCIA

No México, um filósofo cubano, empolgado com a qualidade da intervenção de Labica num Seminário em que participávamos, intitulado «Os Partidos e uma nova Sociedade», perguntou-me o que mais me impressionava naquele pensador francês que num discurso breve conseguia transmitir uma reflexão tão profunda e diversificada sobre a vida.

«A cultura integrada – respondi.»

Eu acabava de ler «Théorie de la Violence», o ultimo livro de Georges Labica e talvez aquele onde ele, sem esforço, revela esse dom de transmitir uma cultura integrada, nascida da assimilação de uma prodigiosa acumulação de conhecimento.

Não conheci alguém como Georges Labica cuja reflexão sobre a violência na História seja tão profunda, lúcida e criadora.

O tema tem sido tratado por grandes autores. É actualíssimo porque a humanidade continua a nadar num oceano de violência.

Mais de uma vez me interroguei sobre o impulso que o levou a escrever esse livro. O assunto, árido, trazia a certeza de que a obra não ultrapassaria as fronteiras de um público limitado. As motivações académicas estiveram também ausentes na escolha feita.

Na Introdução, o autor abre uma janela sobre a questão ao lembrar que a existência da violência coincide com «o aparecimento do homem». Mas é nos três primeiros capítulos que a resposta indirecta à questão que coloquei fica esboçada.

Geoges Labica, partindo do Livro de Job, do desafio de Prometeu e de uma navegação empolgante pela mitologia e pelo teatro gregos, desce às raízes da condição humana para, acompanhando a violência sob as suas infinitas modalidades, desembocar no limiar do século XXI em que ela permanece endémica.

Esquecemos com frequência, ao reagir com indignação a crimes hediondos do presente e a hecatombes de guerras contemporâneas, que o homem busca no passado quase com deleite uma cultura de violência. Porque se reencontra nela. O interesse que a tragédia grega continua a inspirar confirma essa realidade. Em Esquilo, Sofocles, Euripedes – três exemplos – o infanticídio, o uxoricídio, o parricídio, e outras formas de violência exacerbada estão na génese das relações familiares e sociais.

A cultura integrada de Labica, ao iluminar cenários muito diferentes, empurra o leitor para uma compreensão multidimensional da violência ao longo da História. Na sua reflexão ele passeia dos deuses da Babilónia, do Irão aquemenida, do Egipto faraónico, dos rituais sangrentos da Mesoamerica, das pirâmides de crânios de Tamerlao para a visão da violência que inspirou os pintores do Renascimento ao plasmarem em obra imortais os mitos da antiguidade e o temor e a esperança como motores de religiões fabricadas, nascidas do medo da morte.

Aonde nos conduz Georges Labica?

Aos horrores, similares e diferentes, da violência hodierna. E é novamente a sua cultura integrada que no discurso do revolucionário imprime a força da evidência a realidades óbvias que a maioria da humanidade ou esquece ou não assimila por não as interrelacionar.

Pelo ecran da violência desfilam então açougues humanos como as duas conflagrações mundiais, as matanças nazis, a longa cadeia de guerras coloniais, genocídios como o de Rwanda, guerras de saque ditas preventivas, como as do Iraque e do Afeganistão.

Como a cultura dominante é a da violência e não a da paz, o capitalismo utiliza-a como alavanca e cimento da opressão social.

Um hadith famoso expressa bem a crueldade da ordem imposta pelos de cima: afastamo-nos mais de deus quanto mais próximos estamos do poder.

Na sua meditação sobre as funções da violência, o autor de «Robespierre, une politique de la philosophie» leva-nos de Maquiavel a Bush, numa caminhada que passa por Bonaparte e Hitler, não sem recordar que uma das mais devastadoras modalidades da violência, envernizada por uma oratória pseudo humanista, é a exercida pelo modo de produção capitalista, fonte da exploração do homem pelo homem.

A ARGÉLIA E LABICA

A Argélia deixou marcas profundas na vida, no pensamento e na obra de Georges Labica.

Desde a juventude ele abominava o colonialismo. Mas condenar um sistema de opressão e a sua ideologia é diferente de conhecer a engrenagem monstruosa do colonialismo onde ela funciona.

Para o jovem professor chegado de França, foi enorme o efeito da descoberta da luta do povo argelino e da cultura árabe. O seu olhar sobre a História e o combate dos povos não seria o mesmo sem a experiência argelina. Numa época em que na Europa se ignorava praticamente a cultura magrebina, Georges Labica foi um dos primeiros pensadores a contribuir para a sua difusão em França. Os seus livros sobre Ibn Khaldoun – o genial autor de «La Muqaddima», filósofo, economista e precursor da moderna historiografia – e sobre Ibn Tufayl tornaram-se indispensáveis à compreensão da riqueza e profundidade do pensamento, da cosmovisão e da ciência árabes da Idade Média.

