sexta-feira, 1 de abril de 2011

FOLHA: “A GENTE SÓ APOIAVA E FINANCIAVA A DITADURA”


O que a falácia da ditabranda revela

Por Marco Aurélio Weissheimer, da Carta Maior

Em um editorial publicado no dia 17 de fevereiro de 2009, o jornal Folha de S. Paulo utilizou a expressão “ditabranda” para se referir à ditadura que governou o Brasil entre 1964 e 1985. Na opinião do jornal, que apoiou o golpe militar de 1964 que derrubou o governo constitucional de João Goulart, a ditadura brasileira teria sido “mais branda” e “menos violenta” que outros regimes similares na América Latina.
Como já se sabe, a Folha não foi original na escolha do termo. Em setembro de 1983, o general Augusto Pinochet, em resposta às críticas dirigidas à ditadura militar chilena, afirmou: “Esta nunca foi uma ditadura, senhores, é uma dictablanda”. Mas o tema central aqui não diz respeito à originalidade. O uso do termo pelo jornal envolve uma falácia nada inocente. Uma falácia que revela muita coisa sobre as causas e consequências do golpe militar de 1964 e sobre o momento vivido pela América Latina.
É importante lembrar em que contexto o termo foi utilizado pela Folha. Intitulado “Limites a Chávez”, o editorial criticava o que considerava ser um “endurecimento do governo de Hugo Chávez na Venezuela”. A escolha da ditadura brasileira para fazer a comparação com o governo de Chávez revela, por um lado, a escassa inteligência do editorialista. Para o ponto que ele queria sustentar, tal comparação não era necessária e muito menos adequada. Tanto é que pouca gente lembra que o editorial era dirigido contra Chávez, mas todo mundo lembra da “ditabranda”.
A falta de inteligência, neste caso, parece andar de mãos dadas com uma falsa consciência culpada que tenta esconder e/ou justificar pecados do passado. Para a Folha, a ditadura brasileira foi uma “ditabranda” porque teria preservado “formas controladas de disputa política e acesso à Justiça”, o que não estaria ocorrendo na Venezuela. Mas essa falta de inteligência talvez seja apenas uma cortina de fumaça.
O editorial não menciona quais seriam as “formas controladas de disputa política e acesso à Justiça” da ditadura militar brasileira, mas considera-as mais democráticas que o governo Chávez que, em uma década, realizou 15 eleições no país, incluindo aí um referendo revogatório que poderia ter custado o mandato ao presidente venezuelano. Ao fazer essa comparação e a escolha pela ditadura brasileira, a Folha está apenas atualizando as razões pelas quais apoiou, junto com a imensa maioria da imprensa brasileira, o golpe militar contra o governo constitucional de João Goulart.
Está dizendo, entre outras coisas, que, caso um determinado governo implementar um certo tipo de políticas, justifica-se interromper a democracia e adotar “formas controladas de disputa política e acesso à Justiça”. A escolha do termo “ditabranda”, portanto, não é acidental e tampouco um descuido. Trata-se de uma profissão de fé ideológica.
Há uma cortina de véus que tentam esconder o caráter intencional dessa escolha. Um desses véus apresenta-se sob a forma de uma falácia, a que afirma que a nossa ditadura não teria sido tão violenta quanto outras na América Latina. O núcleo duro dessa falácia consiste em dissociar a ditadura brasileira das ditaduras em outros países do continente e do contexto histórico da época, como se elas não mantivessem relação entre si, como se não integrassem um mesmo golpe desferido contra a democracia em toda a região.
O golpe militar de 1964 e a ditadura militar brasileira alimentaram política e materialmente uma série de outras ditaduras na América Latina. As democracias chilena e uruguaia caíram em 1973. A argentina em 1976. Os golpes foram se sucedendo na região, com o apoio político e logístico dos EUA e do Brasil. Documentos sobre a Operação Condor fornecem vastas evidências dessa relação.
Recordando. A Operação Condor é o nome dado à ação coordenada dos serviços de inteligência das ditaduras militares na América do Sul, iniciada em 1975, com o objetivo de prender, torturar e matar militantes de esquerda no Brasil, Argentina, Chile, Paraguai, Uruguai e Bolívia.
O pretexto era o argumento clássico da Guerra Fria: "deter o avanço do comunismo internacional". Auxiliados técnica, política e financeiramente por oficiais do Exército dos Estados Unidos, os militares sul-americanos passaram a agir de forma integrada, trocando informações sobre opositores considerados perigosos e executando ações de prisão e/ou extermínio. A operação deixou cerca de 30 mil mortos e desaparecidos na Argentina, entre 3 mil e 7 mil no Chile e mais de 200 no Uruguai, além de outros milhares de prisioneiros e torturados em todo o continente.
Na contabilidade macabra de mortos e desaparecidos, o Brasil registrou um número menor de vítimas durante a ditadura militar, comparado com o que aconteceu nos outros países da região. No entanto, documento secretos divulgados recentemente no Paraguai e nos EUA mostraram que os militares brasileiros tiveram participação ativa na organização da repressão em outros países, como, por exemplo, na montagem do serviço secreto chileno, a Dina. Esses documentos mostram que oficiais do hoje extinto Serviço Nacional de Informações (SNI) ministraram cursos de técnicas de interrogatório e tortura para militares chilenos.
Em uma entrevista ao jornal O Estado de São Paulo (30/12/2007), o general Agnaldo Del Nero Augusto admitiu que o Exército brasileiro prendeu militantes montoneros e de outras organizações de esquerda latino-americanas e os entregou aos militares argentinos. “A gente não matava. Prendia e entregava. Não há crime nisso”, justificou na época o general. Humildade dele. Além de prender e entregar, os militares brasileiros também torturavam e treinavam oficiais de outros países a torturar. Em um dos documentos divulgados no Paraguai, um militar brasileiro diz a Pinochet para enviar pessoas para se formarem em repressão no Brasil, em um centro de tortura localizado em Manaus.
Durante a ditadura, o Brasil sustentou política e materialmente governos que torturaram e assassinaram milhares de pessoas. Esconder essa conexão é fundamental para a Folha afirmar a suposta existência de uma “ditabranda” no Brasil. A ditadura brasileira não teve nada de branda. Ao contrário, ela foi um elemento articulador, política e logisticamente, de outros regimes autoritários alinhados com os EUA durante a guerra fria. O editorial da Folha faz eco às palavras do general Del Nero: “a gente só apoiava e financiava a ditadura; não há crime nisso”.
Não é coincidência, pois, que o mesmo jornal faça oposição ferrenha aos governos latino-americanos que, a partir do início dos anos 2000, levaram o continente para outros rumos. Governos eleitos no Brasil, na Venezuela, na Bolívia, na Argentina, no Paraguai e no Uruguai passam a ser alvos de uma sistemática oposição midiática que, muitas vezes, substitui a própria oposição partidária.
A Folha acha a ditadura branda porque, no fundo, subordina a continuidade e o avanço da democracia a seus interesses particulares e a uma agenda ideológica particular, a saber, a da sacralização do lucro e do mercado privado. Uma grande parcela do empresariado brasileiro achou o mesmo em 64 e apoiou o golpe. Querer diminuir ou relativizar a crueldade e o caráter criminoso do que aconteceu no Brasil naquele período tem um duplo objetivo: esconder e mascarar a responsabilidade pelas escolhas feitas, e lembrar que a lógica que embalou o golpe segue viva na sociedade, com um discurso remodelado, mas pronto entrar em ação, caso a democracia torne-se demasiadamente democrática.

As razões do golpe de 64

Emir Sader na Carta Maior

As visões descritivas dos grandes acontecimentos históricos tendem a reduzi-los a contingências – a Primeira Guerra, a um episodio menor – ou a idiossincrasias – a personalidade de Hitler. No caso do golpe no Brasil, a imprensa golpista da época se centrava nos supostos “abusos” do governo Jango, que teriam levado à intervenção dos militares para “salvar a democracia” – lugar comum nos editoriais da época.

O movimento que desembocou no golpe de 1964 na realidade vem de longe. Podemos remontá-lo ao começo da Guerra Fria, no fim da Segunda Guerra e no começo do segundo pós-guerra, quando os EUA reciclavam sua definição de inimigos do bloco derrotado na guerra, para a URSS. Não seria possível explicar a brutalidade das bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki, sem levar em conta a nova atitude norteamericana de mostrar para a URSS sua superioridade nuclear, que iria definir o começo do novo período. De capa da revista Times há poucos anos antes, como herói da luta pela democracia, Stalin se tornava a encarnação do mal que haveria que evitar: o “espectro do comunismo”.

