sexta-feira, 18 de março de 2011

Governo federal quer 85% dos municípios com rádio comunitária


Do blog Patria Latina

O governo federal pretende criar condições para que 85% dos municípios de todas as regiões do país tenham rádios comunitárias. A intenção é, entre outras ações, facilitar o processo de outorga a entidades interessadas nesse tipo de serviço. Com esse objetivo, foi lançado nesta quinta-feira (17) o Plano Nacional de Outorgas para Radiodifusão Comunitária.
A previsão é que, em 2011, 431 municípios sejam beneficiados com a publicação de 11 editais. O primeiro deles sairá na primeira quinzena de abril e o último, em novembro.

O Ministério das Comunicações estima que haja cerca de 1,5 mil rádios comunitárias aguardando outorga para operar em 1.268 cidades. Há, ainda, 13 cidades que nunca foram contempladas com esse tipo de emissora. Atualmente existem mais de 4,2 mil rádios comunitárias em todo o país.

"Não há emissoras de rádio comunitária em mais de 2 mil cidades, após 13 anos de vigência da lei para o setor", disse o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, durante a coletiva de imprensa destinada a anunciar o lançamento do plano.

Segundo ele, a presidente Dilma Rousseff em diversos momentos manifestou que as outorgas para rádios comunitárias estão entre as prioridades do Ministério das Comunicações. "Se bem-sucedido, esse plano permitirá que 85% dos municípios sejam contemplados", disse o ministro.

Calendário de publicações
O governo pretende divulgar com antecedência um calendário com as datas dos avisos de habilitação e as localidades que serão contempladas. Dessa forma, os interessados em operar o serviço poderão se planejar, evitando atrasos e a necessidade de prorrogação dos prazos dos avisos.

"Como não havia periodicidade definida, recebíamos muitas reclamações sobre a falta de divulgação. Com o anúncio antecipado, vamos evitar a prorrogação dos prazos, o que atrasaria ainda mais todo o processo", afirmou Paulo Bernardo.

Critérios
Alguns critérios foram estabelecidos pelo governo para a escolha das cidades que serão beneficiadas pelos 11 editais previstos para 2011. A universalização dessas rádios atenderá de forma concomitante todas as macrorregiões do país, priorizando as cidades onde entidades já manifestaram interesse em explorar o serviço e as que já estão incluídas no Plano Básico de Frequências. O governo pretende contemplar antes as cidades mais populosas.

Paulo Bernardo enfatizou que a fiscalização de todas as rádios continuará sendo feita na forma prevista na legislação, mas que mudanças poderão ocorrer por meio de marco regulatório ou por projeto de lei.

"Começamos um processo de revisão da norma que trata dos critérios para outorga a fim de identificar necessidades de modificação, a partir da avaliação que estamos fazendo das sugestões apresentadas por representantes das comunidades", disse o ministro. "Na região Norte, por exemplo, reclamam que a potência máxima prevista pela lei é baixa para atender pequenas populações situadas em localidades distantes".

A potência máxima padrão permitida para os transmissores de rádios comunitárias é 25 watts. Isso permite uma cobertura em um raio de 1 km de distância. A distância mínima permitida entre as rádios é 4 km.

quinta-feira, 17 de março de 2011

O machismo que mata e destroi todos os dias


 
Já são muitos anos de luta pelo fim da violência contra as mulheres no Brasil e no mundo. No final dos anos 70, movimentos de mulheres e feministas já realizavam esforços para tirar o problema da invisibilidade e torná-lo uma questão da esfera pública. A luta não cessou.

Raquel Viana *

Entre avanços e recuos, ela se ampliou, sensibilizou outros setores, conquistou aliados. Mas ainda é necessária, pois, se é impossível não reconhecer os avanços obtidos com uma maior conscientização das mulheres, com as políticas publicas implementadas, em especial, pelo governo do presidente Lula – como a Lei Maria da Penha –, é preciso reconhecer que há um longo caminho a trilhar.
Ainda é forte a naturalização dessa violência. Parece natural que mulheres tenham suas vidas interrompidas, que sejam desqualificadas e tratadas como mercadorias, que sejam impedidas de realizar sonhos, seja de estudar, de trabalhar, de ser dona do próprio destino, assim como o fato de muitas mulheres violentadas sexualmente sejam obrigadas a seguir com uma gravidez que não desejaram, porque poucos se importam com a defesa de suas vidas.
Não foi à toa que, em 2010, o tema escolhido pela Prefeitura de Fortaleza para a campanha de prevenção e enfrentamento à violência contra a mulher tenha sido Violência contra a mulher: isso não é natural. Devemos desconstruir essa ideia da naturalização da violência. É preciso reforçar que ela é fruto de relações desiguais entre homens e mulheres.
E é lamentável ver o machismo continuar a matar todos os dias. Milhares de mulheres são brutalmente assassinadas no Brasil. No Ceará, foram 153 somente em 2010, segundo a Delegacia de Defesa da Mulher. Avançam em números e na crueldade com a qual são praticados, como das duas vítimas estupradas, assassinadas e jogadas literalmente no lixo, ou da mulher, grávida de cinco meses, assassinada por seu ex-marido. Mesmo quando os crimes têm como causa o tráfico de drogas, o componente da violência sexista está presente, através da violência sexual. Será que isso nos diz alguma coisa?
O machismo, as relações desiguais e a opressão, combinados à impunidade, são fatores importantes para entender a problemática da violência sexista. É preciso que a sociedade se debruce mais sobre o tema. Necessário se faz efetivar a Lei Maria da Penha na sua integralidade, bem como ampliar cada vez mais as políticas públicas.
Mas é importante que se diga: as mulheres estão reagindo e continuam protagonizando esta luta, a exemplo da Rede de Mulheres pelo Fim da Violência, apoiada pela Coordenadoria de Políticas para Mulheres, que articula uma ação de conscientização de outras mulheres, de socialização de informações sobre direitos e serviços. Tudo isso aliado aos esforços dos demais setores da sociedade é instrumento para vencer a luta contra a violência sexista.

