quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Apropriação indébita: como os ricos estão tomando nossa herança comum


Hoje 95% do milho plantado nos EUA é de uma única variedade, com desaparecimento da diversidade genética. O livre acesso às composições de Heitor Villalobos será a partir de 2034. Isto está ajudando a criatividade de quem? Patentes de 20 anos há meio século atrás podiam parecer razoáveis, mas com o ritmo de inovação atual, que sentido fazem? Já são 25 milhões de pessoas que morreram de Aids, e as empresas farmacêuticas proibem os países afetados de produzir o coquetel. Há um imenso enriquecimento no topo da pirâmide, baseado não no que estas pessoas aportaram, mas no fato de se apropriarem de um acúmulo historicamente construído durante sucessivas gerações. O artigo é de Ladislau Dowbor.

Gar Alperovitz and Lew Daly – Apropriação Indébita: como os ricos estão tomando a nossa herança comum – Editora Senac, São Paulo 2010, 242 p.

A concentração de renda e a destruição ambiental constinuam sendo os nosso grandes desafios. São facetas diferentes da mesma dinâmica: na prática, estamos destruindo o planeta para a satisfação consumista de uma minoria, e deixando de atender os problemas realmente centrais. Como explicar que, com tantas tecnologias, produtividade e modernidade, estejamos reproduzindo o atraso? Em particular, como a sociedade do conhecimento pode se transformar em vetor de desigualdade?

O prêmio Nobel Kenneth Arrow considera que os autores de “Apropriação indébita: como os ricos etão tomando a nossa herança comum”, Gar Alperovitz e Lew Daly, “se baseiam em fontes impecáveis e as usam com maestria. Todo mundo irá aprender ao ler este livro”. Eu, que não sou nenhum prêmio Nobel, venho aqui contribuir com a minha modesta recomendação, transformando o meu prefácio em instrumento de divulgação. Mania de professor, querer comunicar o entusiasmo de boas leituras. E recomendação a não economistas: os autores deste livro têm suficiente inteligência para não precisar se esconder atrás de equações. A leitura flui.

A quem vai o fruto do nosso trabalho, e em que proporções? É a eterna questão do controle dos nossos processos produtivos. Na era da economia rural, os ricos se apropriavam do fruto do trabalho social, por serem donos da terra. Na era industrial, por serem donos da fábrica. E na era da economia do conhecimento, a propriedade intelectual se apresenta como a grande avenida de acesso a uma posição privilegiada na sociedade. Mas para isso, é preciso restringir o acesso generalizado ao conhecimento, pois se todos tiverem acesso, como se cobrará o pedágio, como se assegurará a vantagem de minorias?

Um argumento chave desta discussão, é naturalmente a legitimidade da posse. De quem é a terra, que permitia as fortunas e o lazer agradável dos senhores feudais? Apropriação na base da força, sem dúvida, legitimada em seguida por uma estrutura de heranças familiares. Uma vez aceito, o sistema funciona, pois na parte de cima da sociedade forma-se uma aliança natural ditada por interesses comuns.

Na fase industrial, um empresário pega um empréstimo no banco – e para isso ele já deve pertencer a um grupo social privilegiado – e monta uma empresa. Da venda dos produtos, e pagando baixos salários, tanto auferirá lucros pessoal como restituirá o empréstimo ao banco. De onde o banco tirou o dinheiro? Da poupança social, sob forma de depósitos, poupança esta que será transformada na fábrica do empresário. Aqui também, vale a solidariedade dos proprietários de meios de produção, e o resultado de um esforço que é social será em boa parte apropriado por uma minoria.

Mudam os sistemas, evoluem as tecnologias, mas não muda o esquema. Na fase atual, da economia do conhecimento, coloca-se o espinhoso problema da legitimidade da posse do conhecimento. A mudança é radical, relativamente aos sistemas anteriores: a terra pertence a um ou a outro, as máquinas têm proprietário, são bens “rivais”. No caso do conhecimento, trata-se de um bem cujo consumo não reduz o estoque. Se transmitimos o conhecimento a alguém, continuamos com ele, não perdemos nada, e como o conhecimento transmitido gera novos conhecimentos, todos ganham. A tendência para a livre circulação do conhecimento para o bem de todos torna-se portanto poderosa.

A apropriação privada de um produto social deve ser justificada. O aporte principal de Alperovitz e de Daly, neste pequeno estudo, é de deixar claro o mecanismo de uma apropriação injusta – Unjust Deserts – que poderíamos explicitar com a expressão mais corrente de apropriação indébita. Ao tornar transparentes estes mecanismos, os autores na realidade estão elaborando uma teoria do valor da economia do conhecimento. A força explicativa do que acontece na sociedade moderna, com isto, torna-se poderosa.

Para dar um exemplo trazido pelo autor, quando a Monsanto adquire controle exclusivo sobre determinada semente, como se a inovação tecnológica fosse um aporte apenas dela, esquece o processo que sustentou estes avanços. “O que eles nunca levam em consideração, é o imenso investimento coletivo que carregou a ciência genética dos seus primeiros passos até o momento em que a empresa toma a sua decisão. Todo o conhecimento biológico, estatístico e de outras áreas sem o qual nenhuma das sementes altamente produtivas e resistentes a denças poderia ter sido desenvolvida – todas as publicações, pesquisas, educação, treinamento e ferramentas técnicas relacionadas sem os quais a aprendizagem e o conhecimento não poderiam ter sido comunicados e fomentados em cada estágio particular de desenvolvimento, e então passados adiante e incorporados, também, por uma força de trabalho de técnicos e cientistas – tudo isto chega à empresa sem custo, um presente do passado” (55). Ao apropriar-se do direito sobre o produto final, e ao travar desenvolvimentos paralelos, a empresa canaliza para si gigantescos lucros da totalidade do esforço social, que ela não teve de financiar. Trata-se de um pedágio sobre o esforço dos outros. Unjust Deserts.

Se não é legítimo, pelo menos funciona? A compreensão do caráter particular do conhecimento como fator de produção já é antiga. Uma jóia a este respeito é um texto 1813 de Thomas Jefferson:

“Se há uma coisa que a natureza fez que é menos suscetível que todas as outras de propriedade exclusiva, esta coisa é a ação do poder de pensamento que chamamos de idéia....Que as idéias devam se expandir livremente de uma pessoa para outra, por todo o globo, para a instrução moral e mútua do homem, e o avanço de sua condição, parece ter sido particularmente e benevolmente desenhado pela natureza, quando ela as tornou, como o fogo, passíveis de expansão por todo o espaço, sem reduzir a sua densidade em nenhum ponto, e como o ar no qual respiramos, nos movemos e existimos fisicamente, incapazes de confinamento, ou de apropriação exclusiva. Invenções não podem, por natureza, ser objeto de propriedade.” (1)

O conhecimento não constitui uma propriedade no mesmo sentido que a de um bem físico. A caneta é minha, faço dela o que quiser. O conhecimento, na medida em que resulta de um esforço social muito amplo, e constitui um bem não rival, obedece a outra lógica, e por isto não é assegurado em permanência, e sim por vinte anos, por exemplo, no caso das patentes, ou quase um século no caso dos copyrights, mas sempre por tempo limitado: a propriedade é assegurada por sua função social – estimular as pessoas a inventarem ou a escreverem – e não por ser um direito natural.

O merecimento é para todos nós um argumento central. Segundo as palavras dos autores, “nada é mais profundamente ancorado em pessoas comuns do que a idéia de que uma pessoa tem direito ao que criou ou ao que os seus esforços produziram”.(96) Mas na realidade, não são propriamente os criadores que são remunerados, e sim os intermediários jurídicos, financeiros e de comunicação comercial que se apropriam do resultado da criatividade, trancando-o em contratos de exclusividade, e fazem fortunas de merecimento duvidoso. Não é a criatividade que é remunerada, e sim a apropriação dos resultados: “Se muito do que temos nos chegou como um presente gratuito de muitas gerações de contribuiçoes históricas, há uma questão profunda relativamente a quanto uma pessoa possa dizer que “ganhou merecidamente” no processo, agora ou no futuro.”(97)

As pessoas em geral não se dão conta das limitações. Hoje 95% do milho plantado nos EUA é de uma única variedade, com desaparecimento da diversidade genética, e as ameaças para o futuro são imensas. Teremos livre acesso às obras de Paulo Freire apenas a partir de 2050, 90 anos depois da morte do autor. O livre acesso às composições de Heitor Villalobos será a partir de 2034. Isto está ajudando a criatividade de quem? Patentes de 20 anos há meio século atrás podiam parecer razoáveis, mas com o ritmo de inovação atual, que sentido fazem? Já são 25 milhões de pessoas que morreram de Aids, e as empresas farmacêuticas (o Big Pharma) proibem os países afetados de produzir o coquetel, são donas de intermináveis patentes. Ou seja, há um imenso enriquecimento no topo da pirâmide, baseado não no que estas pessoas aportaram, mas no fato de se apropriarem de um acúmulo historicamente construído durante sucessivas gerações.