Foi nesse momento que os EUA elaboraram a Doutrina da Segurança Nacional, que propunha que os Estados se transformassem em quarteis generais na luta contra a “subversão” e o “comunismo”. Todo tipo de conflito, de divergência, de expressão de descontentamento social seria classificado como “subversão”, expressão de interesses estrangeiros e deveria ser extirpado. A instalação de ditaduras militares, que blindassem os Estados, seria o objetivo ideal.

Da geração de militares brasileiros que foi à guerra da Itália, Humberto Castello Branco e Golbery do Couto e Silva, estreitaram ali laços com as tropas nortemamericanas e, na volta para o Brasil, fundaram a Escola Superior de Guerra, que passou a ser o lugar estratégico de formulação, difusão e formação de pessoal das FFAA baseado na Doutrina de Segurança Nacional.

Os anos 50 foram anos de ensaios de golpe, contra Getúlio e contra JK, depois na renúncia do Jânio. Enquanto isso o Brasil crescia, distribuía renda, afirmava uma politica internacional própria. Os investimentos norteamericanos foram voltando com força – depois do longo interregno desde a crise de 1929-, até que, com a chegada da indústria automobilística, deslocaram para si o eixo da economia e condicionaram fortemente o consumo de luxo. Mas ao mesmo tempo o mercado interno se expandia na direção do consumo de bens de consumo popular nas grandes cidades e também no campo, onde se estendia o processo de sindicalização rural, pela primeira vez.

As duas dinâmicas se chocavam: a da democratização do consumo e a do consumo de luxo junto à exportação. A ditadura resolveu o conflito a favor desta. Além da brutal repressão que desatou contra tudo o que significasse democracia, desde o começo o regime militar teve um caráter de classe muito definido: interveio em todos os sindicatos, perseguiu a seus lideres e determinou um arrocho salarial, o que significou uma situação extraordinariamente favorável à superexploração dos trabalhadores e à acumulação favorável ao grande capital nacional e estrangeiro.

Ao contrario do que alguns pensavam, a ditadura não significou o retrocesso da expansão economia e da industrialização no Brasil. O fim da democracia e a imposição da ditadura foram funcionais ao capitalismo. Brecaram as demandas populares mediante o arrocho, bloquearam as demandas salariais pela intervenção e repressão aos movimentos populares, enquanto abria a economia ao capital estrangeiro, liberava o envio de royalties ao exterior e favorecia de todas as maneiras a concentração em favor das grandes empresas nacionais e estrangeiras.

O chamado “milagre” tinha um santo: a ditadura, a repressão, os golpes ao movimento popular e à democracia. Foi uma ditadura articulada com os planos da guerra fria dos EUA e com o modelo de acumulação do grande capital – que se desenvolveu em base à concentração no consumo de luxo, na superexploração dos trabalhadores e na exportação. Avançou o Brasil desigual, injusto, de concentração de renda, de exclusão social, de prepotência, de terror, de poder do capital, dos latifundiários, dos donos da mídia privada. O Brasil que recentemente começamos a superar, daí a oposição dos herdeiros da ditadura.

Crise humanitária marfinense além da fronteira

Milhares de marfinenses fogem para a Libéria por causa da violência desatada no país, após as eleições de novembro que o deixaram à beira de uma guerra civil. O questionado presidente da Costa do Marfim, Laureng Gbagbo, não cede às pressões internacionais para que deixe o cargo após a vitória eleitoral, avalizada pela Organização das Nações Unidas (ONU), de seu tradicional adversário, Alassane Ouattara.

Por Jessica McDarmind

Milhares de marfinenses fogem para a Libéria por causa da violência desatada no país, após as eleições de novembro que o deixaram à beira de uma guerra civil. O questionado presidente da Costa do Marfim, Laureng Gbagbo, não cede às pressões internacionais para que deixe o cargo após a vitória eleitoral, avalizada pela Organização das Nações Unidas (ONU), de seu tradicional adversário, Alassane Ouattara. A disputa de poder que se seguiu à votação deixou centenas de mortos, quase um milhão de refugiados e uma economia deteriorada.

O conflito tem consequências sobre os países vizinhos, que se recuperam de seus próprios problemas. Os moradores do Butuo, a um par de quilômetros da fronteira com a Costa do Marfim, recebem dezenas de marfinenses em suas pequenas casas e, em alguns casos, literalmente lhes dão comida de seus pratos e a roupa que estão usando. Eles recordam o que é perder tudo e ter que fugir ao som dos disparos de armas automáticas. Não se esquecem dos que os ajudaram quando estiveram com problemas. Vários milhares de liberianos se refugiaram na Costa do Marfim durante os 14 anos da guerra civil que terminou em 2003.

Desde que refugiados da aldeia marfinense de Bin Houye, do outro lado da fronteira, começaram a chegar a Butuo, Titos Peter abrigou cerca de 60 pessoas, além da dezena de familiares com os quais convive. Muitas das pessoas que recebeu são parentes, mas também há estranhos que precisam de ajuda, disse Titos, que vive há anos neste povoado, depois de estar durante anos em Bin Houye, durante a guerra na Libéria. “Estamos todos relacionados”, explicou. “Se algo acontece deste lado, vamos para lá. Quando algo acontece lá, vêm para cá”, disse.

Há meses que chegam marfinenses a este povoado e isto esgota os escassos recursos de água e comida. As tensões começam a surgir com a propagação de doenças e da fome, que afeta cada vez mais pessoas. Os refugiados lotam as casas da população local e comem sua comida, sem importar se são convidados ou não, e a doença se espalha porque as pessoas defecam em espaços públicos por falta de instalações adequadas, lamentou a representante distrital Annie W. Kwaleh. “O pouco que têm dividem com os estrangeiros. Estes não querem ir para os acampamentos e não podemos abandoná-los. Comeram tudo, não nos resta nada. Não sabemos o que fazer”, acrescentou.

O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) desloca lentamente as pessoas para o acampamento de Bahn, a 60 quilômetros, por um caminho em mau estado. O lugar tem capacidade para 15 mil pessoas, mas só há 2.500. Há outro acampamento em construção e vários provisórios em todo o condado de Nimba, onde se concentra a crise humanitária neste momento.

O trabalho da organização se complicou a partir de 24 de fevereiro, quando eclodiu um forte enfrentamento na fronteira ocidental da Costa do Marfim entre forças de Gbagbo e ex-integrantes do exército rebelde, leais a Ouattara. “Aquele dia começou com um telefonema informando que havia duas mil pessoas na fronteira”, contou Dina Sinigallia, responsável de Relações Externas do escritório do Acnur em Saclepea, perto de Bahn.

O Acnur deve enfrentar uma crescente quantidade de pessoas na fronteira e a deterioração da segurança. Agora, seu objetivo é tirar as pessoas da região. A agência recomenda aos refugiados que se dirijam para Bahn ou a uma das 15 comunidades com áreas para alojá-los, explicou Dina. “Não haverá mais assistência na fronteira e é pouco provável que continuem sendo distribuídos alimentos”, acrescentou. No entanto, muitos refugiados se negam a ir para Bahn porque não querem se afastar de seus familiares que ficaram na Costa do Marfim. Além disso, dizem que o bulgur (alimento à base de trigo) entregue pelo Acnur faz mal. “Não podemos obrigar as pessoas a irem. Tem de ser voluntário”, ressaltou Dina.

O pouco alimento distribuído era inadequado, o mesmo bulgur que faz com que os refugiados não queiram ir para os acampamentos, e as condições de higiene se deterioram, disse P. Zoyeagbander D. Gberardeu, assistente do superintendente de Butuo. Desde que começou a afluência de refugiados, no final de fevereiro, morreram, pelo menos, sete pessoas de diarreia, afirmou. “Dizemos a eles que é melhor irem para os acampamentos porque nossa comida acabou. Se ficarem, todos teremos de partir ou morreremos de fome”, acrescentou.