* Raquel Viana é secretária municipal de políticas para as mulheres da Prefeitura de Fortaleza.

Peru celebra o centenário de José María Arguedas

A atualidade do pensamento do escritor peruano, que desafiou a estética europeia, estimula a reflexão sobre as questões culturais da América Latina indígena.

Por Julia Nassif de Souza na Caros Amigos

Comemora-se em 2011 o centenário de nascimento de um dos escritores mais representativos da literatura peruana. Detentor de obras literárias, linguísticas, antropológicas e etnológicas, José María Arguedas desafiou, através de sua consciência crítica, a estética peruano-européia, convidando a repensar a representação da cultura no Peru.
Arguedas nasceu no dia 18 de janeiro de 1911, em Andahuaylas, estado de Apurimac, ao oeste de Cuzco, e aos 3 anos de idade perde sua mãe. Seu pai se casa novamente, mas passa a ter uma vida agitada trabalhando como advogado itinerante. Longe de cuidados familiares, ainda criança é posto por sua madrasta, fazendeira, sobre os cuidados dos empregados da casa, com quem teve sua primeira fase de criação, na região de Puquio.
Maltratados pela madrasta, José María e seu irmão Arístedes fogem de casa e vivem refugiados junto a indígenas, que lhes recebem e ensinam seus costumes e principalmente seu idioma, o quéchua, que posteriormente é utilizado pelo escritor, através de traduções e escritos fundamentais para a revalorização da língua no país, tornando-se um dos mais importantes tradutores de quéchua do Peru.
Desde sua infância, por mais que as condições sociais lhe permitissem outra posição, Arguedas se nutriu da terra e do povo peruano, a princípio por desdém familiar, mas que logo se transforma em opção pessoal.
Resgatado por seu pai dois anos depois de sua fuga, Arguedas consegue aproveitar as viagens que fazia para acompanhá-lo pelo interior do país, para conhecer as essências da tradição popular peruana, raízes nas quais escolheu ser criado e onde passou a maior parte do tempo, aproveitando os ensinamentos de camponeses e artistas populares do Peru profundo.
Estabelece-se em Abancay e mais tarde se desloca a Ica e logo Lima, onde desenvolve estudos na faculdade de Letras, chegando a formar-se doutor, em 1963.
Exerce como professor em diversas oportunidades; colabora com o Ministério de Educação; e em algum momento chega a ser cassado por ser considerado comunista. Casa-se, divorcia e casa, novamente, sempre acompanhado pela tristeza com que levava a vida, marcada de episódios de depressão e crises de angústia que lhe alçavam para cima e para baixo entre uma publicação e outra, resultando em um suicídio bem sucedido, aos 58 anos.
Como escritor Arguedas era literato, antropólogo, linguista e indigenista, permitindo aprofundar a visão sobre os temas vivos e marginalizados da cultura popular peruana, de maneira envolvente, refletidos pelo fato de haver pertencido de alguma forma à realidade que descreve.
Seus estudos e histórias são alimentados pelo folclore, particularmente apoiado à cultura dos Andes peruano, em seus costumes, suas músicas e danças, principalmente adquiridos pela tradição oral, no qual puderam encontrar um cúmplice e tradutor, que se identificava e entendia a complexa realidade indígena.
Era entre esses dois polos que se dividia sua vida, e Arguedas conseguiu, através de suas vivências reais, analisar a integração conflitiva entre a cultura européia, urbana, e a cultura quéchua, andina, sem deixar, é claro, de tomar partido nessa relação.
A atualidade de seu pensamento e a urgência de repensar questões culturais na sociedade peruana, colocadas por seus livros, hoje são reconhecidas e aclamadas em todo o Peru, em um ano de comemorações, debates, encontros, festas e reflexões com respeito a um dos mais importantes, escritores e personagens da história peruana.
Seus livros publicados são: Agua (1935), Diamantes y pedernales (1945), Los ríos profundos (1958), El sexto (1961), Todas las sangres (1964), Amor mundo y todos los cuentos (1967), El zorro de arriba y el zorro de abajo (1971) e Katatay (1972). No Brasil é possível encontrar em português o livro Os Rios Profundos.

Júlia Nassif de Souza é antropóloga e comunicadora social.