Nesta era em que a concentração planetária da riqueza social em poucas mãos está se tornando nsustentável, entender o mecanismo de geração e de apropriação desta riqueza é fundamental. Os autores não são nada extermistas, mas defendem que o acesso aos resultados dos esforços produtivos devam ser minimamente proporcionais aos aportes. “A fonte de longe a mais importante da prosperidade moderna é a riqueza social sob forma de conhecimento acumulado e de tecnologia herdada”, o que significa que “uma porção substantiva da presente riqueza e renda deveria ser realocada para todos os membros da sociedade de forma igualitária, ou no mínimo, no sentido de promover maior igualdade”.(153)

Um livro curto, muito bem escrito, e sobretudo uma preciosidade teórica, explicitando de maneira clara a deformação generalizada do mecanismo de remuneração, ou de recompensas, que o nosso sistema econômico gerou. Trata-se aqui de um dos melhores livros de economia que já passaram por minhas mãos. Bem documentado mas sempre claro na exposição, fortemente apoiado em termos teóricos, na realidade o livro abre a porta para o que podemos qualificar de teoria do valor, mas não da produção industrial, e sim da economia do conhecimento, o que Daniel Bell qualificou de “knowledge theory of value”. A Editora Senac tomou uma excelente iniciativa ao traduzir e publicar este livro. Vale a pena. (www.editorasenacsp.com.br)

(1) Citado por Lawrence Lessig, The Future of Ideas: the Fate of the Commons in an Connected World – Random House, New York, 2001, p. 94

(*) Ladislau Dowbor, professor de economia e administração da PUC-SP, é autor de Democracia Econômica e de Da propriedade Intelectual à Sociedade do Conhecimento, disponíveis em http://dowbor.org

“Querem transformar o controle técnico da internet em controle político e cultural”


por Juliana Sada  no blog ESCREVINHADOR

Publicamos hoje a continuação da entrevista com o sociólogo Sergio Amadeu. Nesta segunda parte um dos maiores especialistas em internet no Brasil aponta quais são as grandes ameaças à privacidade e liberdade na rede.
A primeira parte da entrevista sobre o Plano Nacional de Banda Larga intitulada “Jogo complexo: a grande mídia não está sozinha” pode ser lida aqui

Quais são os obstáculos que estão postos e quais iniciativas de cerceamento da liberdade na internet?

Existem governos, como o da China, e grupos de pessoas ou políticos conservadores que querem transformar os protocolos, o controle que é dado tecnicamente na internet em controle político e cultural.
É difícil a gente falar isso: a rede amplia a liberdade de expressão, amplia a capacidade de interação entre as pessoas, ela é uma rede que permite a liberdade nesse sentido. Mas ela é uma rede também de controle. Ela é uma rede cibernética: de comunicação e controle.
Atualmente você pega um grupo como o Google que conseguiu atrair a atenção e interesse das pessoas, que passaram a entregar as suas informações voluntariamente, porque era legal usar o Gmail,o Youtube, o Orkut, as aplicações, o mecanismo de busca…É uma empresa que não obrigou ninguém a passar tanta informação para eles mas eles são um repositório de informações jamais alcançado  por alguém história da humanidade.
Nunca tivemos uma situação onde pudéssemos falar tanto e nunca fomos tão controlados. É uma aparente contradição mas não é. A própria rede para ser dispersa, tem que ser extremamente controlada. Mas na hora que eu transformo esse controle tecnológico, que é tipico da cibernética, em controle  cultural e começo a dizer que deve passar por determinados lugares, que tem que definir o comportamento político cultural das pessoas. Daí eu tenho algo extremamente grave. Então nós estamos com um grande problema hoje. E uma das grandes expressões desse problema de transformação do controle tecnológico em controle político se dá em torno da neutralidade da rede.
Você pode explicar o conceito de neutralidade da rede?
A internet ela pode ser entendida como uma rede lógica, uma rede de informações. Para usarmos a internet, utilizamos a infraestrutura de telecomunicações, ou seja, os controles do que a gente chama de camada física da rede. Essas operadoras de telecom querem controlar o fluxo de informações que passa por seus cabos.
A internet até hoje não funcionou assim porque uma camada era neutra em relação às outras. Daí o termo neutralidade da rede. Ou seja, até hoje não era permitida a discriminação dos pacotes, seja por origem, destino, conteúdo…
Agora essas operadoras dizem “não, nós estamos com um problema: as pessoas tão baixando vídeo e compete com um tráfego importante de dados. Os vídeos tem que pagar para andar na minha rede”. É como se fossem pedágios virtuais nesse sentido. E elas querem assim: se o blog do Sergio Amadeu não tiver acordo com uma operadora americana, não vão abrir o blog com a mesma velocidade do MSN, que tem um acordo.
Então nos vamos implantar estradas pedagiadas, vamos implantar as regras de mercado dentro do ciberespaço. O ciberespaço sempre permitiu ação do mercado mas ele não é o mercado, ele é o espaço comum, onde todos eram tratados de maneira equânime. E as operadoras com essa tentativa de restrição, estão interferindo diretamente no meu interesse, na minha liberdade de me comunicar.
Isso coloca em risco a criatividade da rede. Se eu criar uma nova aplicação, o que vai acontecer? Uma operadora pode dizer “não sei o que é isso, não vou deixar passar”. O Twitter poderia não existir, o Youtube…Pois todo mundo que quiser criar algo vai ter que ser sócio deles, senão não vai poder caminhar nas redes. Isso é uma aberração.
Defender a neutralidade na rede, é defender a liberdade de expressão, de criação, de invenção. E é uma das coisas mais importantes no mundo da internet hoje.
Que iniciativas existem nesse sentido?
Nos EUA, a Justiça deu ganho de causa à empresa Conquest que alegava poder privilegiar determinados pacotes de informação em detrimento a outros em sua rede. E a FCC, a Anatel deles,  está contra essa decisão e tem ações legais no parlamento americano para aprovar projetos que garantam a neutralidade na rede, contra a descriminação dos pacotes.
No Brasil colocamos no Marco Civil da Internet que um dos princípios da internet no Brasil é a neutralidade na rede. Isso colocaria, ao menos no nosso território, uma situação difícil para operadoras que começassem a interferir nos pacotes.  É um movimento no qual a gente tenta aprovar leis em todos os países importantes do mundo pra garantir a neutralidade da rede.
Porque isso não depende de cada país já que o acesso não tem fronteiras, certo?
Essa questão é bem interessante. O que a gente quer fazer em cada país é garantir que a internet continue livre e não fazer uma lei para dizer “meu país é diferente”. Então é um espírito de uma parte da opinião pública mundial que luta por isso. Olha que interessante: a internet é transnacional mas se os EUA aplicarem o processo de quebrar a neutralidade, eles vão impor essa lógica no mundo inteiro pois é la que estão os maiores provedores de conteúdo e as principais redes sociais.
Então, na verdade, temos que lutar com leis contra o poder de oligopólio desse controladores das redes físicas. A rede física é que controla os cabos, satélites, cabos submarinos…Esses caras são oligopólios no mundo, é mais fácil a gente convencer o governo americano a fazer algo do que a convencermos uma operadora dessa. Porque eu não posso eleger-los, eu não posso controlar-los. Eles não se guiam por preceitos democráticos, é a ditadura do capital. Então é muito grave,  daí estranhamente para defender a liberdade transnacional, a gente recorre às leis nacionais.  Dizendo “neste pedaço da terra, o fluxo é livre, naquele também, naquele também” e se esses países forem os mais importantes, a gente venceu a batalha.
E qual o interesse das operadoras em fazer isso? Tem a ver com o interesse da indústria fonográfica em barrar o download de músicas, por exemplo?
O interesse maior é eles ganharem mais dinheiro, é cobrar. E aí tem a indústria do copyright, que pensa “bom, se eles puderem controlar a rede, eu faço um acordo com eles pra não passar protocolo bitorrent pela rede deles e aí eu acabo com a pirataria”. É ilusão dos caras isso. Mas o principal interesse das operadores é aumentar seu controle, eles pegam o controle técnico que tem – os computadores sabem que pacotes estão passando – e aí eles ganham mais dinheiro.
E para ganhar mais dinheiro eles destroem a liberdade de expressão, de criação. Eles passam a ter um controle grande porque se eu inventar a Web 3D, vou ter fazer um acordo com ele porque senão eles podem barrar meu conteúdo. Vamos ter cercas digitais e eles só abrem a porteira mediante pagamento ou acordo. Isso é um controle gigantesco sobre a criatividade.
No mundo, as operadoras estão se concentrando – vão ser de 10 a 12 grandes operadoras, que tem mais poder que  Estados. E é um poder sobre a comunicação e então a gente tem que  superar essa nossa dependência desse tipo de companhia – não sei ainda qual seria a solução mas a situação atual é grave. Essas empresas são estratégicas do ponto de vista do direito a comunicação hoje e elas tem que ter o controle social.
Quem são as grandes empresas de telecom? Quem são esses grupos que controlam o mercado?
Tem algumas empresas grandes dos EUA, a AT&T, Conquest, Verizon…Alguns grupos europeus como a Telefônica, a Vodafone e algumas alemãs. Tem duas grande chinesas, muito grandes. Mas o que está acontecendo é que essas empresas estão se coligando, então o grande perigo é essa enorme concentração. É um setor estratégico, eles tem toda a infra-estrutura da rede. Por exemplo, como é que a China faz: eles não deixam que alguns IPs sejam lidos o fluxo de alta velocidade vem e ao entrar na China, tem um computador que filtra. É o chamado grande firewall chinês, a grande barreira.

