sábado, 10 de abril de 2010

A midia corporativa e o monopólio da comunicação.....

Velhas e novas formas de ameaças à liberdade de expressão

Ao contrário do que afirma a grande imprensa, as ameaças à liberdade de expressão no país não vêm das iniciativas de regulação da mídia. No Brasil, é o sistema de concessões e renovação de outorgas de rádio e TV um dos principais mecanismos de concentração da propriedade da mídia e ausência da pluralidade de vozes nos meios de comunicação. Por outro lado, as verbas governamentais para publicidade se transformaram numa nova maneira de influenciar a cobertura dos veículos impressos.

Desde 2009, quando o tema da regulação e controle social da mídia ganhou espaço no debate público nacional com a realização da I Conferência Nacional de Comunicação, os grandes meios têm dedicado espaço considerável em suas páginas ou telejornais para bradar, sem cessar, que a liberdade de expressão está ameaçada no país. Foi esta a tônica da cobertura das resoluções da I Confecom; tem sido este um dos motivos para os ataques da imprensa ao Programa Nacional de Direitos Humanos; e foi este o discurso professado sem constrangimentos pelas entidades apoiadoras do Instituto Millenium, que recentemente realizou um seminário em São Paulo onde os donos da mídia garantiram que há censura estatal no Brasil.

No entanto, em um outro seminário, também realizado em São Paulo, esta semana, desta vez no Memorial da América Latina, o debate sobre liberdade de expressão ganhou outros contornos. E deixou claro que os limites e supostas ameaças a este direito fundamental em nosso país são de outra ordem e têm raízes muito mais profundas do que querem nos fazer crer os grandes empresários da comunicação.

Numa palestra elucidadora, o pesquisador e ex-professor da Universidade de Brasília, Venício Lima, apontou o sistema de concessões e renovação das outorgas de rádio e televisão como um lócus privilegiado para a manutenção de interesses privados – disfarçados de públicos –, que na prática caracteriza uma das maiores ameaças à liberdade de expressão no país. Segundo Lima, o funcionamento das concessões de radiodifusão no Brasil gerou um fenômeno agora conhecido por “coronelismo eletrônico”, só que em vez do controle da terra, como acontecia na República Velha, hoje é o controle dos meios de comunicação de massa que leva seus proprietários ao controle político de diferentes regiões do país.

“Não é novidade que os políticos locais tenham vínculos com a mídia, não apenas no nordeste. São governadores, deputados estaduais, senadores, que formam verdadeiras oligarquias regionais. Os nomes também são conhecidos: Sarney, Garibaldi, Collor, Magalhaes, Jereissati etc”, conta Venício Lima. “A moeda de troca continua sendo o voto, mas agora com base no controle da informação e na influência da opinião pública. A recompensa é antecipada aos coronéis pelas outorgas de rádio e TV, que depois são renovadas automaticamente”, explica.

Segundo o pesquisador, há uma série de normas e procedimentos legais das concessões que têm permitido e perpetuado essa situação, ameaçadora para a liberdade de expressão do conjunto da população brasileira. Uma delas, prevista na Constituição Federal, cria assimetrias em relação aos demais concessionários de serviços públicos. Ao contrário de outras áreas, onde o poder concedente pode cancelar contratos de concessão caso o serviço não esteja sendo cumprido a contento, na radiodifusão, para uma concessão não ser renovada são necessários dois quintos de votos nominais, ou seja, abertos, do Congresso Nacional.

“Diante do poder da mídia, é improvável que um processo de não renovação chegue a ser votado. Menos provável ainda que uma concessão não seja renovada por quem depende da televisão para sua sobrevivência política. Não há na história do Brasil um projeto de não renovação que tenha sido sequer apresentado no Congresso”, afirma. “Já o cancelamento de uma concessão durante sua vigência só ocorre com decisão judicial”, acrescenta.

Os critérios para definição dos concessionários de rádio e televisão também não têm relação com o que a legislação brasileira estabelece para o serviço de radiodifusão. Os princípios que devem orientar a programação das emissoras, por exemplo, previstos no Art.221 da Constituição, não são usados como critério. Tão pouco o respeito à complementaridade entre os sistemas público, privado e estatal de comunicação e à regra que proíbe o monopólio da mídia.

“Sem falar dos casos em que os próprios representantes do coronelismo eletrônico votam em benefício próprio. Como a Constituição compartilha entre o Executivo e o Congresso Nacional o poder de outorga, há casos de senadores e deputados votando na renovação de suas próprias concessões”, critica Venício Lima. “O resultado é a formação de um sistema de radiodifusão protagonizado pela concentração privada, e onde há uma clara assimetria na disputa eleitoral entre aqueles que usam as concessões em benefício próprio e aqueles que não têm acesso a este serviço público”, completa.

Independência editorial
Se por um lado o sistema de outorgas de rádio de TV historicamente tem contribuído para limitar a liberdade de expressão no país, o seminário no Memorial chamou a atenção para uma nova ferramenta que, de forma indireta, pode trazer conseqüências na linha editorial dos veículos, sobretudo dos impressos: a publicidade governamental.

Para o jornalista Eugênio Bucci, professor da Universidade de São Paulo e articulista do jornal O Estado de S.Paulo, a influência do poder político no funcionamento dos meios de comunicação através da publicidade oficial tem crescido nos últimos anos. Levantamento do Grupo de Mídia São Paulo, que faz uma avaliação anual do tamanho do mercado anunciante no Brasil, mostrou que em 2008 foram gastos R$ 23 bilhões em publicidade no país. O maior anunciante são das Casas Bahia, com R$ 3 bilhões. Somados, todos os governos municipais, estaduais e federal totalizaram R$ 2,7 bilhões. Somente o governo de São Paulo saltou de R$ 59 milhões de publicidade oficial em 2007 para R$ 158 milhões em 2008. Os Ministérios da Educação, do Turismo e da Saúde, juntos, gastaram R$ 628 milhões no mesmo ano.

“Por meio da verba governamental, interesses dos governos adquirem uma entrada privilegiada nas redações dos jornais, influenciando na pauta e minando a liberdade de imprensa. Tenho dúvidas sobre a necessidade e pertinência do Poder Executivo ser um anunciante tão grande”, questiona Bucci. “Na prática, os anúncios são a continuação da propaganda eleitoral fora do período de campanha. Não é à toa que são feitas pelas mesmas equipes, com a mesma linguagem”, acredita.

Com este tipo de política, na opinião do jornalista, abre-se espaço para um tipo de pressão do governo sobre jornais de porte médio ou pequeno, onde a presença do anúncio público pode representar a diferença entre a viabilidade econômica e a falência. “A força de pressão que o controlador da verba pública tem sobre essas publicações é imensa. Direta ou indiretamente as oligarquias que controlam as verbas públicas acabam interferindo na pauta desses jornais”, afirma.

Bucci admite que há uma chantagem mútua neste processo, onde muitos veículos também podem pressionar governos por mais anúncios em troca de uma cobertura favorável ou não às administrações públicas. “É um ecossistema. Este tipo de pressão existe de um lado e de outro e setores do mercado e do Estado se associam nesta simbiose”, diz.

Um caminho apontado no seminário para garantir a independência editorial dos veículos de pequeno e médio porte foi a criação de linhas de financiamento e fomento público para órgãos de comunicação, prática bastante difundida nos países europeus e também nos Estados Unidos e que ainda não se tornou realidade no Brasil.

A convidada internacional do seminário, a jornalista Liza Shepard, ombudsman da Rádio Pública Nacional (NPR) dos Estados Unidos, concordou. Com a crise econômica que atravessa o país e a queda nas vendas dos jornais impressos diante do boom da internet, pela primeira vez algumas empresas americanas privadas de comunicação começam a pensar em ajuda governamental.

“Vivemos um tempo de instabilidade e revolução na mídia. Se o governo ajuda a indústria bélica, automobilística, porque não pode fazer o mesmo com a indústria de notícias? É algo que ainda está em discussão”, conta.