A segurança também é motivo de preocupação. O distrito de 47 mil habitantes tem três policiais, 13 funcionários de fronteira e oito de migração. Os combates aconteceram tão perto que a população ouviu disparos e artilharia pesada, acrescentou Gberardeu. “Não queremos que nada de mal aconteça, mas se chegar a ocorrer estaremos em uma situação de extrema vulnerabilidade”, afirmou.

Por Envolverde/IPS. Foto por http://www.flickr.com/photos/fleshmanpix/.

quinta-feira, 31 de março de 2011

Seres infames



JUREMIR MACHADO DA SILVA


Mostrei ao governador Tarso Genro, na terça-feira, antes de entrevistá-lo na comemoração do primeiro ano do "Esfera Pública", programa que apresento todos os dias, entre 13h e 14h, na Rádio Guaíba, junto com Taline Oppitz, um parágrafo do livro "O Abolicionista", de Joaquim Nabuco, um dos maiores intelectuais brasileiros. Tarso, homem de livros e de sensibilidade social, sabe perceber a força das palavras. Dizia Nabuco, antes da abolição da escravatura: "Tudo o que significa luta do homem com a natureza, conquista do solo para a habitação e cultura, estradas e edifícios, canaviais e cafezais, a casa do senhor e a senzala dos escravos, igrejas e escolas, alfândegas e correios, telégrafos e caminhos de ferro, academias e hospitais, tudo, absolutamente tudo que existe no país, como resultado do trabalho manual, como emprego de capital, como acumulação de riqueza, não passa de uma doação gratuita da raça que trabalha à que faz trabalhar", doação forçada dos negros aos brancos.

Os negros "doaram gratuitamente" o Brasil construído aos brancos, que nunca os indenizaram por isso. Sempre que alguém brada contra as cotas, eu penso nessa dívida jamais quitada. Somos todos beneficiados por essa "doação" obtida de maneira infame. Pensei nisso ao ler as declarações do indigesto Jair Bolsonaro ao ser questionado por Preta Gil, no programa "CQC", se aceitaria o relacionamento de seu filho com uma negra. O infame Bolsonaro, com quem já discuti na Rádio Guaíba, respondeu que "não corria o risco", pois "eles foram muito bem-educados". Bolsonaro deveria ler esse texto de Joaquim Nabuco. Mas seria inútil. Analfabeto intelectual, ele não o entenderia. Nos últimos anos, só discuti com um sujeito tão intragável quanto Bolsonaro, o insuportável Juca Chaves, cujo reacionarismo já não faz mais ninguém rir.

Bolsonaro alega que se enganou. Não teria pensado que Preta falava em relacionamento do filho dele com uma negra, mas com um gay. Tenta escapar da infâmia racista abrigando-se na infâmia do preconceito sexual. Além de racista e homofóbico, parece burro, se isto não for preconceito meu com esses pobres animais. O preconceito corre solto no Brasil. Tapamos o sol com a peneira nos estádios de futebol. Depois que publiquei "História Regional da Infâmia, O Destino dos Negros Farrapos e Outras Iniquidades Brasileiras", vi pessoas mudarem de comportamento comigo. Não me assusto. Releio Nabuco sobre o primeiro dever de qualquer um no século XIX: "Antes de discutir qual o melhor modo para um povo ser livre de governar-se a si mesmo - é essa a questão que divide os outros - trata de tornar livre a esse povo, aterrando o imenso abismo que separa as duas castas sociais".

Para Joaquim Nabuco não havia dúvida, "o abolicionismo deveria ser a escola primária de todos os partidos, o alfabeto da nossa política". Tudo o mais era menor. Continua sendo. Precisamos abolir o preconceito. Enquanto os Bolsonaro da vida vomitarem infâmias, será preciso combatê-los a golpes de Nabuco. Demora. A inteligência cala lentamente no concreto da estupidez.

JUREMIR MACHADO DA SILVA é jornalista, escritor e professor

“As revoluções no mundo árabe transcendem e superam as categorias tradicionais da esquerda”

Confira entrevista com o correspondente Gabriele del Grande, que há dois meses vem fazendo cobertura – desde a Tunísia, Egito e agora na Líbia – dos acontecimentos do mundo árabe.

Por Alma Allende na Revista Fórum

Gabriele del Grande, nascido em 1982, formado em Estudos Orientais na Universidade de Bologna. Escreve no L’Unitá e no Peacereporter, mas na realidade se dedica desde muitos anos, como jornalista atento, comprometido e rigoroso, a história da verdadeira “classe universal” do século XXI: os imigrantes. Em 2006, fundou o observatório das vitimas da imigração Fortress Europe, onde registra nomes e dados do “genocídio estrutural” derivado das políticas migratórias européias. É autor de dois livros fundamentais sobre o tema: Mamadou vai morrer e O Mar do Meio, cujos capítulos sobre Tunísia e Líbia são de obrigatória leitura para quem queira abordar a situação atual dos dois países. Há dois meses vem fazendo cobertura – desde a Tunísia, Egito e agora na Líbia – dos acontecimentos do mundo árabe. Há vinte dias se encontra em Bengasi e dali respondeu a nossas perguntas.

Agora que se decidiu pela intervenção da ONU e que as bombas “aliadas” caem sobre a Líbia, numerosas vozes antiimperialistas tratam de demonstrar que a revolta líbia foi, desde o princípio, uma armação das potências ocidentais. Que você pensa a respeito? Houve algum projeto exterior ou foram levantes populares espontâneos como na Tunísia e no Egito?

Gabriele del Grande - Não estou absolutamente de acordo com os que denunciam um complô. Na Líbia, como na Tunísia, Egito, Iêmen e agora também Síria, as revoltas foram espontâneas e populares e não o resultado de complôs estadunidenses, mas sim a resposta mais natural que podíamos esperar depois de décadas de ditaduras apoiadas pelas grandes potências em nome da estabilidade e dos bons negócios. Assombra-me que certas teorias conspiratórias procedam do campo da esquerda. Mas isso ocorre também porque estas revoluções transcendem e superam as categorias da esquerda. É interessante analisar este paradoxo. Nas ruas do Cairo, como em Túnis e em Bengasi, estão, sobretudo, os pobres. Mas os pobres não pedem salários, não gritam contra os patrões, não se identificam como classe trabalhadora. Ou, pelo menos, não ainda. Antes de tudo, clamam por liberdade e antes de qualquer coisa se identificam como cidadãos. E um dos instrumentos principais que os permite se organizar é um objeto de consumo. Talvez o símbolo mais fútil dos bens de consumo: o computador com o qual se conectam a rede, e os celulares com câmeras para gravar o que se sucede nas ruas.

Há, enfim, um elemento geracional. Trata-se de países muito jovens, ao contrário da Itália ou da Espanha, cujos cidadãos médios cresceram durante a Guerra Fria. Aqui a maior parte da população tem menos de 25 anos e impulsiona mudanças. Uma mudança que na bancada norte (do Mediterrâneo) não sabemos compreender, também por causa de um prejuízo racista e colonial do qual não conseguimos nos libertar. A Europa se considera a única possível depositária de democracia. Como se fosse um conceito que pode pertencer somente a algum e não a todos. E considera impossível que um país muçulmano possa aspirar à liberdade em lugar do obscurantismo religioso. Esta é a razão pela que prosperam as teses conspiratórias. Não aceitar a ideia de que à “nossa” decadência corresponda “seu” ressurgimento.

Por que você crê que os EUA, a UE e inclusive a Itália, com interesses tão fortes na Líbia, decidiram-se por uma intervenção “humanitária” contra um amigo e aliado?

Del Grande - Creio fundamentalmente que por um erro de cálculo. Em um primeiro momento, parecia que o regime de Gadafi ia implodir sobre si mesmo no curso de poucos dias. Assim foi na Tunísia e no Egito. E nestes dias as potências mundiais se precipitaram a condenar a ditadura líbia e a mandar sinais de abertura aos rebeldes com o fim de garantir a continuidade dos contratos petroleiros e das concessões milionárias que a Líbia oferece e oferecerá nos próximos anos. Depois se demonstrou que Gadafi era um osso mais duro de roer do que o previsto e ganhou terreno graças à parcimônia da ONU e à entrada na Líbia de mercenários profissionais de guerra, chegados de outros países africanos, e utilizados em campanhas ofensivas contra as cidades dos rebeldes. Chegado a este ponto, as potências internacionais tiveram que tomar uma decisão para proteger seus interesses na Líbia. Ou apostar nos rebeldes e preparar as armas; ou voltar sobre os próprios passos com o risco muito alto de que um personagem como Gadafi, ressentido pela afronta, cancelasse os contratos com as companhias ocidentais, nos termos da sua conhecida gestão pessoal e lunática do sistema Líbia.