Há pouco que colher sobre uma efetiva política agrária nos novos documentos oficiais


  Guilherme C. Delgado  no Correio da Cidadania
 
Dois documentos públicos e oficiais - "Brasil 2022", da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República (Brasília, dezembro de 2010), e "Inclusão Social e Produtiva" (Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), janeiro de 2011, texto na internet) - conseguem tratar a política agrária do futuro próximo de maneira parecida: usam apenas frases e títulos soltos, sem texto.
 
Na verdade o documento da SAE consegue a proeza de produzir uma seção inteira, das páginas 66 a 91, daquilo que chama de "Metas do Centenário", sem texto para quaisquer dos enfoques que elege – Economia, Sociedade, Infra-estrutura e Estado. Enquanto que o documento do MDA concentra-se naquilo que seria atribuição deste Ministério. Mas ambos convergem na linguagem anti-comunicativa em relação às políticas públicas. Substituiu-se o discurso expositivo de idéias por frases desconexas, ou números-meta, supostamente auto-explicativos.
 
Há muito pouco que colher nos documentos e declarações oficiais, que efetivamente possa configurar uma diretriz estratégica sobre política agrária, de desenvolvimento rural ou de tratamento dos recursos naturais. Enquanto isto, a política agrícola tradicional, conduzida pelo Ministério de Agricultura com respaldo da área econômica do governo e das cadeias agroindustriais conexas, vai ocupando todos os espaços, em especial os espaços externos da inserção primário-exportadora.
 
Por outro lado, a grande mídia tem destacado em matéria de temas agrários duas focalizações aparentemente relevantes: 1) a discussão "interna-corporis no INCRA/MDA sobre o que fazer com o Instituto; 2) a discussão da revisão do Código Florestal no Congresso, estranhamente liderada pela senadora do DEM Katia Abreu, não obstante a esmagadora maioria governista nas duas casas do Congresso.
 
Nessas duas focalizações, escapam da própria mídia, quanto ao "pensamento" oficial, aquilo que de essencial deveria ser tratado na reestruturação do INCRA e na revisão do Código Florestal: a regulação e efetiva aplicação dos direitos da propriedade sobre a superfície territorial, tendo em vista o atendimento da função social e ambiental da terra.
 
Mas há um "acórdão", aliança ou pacto de economia política entre proprietários de terra, agroindustriais, bancada ruralista e governo que já atravessa três governos - FHC II, Lula I e Lula II e provavelmente Dilma - que é a verdadeira diretriz estratégica da política agrária: aprofundar a acumulação de capital no setor primário da economia com vista à demanda externa de "commodities", ficando tudo mais a reboque. Sobre as implicações sociais e econômicas desse pacto, em médio prazo, não se discute, como não se discutiu à época, por outros métodos, a modernização conservadora do Regime Militar.
 
Merece especial destaque no documento citado do MDA, que este não cita em nenhuma de suas frases soltas, a omissão das duas missões constitucionais básicas que o Ministério deveria realizar: cumprir e fazer cumprir o princípio da função social de propriedade fundiária e realizar a reforma agrária. É que essas missões estorvam o mencionado "acordão".
 
Em síntese, caso não haja pressão exógena, mobilização social ou fato circunstancial relevante, que modifique aquilo que chamam de "correlação de forças", não virá da iniciativa deste governo uma ação autônoma de promoção de uma política agrária distinta daquela que efetivamente se operou nos último 12 anos, suscetível de alterar a própria correlação de forças políticas dominantes no agronegócio.
 
Guilherme Delgado é economista e membro da Comissão Brasileira de Justiça e Paz.

Imperialismo age para evitar que Barein escape de seu domínio


Humberto Alencar no Vermelho

O recente envio de mais de mil soldados da Arábia Saudita e 500 policiais dos Emirados Árabes Unidos à monarquia do Barein indica que os Estados Unidos, verdadeiros donos da situação na região, estão cada vez mais preocupados com a ação dos grupos oposicionistas bareinitas, que desejam democratizar o país.
A rebelião que de início foi às ruas pela instauração de uma monarquia parlamentarista foi reprimida com balas. Uma evidência de que os Estados Unidos procuram obter controle sobre a oposição foi a pressão que o presidente Barack Obama fez sobre o rei Hamad al Khalifa para fazer a polícia e o exército recuarem, porque já havia se acertado com a oposição do país para a abertura de "diálogo".

Ministros pedem demissão

Dois ministros do governo real bareinita pediram demissão de seus cargos nesta quarta, após a forte repressão promovida pelas forças policiais antimotins do Barein e por soldados da Arábia Saudita contra manifestantes que tentavam protestar na Praça Pérola, no centro de Manama, capital do reino.
As forças militares sauditas foram colocadas em ação e chegaram a invadir um hospital da cidade onde manifestantes feridos estavam sendo tratados. Testemunhas afirmaram que os sauditas teriam tomado todas as pessoas do prédio – inclusive enfermeiros e médicos – como prisioneiros, ameaçando utilizar munição real contra eles.
Um médico do Hospital Salmaniya relatou à emissora britânica BBC que "eles estão ao redor do hospital com suas armas e estão disparando em qualquer pessoa que passe diante do complexo hospitalar".
Outras organizações afirmaram que os médicos que procuraram auxiliar os manifestantes feridos pela polícia foram agredidos. A polícia bareinita bloqueou o acesso ao hospital.
Um dos demissionários, o ministro da Saúde Nezar bin Sadeq al-Baharna, afirmou que não conseguia mais ver pessoas sendo agredidas pelos policiais no hospital Salmaniya.
Dentre os sauditas também estão militares do Catar e de Omã. Há também relatos de que juízes xiitas teriam renunciado a seus cargos na Corte do país, por causa "dos eventos sangrentos e do uso de força excessiva além de armas", segundo reportou a imprensa iraniana.
Em seguida à repressão, que deixou cinco mortos, o presidente americano Barack Obama ligou para o rei Abdullah da Arábia Saudita e para o rei Hamad do Barein. Segundo o porta-voz da Casa Branca, Jay Carney, Obama expressou aos monarcas sua "profunda preocupação" com as revoltas da oposição no Barein e a violência na repressão.