Hoje, no entanto, a independência editorial da NPR é garantida em parte por sua forma de financiamento. Somente 2% dos 150 milhões de dólares de seu orçamento anual vêm do governo dos Estados Unidos. A NPR não é uma emissora, e sim uma produtora de conteúdo para rádios públicas que tira a maior parte de seu sustento da venda de programação para 900 emissoras em todo o país. Sua programação atinge 34 milhões de pessoas, das quais 10%, todos os anos, doam recursos para a sustentação das rádios.

“Pode o governo fazer parte do financiamento e não controlar nada editorialmente? Sim. É assim que funciona nos EUA. A NPR é um exemplo positivo de como uma mídia pública pode operar de forma independente de um governo”, conclui Liza.

Documentário para entender melhor os conflitos agrários no Brasil....





(Brasil, 2007, 111min.- Direção: Alexandre Rampazzo)

Um dos documentários mais completos para se entender a questão dos conflitos agrários no Brasil.

Trabalhadores sem opção de sobrevivência em seus estados partem para a Amazônia, no Pará, para trabalhar nas fazendas iludidos pelo sonho de se poder conseguir o sustento de suas famílias. Mas a realidade é outra, grande parte não volta mais, torna-se um contingente de trabalhadores escravos, inseridos em um ciclo vicioso de trabalho e dívida com seu patrão. Após serem explorados durante décadas, muitos tornam-se indigentes. Muitos dos que tentam escapar desse sistema, são assassinados.

O chamado "Agronegócio" do latifúndio está quase sempre associado a diversas práticas nocivas a sociedade e ao planeta: quase todas as fazendas da região são produtos da grilagem, ou seja, são terras da União que de alguma forma foram fraudadas em nome de alguém; os pistoleiros, quando não a polícia do Estado, promovem a "limpeza" humana das áreas, ameaçando, assassinando os colonos que lá antes habitavam. Esse modelo está ligado a derrubada de florestas, extinção de espécies, queimadas, contaminação dos recursos hídricos, a concentração de terras e de renda.

Para fazer frente a isso, surgem os grupos sociais, como o Movimento dos Sem Terra, a Pastoral da Terra e personalidades internacionais, como Dorothy Stang, que enfrentam o poder dos fazendeiros, políticos corruptos, assassinos e a mídia tradicional.
(Comentários: Docverdade)

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sexta-feira, 9 de abril de 2010

Nota do MST de apoio à greve dos professores de SP...

SOLIDARIEDADE À LUTA DOS PROFESSORES DE SÃO PAULO

O direito de greve foi conquistado com a pressão dos trabalhadores e trabalhadoras por melhores condições para exercerem as suas atividades. Dessa forma, as sociedades avançaram em todo o mundo, com a consolidação das legislações trabalhistas para garantir direitos aos trabalhadores e deveres ao capital.

Os professores da rede estadual de ensino do Estado de São Paulo estão em greve desde 8 de março, portando na sua mobilização toda a mística das lutas históricas do Dia Internacional das Mulheres.

Na greve, apresentam uma pauta de negociação que reivindica reajuste salarial de 34,3%, a incorporação das gratificações e extensão aos aposentados, um plano de carreira justo e a garantia de emprego. O salário base de um professor alfabetizador de Educação Básica I é de R$ 785,50. Já os professores de Educação Básica II recebem R$ 909,32.

Dois dados para efeito de comparação, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). A cesta básica na cidade de São Paulo, a segunda mais cara do país, custa R$ 229,64 - isso é quase 30% do salário de um educador só para comer o básico. Já o salário mínimo necessário, de acordo com o preceito constitucional, deveria estar na base de R$ 2.003,30.

No momento em que as centrais sindicais e os movimentos populares fazem uma grande campanha pela redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais, o governo de São Paulo, comandado por José Serra (PSDB), atua de forma intransigente e reprime violentamente os protestos de professores.

Os protestos dos grevistas sofreram uma forte repressão da Polícia Militar. Mais uma vez, os direitos de organização e manifestação previstos na Constituição são desrespeitados. A PM paulista infiltrou até mesmo soldados numa passeata com 30 mil educadores pelas ruas da capital paulista. Depois de 25 anos da derrota da ditadura militar, manifestantes são monitorados e lideranças listadas para posterior perseguição, além da criação de tumultos para desmoralizar a greve.

Dessa forma, o governo Serra repete os métodos de criminalização de viés fascista da gestão Yeda Crusius, no Rio Grande do Sul. A ausência de diálogo, violência física, processos judiciais (nos âmbitos civil e criminal) e perseguição política caracterizam o tratamento das lutas dos trabalhadores pelos governos conservadores.

Temos denunciado o processo de criminalização das lutas sociais, a perseguição dos movimentos populares, sindicais e estudantis e a interdição de qualquer conquista da classe trabalhadora. O governo Serra pretende derrotar a greve dos professores e abrir caminho para uma ofensiva contra os direitos sociais e trabalhistas do povo. Dessa forma, pretendem repetir a ação do governo Fernando Henrique Cardoso contra a greve dos petroleiros em 1995.

O nosso movimento, que vem enfrentando um processo duro de criminalização, liderado pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, pela bancada ruralista no Congresso Nacional (foram criadas três CPIs em oito anos para nos investigar) e pela mídia burguesa, manifesta apoio à luta dos educadores.

Vamos organizar, ao lado das centrais sindicais, movimentos populares e organizações estudantis, uma grande campanha nacional de apoio aos professores e contra a criminalização das lutas sociais.

As reivindicações são justas e necessárias, ainda mais porque a educação deve ser a prioridade no país. Se os professores, que exercem uma das atividades mais nobres na nossa sociedade, são tratados dessa forma, não podemos esperar nada além do que violência como resposta às lutas da classe trabalhadora que ainda virão.

SECRETARIA NACIONAL DO MST

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Estado fascista-sionista de Israel bombardeia Faixa de Gaza e Cisjordânia


A resistência não cessa

Com paus e pedras, palestinos enfrentam a repressão sionista após bloqueio à Cisjordânia
Na primeira quinzena de março o exército sanguinário de Israel bloqueou os acessos à   Cisjordânia. Os sionistas bloqueiam a Cisjordânia em data festiva, mas dessa vez a razão não era essa. Mais de duzentos manifestantes palestinos enfrentaram, no dia 13 de março, o exército israelense no posto de controle militar de Kalendia, ao norte de Jerusalém, na região da Cisjordânia ocupada. A resistência palestina, que tem o Hamas como sua força principal, denuncia a invasão de Israel na Cisjordânia e em particular na Jerusalém oriental.
Cresce o número e o volume dos protestos, cada vez mais radicalizados, desde que Israel anunciou seu plano para a ocupação de um bairro da Cisjordânia com 1.600 casas de colonos.
A política colonialista e de agressão lançada por Israel contra o povo e os territórios palestinos é incessante desde o fim da 2? guerra imperialista mundial e se aprofundou nos últimos anos. O imperialismo, principalmente o ianque, que se utiliza do Estado de Israel como seu principal preposto no Oriente Médio, faz demagogia "aconselhando" a não implantação das 1.600 casas de colonos judeus. Dois pesos, duas medias: aos sionistas, patrocínio e "conselhos"; aos palestinos, genocídio e cerco permanente.

Dia de fúria

Frente aos ataques de Israel, o Hamas convocou o 'dia de fúria'. Centenas de palestinos se levantaram em uma onda de protestos e entraram em choque com as forças sionistas em Jerusalém.
No dia 16 de março manifestantes palestinos queimaram pneus e atiraram pedras contra os policiais israelenses, cerca de 60 pessoas foram presas. O governo fascista de Israel enviou três mil militares para reprimir os protestos.
Também ocorreram enfrentamentos no posto de controle de Qalandiya, nas proximidades de Ramallah, capital administrativa palestina. Grupos de manifestantes ergueram barricadas e lançaram pedras contra as tropas israelenses. Em Dir Nizam, próximo a Ramallah, cerca de cem palestinos atiraram pedras contra os soldados israelenses. Outros enfrentamentos se deram em Bilin e Nilin.