É possível haver uma regulação a nível mundial? Alguma instância de decisão?

Não, acima dos Estados Nacionais tem acordos. Seria uma boa ideia a gente tentar fazer um acordo em defesa da liberdade na internet mas é muito difícil. No momento nós temos que ganhar a opinião pública em cada país. Porque aí as sociedades em cada local brigam. Na Espanha tem uma briga forte em defesa da neutralidade da rede. Na França infelizmente a gente perdeu para o Sarkozy, que criou lei absurdas. Mas a gente tem um movimento mundial.
Você pode explicar sobre a lei aprovada na França e que foi debatida no parlamento de vários países europeus?
A grande iniciativa hoje é chamada “three strikes”, são as três batidas. Eles identificam que você está baixando, por exemplo, um arquivo de música. Então ele violam a sua privacidade para ver que tipo de arquivo você está baixando. Se for um arquivo protegido pelo copyright, ou melhor dizendo cerceado pelo copyright, eles te mandam um aviso “você está violando a lei” – é a primeira batida. Se você continuar, eles te mandam um segundo aviso e na terceira vez eles cortam a sua conexão, em geral por um ano.
Qual o problema disso? Pense na minha casa que tem três pessoas usando a internet, só eu baixei a música. Na hora que me desconectam, são prejudicadas outras pessoas que não tem nada a ver com isso. Quer dizer, é uma lei inexequível. Tanto é que na França ela foi aprovada há mais de um ano mas não foi aplicada.
A grande questão em relação ao IP [Internet Protocol, número de identificação de um computador na rede] é a seguinte: para você navegar na internet você tem que ter um número de IP, então é muito fácil identificar o IP, a máquina e a região em que está. O grande problema é você individualizar o IP, ou seja, vincular um IP a uma identidade civil. Daí toda aquela navegação, tudo o que aquele IP fez pode ser rastreado por outros e não só autoridades. Basta que eu sabia que o IP x é do Sergio Amadeu. Eu acabo seguindo o rastro digital. Então é uma coisa bem complicada do ponto de vista da privacidade.

O Ateísmo como militância social

Escrito por Mário Maestri   no Correio da Cidadania
 
Dentro do respeito às crenças individuais dos homens e das mulheres de bem, a militância ateísta é dever social inarredável para todos os que se mobilizam pela redenção da humanidade da alienação social, material e espiritual que a submerge crescentemente neste início de milênio, ameaçando a sua própria existência. Por mais subjetiva, introspectiva e sublimada que se apresente, a crença religiosa jamais nasce, se realiza e se esgota no indivíduo. Ela é fenômeno parido no mundo social, que influencia essencialmente a ação individual e coletiva.
 
Em forma mais ou menos radical, mais ou menos plena, mais ou menos consciente, a crença religiosa dissocia-se da objetividade material e social. Ela desqualifica o doloroso esforço histórico que permitiu ao ser humano superar sua origem animal e, percebendo a si e à natureza, começar a conhecer as leis imanentes ao mundo, na difícil, necessária e inconclusa luta pela harmonização da existência social.
 
A crença religiosa nega as crescentes conquistas da racionalidade, da objetividade, da materialidade, da historicidade, encobrindo-as com as espessas sombras da irracionalidade, da subjetividade, do espiritualismo. Desequilibra a difícil luta do ser humano para erguer-se sobre as pernas e moldar o mundo com as mãos, forçando-o a ajoelhar-se novamente, apequenado, temeroso, embasbacado diante do "desconhecido", sob o peso de alienação socialmente alimentada.
 
A crença religiosa droga o ser social com suas ilusões infantis de redenção conquistada através da obediência incondicional a estranho super-pai, que em muitas das mais importantes tradições espiritualistas, apesar de onisciente, onipotente e onipresente, e, assim, capaz de tudo dar aos filhos, lançou-os – no singular e no plural – em desnecessárias desassistência, miséria e tristeza.
 
É porque é!
 
A essência anti-científica da religião, que não argumenta, pois se nutre da crença incondicional no arbitrário, materializa-se na oposição visceral, mais ou menos realizada, ao maior tesouro humano, a capacidade de diálogo e de compreensão tendencial do universo. Que o digam Galileu e Giordano Bruno! Daí sua histórica intolerância, desconfiança e ojeriza para com o pensamento científico. E, verdadeiro tiro no pé, seu constante e paradoxal esforço para afirmar que a ciência seja uma crença a mais.
 
O pensamento religioso nega e aborta o ativismo e o otimismo racionalistas e materialistas, nascidos da possibilidade de compreensão, domínio e transformação do mundo social e material. Impõe visão pessimista, quietista, introspectiva e infantil do universo, essencialmente petrificado e eternizado pela materialização de transcendência, à qual o homem deve apenas submeter-se e render-se, para merecer a liberação.
 
Para tais visões, o ativismo e otimismo social são incongruências, ao não haver imperfeição social superável, já que esta última nasce da própria natureza humana, habitada pelo mal e pelo pecado, devido ao desrespeito a interdições primordiais do pai eterno – olha aí ele de novo –, origem do pecado. Pecado que exige incessante expiação e penitência, lançando o ser religioso em triste e mórbido mundo de culpa, de submissão, de punição.
 
Ativismo e otimismo sociais impensáveis para uma forma de compreender a sociedade em que não há história. Ou o que compreendemos como história se mostra ininteligível, pois regida essencialmente por determinações transcendentais paridas e concluídas à margem das práticas humanas. Realidade à qual, segundo tal visão, podemos ascender, muito limitadamente, apenas através da revelação.
 
Quando deus mata o homem
 
Na sua petrificação a-social e a-histórica, a religião cria um mundo chato, triste, deprimente, infantil, mórbido. Um universo que valoriza a paciência, a submissão, o imobilismo, o quietismo, a humildade, a transcendência, a espiritualidade etc., valores e comportamentos historicamente explorados pelos opressores, no esforço de manter o mundo imóvel, através de alienação e submissão dos oprimidos, nesta vida, é claro, pois na outra se sentarão à direita de deus-pai.
 
O ateísmo militante é necessário ao retrocesso da alienação, enormemente crescente em tempos de vitória da contra-revolução neoliberal. Ele impõe-se na luta por um mundo mais rico, mais pleno, mais livre, mais fraterno, em que o homem seja o amigo, não o lobo do homem. É imprescindível ao esforço de superação da miséria, da tristeza e da dor, materiais e espirituais, nos limites férreos da natureza humana historicamente determinada.
 
O ateísmo militante é democrático, pois tem como essencial meio de pregação a conscientização, individual e coletiva, da necessidade de assentar as práticas sociais nos valores da humanidade, da racionalidade, da liberdade, da solidariedade, da igualdade. Pregação racionalista e materialista que compreende que a superação da alienação espiritual será materializada plenamente apenas através da superação da alienação social e material.
 