Importância crucial

Embora seja um país diminuto e com uma população relativamente pequena – 1,2 milhão de habitantes – o Barein é de enorme importância para o imperialismo e o sionismo. Seu território de 750 km² no Golfo Pérsico abriga a Quinta Frota da Marinha de Guerra estadunidense, que controla as águas por onde passam 20% do petróleo mundial e é base de logística para as provocações contra o Irã. Dali partiram os ataques ao Iraque na 1ª Guerra do Golfo, em 1990, e na 2ª, há oito anos.
O Barein é uma das mais diversificadas economias no Golfo Pérsico. Com os setores de meios de transporte e de comunicação altamente desenvolvidos, o Barein transformou-se em sede de numerosas empresas com negócios no Golfo. Como parte de seus planos de diversificação, o Barein implantou um Tratado de Livre Comércio com os Estados Unidos em agosto de 2006, que foi o primeiro TLC assinado por um Estado do Golfo com os EUA. A economia do país depende basicamente do petróleo. Sua produção e refino resultam em mais de 60% das receitas de exportação bareinitas, 70% dos lucros do governo e 11% do PIB nacional.

Desconstruir e desvirtuar

No Barein, o imperialismo procura desconstruir e desvirtuar a onda revolucionária em curso no Oriente Médio e não há dúvidas de que por trás das ações de sauditas e emirados está a mão do Pentágono. Como prova disso, basta procurar na internet alguma declaração de qualquer autoridade dos Estados Unidos propondo a derrubada da monarquia bareinita, marroquina ou saudita – países satélites dos EUA no Norte da África e Oriente Médio –, ou pedindo uma reunião urgente do Conselho de Segurança da ONU para punir os agressores.
Em editorial publicado em 23 de fevereiro, o jornal americano The Wall Street Journal disse que "os EUA e a Europa deviam ajudar os líbios a derrocar o regime de Kadafi". Antes e depois desse editorial não há qualquer menção de Washington sobre uma intervenção para ajudar os manifestantes do Kuwait, da Arábia Saudita ou de Barein a derrocar seus ditadores.
Muito menos em relação a Israel, o satélite americano mais importante do Oriente Médio. Não houve qualquer intervenção norte-americana para ajudar o povo palestino de Gaza quando milhares de palestinos morreram em consequência do bloqueio promovido e executado por Israel. Nem haverá, já que Obama vetou uma resolução do Conselho de Segurança da ONU que condenava a construção de casas israelenses nos territórios ocupados da Palestina.

Posto avançado no Golfo Pérsico

Em termos populacionais, o Barein é pouco expressivo, abrigando pouco mais de 1,2 milhão de habitantes, cifra que pode ter baixado após êxodos provocados pela luta da maioria xiita contra a minoria sunita do reino de al Khalifa. Cerca de 16% de cada mil habitantes do país são estrangeiros migrantes.
Além do petróleo, outras atividades econômicas de monta são a produção de alumínio – segundo maior item de exportação do país –, o setor financeiro e o de construção civil. O Barein disputa com a Malásia o posto de centro internacional do setor bancário islâmico. O desemprego, especialmente entre a juventude, é um dos problemas mais graves da economia do país, o que fez com que a monarquia retirasse benefícios dos trabalhadores imigrantes e aumentasse os custos das empresas que empregavam estrangeiros.
O país tem 611 mil trabalhadores, segundo estimativas da monarquia bareinita publicadas em 2010. A dívida pública em 2009 passava dos 59%, enquanto a inflação rondava os 3,3%. O maior cliente das exportações bareinitas é a Índia (mais de 4%), seguida da Arábia Saudita (2,78%), país que responde por 22,95% das importações que a economia do país gera por ano. O segundo maior exportador para o Barein é a França, com 9,76%, enquanto os EUA respondem por 7,95% das importações.
O líder da oposição xiita no Barein, o religioso Ali Salmane, é representante da Associação do Entendimento Nacional Islâmico (Aeni). A associação conta com 18 deputados na Assembleia, em um total de 40 parlamentares, e Salmane repudia todas as formas de repressão aplicadas pelo reinado contra os cidadãos. “As soluções de segurança não podem resolver as crises”, afirmou, depois de uma repressão sangrenta praticada contra manifestantes há dez dias..
Cerca de 88% dos habitantes são islâmicos, dos quais 70% da confissão xiita. Como o comando do país está nas mãos da minoria sunita, eles reivindicam mais ofertas de empregos e oportunidades e se dizem discriminados. Também querem melhores moradias para a população, a libertação dos presos políticos, assim como a criação de um Parlamento representativo. Al Khalifa está no poder há 40 anos.