Bombas assassinas de Israel

No dia 19 o exército sionista desferiu um ataque aéreo atingindo dez áreas em Gaza. Helicópteros Apache e aviões F-16 do exército sionista dispararam 10 mísseis a meia noite.
No dia 20, novo ataque deixou onze pessoas feridas. As bombas lançadas por helicópteros israelenses atingiram um aeroporto desativado na Faixa de Gaza. As forças da resistência palestina responderam lançando foguetes contra Israel.
Os porta-vozes sionistas dizem que estes bombardeios são uma "forte resposta" a cinco foguetes lançados contra Israel pela resistência palestina entre os dias 18 e 19 de março que teriam causado a morte de um tailandês naquele país. O que não é citado em nenhum momento é que este suposto tailandês foi a primeira pessoa a morrer no sul de Israel desde agressão sionista à Faixa de Gaza, entre dezembro de 2008 e janeiro do ano passado, que deixou milhares de mortos e centenas de milhares de mutilados e desabrigados. Nesse mesmo período cerca de cem palestinos foram assassinados em Gaza por militares israelenses ou morreram em confrontos.

Gaza se levanta

Grandes protestos marcaram o dia 19 de março na Faixa de Gaza. Mais de 10 mil pessoas saíram às ruas na área central do território, enquanto outras 2 mil realizaram uma manifestação em Rafah, ao sul.
Durante os protestos os militares israelenses mataram quatro palestinos. Os dois primeiros, mortos no dia 20 a tiros, eram camponeses que portavam apenas seus instrumentos de trabalho. Enquanto os militares sionistas dizem ter sido atacados pelos dois, testemunhas palestinas, citadas pela agência de notícias palestina Wafa, afirmaram que ambos "eram lavradores que carregavam ferramentas agrícolas, e que os soldados atiraram quando eles se aproximaram do posto de controle porque cantavam canções políticas da resistência".
No dia 21, um jovem palestino foi assassinado por tropas israelenses durante um protesto no território ocupado da Cisjordânia. Um outro jovem da mesma família também morreu ao ser atingido pelos tiros. Useid Abed an-Nasser Qadus, de 17 anos, foi atingido no estômago. Segundo a agência de notícias palestina Maan, "o adolescente morreu por causa da perda intensa de sangue, apesar de receber 12 transfusões". Mohammed Ibrahim Qadus, de 16 anos, morreu no mesmo ataque sionista sendo atingido por um tiro na cabeça. 

Original em : A Nova Democracia

Reforma agrária urgente....

Em concentração de renda, Brasil rural só não supera Namíbia





Repórter Brasil *Adital -
 

Um "país" dentro do Brasil com 30 milhões de habitantes, com a quadragésima (40a) maior população do mundo, atrás apenas de Brasil e Argentina na América do Sul. Este "numeroso contingente" que forma a "nação" do Brasil rural, mesmo que cada vez menos quantitativa em comparação às multidões dos centros urbanos, continua sendo relevante.
De acordo com estudo do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), que analisou dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2008, "as dificuldades a que essa população [rural brasileira] está sujeita produzem, do ponto de vista social, grandes impactos".
A acentuada desigualdade - já destacada em outros levantamentos como o Censo Agropecuário 2006 - é um dos principais traços desta "pátria" fora das cidades. A concentração de renda dos domicílios rurais brasileiros, aferida segundo o índice de Gini, atinge 0,727. Guardadas as devidas particularidades e apenas a titulo de comparação em termos de grandeza, no mundo todo, somente a Namíbia, com 0,743, apresenta índice maior, segundo o Relatório de Desenvolvimento Humano 2009 das Nações Unidas . Quanto maior o índice (que vai de 0 a 1), maior a concentração.
Países com concentração acima 0,6 se enquadram nos "níveis extremamente altos de desigualdade social". Além da Namíbia, apenas Comores (0,643) - formada por três ilhas entre a Costa Oriental de África e Madagascar - e Botsuana (0,61) fazem parte do grupo. O Brasil como um todo é o atrás apenas dos três países africanos já citados e de Haiti (0,595), Angola (0,586), Colômbia (0,585), Bolívia (0,582), África do Sul (0,578) e Honduras (0,553).
"A questão da concentração do patrimônio rural no Brasil precisa ser resolvida. O fortalecimento da democracia implica distribuir melhor esse patrimônio", comentou Brancolina Ferreira, coordenadora de Desenvolvimento Rural da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais (Disoc) e uma das autoras da publicação. "Grande parte da mídia demoniza os movimentos sociais que lutam pela reforma agrária. Eles contribuíram muito para a democratização no campo, que ainda tem um longo caminho a percorrer", completou.
Além da concentração, também surpreende a quantidade de não remunerados em empreendimento do grupo agrícola: eles representam 43% da mão de obra rurícola (veja divisão abaixo). Uma das hipóteses plausíveis sugeridas no estudo do Ipea é que a maior parte desses trabalhadores vive em domicílio em que a família possui alguma fonte de renda.
"Porém, dada a expressividade do número de não remunerados no total da força de trabalho ocupada, é provável que no interior deste contingente encontremos relações precárias de trabalho e desemprego", completa o estudo. Na avaliação do Ipea, este cenário de vulnerabilidade "confirma a atualidade e urgência da reforma agrária como única forma de superar as condições precárias de vida e a pobreza que caracteriza o meio rural brasileiro".

Ocupação
Quase 70% dos grupamentos agrícola estão fora de qualquer relação de assalariamento - 43% de não-remunerados e 25% de trabalhadores por conta própria. "Este elevado contingente está sujeito a uma renda instável, sujeita a um conjunto de fatores sobre os quais os trabalhadores não possuem controle", prossegue o comunicado divulgado pelo Ipea na última quinta-feira (1º). "O risco de uma renda insuficiente ao provimento de bens necessidades básicas reforça a importância da previdência social e dos programas sociais de transferência de renda do governo federal no meio rural".
A confirmação do emprego temporário como "elemento estruturante do mercado de trabalho agrícola, respondendo por 43% de empregados ocupados" (confira Gráfico) também sobressai no trabalho do Ipea sobre a PNAD 2008. "A alta taxa de participação dos temporários sintetiza algumas das características ainda dominantes na área rural: sazonalidade das ocupações, relações de trabalho altamente instáveis, baixos salários, trabalho braçal e extenuante e péssimas condições de trabalho", analisa o instituto.

Grau de formalização
A forte desigualdade entre homens e mulheres nas ocupações agrícolas (Tabela I) constitui outro aspecto observado nos dados. "A proporção de mulheres em atividades precárias e não remuneradas (incluindo a produção para o próprio consumo) é significativamente maior que a de homens dedicados a estas atividades. O mesmo não se verifica nas atividades remuneradas, em que os homens representam mais que 85% da força de trabalho empregada em todas as condições de ocupação", sublinha o Ipea.
Para Brancolina, da Disoc, o quadro é preoupante não só pela grande quantidade de trabalhadores rurais que estão fora de qualquer relação de assalariamento, mas também por causa das condições enfrentadas por elas (inclusive quanto às dificuldades de acesso à educação). "As mulheres funcionam como um exército de reserva de trabalhadores do campo. Elas não possuem renda e muitas vezes trabalham em substituição aos homens, que se locomovem para outras frentes de trabalho em busca de melhores salários".

Participação homens/mulheres
"À concentração urbana dos trabalhadores se contrapõe uma baixa participação da população rural no total de ocupados, resultado de todo o processo de concentração fundiária e de expulsão da população rural ao longo do século XX", avalia o Ipea. As políticas dirigidas ao fortalecimento do agronegócio, frisa o instituto, "intensificam e reproduzem esta herança".
Renda
O rendimento médio mensal do trabalho principal para a família nas áreas rurais do país se limita a 35% (R$ 360) do rendimento médio mensal do trabalho principal daqueles que vivem nas cidades (R$ 1.017). Quando o critério adotado é a atividade propriamente dita, esta diferença aumenta: o rendimento médio mensal do trabalho principal agrícola (R$ 335) é menor que um terço (32,8%) do rendimento médio de atividades não-agrícolas (R$ 1.020).