O que exige intransigente luta política, cultural e ideológica pela defesa dos maltratados valores do laicismo, única base possível para convivência social mínima por sobre crenças religiosas, étnicas, ideológicas etc. singulares. Laicismo agredido pela despudorada exploração mercantil, política e social, direta ou indireta, por parte das religiões novas e antigas, da crescente fragilidade popular contemporânea. O monopólio público da educação e da grande mídia televisiva e radiofônica, sob controle democrático, e a ilegalização do escorcho religioso popular direto são pontos programáticos dessa mobilização.
 
O Céu e o Inferno
 
O ateísmo militante é pregação de adultos, conscientes do limite e dos perigos de empreitada subversiva, dessacralizante e mobilizadora, pois voltada para a necessidade do homem de retomar as rédeas de sua vida material e espiritual, no aqui e no agora. É jornada sem esperanças de premiações e de graças na outra vida, e sobretudo nessa, ao contrário do habitual nas religiões oferecidas como vias expressas para o sucesso individual, no rentável balcão da exploração da alienação.
 
O racionalismo militante é caminho difícil que premia os que nele perseveram com a experiência, mesmo fugidia, com o que há de melhor nos seres humanos, a racionalidade, a solidariedade, a fraternidade. Sentimentos e práticas vividos em forma direta, sem tabelas, pois a única ponte que liga os homens são as lançadas pelos próprios homens, entre homens construídos pela história à imagem e semelhança dos homens.
 
A vida racional é aventura recompensada, sobretudo, pelo inebriante desvelamento do encoberto pela ignorância e irracionalidade e pelo equilíbrio obtido na procura da harmonia social, por mais difícil e limitada que seja. Trata-se de caminho que permite, sem sonhar nem crer, seguir decifrando, alegre e desvairadamente, esse mundo crescentemente encantado e terrível. Viagem por esta vida terrena, valiosa, breve e única, sempre apoiada na lembrança de que, diante das penas e tristezas, não se há de rir ou chorar, mas sobretudo entender, para poder transformar.
 
Uma experiência de vida que, mesmo bordejando não raro o inferno, ou sendo elevada fugidamente aos reinos dos céus, sabe-se que tudo se passa e se conclui nesse mundo, concreto, terrivelmente triste e belo, sobre o qual somos plena, total, sem desculpas e irremediavelmente responsáveis.
 
Mário Maestri é rio-grandense, historiador, ateu, marxista, comunista sem partido. E-mail: maestri@via-rs.netEste endereço de e-mail está protegido contra spam bots, pelo que o Javascript terá de estar activado para poder visualizar o endereço de email
 

O debate que as grandes empresas de comunicação querem interditar



A imprensa brasileira foge desse debate como o diabo da cruz. O debate sobre a regulação do setor da comunicação. A mínima menção sobre o mesmo provoca gritos tão eloqüentes quanto ignorantes sobre as ameaças à liberdade de expressão e de imprensa que o mesmo traria. É uma mentira deslavada. E a população brasileira precisa ser informada disso. A imensa maioria dos países apontados por essa mesma imprensa como modelos de liberdade de expressão (EUA e os países europeus) possuem legislações nesta área, algumas delas bastante restritivas no que diz respeito, por exemplo, à publicidade em horário nobre nos canais de televisão. Leis que existem em países com Suécia e Holanda, por exemplo, aqui seriam taxadas de chavismo ou algo do gênero. Esse comportamento, na verdade, não é exclusividade da imprensa brasileira, reproduzindo-se também em outros países.
Não se trata, na verdade, de um problema de imprensa ou de comunicação exatamente, mas sim de um problema político-econômico. As grandes empresas de comunicação no mundo inteiro, como se sabe, são hoje, em sua esmagadora maioria, braços midiáticos de interesses corporativos e ideológicos poderosos e mito bem identificados. Esses interesses seqüestraram os conceitos de liberdade de imprensa e de liberdade de expressão. E o que pior: trata-se de um seqüestro sem pedido de resgate. Querem manter os reféns em prisão perpétua.
Seguem duas sugestões de leitura que mostram que esse problema não é exclusivamente brasileiro.
O jornalista Ignácio Ramonet, ao receber o Prêmio Antonio Asensio, em Barcelona, criticou aqueles que fazem “entretenimento domesticado” ao invés de fazer jornalismo. “A imprensa escrita”, assinalou, “vive um dos momentos mais difíceis, e o jornalismo atravessa uma grave crise de identidade. O importante se dilui no trivial e o sensacionalismo substitui a explicação. A informação é algo muito sério, pois de sua qualidade depende a qualidade da democracia. Para ele, ainda há muitas injustiças no mundo que justificam uma concepção do jornalismo a favor de mais liberdade, justiça e democracia”. (leia mais aqui)
No Chile, a revista Punto Final publicou dia 15 de outubro um artigo de Paul Walder denunciando o que chama de “obsceno poder da imprensa chilena”. Os problemas apontados são muito similares:
É o provincianismo em sua pior expressão. Porque é a ignorância manipulada e conduzida. Hoje é o governo argentino, personalizado na presidenta Cristina Fernández, outro dia é Hugo Chávez. Há algumas décadas era o comunismo internacional e, numa determinada ocasião, foi um foguete sinalizador brasileiro. Os meios de comunicação chilenos, tal como ouvimos durante mais de uma década, estão aí (supostamente) para mostrar a verdade. Mas sua versão da realidade é o lugar dos interesses do poder. (leia mais aqui)

terça-feira, 2 de novembro de 2010

III Encontro Civilização ou Barbárie

Comunicação de Michel Chossudovsky


“Tudo aquilo que a Fundação [Ford] fez pode ser considerado no âmbito de “tornar o mundo seguro para o capitalismo”, diminuindo as tensões sociais ao ajudar a socorrer os angustiados, a proporcionar válvulas de segurança aos raivosos e a melhorar o funcionamento do governo (McGeorge Bundy, conselheiro de Segurança Nacional dos Presidentes John F. Kennedy e Lyndon Johnson (1961-1966) e Presidente da Fundação Ford (1966-1979).

“Ao pôr os fundos e o enquadramento político à disposição de muita gente preocupada e dedicada que trabalha no sector não lucrativo, a classe dirigente pode ir buscar líderes às comunidades de base,… e pode tornar o financiamento, a contabilidade e os componentes de avaliação do trabalho tão demorado e oneroso que o trabalho de justiça social é praticamente impossível nessas condições” (Paul Kivel, You Call this Democracy, Who Benefits, Who Pays and Who Really Decides, 2004, p. 122 )

“Na Nova Ordem Mundial, o ritual de convidar líderes da “sociedade civil” para os círculos interiores do poder – enquanto simultaneamente reprime os cidadãos comuns – satisfaz diversas funções importantes. Primeiro, diz ao Mundo que os críticos da globalização “têm que fazer concessões” para ganharem o direito de se misturar. Segundo, transmite a ilusão de que, embora as elites globais devam – no que eufemísticamente se chama democracia - estar sujeitas à crítica, governam legitimamente. E terceiro, diz “não há alternativa” à globalização: não é possível uma mudança radical e o mais que podemos esperar é negociar com esses governantes um ineficaz “dar e receber”.