Tropas sauditas

O monarca da Arábia Saudita, Abdullah bin Abdul Aziz, já vinha afirmando que era necessário aplacar a ira do povo com medidas econômicas, tanto na Arábia quanto no Barein, para onde chegou a enviar dinheiro. Como os protestos perduraram, acabou enviando soldados ao país vizinho, em conjunto com os Emirados Árabes Unidos que, curiosamente, declararam o envio de tropas por meio de seu chanceler, em coletiva de imprensa ao lado da secretária de Estado dos Estados Unidos, Hillary Clinton.
Os opositores denunciaram o envio de tropas como "ocupação aberta do reino do Barein e uma conspiração contra o povo desarmado", denunciando também que mais tropas sauditas já se encontravam no país.
Antes concentrados na praça Pérola, onde haviam instalado barricadas e tendas à maneira da praça Tahrir do Egito, o movimento bareinita vinha realizando atos nas ruas de Manama. Além da liderança xiita do movimento oposicionista, há também entre eles republicanos e defensores de uma monarquia constitucional.
A ameaça de uma intervenção militar estrangeira na Líbia está obviamente associada a esses acontecimentos no Barein, os fatos aí estão estreitamente entrelaçados e ligados à estratégia de domínio imperialista, que também passa pela contenção da democracia no Egito, na Tunísia e nos demais satélites árabes ainda submissos ao imperialismo.
O objetivo central dos Estados Unidos é conter e desvirtuar, neste momento, a onda revolucionária em curso no Oriente Médio e Norte da África.





Governo do Estado propõe reajuste de 8,5% ao magistério

Em reunião com o CPERS Sindicato, nesta quarta-feira (16), o Governo apresentou propostas para contemplar os 17 itens de reivindicações feitos pelos professores no início do mês. Em relação aos vencimentos do magistério estadual, o Executivo propõe um reajuste de 8,5% para toda a categoria, mais o pagamento de parcela autônoma para equiparar os vencimentos dos níveis iniciais ao Piso Nacional.

O secretário de Estado da educação, Prof. Dr. Jose Clovis de Azevedo, reafirmou o compromisso e respeito com a categoria. “Queremos discutir não apenas questões salariais, mas também a política pedagógica, democratizando cada vez mais nossas relações com as instituições”, disse. Para ele, os 17 pontos são pertinentes e de conteúdo muito importante. “Não questionamos nenhuma das solicitações.

Foi entregue, ainda, um documento, no qual o Governo reafirma o compromisso com a educação pública, gratuita, laica e de qualidade social. A proposta foi elaborada a partir da pauta entregue pelo CPERS/Sindicato em reunião realizada em 28 de fevereiro.

Entre as propostas apresentadas, está garantia da não-implementação da meritocracia e a realização de concurso público até o final do ano. Confira os itens do documento:

1. Manutenção dos planos de carreira: não há discordância com esta reivindicação.

2. Regularização das promoções do plano de carreira e pagamento dos atrasados: no momento, está sendo feito o levantamento referente ao ano de 2003, a fim de abrir vagas para concurso.

3. Não implementação da meritocracia não à avaliação externa: Não estabeleceremos a política de diferenciar salário a partir de verificação de resultados, nem vamos promover competição entre escolas e professores o que só aprofundaria a desigualdade.

4. Inclusão dos funcionários de escola que ficaram fora do Plano de Carreira: Assunto será debatido conjuntamente com a categoria

5. Realização de concurso público no Estado com imediata nomeação: O concurso ocorrerá até o final de 2011 para provimento de cargos no ano de 2012.

6. Fim dos contratos emergenciais: Ocorrerá na medida em que forem realizados os concursos públicos.

7. Garantia do IPE público somente para os servidores e seus dependentes; Não à Reforma da Previdência: Reafirmamos os compromissos de garantir o IPE público e estabelecer um amplo debate sobre a previdência estadual.
8. Extensão do pagamento de reajustes dos ativos aos aposentados: faz parte das políticas do Governo do Estado o respeito à paridade entre ativos e aposentados.

9. Política de reajuste Salarial: O espaço e a mesa de negociações estão garantidos na Câmara Temática que integra o Codipe - Comitê de Diálogo Permanente.

10. Pagamento dos Precatórios e RPVs: Estão garantidos esses pagamentos atendendo à ordem, cronograma e valores determinados e publicamente divulgados.

11. Não às privatizações e terceirizações no serviço público e não à municipalização do ensino: O processo de municipalização foi interrompido. Como cabe aos municípios cumprir a obrigação constitucional com a oferta da educação infantil, propomos uma política de apoio técnico para a captação de recursos às prefeituras junto ao MEC para a construção de escolas de educação infantil. Sobre as terceirizações do processo educativo, foram interrompidas as iniciativas que substituíam a obrigação do Estado e a ação direta do professor.

12. Regularização dos repasses de verbas para as escolas: Foi restabelecido o repasse integral das verbas da autonomia financeira às escolas com os repasses em dia, tendo como base os critérios já adotados, entre eles o número de alunos matriculados e o IDEB.