Os números que evidenciam a discrepância entre as realidades rural e urbana no Brasil ficam evidentes nas Tabelas II e III (veja abaixo) e são complementados por outros indicadores. A renda média mensal da População Economicamente Ativa (PEA), residente em área rural, representa apenas 43% da renda de mesmo tipo auferida pela PEA com domicílio em área urbana.

Tanto o rendimento médio no meio rural quanto o rendimento médio de atividade agrícola detectados em 2008 sequer alcançavam o salário mínimo da época (R$ 415). A verificação de rendimentos menores que o mínimo transparece nos rendimentos por classes. A partir desta divisão, é possível notar que 43% das pessoas com 10 anos ou mais, ocupadas na atividade agrícola (Tabela IV), simplesmente não tinham nenhum rendimento.

Os rendimentos médios mensais dos empregados permanentes e dos trabalhadores por conta própria eram, como mostra a Tabela V, bastante próximos entre si: R$ 567 e R$ 509, respectivamente. Enquanto o rendimento médio mensal do empregado temporário era de R$ 344 em 2008, a média do empregador, com pelo menos um empregado, era de R$ 2.552. Em suma, os temporários e os permanentes ganhavam, respectivamente, cerca de 13,4% e 22,2% da quantia média acumulada pelos empregadores.

A distribuição dos rendimentos médios mensais da PEA pelas diferentes regiões do país também é revaladora. A renda média no Nordeste não ultrapassava R$ 296, inferior ao salário mínimo, justamente na região onde é maior a proporção de pessoas vivendo em áreas rurais - e a média dos valores correspondentes nas demais regiões do país era de R$ 578,75. Vale ressaltar ainda que a grande maioria das ocupações no meio rural (em torno de 70%), detectada pela PNAD 2008, estava ligada à agricultura familiar, que responde ainda por cerca de 70% da produção de alimentos no Brasil.
Panorama
Conforme dados selecionados da PNAD 2008, os domicílios rurais abrigam pouco mais de 16% do total de habitantes do País. "A diferença em relação ao tamanho da população das cidades, amplamente majoritária, tem por vezes suscitado a opinião de que a questão agrária perdeu muito de sua importância, e que a questão social se transferiu, junto com os milhões de trabalhadores migrantes, para a cidade", realça o comunicado.
Os autores do comunicado específico sobre o meio rural lembram que "a dinâmica da modernização econômica, que engendrou a acelerada urbanização do país, teve, nas áreas rurais, um caráter conservador: transformou a base técnica da produção, obrigando a mão de obra a migrar para as cidades, sem contudo alterar o padrão fundiário dominante".
"A expressiva repercussão do Censo Agropecuário 2006, os debates fortemente polarizados que a divulgação de seus resultados suscitou, e outras controvérsias relativas ao meio rural, como a proposta de reajuste dos índices de produtividade, confirmam, por si só, a permanência da questão agrária", completa o estudo, que julga as políticas públicas de desenvolvimento rural e o aprimoramento constante das informações relativas aos modos de vida e produção da população do campo como "imprescindíveis".
Nas regiões Nordeste e Norte, por exemplo, a população rural bate 27,6% e 22%, respectivamente. Mais urbanizada do País, a Região Sudeste tem só 8% de sua população residindo na zona rural. A mesma região, porém, abriga a segunda maior concentração de população rural (20,5% da soma nacional). Nesse quesito, a Região Sudeste só perde para a Região Nordeste, que concentra 48% da população rural, como frisa o documento do Ipea.
Na zona urbana, a taxa de analfabetismo para pessoas acima de 15 anos é de 7,5%. Na zona rural, esta mesma taxa chega a 23,5%. A população mais escolarizada, com mais de 11 anos de estudo, representa mais de 40% da população urbana e apenas 12,8% da população rural. A maioria da população do campo (73%) sequer completou o ensino fundamental.
De 2004 para 2008, a porcentagem de domicílios abastecidos por energia elétrica subiu de 81% para 91%, em grande medida graças ao Programa Luz para Todos de eletrificação rural, implementado pelo governo federal.
Por meio dos indicadores da PNAD 2008, o comunicado do Ipea mostra que apenas um terço dos domicílios rurais não possui água encanada. Nas cidades, este percentual não atinge 3%. Outro relatório apresentado no final de março pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) revelou que 23% das casas nas áreas rurais do Brasil eram atendidas por saneamento básico em 2008. A cobertura é inferior aos dados recolhidos pelas Nações Unidas acerca da área rural de países da África e da Ásia como Sudão (24%), Nepal (24%), Nigéria (25%) e Afeganistão (25%).
*Com informações da Agência Ipea

* Agência de Notícias sobre Trab

O fascismo na Bolivia....

Bolívia: Erradicar os surtos fascistas

Marcos Domich*
Marcos Domich 
“A que atribuir este súbito ressurgimento dos símbolos e do pensamento nazi na política boliviana? É óbvio que há uma crise profunda nas direitas. Fechou-se-lhes o campo democrático. Não gozam de aceitação popular; não podem aspirar à conquista da maioria dos votos. Nessas circunstâncias não lhes resta outro caminho que não seja o da conspiração aberta, o recurso à subversão e à simulação política.”
Fora do país fui surpreendido pela notícia, difundida pela internet, da realização de um «Encontro Nacional Indianista-Katarista (ULAQA) que teve facetas preocupantes. O encontra, realizado nas instalações da Universidade Pública de El Alto (UPEA) e patrocinado por 7 entidades, entre elas a Cátedra de Sociologia, tinha um conteúdo estranho. Foram exibidos «estandartes» com simbologia nazi e alguns dos vestiam capotes que imitavam os dos soldados nazis e braceletes com a típica suástica. Além disso tinham um estranho discurso e poses que eram, como eles próprios se encarregaram de explicitar, uma mistura de indianismo e nazismo que não admite dúvidas sobre o seu enraizamento de extrema-direita, fascista.
A essência nazi, que implica sempre racismo, exteriorizou-se imediatamente. Um rapaz loiro que ingenuamente participava, talvez levado pelo sentimento que há hoje na Bolívia de que se deve apoiar toda a manifestação índia e de mudança, foi expulso da reunião com violência verbal e uma «argumentação» esfarrapada e ridícula. Disseram-lhe que por ter «mais pelos na cara» estava mais próximo do macaco e por isso menos evoluído, incapacitado «para fazer a revolução». Em suma, que era de um escalão inferior da evolução do homo sapiens. Concluindo a irracional argumentação, acusaram o criador da teoria da evolução das espécies, o ilustre Charles Darwin, de ter «roubado a concepção evolucionistada Porta do Sol». Atribuem ao grande cientista uma coisa que nem sequer é coerente no tempo. Quando Darwin formulava a sua teoria, na década de 30 do século XIX, duvidamos que tivesse notícia da Porta do Sol.
Onde entendemos que foram coerentes é designarem-se de indianistas e não indigenistas. O indianismo, desde Mariátegui e outros teóricos que abordaram o tema, é a tendência ideológica destinada a exaltar e proclamar os povos, a nacionalidades e etnias indígenas ou originárias portadoras de valores e objectivos exclusivos. No caso de países como a Bolívia, multinacionais (ou plurinacionais), plurilingues e multiculturais, os objectivos destes povos só seriam alcançados e poderiam realizar-se excluindo os outros, os não originários.
Não é a primeira vez que círculos indianistas recorrem ao uso de símbolos fascistas. Há alguns anos, Fernando Antoja já utilizou a suástica nazi num boletim cujo nome era, se a memória não me falha, «Ayra». A sua explicação foi a de que este símbolo aparece em talhas tiahunacotas. Mas a verdadeira explicação é outra. A corrente indianista a que pertence Untoja não só utiliza estes símbolos como suposta reminiscência da cultura andina, mas por uma – muito actual e nada casual – identificação com essa simbologia de extrema-direita. Daquilo que falamos é, ninguém duvide, de algo mais do que uma brincadeira de adolescentes que não sabem o que procuram. São pessoas adultas, homens feitos, que sabem perfeitamente o que querem. No caso concreto de Untoja há uma correspondência perfeita com quem num determinado momento foi deputado do ditador Banzer e depois reiteradamente candidato fracassado de formações da direita; tenaz opositor de Evo Morales ao processo de mudanças.
Esta tendência não é única. Em pista separada há outros indianistas que há já algum tempo desenvolvem uma política de direita e etnocentrista que continuam a esconder-se atrás da máscara indianista ou indigenista.
A que atribuir este súbito ressurgimento dos símbolos e do pensamento nazi na política boliviana? É óbvio que há uma crise profunda nas direitas. Fechou-se-lhes o campo democrático. Não gozam de aceitação popular; não podem aspirar à conquista da maioria dos votos. Nessas circunstâncias não lhes resta outro caminho que não seja o da conspiração aberta, o recurso à subversão e à simulação política. Mas ao mesmo tempo necessitam de executores e preferentemente que não apareçam directamente ligados às organizações ou correntes tradicionais do conservadorismo. Entre estas organizações e tendências estão os que aparentam proximidade ideológica ou de classe e nacional-étnica. Inclusivamente, aqui estão aqueles grupos e personagens que em algum momento aderiram à causa que hoje combatem freneticamente. Grupos, correntes, organizações e personagens de diverso jaez tornam-se funcionais aos planos do imperialismo e da direita. Mariátegui evidenciava-o quando na sua recompilação «Ideologia e política», há 80 anos, dizia que a intelectualidade burguesa elucubrava com a raça, para desviar a atenção dos reais problemas do povo.
Referimos Untoja, mas também aqui há personagens como Félix Patzi, não para o citar, mas para referir o mais visível do grupo que poderíamos chamar de os frustrados. Há alguma coisa em comum entre Untoja, Felipe Quispe, V.H. Cárdenas, Alejo Véliz, Román Loayza e Patzi? Além das ambições pessoais e de protagonismo, há o discurso, a retórica acerca do «colonialismo interno». E aqui está um ponto importante. O anticolonialismo interno também se converte numa máscara que não tem nada a ver com o anti-imperialismo real e efectivo. Também não tem muito a ver com o verdadeiro combate à oligarquia. Para a totalidade do conjunto referido (tocam todos a mesma partitura) as projecções anti-imperialista e anti-oligárquica não existem como essência e abordagem de classe.
Por último não podemos deixar de ver um aspecto mais, próprio das situações de grande viragem histórica. É o momento da política quando a confusão ideológica e doutrinal é um campo escorregadio e movediço. Há um caso na história do fascismo espanhol. O criador das Juntas Operárias Nacional-Sindicalistas concluía os seus manifestos «dando vivas à Itália fascista, à Alemanha nazi e à Rússia Soviética!». Aparentemente um alteração grave da palavra e do pensamento que pode penetrar, sobretudo numa juventude despolitizada desorientada, mas emocionalmente disposta á acção, a qualquer acção. Não será difícil encontrar os que dentro e fora do país manejam os actores que podem causar mais transtornos, quando do que se trata é de conseguir estabilidade, paz e democracia para continuar a mudar a Bolívia
* Marcos Domich, Professor na Universidade de La Paz, é amigo e colaborador de odiario.info.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