Leia o texto na íntegra no DIARIO.INFO

Não é o que parece

Em um primeiro momento a vitória de Dilma pode parecer acachapante, considerando-se, inclusive, que é a terceira seguida da coligação do PT sobre a do PSDB em três eleições presidenciais. Pode parecer, ainda, que o Lulismo, em seu auge, desarticula o PSDB e o deixa em condições debilitadas para sequer ameaçar a maioria governamental no Congresso. O pragmatismo submeteu a discussão política a um segundo plano e os gênios da comunicação foram bem sucedidos ao embalar o produto de acordo com a avidez do consumidor em continuar com a festa do crescimento.
Embora tenhamos que reconhecer os méritos de Lula e a perseverança de Dilma, o quadro político que se revela no pós-eleição não é tão róseo quanto possa parecer.
Dilma é eleita com um pouco mais de 41% dos votos totais e somando-se abstenções, votos brancos e nulos temos quase 27% de eleitores que, não se entusiasmando com as opções, viraram as costas para os postulantes. Somando-se este contingente aos eleitores de Serra, temos a segunda e óbvia conclusão: Dilma foi eleita por uma minoria de eleitores. Lula, do alto de seus 83% de aprovação, só conseguiu transferir 50% de sua popularidade a sua pupila, agora presidente eleita.
Não digo isso para minimizar o extraordinário feito de Dilma que, do quase anonimato, tornou-se a primeira mulher eleita presidente do Brasil, o que não é pouca coisa. Digo porque a intenção afirmada em seu primeiro discurso pós resultado das urnas, é e precisa ser levado a sério. Quando diz que estenderá as mãos àqueles que não caminharam com ela, longe de ser um gesto generoso, é um gesto necessário e fundamental para a sobrevivência deste novo futuro governo.
Não são poucas as equações politicas a serem resolvidas. A oposição à presidente eleita liderará os estados com os maiores colégios eleitorais do pais, com mais de 52% dos eleitores. O “corredor oposicionista” vai de Santa Catarina ao Pará, presente nos Estados mais cosmopolitas ( com excessão do Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro) com maior população urbana e com intensa atividade agrícola e industrial. Embora com ampla maioria no Congresso, a gestão federativa não apresenta o mesmo conforto que as casas legislativas prometem. Prometem?
Aí vem o outro desafio: até onde vai a coligação liderada pelo PT nessas eleições?
O PMDB caracteriza-se como a fina flor do fisiologismo. Sempre foi governo não importando a coloração partidária do representante máximo da nação. No entanto, dessa vez, teve um importantíssimo papel para que os resultados apurados nas urnas fossem tão favoráveis à Dilma. A obediência quase cerimonial dos seus líderes às vontades do presidente e, claro, vice-versa, apontam agora uma expectativa muito além do discreto e palaciano conchavo. A expectativa do PMDB é a de dividir o governo em igualdade de condições e não deixará de explicitar a contabilidade acima para pressionar o governo Dilma pelo maior número de cargos-chave possíveis. O atual vice-presidente eleito já declarou que seus apaniguados estão cheios de “vontade de colaborar” e que ela não deve ser relativizada. Agora, não deixa de ser ironico que o PT, no auge de sua performance, passe a dever ao que há de pior na politica fisiológica o sucesso de seu futuro governo. Ora, são as armadilhas mortais que a lógica eleitoral impõe ( impõe?). A fraternidade exibida na campanha poderá adquirir nuances fraticídas no exercício do poder. Não dá para se esquecer dos recorrentes episódios envolvendo e originados nos Correios, não é mesmo?
Outro ponto cantado em prosa e verso e que em breve poderá, inclusive, habitar o que há de melhor na literatura de cordel, é o papel do Lula em um próximo governo. Lula é uma destas lideranças raras que não precisa de institucionalidades para se afirmar. Onde ele estiver, da sacada de seu apartamento em São Bernardo aos salões áulicos de Brasília, Lula sempre carregará o mistério dos oráculos. Persistirá a expectativa nacional de perscrutar através de seus olhos as sendas que nos levarão ao futuro promissor. Será ele o discreto e sábio conselheiro que tornará Dilma uma ponderada, eficiente e estratégica liderança? Ou Dilma, no ofício de construir pontes para viabilizar seu governo encontrará nele seu principal desarticulador? Não, é claro, pela falta da persistente dedicação que continuará a conferir à sua criatura, mas pela dificuldade de transferir o intransferível e tomar para sí o que não lhe cabe mais. Se assim fizer, a discípula do maior mestre politico que a democracia brasileira jamais produziu, acabará por se constituir em um arremedo a assombrar-se pelos salões do Planalto, frente a frente com os fantasmas da incompetência politica.
Assim, com uma votação que expressa menos da metade da vontade nacional; com uma oposição desarticulada nacionalmente mas fortemente entrincheirada nos estados; com uma coligação eleitoral que mal disfarça a ansiedade frente a partilha do botim; com a sombra persistente do carisma mítico e legendária de Lula, Dilma inicia sua caminhada rumo ao exercício da presidência. Este que será, provavelmente, o último mandato da geração de lideranças forjadas na luta contra a ditadura e que, embora artífices da redemocratização, ainda não conseguiram nos conduzir à modernidade democrática à altura das necessidades que o Brasil exige neste séc. XXI.
Desejo muita luz à nossa presidente eleita Dilma. Mas desejo ainda, mais fervorosamente, que o discurso proferido após a vitória, guie seus atos, fortaleça suas ações e que ela se torne, orgulhosamente, a primeira presidente mulher de todos os brasileiros.

Ricardo Young

Ricardo Young é empresário, graduado em Administração de Empresas pela FGV, presidente do Conselho Deliberativo do Yázigi Internexus; foi presidente da Associação Brasileira de Franquias (ABF). Foi presidente do Instituto Ethos; conselheiro das organizações Global Reporting Initiative (GRI) em Amsterdam, Holanda, Accountability, em Londres (Inglaterra) e Grupo de Zurich (Suiça).

Grande Banda...

Dire Straits

Todos os créditos ao blog Lagrimapsicodélica, do qual temos a rádio online com muita música legal... Não deixem de visitá-lo, vale a pena!
 
Dire Straits foi uma banda de rock britânica formada em 1977 por Mark Knopfler (guitarra e vocais), seu irmão David Knopfler (guitarra), John Illsley (baixo) e Pick Withers (bateria). Embora formada em uma época em que o punk rock reinava absoluto, decidiram lidar com as convenções do rock clássico, firmando-se em uma sonoridade mais leve, que agradou ao público cansado do som superproduzido do rock dos anos 70. Não tardou para que a banda se tornasse conhecida mundialmente, ganhando o status de disco de platina logo em seu primeiro álbum.
Entre suas canções mais conhecidas estão "Sultans of Swing", "Lady Writer", "Romeo and Juliet", "Private Investigations", "So Far Away", "Money for Nothing", "Walk of Life", "Your Latest Trick" e "Brothers in Arms".
Apesar do grande sucesso, a banda terminou sem estardalhaços em 1994, quando Mark Knopfler expressou o desejo de não mais fazer turnês em larga escala, passando imediatamente a se dedicar integralmente à sua carreira solo.
senha/password: lagrimapsicodelica
1978 - Dire Straits: Download
1979 – Communiqué: Download
1979 - Live At The Rockpalast: Download
1980 - Making Movies: Download
1981 - Live At The BBC: Download
1982 - Extended Dance Play: Download
1982 - Love Over Gold: Download
1984 – Alchemy: Download
1985 - Brothers In Arms: Download
1985 - Live In San Antonio: Download
1985 - Rare Live Songs: Download
1988 - Money For Nothing: Download
1991 - On Every Street: Download
1992 - Live In Basel: Download
1993 - On The Night: Download
1995 – Rare: Download
1998 - Live At The Royal Albert Hall: Download
1998 - Sultans Of Swing: Download
1999 - Dire Straits & Jam With: Download
1999 - The Very Best Of Dire Straits: Download

Ao invéz de um papa fascista, essa deveria ser a coordenação católica mundial

Há tempos a Amazônia sofre com a exploração predatória de seus recursos naturais e com o desrespeito às populações tradicionais que habitam a maior floresta do mundo. Missionários católicos estrangeiros, como prevê a Teologia da Libertação, lutam para reescrever essa história

Por Carlos Juliano Barros
 
Frei Henri des Roziers é o número um da lista dos jurados de morte pelos latifundiários paraenses