O engajamento político do intelectual foi, aliás, complementar do combate do militante comunista pela independência da Argélia.

O REVOLUCIONÁRIO

Comunista desde a juventude, Georges afastara-se do PCF por não se rever mais num Partido que, participando do governo da «gauche plurielle», avalizara uma politica neoliberal tão capituladora que – recordava - privatizou mais empresas do que, juntos, os governos de direita de Balladur e Juppé.

«Deixei o Partido – ouvi-lhe dizer um dia – para continuar comunista».

Conheci poucos revolucionários com os quais me tenha sentido tão plenamente identificado nos terrenos da ideologia e da praxis.

Georges fez do eticismo, na política como na vida quotidiana, uma exigência permanente. Essa fidelidade difícil a princípios e valores revolucionários criou-lhe ao longo da vida embaraços e antipatias mesmo entre camaradas. Era um marxista incómodo. Esse compromisso com a sua mundividência traduziu-se com frequência em criticas aos mais altos dirigentes revolucionários, mesmo quando os apoiava. Era incompatível com todas as formas de populismo; tal como a Lenine, o tacticismo surgia-lhe como uma forma de oportunismo.

Mais de uma vez, na América Latina, o vi permanecer de braços caídos em actos públicos em que a quase totalidade dos intelectuais participantes aclamava com entusiasmo um líder carismático cujo discurso resvalava para a demagogia populista.

A ausência de vaidade era uma característica da sua personalidade. Não cultivava a modéstia. Era nele espontânea.

Coincidimos algumas vezes no México e em Caracas. Esses encontros foram muito gratificantes para mim e a minha companheira pela amizade que nos ligava a Georges e Nadya.

Não esqueci uma manhã em Coyoacan, na Cidade do México, quando visitámos a Casa de Frida Kahlo e Diego Rivera, que todos admirávamos, e depois aquela onde Trotsky residia e foi assassinado.

Momentos como esses abriam portas para intermináveis conversas sobre a bela e inquietante aventura do homem, empurrado hoje para o abismo por um sistema de poder monstruoso e a contracultura por ele imposta em escala mundial.

Conversar com Georges ajudava a transformar o conhecimento em cultura, num processo de assimilação difícil de compreender. E difícil porque foi um pensador que amou com paixão a palavra. Poderia ter sido como outros um filósofo criador e um revolucionário íntegro e um escritor banal. Mas Georges Labica, ao lançar pontes entre as ideias e a linguagem que as expressa, criou um estilo que o projecta como grande escritor. Ao reler hoje textos seus, recordo grandes clássicos franceses do Século XVIII, porque a forma e a essência do pensamento se fundem harmoniosamente inseparáveis.

Quando o tema das nossas conversas incidia sobre globalização como último patamar do imperialismo, Georges lembrava que o fenómeno impunha um repensar do mundo multdimensinal nas frentes da economia, da política, da ideologia da ética, da estratégia, da cultura. E, partindo dai para a mundialização da violência, alertava para a inevitabilidade da violência emancipadora como resposta à primeira.

Cada vez mais – sublinhava – o discurso da «segurança» é erigido em ideologia dominante, servindo para justificar a repressão imposta aos povos em escala planetária pelo sistema.

A desigualdade de meios no combate à engrenagem da globalização imperial não fazia Georges Labica resvalar para o pessimismo desmobilizador. Pelo contrário. Ele tinha uma convicção inabalável de que o sistema será vencido e erradicado.

Por ora não se vislumbra a luz no fundo do túnel. Mas a lenta e necessária convergência das lutas de povos muito diferentes acabará, acreditava, gerando um novo internacionalismo, de contornos por ora imprevisíveis.

Nessa lenta caminhada em defesa da humanidade, democracia e revolução apareciam a Georges Labica como indissociáveis.

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Amigos:

Permitam-me terminar com uma nota pessoal.

Há dois anos, no final de um almoço no seu apartamento de Lê Pecq, Saint Germain en Laye, onde quadros e objectos de arte conduzem o visitante a imaginar a caminhada de Georges Labica pelas estradas do mundo, Nadya fez uma confidencia de que guardo memória:

«Quando o vi pela primeira vez numa aula do liceu onde ele leccionava, eu era uma jovem estudante da Kabilia que saía da adolescencia. Mas pensei: Este jovem vai ser o homem da minha vida. E foi. Estamos casados há meio século e amo-o como nos anos da juventude».

Por mim, falo da amizade que cresceu em paralelo com a admiração.

Aprendi com o rodar do tempo que o sentimento da amizade é muito diversificado; incluo o que me ligou a Georges Labica entre os menos comuns.

Ele tinha o poder de transmitir confiança quando me escrevia, manifestando apreço pelos meus modestos escritos e identificação com posições e ideias que eu assumia.

É reconfortante, amigos, a certeza de que a obra e o exemplo de Georges Labica vão sobreviver ao seu desaparecimento físico.