A luta eterna dos professores....

Professores lutam por salários, mas também pela refundação da educação pública
Escrito por Gabriel Brito, da Redação do Correio da Cidadania  
 
Deflagrada sob grande menosprezo do governo Serra, a greve dos professores da rede estadual de São Paulo, contra todas as previsões derrotistas e acusações eleitoreiras, atingirá um mês de duração no próximo dia 8, quando nova assembléia será realizada no vão livre do MASP, na Avenida Paulista.
 
Marcado por violenta repressão das forças oficiais, o movimento grevista conseguiu uma expressiva adesão na classe docente, escancarando que algo de muito podre paira sobre a educação pública, a despeito do forte exercício publicitário de que o número de alunos matriculados cresceu vertiginosamente nos últimos anos. O que não necessariamente possui conexão com a qualidade do ensino oferecido, como nos esclarecem as estatísticas acerca do altíssimo analfabetismo funcional que assola o país.
 
"Não me surpreende o comportamento do governo. Quando a categoria se manifesta de forma mais firme eles vêm com a repressão. Foi assim em 2000 com Mario Covas e agora se repete. No penúltimo ato foi degradante a atuação do aparelho repressivo do Estado e pior ainda a da imprensa", disse ao Correio o diretor colegiado da APEOESP (Associação dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo), Josafá Rehem Nascimento Vieira.
 
De fato, a atuação do poder público no ‘diálogo’ com a categoria se utilizou de expedientes muito questionáveis dentro do que se entende por Estado democrático, onde o direito à greve é reconhecido pela Constituição e foi referendado pelo STF. A violência que se verificou nas manifestações foi a mesma aplicada aos moradores do Paraisópolis, aos policiais civis em greve e aos paulistanos de diversos cantos alagados da cidade, quando protestavam contra a inépcia governamental no combate às chuvas.
 
O ápice da falta de decoro foi o flagrante de um policial, até hoje não identificado, infiltrado entre os manifestantes, na já celebre assembléia do dia 26 de março, em frente ao Palácio dos Bandeirantes. Após o ato, repercutiu maciçamente a foto da Agência Estado de um suposto docente socorrendo uma PM ferida. A própria polícia se apressou em dizer que a boa alma em meio ao caos era um dos seus, o famoso P2, revelando um expediente digno do período 1968-1977, o pior dos anos de chumbo.
 
"Vínhamos lutando desde o ano passado contra os PL’s, que acabaram virando leis, que retiram muitos direitos, oficializam a contratação temporária no estado, o que na nossa avaliação depõe contra a qualidade da educação, e diminui a malha social da educação, já que trabalhadores com 20 anos de profissão são tratados como temporários. Fora a questão salarial em si, onde temos uma perda do poder de compra dos trabalhadores da educação de 34%.", enumera Josafá.
 
O professor e sindicalista se refere às leis 1041, 1093 e 1097, que desregulamentaram completamente a relação de trabalho da categoria, precarizando não só os defasados vencimentos como a própria organização escolar. "A Lei Complementar nº 1.093 de 16 de julho de 2009, que dispõe sobre a contratação de temporários, impede que ocorra nova contratação da mesma pessoa antes de decorridos 200 dias do fim do contrato.
 
Posso dar aula somente este ano, pois em 2011 ficarei 200 dias letivos sem lecionar, mesmo passando em provas instituídas pelo Estado", explica a professora de história Nágila Soares, em texto que circula em portais educacionais.
 
Uma necessidade inadiável
 
Além disso, lutam também contra o PLS 403, em trâmite no Senado e que segue o mesmo receituário neoliberal no tratamento da educação pública. "Sublinha-se que, muito além de uma óbvia reivindicação salarial, a luta urgente e inadiável deverá ser por um novo modelo de Educação Básica", escreveu neste Correio o também professor Wellington Fontes de Menezes, que também já produzira uma série de textos destrinchando o desmonte da educação pública nos anos tucanos.
 
"Outras pautas históricas também são importantes: 25 alunos por sala, aumento linear, o fim dessa provinha que só proporciona aumento a um quinto da rede, ou seja, é excludente e fere a isonomia da profissão...", prossegue Josafá. "Descobri que somente os docentes que entram no Estado a partir de agora têm direito a FGTS. Um professor que tem 10 anos de carreira não tem nada de fundo de garantia", completa Nágila.
 
Como se vê, exceto os que vêem educação como mais um nicho de negócios, o estado em que se encontra nosso ensino público é deplorável. Condições de trabalho rebaixadíssimas, clima nada ameno nas escolas e total falta de estrutura para ensinar, motivar os alunos e também se sentir estimulado com o exercício da profissão.
 
"Do ponto de vista mais geral, há uma perda gradativa do valor da profissão docente, que em outros períodos já foi considerada nobre pela população. Hoje a situação é cada vez mais difícil. Há salas com 35, 40 alunos, o que não é o ideal para um bom atendimento de suas necessidades. Há outras que tem 50, 60 alunos no ensino médio, o que torna a profissão bastante insalubre, dificultando a relação com os estudantes e também sua conduta", explica Josafá.
 