13. Melhoria das condições de segurança nas escolas: Já está em curso uma ação pela Segurança no Trânsito para a volta às aulas, e o desenvolvimento de uma ação conjunta ao longo do ano, articulada de forma a ampliar e potencializar as ações relativas também a ações de combate à violência, prevenção às drogas, com a promoção de formação de docentes para que efetuem uma transversalidade destes assuntos no currículo das escolas.

14. Garantia da gestão democrática da escola com eleição de diretores: A Secretaria da Educação está reforçando a ampliando o conceito de gestão por meio do fortalecimento dos conselhos escolares e da construção coletiva das políticas educacionais, além do respeito ao Conselho Estadual de Educação com órgão de Estado.

15. Respeito à liberdade sindical e garantia de cedência dos 15 diretores estaduais e dos 42 diretores dos núcleos do CPERS-Sindicato: Já atendido, tanto com a cedência como com a revogação da Ordem de Serviço 04/2008.

16. Anulação dos descontos e pagamento dos dias de greve de 2008 e 2009: Reafirmamos o compromisso de abonar as faltas recebidas pelos professores das greves de 2008 e 2009, uma vez que os dias letivos foram recuperados e estabelecermos um calendário para o pagamento desses dias.

17. Implementação do piso salarial Nacional: O Governo propõe um reajuste de 8,5% para toda a categoria, mais o pagamento de parcela autônoma para equiparar os vencimentos dos níveis iniciais ao Piso Nacional. Assim, o Nível I, Letra A, 20h, por exemplo, que hoje recebe R$ 356,62, passará a perceber, com o reajuste de 8,5%, R$ 386,93. Para equiparar o vencimento ao Piso Nacional, receberá, também, uma parcela autônoma de R$ 207,05, totalizando R$ 593,98. A parcela autônoma será paga sempre como complementação aos vencimentos que ficarem abaixo do Piso Nacional, tendo-o como limite.

quarta-feira, 16 de março de 2011

Julgamento por morte de cacique atrai atenção internacional


O Ministério Público Federal (MPF) espera que o julgamento dos três acusados de matar o cacique Marcos Veron previsto para amanhã (21), na capital paulista, tenha repercussão internacional. “O Marcos Veron era uma liderança internacionalmente reconhecida dos índios Guarani-Kaiowá” disse em entrevista á Agência Brasil o procurador Luiz Carlos Gonçalves, um dos quatro membros do órgão que atuará no juri. Ele lembrou que o caso chegou a ser citado em um relatório da Anistia Internacional.

Para Gonçalves, o julgamento é “talvez o mais importante” na afirmação dos direitos dos índios. “Especialmente dos direitos dos índios à terra, à vida tradicional, ao respeito aos seus valores”. O juri foi suspenso em maio do ano passado após o procurador responsável, Vladimir Aras, se retirar do tribunal. Foi uma forma de protestar contra a recusa da juíza federal Paula Mantovani Avelino em permitir que as testemunhas indígenas fossem ouvidas por meio de tradutor.

Apesar de continuar com o entendimento de que “os índios têm direito a falar no seu idioma”, segundo Gonçalves, o MPF deverá, dessa vez, acatar o que for decidido pela juíza. “A gente confia muito na prudência da doutora Paula Montovani”. Após o acontecimento, Vladimir Aras deixou o caso.

O advogado que defende os réus, Josefino Ujacow, classificou como “deselegância” o fato do procurador Aras ter abandonado o tribunal. Para ele, não existe motivo para o uso de tradutor. “Durante a fase processual, essas mesmas pessoas foram ouvidas sem assistência de interpretes. E eles declararam que sabiam ler e escrever”, afirmou.

Ujacow também fez questão de protestar pela transferência do julgamento de Mato Grosso do Sul (MS) para São Paulo. “Não existe essa propalada influência dos donos da fazenda sobre todos os jurados de Mato Grosso do Sul”.

O tribunal do juri foi transferido de Dourados (MS) para a capital paulista atendendo a um pedido do Ministério Público. De acordo com o órgão, o dono da fazenda onde ocorreram os fatos tem grande poder econômico e poderia influenciar jurados e testemunhas. Além disso, o MPF afirma que existe em Mato Grosso do Sul um preconceito contra os indígenas .

O crime ocorreu em janeiro de 2003, no município de Juti, em Mato Grosso do Sul. Segundo o MPF, a morte do cacique Veron foi consequência de uma série de ataques ao longo de dois dias contra os índios que estavam acampados na Faazenda Brasília do Sul, reivindicada como Terra Indígena Takuara. Os ataques teriam sido feitos por seguranças da fazenda para remover os índios do local. São acusados pelo homicídio: Estevão Romero, Carlos Roberto dos Santos e Jorge Cristaldo Insabralde.

O advogado demonstrou confiança na absolvição dos réus. “Não há provas concretas nem cabais contra os réus que serão julgados. A acusação se alicerça em ilações e meras conjecturas”, disse.

O procurador Gonçalves acredita que o resultado mostrará que para a sociedade brasileira e o resto do mundo que o país não tolera a impunidade. “O que a gente quer mostra é que o Brasil não pode mais ser a terra da impunidade. O Brasil tem que ser a terra dos direitos”, afirmou.
Fonte: Agência Brasil via vermelho

Golpe de mestre

  Gilvan Rocha no Correio da Cidadania   
 
O PMDB mostrou que é formado por velhas raposas na arte da rapinagem. Partido fisiológico não tem compromissos senão o de praticar golpes sejam de natureza política, sejam fisiológica.
 