Quem faz parte do Conselho Nacional Líbio? São agentes do imperialismo, bravos revolucionários, uma mistura de tudo?

Del Grande - Trata-se de personagens de extratos muitos variados. Sobretudo advogados, juízes, homens de negócios e alguma ou outra cara lavada do regime que abandonou Gadafi há tempos e que não tem as mãos sujas de sangue. Alguns voltaram à Líbia depois de anos de exílio no exterior, principalmente nos EUA. Das suas declarações se deduz que buscam uma Líbia unida, com capital em Trípoli, regida por um sistema constitucional, parlamentar e de partidos, que respeite os velhos contratos petroleiros e que reconheça a liberdade de expressão, associação, imprensa e pensamento. O trabalho que têm adiante é longuíssimo, porque há 42 anos a sociedade civil na Líbia foi aniquilada. Não existem associações. Não existem sindicatos. Não existem partidos políticos. Não existem instituições. Existe unicamente a rede de Comitês Populares de Gadafi, suas forças de segurança, um exército que não serve para nada e a mão larga do grande chefe que decide tudo segundo seu humor.

Há uma esquerda mais ou menos organizada em Bengasi? Que papel desempenharam os jovens?

Del Grande - A esquerda não existe e, se existe, não é visível. Repito que não há nem houve partidos nos últimos 40 anos. Foi reprimida toda forma de dissidência. A única força de oposição interna nas últimas décadas foi a do islã político. Reprimido severamente durante a ditadura. Basta pensar nos 1,200 islamistas fuzilados em uma só noite na penitenciária de Abu Slim em Trípoli em 1996. Também a revolução de 17 de fevereiro estourou a partir de uma faísca de um protesto deles, quando em 15 de fevereiro os familiares das vítimas saíram às ruas para exigir justiça. Ademais, trata-se de um movimento espontâneo, formado sobretudo por jovens, e inclusive ingênuo, mas no sentido positivo do termo. No sentido de que há toda uma geração que, sem criar demasiados sofismas, decidiu que vale a pena lutar pela liberdade e decidiu pôr fim ao regime de Gadafi, inclusive ao custo das próprias vidas.

Qual era a situação social e econômica na Cirenaica antes das revoltas? A Líbia não é um país rico? Então, por que os protestos?

Del Grande - Esta é outra coisa interessante. Diferente da Tunísia e do Egito, a Líbia é um país rico. Inclusive estes dias se veem por todas as partes grandes carros novos e as casas onde entram são casas de classe média. Os pobres na cidade são, sobretudo, os estrangeiros: egípcios, sudaneses, chadianos, tunisianos, marroquinos e nigerianos que migraram para a Líbia buscando fortuna e se viram obrigados a fazer os trabalhos mais humildes e mal pagos. Uma coisa muito diferente se sucede no campo e no mundo rural, que vive muito abaixo do nível de vida da cidade. Mas, uma vez mais, aqui não se protesta pelos salários. Nunca escutei pronunciarem a palavra “salário” nos protestos. Claro, se grita contra o escândalo da corrupção, mas o ponto principal é a liberdade e o fim da ditadura e do terrorismo de Estado. Obviamente, é evidente que todos creem que uma gestão de petróleo orientada ao bem público proporcionará uma grande riqueza ao país, mais instrução e maior qualidade de vida. Mas o ponto principal, novamente, é a liberdade.

Os habitantes de Bengasi pediram realmente pela intervenção? Não temem perder o controle da sua revolução? Perder credibilidade a nível internacional, inclusive entre os povos árabes vizinhos?

Del Grande - Os habitantes de Bengasi têm as idéias claras sobre dois pontos. Querem a zona de exclusão aérea e os bombardeios aliados sobre os aviões de Gadafi e sobre o armamento pesado que ameaça os civis. E, ao mesmo tempo, não querem a entrada das tropas estrangeiras nem a ocupação militar. O povo na rua disse isso e o Conselho Transitório Nacional assina embaixo.

Os antiimperialistas que falam de conspiração se perguntam como é possível que os rebeldes tenham se armado tão depressa, desde os primeiros dias. De onde saíram as armas? Quem abasteceu de armamentos os rebeldes?

Del Grande - O estranho é que não se perguntem, ao invés disso, quem armou Gadafi e de onde ele sacou todos estes tanques e todos estes lança-mísseis com os quais está aterrorizando os civis. Mas voltando à pergunta, a dinâmica é muito simples. No dia 15 de fevereiro começam os protestos em Bengasi. O exército, como na Túnis, se nega a disparar contra o povo. Mas o fazem, em seu lugar, as forças especiais de segurança de Gadafi. Em poucos dias há um massacre, ao menos 300 mortos. Neste momento o exército, sob a pressão do povo, abre os quartéis e deixa que os jovens apanhem as velhas kalashnikov e os poucos lança-mísseis que se encontram nos depósitos. Graças a estas armas eles conseguem expulsar da cidade as forças especiais de Gadafi. E com estas mesmas armas defendem Bengasi e liberam as cidades de Ijdabiya, Brega e Ras Lanuf. Até que Gadafi lança contra eles unidades especiais e mercenários armados de tanques e lança-mísseis apoiados pela aviação militar o quê implanta o pânico entre as fileiras dos rebeldes bombardeando o front. Logo, de certo, nos dias posteriores às primeiras derrotas militares contra o exército de Gadafi, chegaram à cidade novas armas e novas munições. Uma vez mais velhas kalashnikov e um pouco de artilharia antiaérea. Alguém conseguiu fazer funcionar três helicópteros e dois aviões militares Mirage, ambos logo abatidos, um por fogo amigo e outro por uma explosão do motor. Em todo caso, se é um mistério de onde chegaram novas armas, o que é certo é que se trata de armas leves e de péssima qualidade. E quanto aos supostos instrutores militares sobre os quais se especulou tanto, a julgar pelo caos do front poderia se dizer que eles nunca chegaram.

Como você acredita que a intervenção ocidental pode influir no curso das revoluções líbia e árabe?

Del Grande - Tudo depende das decisões que se tomem. No momento, o bombardeio sobre a artilharia pesada de Gadafi simplesmente evitou um massacre. É verdade que matou dezenas e quiçá centenas de soldados e mercenários líbios. É verdade que se podia ter evitado intervindo antes com a diplomacia, talvez dez anos antes, ao invés de dedicar-se a cortejar o ditador desde os tempos do fim do embargo, em 2004. Mas, do jeito como as coisas estão, o bombardeio evitou que trinta tanques e vinte lança-mísseis entrassem em Bengasi, quando já estavam na porta, e depois que um só dia de batalha na cidade provocou 94 mortos. Gostemos ou não da guerra, e eu não gosto, é disto que estamos falando. Agora, no entanto, é necessário que a intervenção militar se detenha e que o resto do trabalho seja feito pelos líbios. Porque o problema não é “guerra sim ou guerra não”. A guerra já existe. E é uma guerra de libertação. De um povo contra o regime, seus fantoches e seus mercenários. E não deve converter-se em uma guerra colonial contra um governo inimigo dos próprios interesses particulares. Mas pelo que tenho visto estes dias, estou convencido de que temos que apoiar o povo líbio. Na melhor das hipóteses surgirá uma república constitucional baseada em um sistema econômico liberal. Podemos não gostar disso, mas é o que querem os líbios e eles têm também todo o direito de escolher seu próprio futuro. Apoiar Gadafi em nome de sua máscara socialistas e terceiro-mundista não é somente uma estupidez como também nos convertes em cúmplices de um criminoso de guerra.

“Não faltam razões a Gadafi, as fotos de sua casa bombardeada me fazem sentir mal”, disse Berlusconi. Disse também que queria fazer pessoalmente uma blitz em Trípoli para negociar com o rei “uma saída de cena honrosa”. Por que ele disse essas coisas?

Del Grande - Berlusconi disse isso um pouco por seu delírio de onipotência e sua contínua busca de um posto entre os grandes estadistas da história da Itália. E um pouco também para distrair a opinião pública italiana e internacional da imagem de fanfarrão da qual não consegue se livrar depois dos últimos escândalos sexuais tão morbidamente investigados pela magistratura e pela imprensa italiana.