Provinhas, concursos e propaganda
 
Como tentativa de provar a todos que se empenha na questão, o governo ressalta as já famosas, e repudiadas, provinhas e provões, que buscam uma avaliação dos docentes sob uma suposta égide da meritocriacia. No entanto, os docentes rechaçam sem hesitação as ditas benesses de tais métodos, que recompensariam àqueles trabalhadores mais bem preparados. Ao menos na palavra de Serra e companhia.
 
"A nota da provinha é o principal critério para a atribuição de aulas, gerando enormes distorções. Alunos de graduação e bacharéis que não possuem licenciatura puderam escolher aulas antes de professores que trabalham na rede há vários anos", conta o deputado estadual do PSOL Ivan Valente, em recente entrevista à Caros Amigos. "A única finalidade desses exames é gerar um ranking, que permita selecionar e excluir. Porém, a lógica da competição e do individualismo não condiz com o trabalho educacional, eminentemente coletivo", completa o parlamentar.
 
Além disso, com ajuda da imprensa amiga, o governo alardeia que os professores não têm motivos para se queixar dos valores que recebem, pois podem aumentar seus ordenados obtendo resultados positivos nas citadas avaliações. "Segundo análise de todos os jornais, Folha de S. Paulo, Estado de S. Paulo, Agora, UOL, Jornal da Tarde, e tantos outros, baseados nas informações do governo, o professor ganha de R$ 1.831 a R$ 3.120. Juro que estou investigando. Assim que achar um professor com esse salário aviso", conta a professora Nágila.
 
Como se trata de alguém que vive o dia-a-dia da profissão, com ou sem publicidade e falsa informação, seu depoimento serve para desmentir praticamente toda a retórica oficial. "O governo divulga, ainda, que os professores recebem bônus que variam de 0 a 6 mil reais, uma vez por ano. Ainda não achei alguém que recebesse os 6 mil reais; e segundo um anúncio do governo, que passa em horário nobre na televisão, as escolas possuem bibliotecas novas e salas de informática; procurei por elas nas duas escolas em que trabalho, mas não existem", arremata, ironizando pra não chorar.
 
Quanto às 10 mil vagas abertas em concurso, Josafá também se sente incapaz de ser otimista. "A vacância no magistério é de quase 100 mil cargos. Em relação a isso, fazer concurso pra 10 mil vagas é brincar de resolver o problema. E ainda por cima serão contratações em situação precária".
 
Adivinhem o que está por trás
 
Se a educação pública do estado mais rico de um país que é a nova menina dos olhos do capitalismo mundial chegou à situação tão vexaminosa, é preciso buscar razões de fundo que permitiram tal degradação. "O projeto é o mesmo entre todos eles, de destruição do patrimônio público, virando as armas agora para a educação pública. Já vimos na UNESP e na USP a atuação desse governo, portanto, não se restringe só ao ensino fundamental e médio", destaca Josafá, que também não poupa o atual secretário estadual da educação, Paulo Renato.
 
"Em que pese que nenhum secretário dessa conformação que vem desde o PMDB pode ter atuação considerada avançada, pelo próprio histórico dele e atuação como parlamentar, além de relação com organizações internacionais, podemos considerar o pior de todos, pois é o mais preparado para desenvolver o projeto do capitalismo internacional, que é transformar a educação em um mero serviço, escancarando suas portas ao capital privado", critica, na mesma linha do sindicalista docente João Kleber Santana, entrevistado pelo Correio em 2009, à ocasião de uma das inúmeras crises do ensino público paulista.
 
"Podemos dizer que é a gestão mais danosa, pois é a mais comprometida com aspectos privatistas. Nós que somos mais ligados à educação, sabemos a trajetória dele, que já foi reitor da Unicamp. Ele veio para defender os interesses das elites econômicas e privatistas. Nesse sentido é o pior de todos", fuzila o membro da APEOESP.
 
O que resta é a luta
 
Diante do quadro desolador, Josafá não se anima com nenhum governo eleito este ano. "Talvez haja nuances no projeto do atual presidente da República, mas do ponto de vista dos interesses do capital, não há muitas diferenças, no máximo cosméticas. O Brasil tem tanta desigualdade que algumas dessas mudanças cosméticas podem parecer grandes avanços, mas uma mudança substantiva não se vê nas correntes majoritárias do tabuleiro político nacional", analisa.
 
No entanto, enxerga o lado positivo na luta empreendida pelo professorado paulista. "Talvez não consigamos impor derrota ao governo, até pela contaminação do debate promovida por setores da grande imprensa. Mas temos a compreensão de construir algo importante e temos de debater pela continuidade. Às vezes não se materializa em ganhos imediatos, mas cria musculatura para os embates que virão. A resistência que a APEOESP conseguiu fazer em São Paulo não é pouca coisa".
 
Leia mais:
 
Entrevista com o diretor de escola pública João Kleber Santana
 
O "Processo Imbecilizador" da educação em SP:
 
Série de textos do professor da rede pública Wellington Fontes de Menezes
 
Gabriel Brito é jornalista.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Agrotóxicos e saúde da polulação....

Agrotóxicos versus saúde e meio ambiente
  Marco Antônio de Moraes e Raul Marcelo - Correio da Cidadania   
 
A notícia veiculada pela "Folha de S. Paulo", na edição do dia 22 de março, reportando as flagrantes irregularidades constatadas pela ANVISA nas empresas fabricantes de agrotóxicos, é um fato importante, uma vez que a produção desses produtos no Brasil é marcada pela excessiva tolerância do poder público para com essas empresas e substâncias perigosas.
 
O poder público tem a obrigação constitucional de tutelar e assegurar a saúde e a qualidade ambiental. Mas, em relação aos agrotóxicos, esse importante preceito constitucional é, na prática, negligenciado. São priorizados os aspectos meramente produtivistas e colocam-se em segundo plano os riscos intrínsecos a essas substâncias. Não fosse assim, os produtos com princípios ativos baseados em moléculas de organofosforados - de elevada toxicidade e proibidos em grande número de países do mundo - não teriam ainda uso autorizado no Brasil, como é o caso do Metamidofós, Acefato etc. São vários os trabalhos científicos que comprovam a alta toxicidade e os danos neurológicos ocasionados por esses compostos, inclusive triplicando o índice de suicídios nas populações mais diretamente expostas aos mesmos.
 
Como se denota da reportagem da "Folha", o domínio de mercado é das transnacionais, que, vistas pelo cidadão incauto, são gigantes do mercado apenas pela extrema competência e compromisso com a sustentabilidade ambiental e social, como anunciam suas dissimuladas campanhas publicitárias. No entanto, são corporações absolutamente desprovidas de qualquer consciência ética ou ambiental.
 
As empresas produtoras de agrotóxicos lucram com o veneno na nossa alimentação, com a intoxicação de trabalhadores rurais e com a contaminação do nosso ambiente. E são as mesmas que nos impõem os transgênicos, produtos cujas conseqüências são ainda indecifráveis nos ecossistemas e organismos biológicos. Essas grandes corporações nos adoecem e nos ofertam medicamentos produzidos também em suas fábricas. Lucram com o fechamento de um ciclo de malefícios.
 
Tenta-se criar um mito, de fácil disseminação no senso comum, de que sem esses produtos não haverá capacidade de suprir as necessidades alimentares da população humana: os efeitos colaterais dos agrotóxicos são apregoados como uma espécie de mal menor ante a possibilidade de fome mundial. Desconsiderando que, mais do que uma questão de produção de alimentos, a fome que recai sobre grande parcela da população mundial é conseqüência do insano caráter concentrador do sistema capitalista.
 
Ademais, a criatividade humana tem plena capacidade para o desenvolvimento de tecnologias de produção agrícola que prescindam dos agrotóxicos, como mostram as crescentes vivências e experiências com agroecologia mundo afora. A disseminação de tais experiências encontra como principal obstáculo a insensibilidade governamental para um maior estímulo e incentivo à pesquisa, ao ensino e ao desenvolvimento de programas de extensão rural voltados para essa outra visão tecnológica.
 