Na votação do preço do salário mínimo na Câmara dos Deputados, o PMDB logrou praticar uma grande encenação. Sua bancada votou maciçamente na proposta do governo Dilma em estabelecer em R$ 545,00 o preço do salário mínimo. O golpe foi o de exibir para os capitalistas e para o governo Dilma que o PMDB estava coeso em apoiar as medidas do interesse do sistema.
 
É claro que para este partido, de natureza estritamente fisiológica, nada é feito gratuitamente. Em troca do apoio maciço que foi dado ao mísero salário mínimo proposto pelo grande capital, com a anuência das centrais sindicais corrompidas, esse partido colherá grandes frutos, na forma de cargos e benesses do aparelho de Estado.
 
Veja-se a quanto chegamos com o lulismo no governo! Antes, porém, faz-se necessário deixar explicitado o que significa lulismo. Para fazê-lo, recorremos ao seu "irmão gêmeo", o peronismo argentino, que desmantelou a vida política naquele país, cooptou os sindicatos, levantou a bandeira dos "descamisados" com medidas similares às do Bolsa Família e gerenciou o grande capital. Quando exaurido, Perón foi deposto do governo. Mas, quando se fez necessário, a classe burguesa foi buscá-lo no exílio e promoveu um evento eleitoral onde o "general do povo" conseguiu 92% dos votos válidos como candidato à presidência da Argentina.
 
Como o peronismo, o lulismo tem caminhado no sentido de excluir a vida política e transformar o jogo do poder num simples processo de barganha. Lula jamais poderia ser chamado de estadista mesmo no sentido burguês da palavra. Evitou fazer as reformas de base, necessárias ao desentrave do crescimento do capitalismo, para se poupar de qualquer impopularidade. Praticou desbragadamente o populismo e nisso teve êxito. Porém, não teria caso não soubesse celebrar um ‘casamento’ tão escabroso como o foi PT-PMDB.
 
Gilvan Rocha é presidente do CAEP- Centro de Atividades e Estudos Políticos.
 

O “déficit zero” não tinha sido um sucesso?


 
Paulo Muzell

O povo gaúcho – em especial, o leitor de Zero Hora – foi bombardeado nos últimos quatro anos por notícias que anunciavam e elogiavam a fantástica recuperação das finanças do Rio Grande do Sul, façanha maior do governo Yeda Crusius, o badalado “déficit zero”.
Não é preciso ser técnico em finanças, qualquer cidadão bem informado sabe que o “déficit zero” foi uma fórmula fantasiosa criada para esconder a desordem financeira estrutural que surgiu e se agrava no estado. Essa desordem tem inúmeras causas, todas decorrentes de decisões insensatas e imprudentes de quase todos gestores públicos estaduais das últimas quatro décadas e que resultaram numa enorme dívida fundada e num imenso passivo judiciário. Dívida contratual, aliás, cujas condições – extremamente prejudiciais -, foram negociadas por um governador ex-funcionário da RBS, portanto íntimo da casa e à época o número 1 na lista dos “queridinhos de ZH”. Além disso, há uma grande despesa com os aposentados – hoje representam mais de 50% da folha – que significa um crescente déficit previdenciário. Nada disso avançou um milímetro no governo Yeda.
O que Yeda fez foi obter uma pequena melhora no equilíbrio receita-despesa à custa do desvio de bilhões e bilhões de reais que deveriam ser destinados à saúde e à educação e não o foram; à custa de um forte arrocho salarial e do sucateamento dos serviços essenciais. Só nas áreas da educação e na saúde o número de servidores ativos diminuiu 10%.
Yeda que, até o último minuto de seu governo, insistiu na absurda tese do “déficit zero” tentou um “grand finale”, um golpe de mestre, verdadeiro “fecho de ouro” para seu desastrado governo. Ao rufar de tambores e ao som de fanfarras, anunciou a herança bendita: deixava 3,6 bilhões em caixa para o novo governo que assumia! Os desavisados e mal informados soltaram foguetes e festejaram o “milagre”.
Ledo engano, farsa barata. Poucos dias depois o secretário da Fazenda que assumia anunciava o quadro real: déficit orçamentário, dívida de bilhões no caixa única e cofres zerados. A farsa do “déficit zero” virou fumaça.
ZH – em especial a sua página 10 – dá agora um giro de 180 graus. Passa a anunciar, com destaque e constante repetição a “novidade”: a crise das finanças estaduais! Nas entrelinhas, subliminarmente passa a ideia de que com o novo governo surge uma nova realidade, que maus ventos começam a soprar nos céus do Rio Grande. Mas o déficit zero não tinha sido um sucesso?

terça-feira, 15 de março de 2011

Comissão da Verdade é imperiosa


 

Mair Pena Neto no Direto da redação
Em uma quarta-feira de cinzas em que a gente acorda não esperando nada mais do dia além da apuração do resultado das escolas de samba no Rio,  apareceu nos jornais documento das Forças Armadas, enviado ao ministro da Defesa Nelson Jobim, com críticas à instalação da Comissão Nacional da Verdade, destinada a esclarecer os crimes cometidos na ditadura militar.