Falemos de Lampedusa. Onze mil imigrantes desembarcados, dos quais há 3 mil na ilha; outros 2 mil foram expulsos. Faltam entre 5 e 8 mil que o Ministro do Interior assegura haver “distribuido” pelo território, como se o número de praças disponível nos CIE e nos CARA não fosse um dado políticos. A fábrica da clandestinidade, definitivamente, funciona a pleno rendimento. Inclusive, parece que há líbios entre os imigrantes. Isso tem relação com a Líbia?

Del Grande - Não, por agora não existe essa relação. Existirá de novo, e voltarão a sair de Zuwara, presumivelmente uma vez que a revolução termine. Mas, por hora não vejo este vínculo. Em Lampedusa não está chegando nenhum fugitivo da Líbia. Claro, muitos estrangeiros partiram, ao menos 250 mil, sobretudo egípcios e tunisianos, e também chineses, bengalis e outros, mas em sua maioria regressaram às casas a espera de poder voltar para a Líbia. Os líbios que fogem da guerra saem de uma cidade para outra do país, buscando refúgio nas zonas liberadas, a leste. Em Lampedusa, por outro lado, somente chegaram, até agora, tunisianos. E originários de Zarzis, Djerba e Tataouine. E, mais uma vez, também neste caso, na origem da onda migratória não se encontra o caos gerado no país pela revolução, como muitos pretenderam dizer, falando em asilo político e em fugitivos. Trata-se, ao contrário, de dois fatores. Um mais contingente vinculado à crise econômica da costa tunisiana como conseqüência da queda do turismo após a insurreição. O segundo, vinculado à aventura coletiva. De novo, raciocinar em termos de crise é redutivo e racista porque nos leva a esquecer que trata-se de jovens, iguais a nós, com seus sonhos e seu gosto pelos desafios. Milhares de jovens aprenderam com a revolução que rebelar-se é justo. E talvez sem ter racionalizado isto, começaram a rebelar-se contra a injustiça da fronteira. Querem ir a Paris visitar seus parentes, querem trabalhar alguns meses, conhecer a região ao norte, casar-se com uma italiana. Querem viajar. Os motivos são assuntos seus; além de tudo, viajar não é uma coisa exclusiva dos desesperados, mas uma parte imprescindível da vida de todos os jovens de hoje. E pára fazê-lo violam uma lei que consideram injusta. Para mim, parece um ato de rebelião que entranha um enorme potencial. Por isso digo que, no fundo, não é mal que Lampedusa esteja agora superpovoada. Porque levante questões muito sérias de maneira explosiva. O regime de criminalização da liberdade de circulação deve cair, exatamente como caíram as ditaduras do sul do Mediterrâneo. Os tempos estão maduros para isso.

Escrevendo de Bengasi, não tens a impressão de ser parcial? Como você avalia a qualidade da informação sobre a Líbia no geral e sobre Bengasi em particular? Estão nos manipulando? Quem? Uma parte da esquerda diz, por exemplo, que Gadafi nunca bombardeou os manifestantes com artilharia aérea e que isto demonstraria que tudo não passa de uma montagem midiática para justificar a intervenção. Mas também alguns respeitáveis meios da esquerda – pensemos em Il Manifesto ou na Telesur – foram acusados de dar informação parcial ou falsa.

Del Grande - Claro que sou parcial. Sou consciente e estou orgulhoso. Cada relato tem um ponto de vista. E é importante escolher um próprio. Da mesma maneira que falo de fronteiras assumindo o ponto de vista dos imigrantes e das famílias dos que foram mortos no mar e não assumindo o ponto de vista da burguesia europeia ou o da polícia de fronteiras, e assim relatei a revolução na Tunísia e no Egito, misturando-me aos rebeldes e não com os lacaios dos ditadores. O mesmo na Líbia. Não quero ser porta-voz de um criminoso de guerra como Gadafi. Queria, isso sim, estar em Trípoli e falar da resistência na capital, que desapareceu das notícias depois que as primeiras tímidas manifestações foram reprimidas e derramaram tanto sangue, e depois de que todos os jornalistas “incorporados” foram detidos nos hotéis e obrigados a cobrir somente as noticias previamente selecionadas pelo regime. Portanto sim, sou parcial e prefiro estar na parte daqueles que lutam pela liberdade e não de que emprega tropas mercenárias e lança-mísseis para atacar ao próprio povo porque não quer deixar o poder depois de 42 anos de ditadura. E, bem, a esquerda entrou em crise porque Gadafi foi um símbolo para certo socialismo e certo terceiro-mundismo. E hoje tem muitos amigos. Entre eles Chávez e, portanto Telesur, e Valentino Parlato e, portanto Il Manifesto. De maneira que não citaria estes dois meios como bons exemplos de jornalismo no que diz respeito à questão da Líbia. Como tampouco citaria o canal Al-Arabiya, que fez circular a estatística falsa de 10 mil mortos, e nem todos os demais meios de lançaram sem provas a notícia dos bombardeios sobre a multidão dos manifestantes e das massas, chegando inclusive a usar de maneira absurda a palavra “genocídio”. Aqui emerge pela enésima vez a escassa qualidade do jornalismo de hoje, sobretudo o italiano. E sobretudo quando se trata de contar fenômenos que escapam às usuais categorias de pensamento. O socialismo e a ditadura, a guerra e a paz, o islã e a democracia. Precisamente por isso me parece importante estar aqui e escrever a partir das histórias dos verdadeiros protagonistas desta revolução. Os jovens da nova geração líbia.

Tradução de Cainã Vidor. Publicado por Rebelión. Foto por Foto Globalgrind staff.

INTERNET PARA TODOS: Plano nacional de banda larga terá R$ 589 milhões para 2011









A Telebras terá R$ 589 milhões este ano para implantar o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) e conectar 1.173 cidades à grande rede, a um custo previsto de R$ 35 para o cidadão. Os recursos correspondem aos R$ 316 bilhões em créditos extraordinários do Poder Executivo, previstos para 2010 e empenhados no final de dezembro, somados aos R$ 273 milhões em aporte de capital previsto para 2011.
O valor ficou abaixo da previsão de que, em 2010, seriam liberados R$ 600 milhões, e, em 2011, mais R$ 400 milhões. A diminuição dos recursos, no entanto, não tirou o otimismo do presidente e diretor de Relações com Investidores da Telebras, Rogério Santanna.
“Ainda não fiz o ajuste fino [para avaliar se será possível implantar o PNBL com R$ 589 milhões, em vez dos R$ 1 bilhão previsto]. Mas acredito que isso nos dará liberdade para fazer os contratos, já que os editais acabaram resultando em preços menores do que o que esperávamos. Por isso, é sim, possível”, disse Santanna, após a primeira reunião com o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, no final da manhã desta quarta-feira.

Segundo ele, a reunião foi destinada à apresentação de uma “radiografia” da estatal. “Ele [Paulo Bernardo] enfatizou a importância do PNBL e disse que essa será uma questão central para o governo, conforme já afirmou em outras oportunidades”, disse Santanna.
Segundo o presidente da estatal, todas as pendências jurídicas que suspendiam os editais já foram resolvidas. Com isso, o cronograma do governo, que já havia adiado para abril o início da implantação do PNBL nas 100 primeiras cidades, está mantido.

O Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) prevê levar o serviço de internet em alta velocidade para 4.283 municípios, com baixo preço, até 2014.