A política governamental optou pelo agronegócio e suas nefastas conseqüências: monoculturas, desmatamento, poluição por agrotóxicos e adubos industrializados, concentração de renda e terras, empobrecimento do camponês, enfim, uma opção que não supera o histórico papel periférico de exportador de matérias-primas pelo Brasil. Trata-se de opção em evidente contradição com um novo paradigma de produção agrícola, mais limpa social e ambientalmente, voltada às necessidades humanas, e não apenas aos lucros de poucos.
 
Pensando nisso, elaboramos uma proposta de regulamentação da produção, comércio e uso de agrotóxicos no estado de São Paulo. A proposta tem como orientação a prevenção da saúde e do meio ambiente. Esperamos que a Assembléia Legislativa consiga, em seu conjunto, dar uma resposta à sociedade paulista em relação ao uso descontrolado dessas substâncias que ocorre atualmente no estado. É premente uma determinação política para que, acima dos interesses econômicos, esteja o bem estar da humanidade.
 
Marco Antônio de Moraes, 44, engenheiro agrônomo; Raul Marcelo, 30, deputado estadual e líder do PSOL na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo.

Para derrotar Serra e seu projeto de privatização da escola pública


Todo apoio à greve dos professores

A menos de uma semana após a Assembléia no Palácio dos Bandeirantes, onde os professores e estudantes protagonizaram uma heróica resistência diante dos ataques da Tropa de Choque de José Serra, mais uma vez o governo montou uma praça de guerra para tentar intimidar os professores. Mesmo a direção do sindicato tendo feito um acordo com a PM para não ocupar a paulista, os professores furaram o bloqueio montado pela PM tomando mais uma vez as duas pistas da Paulista antes do início da passeata até a Praça da República (sede da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo). Em Assembléia foi decidido, por unanimidade, dar continuidade à greve. A próxima assembléia ocorrerá no dia 8 de abril na Avenida Paulista e seguirá novamente até a Praça da Republica. Como o governo se recusa abrir negociações, foi aprovado de forma difusa permanecer na praça até que o governo atenda as reivindicações.
A greve dos professores pelos atores envolvidos e pela repercussão que terá no cenário político regional e nacional requer a maior atenção de todos  setores organizados da classe trabalhadora. Como já afirmamos anteriormente a direção do sindicato, que é dirigido pela Articulação (corrente política de Lula que dirige o PT e a CUT) apesar de dirigir a ampla maioria dos sindicatos no Brasil, ainda não moveu uma palha para mobilizar os demais setores em apoio a essa greve fundamental.
Outro aspecto é que essa luta para ter chances de vitória requer uma mobilização que conte com o apoio efetivo de outras categorias organizadas. Nesse conflito o governo Serra conta com o apoio das principais forças burguesas do Estado, basta verificar a linha editorial dos principais meios de comunicação sobre a greve para se verificar quão mentirosa e oportunista são os meios de comunicação que representam a classe dominante.
A direção do sindicato dos professores vive um grande dilema, pois, apesar de interessada no desgaste de José Serra (concorrente direto de Dilma, candidata de Lula), sua posição política é um entrave, que deve ser superado, para que a luta contra Serra possa desenvolver todas as suas possibilidades. Isso porque, de um lado, as políticas educacionais do Estado de São Paulo estão em total consonância com as do governo Lula (Reforma do Ensino médio com objetivo de tirar do currículo disciplinas fundamentais para o conhecimento, sistema de avaliação externa que visa classificar e punir professores, destruição da carreira docente, financiamento educacional submetido às metas de superávit primários com vistas a reduzir investimentos no setor), o que não permite, a esse setor,  uma crítica contundente à política educacional de Serra, pois significaria criticar as políticas levadas a cabo em âmbito nacional  por Lula. Essa direção burocrática teme mais a unificação dos trabalhadores pela base do que a derrota para Serra, pois a separação corporativa da luta é uma forma eficiente de limitar as mobilizações e reivindicações no interior da ordem.
Mobilizar a juventude e a classe a trabalhadora em defesa dos professores da escola pública
É dentro desse cenário que as alternativas classistas dos trabalhadores, como a CONLUTAS, devem apresentar políticas e posturas de mobilização que superem os limites da burocracia lulista. Nesse sentido, é necessário realizar uma verdadeira campanha nacional em defesa dos professores e de suas reivindicações. Uma ampla campanha de esclarecimento deve contar, também, com ações de rua, como passeatas, bloqueios, assembléias, atos nas cidades etc. Outras iniciativas solidárias como coleta de fundos de greve são decisivas nesse momento.
Em boletim anterior defendemos a realização de um acampamento em frente à Secretaria da Educação com meio político–organizativo para dar visibilidade ao movimento grevista. A proposta, aprovada na assembléia, de permanecer em frente à Secretaria da Educação deve ser tratada com a seriedade e conseqüência que merece, pois, mesmo com a saída de Serra do governo devido ao prazo legal para realizar sua campanha eleitoral, a estratégia do governo de quebrar a resistência do magistério para continuar aprofundando os ataques à educação pública permanece. Assim, a proposta aprovada para fazer o governo recuar deve ser levada à sua radicalidade.
O movimento estudantil combativo que já vem desempenhando um papel fundamental nessa luta pode contribuir de maneira ainda mais decisiva para fazer a luta dos professores chegar ao conjunto da classe trabalhadora através de panfletagens nas fábricas, da mobilização de colunas cada vez maiores de estudantes nas assembléias e demais ações. Para que isso se efetive de forma massiva é necessário abrir um amplo debate no interior das universidades e com os alunos da escola pública. Não há mais lugar para a rotina. Assim, convocar assembléia em todas universidade para discutir o significado dessa luta e como apoiar efetivamente as ações dos professores é fundamental.
A greve continua
Práxis na greve
Práxis na greve
Na Avenida Paulista

Crise na europa...


Terceira etapa da grande crise: a Grécia em toda parte
À sombra da crise financeira, floresce sobretudo na Europa o negócio com a dívida pública. Os Estados são os melhores devedores que um credor pode desejar. A lógica é perversa e beira o surrealismo. Nos últimos meses, o Banco Central Europeu inundou os bancos europeus com créditos baratos, negando-se ao mesmo tempo a emprestar dinheiro a Estados membros em dificuldade. Os bancos europeus – a começar pelos alemães – tomaram empréstimos do BCE a juros ínfimos para oferecê-los como empréstimos ao Estado grego com taxas de juro elevadíssimas. Ao mesmo tempo, como resposta à crise, propõe novas "reformas" neoliberais. O artigo é de Michael Krätke

Como era previsível, à crise bancária e financeira não tardou em seguir a crise econômica mundial. E a elas vem somar-se agora a crise das finanças públicas, terceira etapa da Grande Crise. Dívida, culpa e expiação, uma luta encarniçada: os cidadãos devem subsidiar o generoso resgate dos bancos. As dívidas públicas ampliadas aceleradamente são usadas para alimentar essa lógica. Alguns pequenos povos – os islandeses no Norte, os gregos no Sul – tentam resistir a este absurdo dominante e se negam a pagar pela crise. Do dia para a noite, as dívidas de terceiros se converteram em problema de todos.

De acordo com as últimas cifras do FMI, cinco dos Estados do G-8 têm um déficit público superior a 100% do PIB, com o Japão (200%) liderando esse ranking. Alemanha e Canadá, até aqui, estão abaixo do patamar dos 100%. Já os membros da União Européia – Espanha, Portugal, Itália e Grécia – estão beirando esse limite ou já o ultrapassaram. Nunca antes em tempos de paz o déficit público havia subido de maneira tão extrema nos países capitalistas desenvolvidos como vem ocorrendo agora desde o início da crise financeira mundial, no final de2007.

Somente em 2009, os títulos de obrigações emitidos pela República Federal da Alemanha cresceram até alcançar a cifra de 1,6 trilhão de euros. Só em 1995, quando se fizeram sentir de verdade pela primeira vez os custos da reunificação, o salto da dívida pública alemã registrou um salto maior. Nos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o nível médio dos déficits públicos chegou a alcançar cerca de 80% do Produto Interno Bruto (PIB) e, em poucos anos, poderia rebaixar de maneira generalizada a marca dos 100%. A Grécia está em todas as partes.