A comissão parece irreversível e o documento seria apenas a queixa natural do setor mais envolvido com as atrocidades cometidas durante os 25 anos do regime de exceção, mas merece observação pelos argumentos levantados pelos militares, que, mais do que evitar, justificam o esclarecimento da verdade sobre esse período trágico da história brasileira.

Os militares argumentam que a instalação da comissão “provocará tensões e sérias desavenças ao trazer fatos superados à nova discussão”.  Que tensões e desavenças surgirão do debate é natural. O tema é delicado e dolorido para ser tratado com indiferença ou restrito aos debates do Congresso sem o envolvimento da sociedade. É até bom que assim seja para que a questão seja encarada de frente e resolvida de uma vez por todas, de acordo com os resultados e suas conseqüências.

O que precisa ficar claro é se por trás desta constatação está alguma ameaça. Se os militares consideram que tensões e desavenças podem afetar a ordem institucional. Neste caso, mereceriam um enquadramento por insubordinação. Os militares devem obediência e respeito a um projeto do Executivo, que foi enviado ao Congresso e segue os ritos democráticos do país.

A continuação desta argumentação – que considera os fatos superados – é completamente equivocada. É justamente por não estarem superados que eles voltam à tona. O Brasil não pode seguir adiante sem esclarecer o destino de parte de seus filhos e a responsabilidade por suas torturas e mortes.  Este é um capítulo inconcluso de nossa história, que só serenará quando tiver um ponto final, não na forma de lei, como Carlos Menem tentou fazer com decreto homônimo na Argentina, mas com a revelação de tudo o que aconteceu no período.

Os militares prosseguem suas queixas afirmando que “o Brasil vive hoje situação política, econômica e mundial completamente diferente do momento histórico em que os fatos ocorreram. Comissões dessa natureza costumam ser criadas em um contexto de transição política. O que não é o caso na atualidade. Passaram quase 30 anos do fim do governo chamado militar e muitas pessoas que viveram aquele período já faleceram; testemunhas, documentos e provas praticamente perderam-se no tempo, é improvável chegar-se realmente à verdade dos fatos. Assim sendo, a criação de uma Comissão da Verdade não faz mais sentido, considerando que o Brasil superou muito bem essa etapa da sua história quando comparado a outros países do continente, que até hoje vivem conseqüências negativas de períodos históricos similares.”

Este longo trecho merece transcrição completa pelas contradições que encerra. A sentença de abertura tenta justificar crimes contra a humanidade, como a tortura, por um determinado período histórico. Talvez os militares estejam se referindo à guerra fria, mas, se for isso, precisariam se justificar. O Brasil não vivia um período tão diferente assim. Estávamos em plena democracia, governados por um presidente, que assumiu o cargo em função da renúncia do titular, como previa a Constituição. É importante recordar que, à época, o vice-presidente também era eleito pelo voto direto, e que Jango era de partido oposto ao de Jânio Quadros, que acabou renunciando. Assim, Jango era um governante democraticamente eleito e não fruto do acaso, como Sarney viria a ser duas décadas depois.

O fato de comissões da verdade serem, em geral, instaladas em contexto de transição não impede que uma seja criada no Brasil, agora. A Argentina continua julgando os militares responsáveis por crimes da ditadura naquele país, e cada fato novo legitima novo inquérito e julgamento. O tempo decorrido dos crimes cometidos também não é justificativa para a sua não apuração. Os militares se incriminam ao afirmar que “documentos e provas perderam-se no tempo”. Como assim? As pessoas que foram presas, torturadas e mortas estavam em poder do Estado brasileiro. Registros de prisão e processos são obrigatórios. Documentos certamente existiram e se acabaram por se perder no tempo foi por obra de alguém, certamente a parte interessada.

Ao contrário do que afirmam os militares, o Brasil não “superou muito bem essa etapa de sua história”, justamente pelo fato de ela não ter sido esclarecida até hoje e de só ter beneficiado os que praticaram os crimes. Os militares consideram que o governo que comandaram com mão de ferro por um quarto de século “não foi derrubado pelas forças políticas, mas sim ensejou processo lento e gradual de transição e devolução do poder aos civis, promovendo verdadeira reconciliação nacional.”

Parecem desconhecer as forças da história, que os obrigaram a levar adiante o processo inexorável de abertura. Bolsões sinceros e radicais até tentaram prorrogar o período de vigência da ditadura, mas seus dias estavam definitivamente contados pela pressão interna e externa. A democracia não foi concedida de bom grado e sim conquistada pela resistência democrática, exercida das mais diferentes formas.

O documento das Forças Armadas reconhece “o direito legítimo das famílias buscarem seus entes desaparecidos”, mas questiona o suposto uso de uma “causa nobre” para retaliações políticas. Ora, se os militares reconhecem o direito das famílias, deveriam contribuir para esclarecer o que aconteceu com seus filhos e não evitar apurações. As retaliações que porventura vierem da verdade serão de natureza jurídica e não política. Os militares perderam uma boa oportunidade de ficarem calados. Sua argumentação só reforça a necessidade imperiosa de uma comissão da verdade que traga à luz o que tanto se esforçam para manter sob o tapete.