À primeira vista, é difícil acreditar que um carismático francês de 76 anos, de fala lenta e andar compassado por conta da saúde debilitada, encabece a lista dos jurados de morte pelos fazendeiros e madeireiros que transformaram o Pará num apimentado caldeirão de conflitos fundiários. Henri des Roziers, advogado e frei dominicano que há quase três décadas escolheu o Brasil como palco de sua militância social e religiosa, já não anda mais sem a sombra de seguranças pagos por um programa de proteção do Governo Federal. Depois do assassinato da freira norte-americana Dorothy Stang, ocorrido em fevereiro do ano passado em Anapu, às margens da rodovia Transamazônica, não lhe restou alternativa. Desde então, é acompanhado dia e noite por dois policiais que se revezam para garantir sua integridade. Um deles, por sinal, é filho de Raimundo Ferreira Lima, o Gringo, conhecido sindicalista do sul do estado morto em 1980 por se envolver, assim como Frei Henri e Dorothy, na luta pela reforma agrária.
O processo de ocupação da Amazônia desenhado nos últimos quarenta anos deixou um saldo preocupante de crimes contra o meio-ambiente e os direitos humanos. De acordo com dados oficiais, mais de 16% da cobertura original da maior floresta do mundo já foram devastados - área equivalente aos territórios de França e Portugal juntos. Somam-se a isso o desrespeito às populações tradicionais e a superexploração do trabalho de milhares de migrantes que enxergaram na imensidão verde um meio de driblar a escassez de emprego nos seus locais de origem, principalmente no semi-árido nordestino.
Gado na rodovia PA 150: a expansão da pecuária e da soja é uma das principais causas do desmatamento e do trabalho escravo na região Norte do Brasil
A Amazônia pagou um preço muito caro pela noção de progresso associada ao fomento de atividades agropecuárias e de extração de madeira e minérios - desenvolvidas por grandes grupos empresariais e poderosos latifundiários vindos, em sua maioria, do sul do Brasil. Depois do golpe de 1964, a vontade dos militares de "integrar para não entregar" o norte ao restante do país incendiou a disputa por terras. Somente no Pará, onde os conflitos revelam sua face mais sangrenta, ocorreram 772 assassinatos de lideranças sindicais, trabalhadores rurais e defensores dos direitos humanos entre 1971 e 2004 - uma assustadora média de duas mortes por mês.
Na raiz dos movimentos populares de resistência a essa ocupação desordenada encontra-se uma instituição que, se não possui mais a mesma influência de tempos atrás, faz sentir seu legado quando se analisa o atual cenário político nacional: a Igreja Católica. Ela teve participação decisiva na gestação de expoentes da esquerda, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o Partido dos Trabalhadores (PT), por exemplo. E, principalmente no campo, ainda constitui um importante espaço de articulação de militantes que se dedicam à causa da reforma agrária.
Por essa razão, não é difícil encontrar na região norte do Brasil missionários estrangeiros que, da mesma forma que Henri des Roziers, deixaram seus países para mergulhar no meio do povo marginalizado, onde o poder público é incapaz de oferecer assistência adequada à população. Religiosos que acreditam que a Igreja Católica não deve só confortar espiritualmente seus fiéis, mas também se empenhar na resolução dos problemas urgentes dos excluídos.

Opção radical pelos pobres
 

Essa linha progressista do catolicismo ganhou contornos fortes quando, em 1968, bispos de todo o continente se reuniram na cidade colombiana de Medellín - marco do surgimento da doutrina que ficou conhecida por Teologia da Libertação. Uma leitura do evangelho influenciada por conceitos da filosofia marxista, que passou a contestar a miséria de boa parte das populações de países como Brasil e Peru. "Quem primeiro formulou essa opção pelos pobres contra a pobreza, a favor da vida e da liberdade, foi a Teologia da Libertação. É marca registrada da Igreja Latino-Americana", afirma Leonardo Boff, ex-frade franciscano e um dos principais pensadores dessa corrente.
A princípio, quando os militares tomaram o Palácio do Planalto, os dirigentes da Igreja enxergaram com bons olhos a iniciativa, por medo da escalada mundial do comunismo. Contudo, quando vieram à tona as denúncias sobre abusos cometidos pela ditadura, os setores engajados da instituição se mostraram mais antenados aos anseios reprimidos do povo, conquistando espaço entre os fiéis. Naquela época, segundo estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de cada dez pessoas, nove se declaravam católicas. Hoje, esse índice caiu para 70%. Números que atestam a importância da Igreja na sociedade quando aconteceu o golpe de 1964.
Já na década seguinte, a fama progressista do catolicismo nacional espalhou-se pelo mundo inteiro, atraindo interesse daqueles que buscavam sintonia entre a leitura da Bíblia e a vontade de lutar contra as injustiças sociais. De acordo com dados do Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais (Ceris), dos 2.447 religiosos que hoje moram na região norte, 40% vêm de outros países. Porém, é impossível afirmar com precisão quantos desses missionários estão de fato engajados em alguma ação social. Certamente, a maior parte cumpre apenas com as obrigações cotidianas em paróquias e conventos, sem se envolver em qualquer tipo de militância. Entretanto, não é nada desprezível a parcela de padres, irmãos e irmãs que não percorrem milhares de quilômetros somente para pregar e arrebanhar fiéis - como fizeram os jesuítas com os índios brasileiros, séculos atrás.
No Brasil, os ideais da Teologia da Libertação ecoaram mais alto no campo do que na cidade, fortalecendo a luta pela terra. Prova disso é que muitas lideranças do maior movimento social do país, o MST, formaram-se nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). Essas entidades surgiram em meados dos anos 60, depois de uma série de mudanças introduzidas pelo Papa João XXIII no sentido de popularizar a Igreja Católica em todo o mundo. Por meio delas, um grande número de fiéis do interior do país, que não contavam com assistência regular de um sacerdote nos locais onde moravam, passou a organizar as celebrações por conta própria.
O frei dominicano francês Xavier Plassat dedica sua vida à luta pela reforma agrária e ao combate ao trabalho escravo
"Na Europa, o cristão é um consumidor de serviços feitos pelo padre. No Brasil, ocorreu a responsabilização dos leigos. Mas isso não implica necessariamente uma Igreja libertária. Essa reorientação foi provocada pela situação de opressão e pela presença de intelectuais orgânicos de esquerda ligados a ela", explica o frei dominicano francês Xavier Plassat. Os encontros religiosos foram um dos poucos espaços públicos de discussão que o regime militar não aboliu. Era natural, portanto, que nas CEBs também se fizessem debates a respeito da realidade social e política brasileira. "A Teologia da Libertação aproveitou esse envolvimento popular", acrescenta Frei Xavier. Nomes como o da atual ministra do meio-ambiente, a acreana Marina Silva, despontaram dessas comunidades.
A "opção radical pelos pobres" da Igreja Católica saiu do papel com o advento, por todo o país, de pastorais que lidam com os mais variados públicos, como detentos, moradores de rua e profissionais do sexo. Mas uma delas merece destaque pelo importante papel de resistência à ocupação predatória da Amazônia Em 1975, quando a floresta havia se convertido num balaio de crimes graves como assassinatos, grilagem de terra e violação de direitos trabalhistas, foi fundada a Comissão Pastoral da Terra (CPT). Atualmente, ela constitui um dos principais núcleos de pesquisa sobre problemas fundiários do Brasil. Além disso, mantém um corpo de agentes religiosos e leigos para organizar trabalhadores e defender seus direitos, em nome de uma reforma agrária que respeite a agricultura familiar e o modo de vida típico do camponês.