Prioridade do novo ministro
Em seu discurso de posse realizado na segunda-feira (3), o novo ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, já havia sinalizado que a expansão e melhoria da internet em alta velocidade será prioridade de sua gestão.
Um dos principais recursos que o governo deve lançar mão será o de reduzir impostos que incidem sobre equipamentos e serviços de telecomunicações a fim de forçar as empresas prestadoras a diminuir o preço de seus serviços. A concretização dessa ideia começou a ser feita no governo Lula. No último dia de 2010 foi publicada a Medida Provisória (MP) nº 517 que prevê dois benefícios fiscais para o setor.
O primeiro extende o benefício do programa Computador para Todos para os modems (para acesso móvel). Esses equipamentos agora estão isentos de PIS e Cofins, que equivalem a 9,25% de seu preço de venda. Assim, o governo pretende ajudar os estados a baixar também o ICMS e possibilitar diminuição dos preços cobrados pelo serviço atualmente. O segundo benefício fiscal presente na MP 517/2010 visa ampliar o estímulo aos bens de telecomunicação desenvolvidos no país. Para esses, haverá a desoneração total do IPI.
Paulo Bernardo, que é bancário e ocupou vários cargos ligados à área econômica em sua vida pública, também informou que a equipe do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) está mapeando a cadeia produtiva do setor de comunicações para melhorar as condições de produção do que é feito no país e estimular o aumento da produção nacional.
Tudo leva a crer que essa política de desoneração e incentivo à produção nacional deverá ser ponto forte da gestão de Paulo Bernardo. Esse discurso vai de encontro às exigências dos empresários do setor de telecomunicações, que dizem que os altos preços praticados no país são decorrência dos impostos. No entanto, o ministro já disse publicamente que não acredita que o valor das tarifas brasileiras são derivadas apenas da alta carga tributária, fazendo uma crítica aberta a atuação das teles no país.
Rede estatal
Por isso, o PNBL conta também com outras formas de massificar o acesso à internet. A utilização de uma rede estatal gerenciada pela Telebrás é a maior delas. “A reestruturação da Telebras deve ser entendida como um reforço a capacidade de operação não apenas das pequenas e médias operadoras, mas também das grandes, em particular as concessionárias”, disse Paulo Bernardo, em sua posse.
Além de ser o novo centro gerenciador do PNBL, ao lado da Telebrás, o Minicom também vai centralizar a política de inclusão digital do governo. O novo ministro anunciou que uma secretaria será criada ainda este mês com este fim. Não se sabe, porém, quem ocupará a coordenação do novo órgão. No entanto, os assuntos relativos ao PNBL devem mesmo ficar por conta do ministro em conjunto com César Alvarez, que agora ocupa a função de secretário-executivo do Minicom. No governo Lula, Alvarez era assessor especial da Presidência da República.
Inclusão digital democratiza comunicação
O decreto n. 7.175/2010 que instituiu o PNBL fixou que o Plano tem, outre outros, o objetivo de "fomentar e difundir o uso e o fornecimento de bens e serviços de tecnologias de informação e comunicação, de modo a: massificar o acesso a serviços de conexão à Internet em banda larga; acelerar o desenvolvimento econômico e social; promover a inclusão digital; reduzir as desigualdades social e regional; promover a geração de emprego e renda; ampliar os serviços de Governo Eletrônico e facilitar aos cidadãos o uso dos serviços do Estado; promover a capacitação da população para o uso das tecnologias de informação; e aumentar a autonomia tecnológica e a competitividade brasileiras."
Estes registros no corpo da lei já sinalizam o impactam social que o Plano pode ter. Mas há um outro objetivo, não registrado, que justifica todo o empenho do governo na efetivação do PNBL: o fato do acesso à internet ser um poderoso instrumento de democratização da comunicação. Ainda que os grandes grupos de mídia tenham também o controle sobre os grandes portais, é perceptível a diluição da influência dos grandes grupos midiáticos sobre o conteúdo disponibilizado na rede. O próprio presidente Lula sinalizou em seus últimos discursos à frente da Presidência que o cidadão passou a ter acesso a outras visões de mundo a partir do contato com a internet e isso ajudou até mesmo na boa avaliação de seu governo. "Os grandes jornais, revistas e TV já não falam mais sozinhos", disse Lula em uma de suas últimas entrevistas.
"O plano tem suas limitações, mas representa um enorme passo para democratizar a informação e a cultura. O acesso à banda larga estimulará meios alternativos de comunicação, garantirá maior interatividade entre as pessoas e pode ajudar a despertar o senso crítico na sociedade. Na batalha eleitoral, a internet já serviu como contraponto à manipulação dos barões da mídia. No mundo atual, quem não tiver acesso à internet será um novo tipo de marginalizado – o excluído digital", afirma Altamiro Borges, presidente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.
Talvez isso ajude a explicar por que a Telebrás tem enfrentado dificuldades para negociar com as empresas privadas de telefonia. Na verdade, cinco grupos são responsáveis por 95% da oferta atual de banda larga no Brasil – Oi, Telefônica, Embratel/Net, GVT e CTBC – enquanto 2.125 pequenos provedores respondem pelos restantes 5% do mercado. Há pouca ou nenhuma competição e os grupos dominantes são contra a inclusão de metas de expansão da infraestrutura de banda larga nos contratos de concessão das empresas de telefonia que estão em fase de revisão na Anatel, a agência reguladora do setor.

PC do B - nenhuma palavra

Escrito por Gilvan Rocha  no Correio da Cidadania 
 
No dia 24 de março de 2011, foi ao ar pelo rádio e televisão um programa do Partido Comunista do Brasil (PC do B), em comemoração aos 89 anos de sua existência. Quem conhece a verdadeira trajetória do socialismo no Brasil irá se dar conta de que esse partido, dito comunista, deixou de sê-lo desde 1928, quando, por ocasião do VI Congresso da Terceira Internacional, foi imposto o social-patriotismo, tão combatido pelos verdadeiros marxistas, por ocasião da primeira grande guerra, quando a Segunda Internacional abandonou os princípios revolucionários para mudar-se para o campo do nacionalismo burguês.
 
A Terceira Internacional Comunista foi criada para dar combate ao social-patriotismo e restabelecer os princípios do socialismo revolucionário. Em decorrência, porém, da vitória da contra-revolução em escala mundial e do isolamento da URSS, a Terceira Internacional tornou-se cópia fiel da anterior, ostentando, descaradamente, o social-patriotismo sob o rótulo indevido do marxismo-leninismo.
 
A partir de 1928, os partidos ditos comunistas se descaracterizaram completamente e seus militantes, a maioria beatos de boa fé, transformaram-se em patrioteiros, abandonaram o princípio da luta de classes para aderir à tese da capitulação, cujo esteio era eleger a contradição da nação opressora versus a nação oprimida como motor da história.
 
Assim é que os ditos comunistas passaram a defender com intransigência absoluta os interesses da nação, sem se darem conta de que ela é patrimônio da burguesia, uma vez que as terras, as fábricas, as minas, os transportes, os bancos são propriedade somente da classe burguesa, enquanto a imensa maioria do povo trabalhador não passa de uma massa de despossuídos.
 
Defender os interesses nacionais é, em última instância, defender os interesses do capitalismo. Por essa razão que os ditos comunistas do PC do B, em seu programa de rádio e televisão, não pronunciaram nenhuma palavra contra o capitalismo e se limitaram festejar o avanço e a consolidação desse sistema no solo da "pátria amada".
 
Gilvan Rocha é membro do CAEP - Centro de Atividades e Estudos Políticos.

Roberto Carlos e a Ditadura


Urariano Mota * no portal  vermelho

As datas, os aniversários, têm um poder evocativo muito forte. Esta semana me veio de súbito uma pergunta: que música seria mais representativa do golpe militar de 64? Quais canções, que músico seria mais representativo daqueles anos inaugurados em um primeiro de abril?

Num estalo me veio que Roberto Carlos deve ter sido o compositor mais representativo da ditadura. Não sei se num curto espaço conseguirei ser claro. Mas tento. Os mais velhos sabem que a lembrança daqueles anos muito tem a ver com os rádios, em todos os lugares, tocando

“De que vale o céu azul e o sol sempre a brilhar
se você não vem e eu estou a lhe esperar
só tenho você no meu pensamento
e a sua ausência é todo meu tormento
quero que você me aqueça nesse inverno
e que tudo mais vá pro inferno”

Quando Roberto Carlos explodiu os rádios do Brasil, ele cresceu em um programa que arrebentou em 65. O programa Jovem Guarda se opunha ao O Fino da Bossa, com Elis. Enquanto O Fino da Bossa fazia uma ponte entre os compositores da velha guarda do samba e os compositores de esquerda, o Jovem Guarda...

“Eu vou contar pra todos a história de um rapaz
que tinha há muito tempo a fama de ser mau..”