Os economistas estão fortemente divididos em matéria de dívida pública. Um Estado que contrai pouca dívida pública compromete o futuro; um Estado com demasiados credores arruína a economia nacional. Na Alemanha, como em todos os países governados por neoliberais, impera o dogma segundo o qual as dívidas públicas são um mal em si mesmas, levam à inflação, a uma carga fiscal exorbitante e à bancarrota do Estado. Tentam fazer esquecer, contando para isso com todo o poder dos meios de comunicação, a conexão entre crise financeira, socorro bancários e explosão da dívida pública. Em troca, entoam a cantilena do arrocho e dos cortes com o refrão do “Estado social insustentável”.

Não há razão para o pânico. Nenhum Estado europeu tem que ir à falência. Tampouco os gregos devem devolver esses quase 300 bilhões de euros (cerca de 130% de seu PIB), mas sim devem limitar-se ao refinanciamento regular, isto é, ir substituindo regularmente as velhas dívidas por dívida nova. Em princípio, isso não deveria representar o menor problema. O Estado, dotado de monopólio fiscal e monetário, é o melhor devedor. Ao contrário dos grandes bancos, só pode quebrar quando toda a economia nacional está arruinada. Mas, apesar da crise, isso não pode ocorrer em nenhum lugar da União Européia.

Quanto mais crescem as dívidas dos Estados, mais se coloca dívida pública em alguns mercados financeiros que, em geral, estão ávidos em comprá-las, inclusive com ganhos de cotização, porque os empréstimos oferecidos estão super valorizados. Nem a Grécia teve problemas no início do ano para colocar o triplo da dívida nos mercados financeiros. No conjunto da União Européia, emitiram-se em 2008 mais de 650 bilhões de euros de dívida pública. Em 2009, foram mais de 900 bilhões. Em 2010, segundo as estimativas mais prudentes, esse valor chegará a 1,1 trilhão de euros.

O conjunto dos Estados da União Européia já tem mais de 8 trilhões de dólares inscritos como dívida pública. Os EUA os acompanham com mais de 2,3 trilhões de dólares de dívida pública fresca. O negócio com os títulos de dívida pública floresce como nunca. Por que, então, a inquietude nos mercados financeiros? Por que a repentina preocupação com as dívidas da Grécia, Itália, Espanha, Portugal ou Irlanda? De onde vem o medo de uma bancarrota pública na qual, manifestamente, os mercados financeiros não acreditam nem um pouco? Agora como antes, os pacotes de dívida pública grega, espanhola e portuguesa são comprados com pães quentes saídos do forno; são tão desejados quanto os títulos públicos alemães. Naturalmente, com suculentas cobranças pelo risco, o que torna ainda mais rentável o negócio com esses pacotes.

A dívida pública é mais velha que o capitalismo moderno. A bancarrota do Estado foi outrora – antes do descobrimento do déficit público permanente – um meio bm provado de que se serviam os governantes para submeter seus credores, que se vingavam com juros exorbitantes. Em nossos dias, a falsa demagogia sobre os perigos da bancarrota pública é um meio sumamente efetivo de submeter governos, povos e nações pretensamente soberanos aos interesses dos mercados financeiros. Se o crédito de um Estado é posto efetivamente em dúvida, isso serve sobretudo aos credores e, hoje em dia, a regra geral é que os credores não são outros Estados, mas sim investidores privados, bancos, companhias seguradoras e fundos. Uma parte considerável da riqueza de uma nação vai parar em seus bolsos.

As meras taxas de déficit e de dívida pública pouco dizem sobre o risco efetivo do devedor. Obviamente, os leigos em economia que formam a classe política adoram essas taxas, porque elas desviam a atenção das verdadeiras debilidades da economia nacional (por exemplo, no caso da Alemanha, a extrema dependência das exportações). Também se simplificam de muito bom grado os tipos de juros, a relação entre as receitas fiscais anuais e os juros pagos anualmente. Quando, como ocorre agora na Grécia, as receitas fiscais caem, então os tipos de juros sobem rapidamente até 30 ou 40%. Quando isso ocorre, ou seja, quando o serviço da dívida gera um rombo no orçamento público, o país afetado cai, efetivamente, na armadilha devedora. Para evitá-la é preciso reduzir a carga de juros. Uma comunidade como a formada pelos euro-países poderia conseguir isso de maneira mais simples, fortalecendo a credibilidade de um membro como a Grécia sem necessidade de aumentar a pressão de sua dívida pública. Com isso, seriam desfeitas todas as necessidades populistas de Merkel e companhia.

Foram e seguem sendo os bancos – no caso, os europeus – os compradores da dívida pública grega, os controladores da mesma e os principais responsáveis por sua crise financeira: seguradoras e institutos bancários franceses, suíços e alemães são os principais credores, seguidos de longe por bancos britânicos e estadunidenses. Os bancos portugueses possuem quase tanta dívida pública grega quanto os dos EUA.

Não resta dúvida: os déficits públicos podem ser enxugados com uma vigorosa inflação que desvalorize os títulos da dívida e reduza os juros nominais que o Estado tem que pagar por esses títulos. Mas, para ajudar no curto prazo, a inflação teria que ser galopante. Apesar de uma dívida pública crescente em escala planetária, isso é agora praticamente impossível, pois, dado que existem supercapacidades estruturais em praticamente todos os ramos da economia, os preços podem apenas levantar a cabeça. Por ora, o impulsionador dos preços é o Estado e algumas grandes corporações empresariais capazes de controlar a energia e os recursos. E isso não basta para uma hiperinflação.

Que saída resta então? Pois bem, por uma vez só e para variar um pouco, por que não proceder com bom juízo em vez de adotar zelo dogmático e tendência populista? Seria possível ajudar o povo grego de modo simples e efetivo sem aumentar um centavo a dívida pública do país. Por exemplo, com eurobônus ou créditos do Banco Central Europeu (BCE). Bastaria agarrar-se à regra extraordinária que permite que os bancos centrais da Zona Euro aceitem dívida pública e obrigações da Grécia e de outros países.

Para evitar crises deste tipo no futuro faria mais sentido mudar as regras. Não tem nenhuma lógica econômica que os estatutos do BCE proíbam comprar e possuir dívida pública dos países membros da Zona do Euro. Conforme essa regra absurda, o BCE inundou nos últimos meses os bancos europeus com créditos baratos, negando-se ao mesmo tempo a emprestar dinheiro a Estados membros. Ao invés disso, os bancos europeus – a começar pelos alemães – tomaram empréstimos do BCE a juros ínfimos para oferecê-los como empréstimos ao Estado grego com taxas de juro elevadíssimas. Bonito negócio. Ackerman (1) e companhia estão fascinados.

Não se trata só de necessidade; a coisa tem método. Com o medo da bancarrota pública e a ameaça de um caos monetário em caso de queda do euro, promovem-se novas “reformas” neoliberais. Na Espanha, Itália, Portugal e Inglaterra; a ordem do dia é a aposentadoria aos 67 anos. Em toda parte elas impõem aos cidadãos comuns - não aos proprietários de capital e de patrimônio – drásticos aumentos de impostos. Por toda parte se cortam serviços públicos, se reduz o setor público. Impulsionada agora pela situação de suposta emergência financeira do Estado, avança-se irresponsavelmente na privatização da propriedade pública. Os gregos são massacrados, os portugueses são torrados; as facas contra a Espanha perfilam-se com zelo digno da melhor causa. De te fabula narratur (A história fala de ti).

(1) Josef Ackerman é o presidente executivo do Deutsche Bank, o principal banco privado alemão.

(*) Michael R. Krätke, membro do Conselho Editorial de Sinpermiso, é professor de Política Econômica e Direito Tributário na Universidade de Amsterdan, investigador associado ao Instituto Internacional de História Social dessa mesma cidade e catedrático de Economia Política e diretor do Instituto de Estudos Superiores da Universidade de Lancaster, na Inglaterra.

Tradução: Katarina Peixoto