Violência x Resistência

Com a decadência da economia da borracha, que até os anos 20 consistia na principal fonte de divisas da região, o garimpo, a madeira e a pecuária provocaram uma espécie de corrida para o norte do país - a que se assiste até hoje. A partir dos anos 40, o Estado tomou algumas medidas para tentar disciplinar esse novo ímpeto "colonizador", através da instalação de bancos e aeroportos. No começo da década de 60, a abertura da BR 010, batizada de Belém-Brasília, provocou um grande fluxo migratório em direção àquela área.
Mas foi com os militares que o processo de ocupação se desenrolou a pleno vapor. Em 1966, com o intuito de atrair investimentos através da concessão de benefícios a empresários, foi criada a Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). Projetos de ampla envergadura - da extração de minérios à criação de pastos, passando pela plantação intensiva de eucaliptos para a produção de celulose - nasceram nesse período. A retirada do ferro da maior jazida do mundo, localizada na Serra dos Carajás (PA), é um dos exemplos mais conhecidos. Para fornecer a energia necessária a essas atividades, foram construídas hidrelétricas de grande porte, como a de Tucuruí, também localizada no Pará. Novas estradas retalharam a mata a fim de garantir o escoamento da produção e facilitar o povoamento, como a Cuiabá-Santarém (BR 163) e a famosa Transamazônica.
Entretanto, a estratégia de ocupação do "vazio demográfico" do norte do Brasil, representada por slogans do tipo "uma terra sem homens para homens sem terras", não correspondeu ao sonho de uma multidão de migrantes pobres que chegavam à Amazônia de todas as partes do Brasil. "O governo usou a floresta como forma de desviar a atenção dos movimentos organizados dos principais focos de tensão fundiária, como Rio Grande do Sul, Paraná e Pernambuco. Em vez de realizar uma verdadeira reforma agrária, fez uma política de assentamentos, jogando os agricultores em lotes sem qualquer infra-estrutura", explica Paulo Santilli, professor de antropologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp). As medidas desenvolvimentistas também não pouparam os povos indígenas. Pelo contrário: "na década de 70, seu contingente populacional atingiu o nível mais baixo em toda história: pouco mais de 60 mil", completa Santilli.
O massacre de 19 sem-terras, em Eldorado dos Carajás (PA), há dez anos, chamou a atenção do mundo para os conflitos fundiários na Amazônia 
Com a perseguição implacável da ditadura a sindicatos, movimentos sociais e partidos de esquerda, a Igreja era a única instituição de porte nacional com capacidade de fazer frente aos desmandos dos militares e de apoiar a classe trabalhadora. "A primeira década de atuação da CPT foi uma fase heróica, de enfrentamento e formação de verdadeiras lideranças", conta Frei Xavier, que coordena a pastoral de Araguaína, no norte do Tocantins. Essa parte do estado, apelidada de Bico do Papagaio devido a seu formato geográfico, já foi uma das áreas de maior ebulição fundiária do Brasil.
Frei Xavier segue os passos do Padre Josimo Tavares, assassinado em 1986 por incentivar os posseiros a resistirem contra a expulsão das áreas que ocupavam há gerações. "Ele abria a bíblia para as comunidades e dizia que o direito à terra era algo sagrado, que não bastava rezar junto, mas que era necessário formar um sindicato, um partido que representasse a classe trabalhadora. A CPT dava esperança às comunidades ameaçadas", resume. Vinte anos após a morte de Padre Josimo, a apropriação ilegal de áreas que pertencem à União mediante violência e falsificação de escrituras - prática conhecida popularmente por "grilagem" - ainda deixa muitos militantes da Igreja e dos movimentos sociais de cabelo em pé. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) estima que pelo menos 100 milhões de hectares tenham sido abocanhados de maneira criminosa, em todo país. Mais da metade deles estão na região Norte.
Compromisso Social
Na França, não é muito comum que a Igreja se ocupe do debate dos problemas do país, postura que incomodava Frei Henri des Roziers. As notícias sobre a barbárie da ditadura militar despertaram nele a vontade de conhecer o Brasil. "O que me motivou não foi o problema da terra, e sim a questão dos direitos humanos", conta. Logo nos primeiros meses, ele passou uma temporada na diocese de Goiás Velho (GO), comandada pelo bispo D. Tomas Balduíno, presidente nacional da CPT. "Esse estágio me impressionou muito. Senti pela primeira vez uma coerência entre as lutas sociais e a minha interpretação do evangelho. Era a primeira vez que ficava feliz por participar das celebrações", garante. Depois da experiência, não teve dúvidas quanto ao destino a seguir, e entrou para a pastoral da terra. Por quase dez anos, trabalhou na região do Bico do Papagaio, onde se espantou com a violência policial e a omissão do poder judiciário que vitimavam os posseiros. Mas foi no Pará, estado em que atualmente reside, que ele fez história ao participar, em 2000, da acusação que levaria pela primeira vez na história do país um fazendeiro à prisão pelo assassinato de um trabalhador rural.
Hoje, na CPT de Xinguara (PA), o advogado e missionário Henri tenta pôr na cadeia latifundiários que submetem à condição de escravos peões vindos de estados nordestinos pobres, como Maranhão e Piauí. Seres humanos descartáveis que sobrevivem da chamada expansão da fronteira agrícola amazônica. Mão-de-obra pouco qualificada que realiza serviços pesados - como o desmatamento da floresta para formação de pastos, plantações de soja e algodão - sem direito a salário e até mesmo a liberdade para abandonar as fazendas. Essa prática vem de longa data: as primeiras denúncias sobre escravidão contemporânea foram feitas na década de 70 pelo espanhol D. Pedro Casaldáliga, então bispo de São Félix do Araguaia (MT).
Segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que desde 1995 designou um grupo especial de auditores para fiscalizar propriedades do interior do Brasil, mais de 15 mil pessoas já foram resgatadas desde o início das operações, principalmente no Pará, Mato Grosso e Tocantins. Apesar de o Código Penal prever reclusão de até oito anos para esse crime, apenas um fazendeiro até hoje foi condenado na Justiça Comum. Mesmo assim, sua sentença foi revertida para distribuição de cestas básicas.
O combate ao trabalho escravo também consome a maior parte do tempo de Frei Xavier Plassat. Mas ele também acha que, nos últimos anos, a CPT vem encarando novas missões. "Quando cheguei ao Brasil, em meados da década de 80, o principal desafio era lutar contra a grilagem e resistir à expulsão. Hoje, precisamos pensar com os trabalhadores rurais uma outra maneira de se relacionar com a terra e rever o sistema de produção, permitindo o desenvolvimento da agricultura familiar", afirma.
Apesar da valiosa atuação das pastorais, é fato que institucionalmente a Igreja Católica brasileira não possui mais o mesmo vigor na defesa dos direitos básicos das populações excluídas. Frei Xavier, por exemplo, diz que a CPT de Araguaína sequer é convidada pelo bispo para participar das assembléias diocesanas, reflexo das nomeações de dirigentes menos progressistas durante o longo pontificado do conservador João Paulo II. "Nós atuamos praticamente como uma ONG, buscando financiamentos de agências de cooperação internacional", diz. Mas também não se pode dizer que os preceitos da Teologia da Libertação estejam em decadência absoluta. Ainda existem muitos religiosos brasileiros e estrangeiros que enxergam no evangelho a motivação para lutar por uma sociedade igualitária, olhando por regiões onde a presença do Estado ainda é rarefeita. A Amazônia só tem a agradecer a Deus por isso.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Almada: “Não deixemos que a vitória nos faça esquecer que o inimigo é forte”



Bem-vinda, presidente Dilma Roussef

Por Izaías Almada no ESCREVINHADOR

Bem que o Brasil do atraso tentou, o Brasil da calúnia, da infâmia, da subserviência, o Brasil que perdeu a noção da História e da realidade em que vive e da realidade que o cerca. Não adiantou o cidadão e candidato José Serra e a oposição que representa construírem uma estratégia eleitoral torpe, baseada no ódio, na intolerância e no preconceito, pois o presidente Luiz Inácio Lula da Silva mostrou que parte de sua acertada estratégia política está cumprida ao eleger sua candidata e sucessora.
Vitória da perspicácia, da sensibilidade no trato das coisas políticas, da coragem pessoal em confrontar, à sua maneira, a oligarquia que deixou o governo em 2002. E o fez com paciência e tentativas de diálogo e – sobretudo – com o conhecimento do seu povo. É preciso reconhecer: haja sociologia para explicar 83% de aprovação popular a um governo no Brasil. Já disse alguém que a política é a arte do possível. Para muitos, infelizmente, ainda é difícil entender isso. À direita e à esquerda.
Ontem, 31 de outubro de 2010, venceu o Brasil que quer continuar mudando, que busca alternativas para se tornar um país mais soberano e menos injusto. Venceu o povo brasileiro mais sofrido e humilde. Venceu novamente a esperança. Ou, para os menos otimistas, a possibilidade de se continuar tendo esperança. E ouso dizer também que, mais do que o Brasil, venceu a nova América Latina de Chávez, Morales, Correa, Lugo, Cristina e Nestor, Castro, Funes, Mujica e Ortega.