“O Rei, o Rei não tem culpa...”, diz-nos um senhor encanecido, ex-jovem guarda (e como envelheceu a jovem guarda!). “O Rei não tem culpa...”. Sim, compreendemos: quem assim nos fala quer apenas dizer, Roberto Carlos não teve culpa de fazer o medíocre, de falar aos corações da massa jovem daqueles anos. À juventude alienada, mas juventude de peso, em número, que ganha sempre da minoria de jovens estudiosos. Que mal havia em falar para a sensibilidade embrutecida mais ampla? É claro que ele não teve culpa de macaquear a revolução musical dos Beatles em versões bárbaras, em caricaturas dos cabelos longos, alisados a ferro e banha, para lisos ficarem como os dos jovens de Liverpool.

Mas é sintomático nele a passagem de cantor da juventude para o “romântico”. Essa passagem se deu na medida em que os jovens de todo o mundo deixaram de ser apenas um mercado de calças Lee e Coca-Cola, e passaram a movimentos contra a guerra do Vietnã, até mesmo em festivais de rock, como em Woodstock. Ou, se quiserem numa versão mais brasileira, o Rei Roberto se torna um senhor “romântico” na medida em que as botas militares pisam com mais força a vida brasileira. Ora, nesses angustiantes anos o que compõe o jovem, o ex-jovem, que um dia desejou que tudo mais fosse para o inferno? - Eu te amo, eu te amo, eu te amo...

É claro que a passagem do Roberto Carlos Jovem Guarda para o senhor “romântico” não se deu pelo envelhecimento do seu público. De 1965 a 1970 correm apenas 5 anos. O envelhecimento é outro. Nesses 5 correm sangue e raiva da ditadura militar, no Brasil, e crescimento da revolta do público “jovem”, no mundo. Enquanto explodem conflitos, a canção de Roberto Carlos que toca nos rádios de todo o Brasil é “Vista a roupa, meu bem” (e vamos nos casar). Se fizéssemos um gráfico, se projetássemos curvas de repressão política e de “romantismo” de Roberto Carlos, veríamos que o ápice das duas curvas é seu ponto de encontro.

Enfim, o namoro do Rei Roberto Carlos com o regime não foi um breve piscar de olhos, um flerte, um aceno à distância. O Rei não compôs só a música permitida naqueles anos de proibição. O Rei não foi só o “jovem” bem-comportado, que não pisava na grama, porque assim lhe ordenavam. Ele não foi apenas o homem livre que somente fazia o que o regime mandava. Não. Roberto Carlos foi capaz de compor pérolas, diamantes, que levantavam o mundo ordenado pelo regime. Ora, enquanto jovens estudantes eram fuzilados e caçados, enquanto na televisão, nas telas dos cinemas, exibia-se a brilhante propaganda “Brasil, ame-o ou deixe-o”, o que fez o nosso Rei? Irrompeu com uma canção que era um hino, um gospel de corações ocos, um som sem fúria de negros norte-americanos. Ora, ora, o Rei ora: “Jesus Cristo, Jesus Cristo, eu estou aqui”.

Os brasileiros executados sob tortura não estavam com Jesus. Nem Jesus com eles.

* Autor de “Os Corações Futuristas” e de “Soledad no Recife”, que recria os últimos dias de Soledad Barrett, mulher do Cabo Anselmo, executada por Fleury com o auxílio do traidor.

quarta-feira, 30 de março de 2011

Pepe Escobar: Os que já estão lucrando com a invasão da Líbia




por Pepe Escobar, Asia Times Online
Traduzido pelo Coletivo da Vila Vudu via Viomundo