Os miasmas da intolerância e de um fascismo travestido de faniquitos democráticos não muito bem explicados em manifestos e editoriais jornalísticos, em telejornais e revistas de final de semana, em violência e profanação religiosa, em tentativa de manipulação da opinião do eleitor, nos últimos três meses, ou se quisermos, nos últimos oito anos, não foram suficientes para desviar milhões de eleitores brasileiros da rota de um desejo sincero de ver o Brasil mais justo, mais independente e de olhos postos no futuro e não no passado.
Retomando a História interrompida com a morte de Getúlio Vargas e traumatizada pelo golpe civil/militar de 1964, que derrubou um governo eleito democraticamente, a vitória de Dilma Roussef faz uma ponte com nosso passado ainda recente e relança as bases de um protagonismo popular para o futuro, fazendo o país voltar ao leito democrático de onde foi retirado pela força de tanques e baionetas apoiados pelo Departamento de Estado norte americano, esse mesmo Estado que continua a insistir com sua política de desestabilizar governos eleitos democraticamente, como a Venezuela de Chávez, a Bolívia de Evo Morales, a Honduras de Manuel Zelaya ou o Equador de Rafael Correa. E que, com certeza, não dará tréguas ao governo de Dilma Roussef. É bom que não nos esqueçamos disto no calor e na alegria da vitória.
No vácuo da repressão policial/militar da ditadura, com a sua falta de garantias democráticas plenas, instalou-se também no Brasil, em anos mais recentes, a ditadura do poder econômico, impondo-se entre nós o pensamento e a prática hegemônica neoliberal, assumida por uma social democracia encantada com a possibilidade de chegar ao poder político, como de fato chegou, com a chamada redemocratização do país na metade dos anos oitenta. E com o sonho de lá permanecer por pelo menos 20 anos, no dizer de alguns de seus caciques, começando com a imoral compra de votos para a reeleição do seu até então maior ideólogo, Fernando Henrique Cardoso, o presidente das privatarias e traidor do povo brasileiro. Essa prática política encantou àqueles que olharam o país e a História com o binóculo posto ao contrário.
Nesses últimos cinquenta anos de História, tanto uma, a ditadura, quanto o outro, o poder econômico imposto pelo Consenso de Washington, tiveram a seu lado aquele que pode ser considerado o mais forte aliado do mundo contemporâneo: a força do quarto poder, a mídia. Jornais, rádios, televisões, revistas, em grande parte subsidiados ideologicamente por pensadores e acadêmicos de dentro e de fora do país, fizeram de seus editoriais e matérias jornalísticas a apologia diária do paraíso para o capital transnacional, com seus deslumbrados e submissos defensores internos, ao mesmo tempo em que combatiam e dilapidavam as garantias e a defesa dos direitos dos trabalhadores através do arrocho salarial, da terceirização de serviços, do aumento do desemprego, do desestímulo às reivindicações de inúmeras categorias profissionais, da privatização de empresas nacionais estratégicas, agindo contra os interesses nacionais, da criminalização dos movimentos sociais, mantendo intacto – de certa maneira – o arcabouço repressivo ditatorial com um inquestionável conservadorismo na sua prática política.
Tudo isso sustentado por uma democracia e uma Constituição, aquela que melhor se pôde arranjar em 1988, a tal Constituição Cidadã, um imenso tratado com quase quinhentos artigos, tamanho o número de interesses a serem contemplados e acomodados, e que ainda assim, na prática, vem sendo solapada e substituída no dia a dia por um mecanismo anacrônico denominado Medida Provisória, que sempre poderá agradar ou desagradar a gregos e troianos, conforme os interesses de momento e o grupo que estiver no poder político.
Em verdade, passamos a viver a partir da segunda metade dos anos 80 um arremedo de democracia. Dá para o gasto, é claro, pois sempre podemos encher a boca e dizer que vivemos num país democrático, e sob vários aspectos isso é verdade, muito embora os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, com as honrosas exceções de sempre, se deixaram ou ainda se deixam escorregar tentadoramente por caminhos tortuosos, para dizer o menos, quando fica bastante evidente a verdadeira luta de classes no país.
A recente campanha eleitoral deixou à mostra como muitos brasileiros entendem a democracia: um regime de privilégios que é preciso manter a ferro e fogo, sempre e quando para isso se use tais “privilégios” para arrasar o adversário, assassinar sua reputação, atribuindo-lhe as piores qualidades morais e profissionais. São os democratas de fins de semana, dos almoços dominicais com a família. Hipocrisia que a campanha do candidato José Serra mostrou à perfeição.
Nesse quadro político e institucional, os homens que queriam governar “por 20 anos” descuidaram-se e o sentimento de mudanças que permeava partidos de esquerda e movimentos sociais desde o período ditatorial, soube se movimentar, mesmo com suas divergências, contradições e até defecções, criando condições para que o país buscasse alternativas para o sufoco neoliberal.
Incrédulos com a vitória do metalúrgico semi-analfabeto em 2002, os serviçais e bajuladores da “Casa Grande”, fiéis leitores da cartilha econômica do neoliberalismo, apostaram suas fichas no fracasso e na incompetência do operário, sem jamais esconder o seu preconceito de classe e seu espírito impatriótico. À medida que o tempo avançou e o fracasso esperado do governo Lula não vinha, os órgãos de comunicação social foram mais uma vez acionados com bastante virulência no ano de 2005, pois nova derrota eleitoral seria o início do desastre.
De nada adiantou a campanha moralista naquela altura, curiosamente liderada por alguns dos políticos mais imorais e corruptos do país, alguns deles felizmente defenestrados nas recentes eleições, ou as CPIs policialescas instaladas nas duas casas do Congresso Nacional, onde a pregação intolerante contra o Partido dos Trabalhadores e a esquerda de um modo geral chegou a ser defendida com o chamamento à eliminação “dessa gente” da política brasileira. Bravatas, arrogância e intolerância substituíam os discursos políticos daquilo que se poderia esperar de uma oposição minimamente civilizada, se é que se pode chamar de civilizados um grande número de dilapidadores do patrimônio nacional em beneficio próprio.
Acuado, o governo soube esperar a hora do contra ataque. E o fez no seu segundo mandato, aprofundando as suas políticas sociais e de infraestrutura econômica. Lula se reelegeu em 2006 e chega a 2010, no final do seu governo, com um índice de popularidade “nunca visto antes na história desse país”. E mais: sai o operário e entra uma mulher. Impensável no Brasil de dez anos atrás.
O desafio que tem pela frente a presidente Dilma Roussef é enorme, a começar pela guerra diária que lhe imporá a vetusta oligarquia brasileira e sua velha mídia incompetente, desonesta e oportunista.
Mas, guerra é guerra e o povo, atento e organizado, sempre que chamado, irá se manifestar através de sindicatos, dos movimentos sociais, das entidades estudantis e dos partidos políticos comprometidos com a soberania do país e das suas conquistas sociais, fazendo avançar essas conquistas. E também através de uma nova mídia que se forma pela internet ou – o que espera o país – ver alguns jornais, revistas e televisões tendo que se ajustar a um novo marco regulatório para a comunicação social, tornando-a verdadeiramente democrática.
De hoje em diante toda atenção é pouca, porque o conservadorismo, agora efetivamente de mãos dadas com o emergente fascismo tupiniquim não irá descansar. E essa é uma união mais do que perigosa. Alguém já disse que para onde pender o Brasil, deverá pender a América Latina. Não deixemos que a vitória nos faça esquecer que o inimigo é forte e continuará sua insidiosa luta no dia a dia das calúnias, das mentiras, dos factóides, tentando minar a confiança do povo no seu novo governo.
Felicidades, presidente Dilma Roussef! Seja bem-vinda.

Izaías Almada é escritor, dramaturgo, autor – entre outros – do livro “Teatro de Arena: uma estética de resistência” (Boitempo) e “Venezuela povo e Forças Armadas” (Caros Amigos).

Os derrotados da eleição

A guerra acabou. Dilma Rousseff é presidente do Brasil. Para chegar até aqui, teve que enfrentar uma das batalhas mais violentas da história da República. E venceu.
Derrotou não só seu adversário, José Serra, mas também um exército implacável, cruel e muito poderoso: os principais grupos de comunicação do país. Estes são os grandes derrotados nesse dia de glória para a democracia.
Os milhões de votos recebidos pela candidata petista são a prova gigantesca de que os brasileiros nunca mais se deixarão ser manipulados. Nem permitirão ser tratados como gente ignorante. O povo, definitivamente, não é bobo.
Durante meses, houve um bombardeio incessante de manchetes, chamadas, apelos, boatos e factoides. Um massacre impiedoso, orquestrado. Em fiapos de verdade, urdiram uma rede de mentiras e preconceitos.
Não bastou ser atacada durante o horário eleitoral gratuito. Isso faz parte do jogo. Infame foi ser fustigada diariamente pela propaganda política voluntária dos barões da mídia.
Dilma Rousseff e milhões de brasileiros enfrentaram o maior jornal do país, a Folha de S.Paulo. E a maior emissora de TV, a Globo. A revista de maior tiragem, a Veja. Nessa tropa de choque incansável também perfilam os jornais O Estado de S.Paulo e O Globo. Turma da pesada.
Nos próximos dias, sempre às 10h e às 16h, vamos usar este espaço para detalhar a forma como esses derrotados agiram do alto de seus palanques. Como pisotearam a liberdade de imprensa.
Cada um com seus soldados. Ou capangas. Tanto poder para quê? Tanta arrogância, fulminada pela força das urnas. Os que escrevem e entrevistam e ditam editoriais ficaram mudos. Quem manda, senhores do universo, é quem lê, quem ouve, quem vê. Os vitoriosos. Deste Brasil.

 Marco Antonio Araújo