Mentiras, hipocrisias e agendas ocultas. Eis os temas dos quais o presidente Barack Obama não tratou, ao explicar aos EUA e ao mundo a sua doutrina para a Líbia. A mente se perde, vacila, ante tais e tantos buracos negros que cercam essa esplêndida guerrinha que não é guerra (é “ação militar com escopo limitado por prazo limitado”, nos termos da Casa Branca) – complicados pela inabilidade do pensamento progressista, que não consegue condenar, ao mesmo tempo, tanto a crueldade do governo de Muammar Gaddafi quanto o “bombardeio humanitário” dos exércitos de EUA-anglo-franceses.
A Resolução n. 1.973 do Conselho de Segurança da ONU operou como cavalo de Tróia: permitiu que o consórcio EUA-anglo-francês – e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) – se convertesse em força aérea da ONU usada para apoiar um levante armado. Aparte nada ter a ver com proteger civis, esse arranjo é absoluta e completamente ilegal em termos da legislação internacional. O objetivo final aí ocultado, que até as crianças subnutridas da África já viram, mas que ninguém assume ou confessa, é mudar o governo na Líbia.
O tenente-general Charles Bouchard do Canadá, comandante da OTAN para a Líbia, que insista o quanto quiser, repetindo que a missão visa exclusivamente a proteger civis. Pois os “civis inocentes” lá estão, dirigindo tanques e disparando Kalashnikovs, brigada de farrapos que, de fato, são soldados em guerra civil. O problema é que, agora, a OTAN foi convertida em força aérea daquele exército, seguindo as pegadas do consórcio EUA-franco-inglês.
Ninguém diz que a “coalizão de vontades” que hoje combate o governo líbio é coalizão de apenas 12 vontades (das 28 vontades representadas na OTAN), mais o Qatar. Isso absolutamente nada tem a ver com a “comunidade internacional”.
O veredicto sobre a zona aérea de exclusão ordenada pela ONU só será conhecido depois que houver governo “rebelde” na Líbia e terminar a guerra civil (se terminar rapidamente). Só então se poderá saber se, algum dia, os Tomahawks e bombas-em-geral foram algum dia justificados; o porquê de os civis de Cyrenaica terem sido “protegidos”, ao mesmo tempo em que os civis em Trípoli foram Tomahawk-eados; quem, afinal eram os ditos “rebeldes” ditos “salvos”; se a coisa toda, desde o início, em algum momento deixou de ser ilegal; como aconteceu de uma resolução do Conselho de Segurança da ONU ser usada para acobertar golpe de Estado (digo, “mudança de regime”); como o caso de amor entre “revolucionários” líbios e o Ocidente pode acabar em divórcio sangrento (lembrem o Afeganistão!); e quais os atores ‘ocidentais’ que lucrarão mais, imensamente, com a exploração de uma nova Líbia – seja unificada seja balkanizada.
Pelo menos por hora, é muito fácil identificar os que já estão lucrando.
O Pentágono
Roberto “O Supremo do Pentágono” Gates disse no fim-de-semana, na maior cara dura, que só há três regimes repressivos em todo o Oriente Médio: Irã, Síria e Líbia. O Pentágono se encarrega agora do elo mais fraco – a Líbia. Os outros dois sempre foram figuras chaves da lista dos neoconservadores, de governos a serem derrubados. Arábia Saudita, Iêmen, Bahrain etc. são exemplos de democracia.
Como nessa guerra de prestidigitação “agora se vê, agora não se vê”, o Pentágono obra para lutar não uma, mas duas guerras. Começou pelo AFRICOM – Comando dos EUA na África –, criado no governo George W Bush, reforçado no governo Obama, e rejeitado por legiões de governos, intelectuais, organizações de direitos humanos e especialistas africanos. Agora, a guerra está em transição, passando para as mãos da OTAN, que é o mesmo que a mão pesada do Pentágono sobre seus asseclas europeus.
É a primeira guerra africana do AFRICOM, comandada agora pelo general Carter Ham diretamente de seu quartel-general nada-africano em Stuttgart. O AFRICOM é fraude, como diz Horace Campbell, professor de estudos afro-norte-americanos e ciência política na Syracuse University: fundamentalmente, é uma frente de operação comercial, para que empresas contratadas pelos militares nos EUA – Dyncorp, MPRI e KBR possam fazer negócios na África. Os estrategistas dos EUA que muito se beneficiaram na porta giratória que se criou entre as privatizações e as guerras estão adorando a intervenção na Líbia, como magnífica oportunidade para dar credibilidade político-militar ao AFRICOM-business.”
Os Tomahawks do AFRICOM-EUA atingiram também – metaforicamente – a União Africana (UA) a qual, diferente da Liga Árabe, não se deixa facilmente comprar pelo ocidente. As petro-monarquias do Golfo, todas, festejaram o bombardeio; Egito e Tunísia, não.
Só cinco países africanos não são subordinados ao AFRICOM-EUA: Líbia, Sudão, Costa do Marfim, Eritreia e Zimbabwe.
A OTAN
O plano master da OTAN é dominar o Mediterrâneo, como lago da OTAN. Sob essa “ótica” (no jargão do Pentágono), o Mediterrâneo é infinitamente mais importante hoje, como teatro de guerra, que o “AfPak”.
Apenas três, das 20 nações do ou no Mediterrâneo não são da OTAN ou aliadas de seus programas “de parceria”: a Líbia, o Líbano e a Síria. O Líbano já está sob bloqueio da OTAN desde 2006. Atualmente, já há bloqueio também contra a Líbia. Os EUA – via OTAN – já praticamente conseguiram fazer do círculo, o quadrado. Que ninguém se engane: a Síria é o próximo alvo.
A Arábia Saudita
Excelente negócio! O rei Abdullah vê-se livre de Gaddafi, seu arqui-inimigo. A Casa de Saud – do modo abjeto que é sua marca registrada – rende-se ao atraso, para beneficiar o ocidente. A atenção da opinião pública ganha objeto alternativo, para distrair-se: os sauditas invadem o Bahrain, para esmagar movimento popular legítimo, pacífico, pró-democracia.
A Casa de Saud vendeu a ficção segundo a qual “a Liga Árabe” teria votado unanimemente a favor da zona aérea de exclusão. É mentira.
Dos 22 membros da Liga Árabe, só 11 estiveram presentes à sessão que aprovou a “no-fly zone”; seis desses são membros do Conselho de Cooperação do Golfo, gangue da qual a Arábia Saudita é o cão-chefe.
A Casa de Saud teve de aplicar uma chave-de-braço em três. A Síria e a Argélia estavam contra a no-fly zone contra a Líbia. Tradução: só nove, dentre 22 países árabes, votaram a favor de implantar-se a zona aérea de exclusão na Líbia.
Agora, a Arábia Saudita já pode até mandar que o presidente do Conselho de Cooperação do Golfo Abdulrahman al-Attiyah declare sem piscar que “o sistema líbio perdeu a legitimidade”. Sobre a Casa de Saud e os al-Khalifas do Bahrain… não faltará quem os indique para o Hall da Fama da Assistência Humanitária.
O Qatar
O país que hospedará a Copa do Mundo de Futebol de 2022 sabe, sim, amarrar negócios. Seus Mirages já ajudavam a bombardear a Líbia, enquanto Doha preparava-se para vender aos mercados ocidentais o petróleo da Líbia. O Qatar foi o primeiro país a reconhecer o governo dos “rebeldes” líbios como único governo legítimo; fê-lo um dia depois de ter fechado o negócio do varejão do petróleo líbio no ocidente.
Os “rebeldes”
Sem desrespeitar as importantes aspirações democráticas do movimento da juventude líbia, fato é que o grupo mais bem organizado da oposição a Gaddafi é a Frente Nacional de Salvação da Líbia – há anos financiada pela Casa de Saud, pela CIA e pela inteligência francesa. O “rebelde’ “Conselho Nacional do Governo de Transição” é praticamente a velha Frente Nacional, acrescida de alguns militares desertores. A “coalizão” “protege” essa “elite” de “civis inocentes”, hoje.
Nessa linha, o “Conselho Nacional do Governo de Transição” acaba de nomear novo ministro das finanças: Ali Tarhouni, economista formado nos EUA. Foi ele quem disse que vários países ocidentais há lhe haviam dado créditos, sob garantias do fundo soberano líbio; e que os britânicos lhe deram acesso a 1,1 bilhão de dólares do dinheiro de Gaddafi.
Significa que o consórcio EUA-anglo-francês – e agora a OTAN –, só terão de pagar a conta da compra das bombas. No que tenha a ver com histórias da imundície das guerras, essa é impagável: o ocidente está usando o dinheiro da Líbia para pagar um bando de líbios oportunistas interessados em derrubar o governo da Líbia. França e Inglaterra gozam, de tanto que amam as bombas. Nos EUA, os neoconservadores devem estar se estapeando, lá entre eles, de inveja: por que o vice-secretário de Defesa Paul Wolfowitz não teve a mesma ideia, para o Iraque, em 2003?
A França
Oh la la, a coisa bem poderia servir de substrato para romance proustiano. A coleção estrela da primavera francesa nas passarelas parisienses é o show de moda-fantasia de Nicolas Sarkozy: uma zona aérea de exclusão na Líbia, rebordada com ataques-acessórios pelos jatos Mirage/Rafale. Todo o show e pirotecnia foi concebido por Nouri Mesmari, chefe de protocolo de Gaddafi, que desertou e fugiu para a França em outubro de 2010. O serviço secreto italiano vazou para jornalistas e jornais selecionados os detalhes da deserção e da fuga. O papel do DGSE, serviço secreto francês, está mais ou menos explicado no e-jornal (só para assinantes) Maghreb Confidential.
A verdade é que o coq au vin da revolta de Benghazi já estava cozinhando em fogo baixo desde novembro de 2010. Os galos-estrelas foram Nouri Mesmari; Abdullah Gehani, coronel da Força Aérea da Líbia; e o serviço secreto francês. Mesmari era chamado “o WikiLeak líbio”, porque vazou quase todos os segredos militares de Gaddafi. Sarkozy adorou, furioso desde que Gaddafi cancelou gordos contratos para comprar aviões Rafales (para substituir os Mirages líbios que, hoje, estão sendo bombardeados por Mirages franceses) e usinas nucleares francesas.
Isso explica por que Sarkozy, que estava tão animadinho, posando de neoliberador de árabes, foi o primeiro líder europeu a reconhecer “os rebeldes” (para tristeza de muitos, na União Europeia) e o primeiro a bombardear as forças de Gaddafi.
Vê-se aí também exposto o papel do desavergonhado filósofo e autopropagandista Bernard Henri-Levy, que se esfalfou enchendo a mídia mundial com notícias de que ele telefonara a Sarkozy, de Benghazi, e assim despertou o filão humanitário no coração do presidente. Ou Levy é o otário da hora, ou é uma conveniente cereja “intelectual” acrescentada ao já assado bolo-bomba contra Gaddafi.
Ninguém detém Sarkozy, o Terminator. Já avisou todos os governos árabes que estão na mira para serem bombardeados ao estilo Líbia se espancarem manifestantes. Até já avisou que a Costa do Marfim seria “a próxima”. Bahrain e Iêmen, claro, não têm com o que se preocuparem. Quanto aos EUA, mais uma vez os EUA apoiam golpe militar (não deu certo com o Omar “Sheikh al-Tortura” Suleiman no Egito. Talvez funcione na Líbia).
Al-Qaeda
O coringa sempre conveniente renasce. O consórcio EUA-franco-inglês – e agora também a OTAN – outra vez combatem aliados à al-Qaeda, dessa vez representada pela al-Qaeda no Maghreb (AQM).
Abdel-Hakim al-Hasidi, líder dos “rebeldes” líbios – que combateu ao lado dos Talibã no Afeganistão – confirmou, com detalhes, para a mídia italiana, que recrutara pessoalmente “cerca de 25” jihadistas na região de Derna no leste da Líbia para combater os EUA no Iraque; e que agora “eles estão na linha de frente em Adjabiya”.
Isso, depois de o presidente do Chad Idriss Deby ter dito que a al-Qaeda no Maghreb assaltou arsenais militares na Cyrenaica e provavelmente já têm alguns mísseis terra-ar. No início de março, a al-Qaeda no Mahgreb apoiou publicamente os “rebeldes”. O fantasma de Osama bin Laden deve estar rindo como o gato Cheshire de Alice; mais uma vez, conseguiu por o Pentágono a trabalhar para ele.
Os privatizadores da água
Poucos no ocidente sabem que a Líbia – como o Egito – repousa sobre o Sistema Aquífero do Arenito Núbio [ing. Nubian Sandstone Aquifer]: é um oceano de extremamente valiosíssima água doce. Ah, sim, sim, essa guerra de prestidigitação “agora se vê, agora não se vê”, é crucial guerra pela crucial água.
O controle do aquífero é patrimônio sem preço: além da água para beber, o prestígio para dominar: a EUA-França-Inglaterra “resgatando” valiosos recursos naturais, das mãos dos árabes “selvagens”.
É um Aquedutostão – enterrado fundo no coração do deserto. São 4.000 quilômetros de dutos. É o Maior Projeto de Rio Criado pelo Homem [ing. Great Man-Made River Project (GMMRP)], que Gaddafi construiu por 25 bilhões de dólares sem tomar emprestado nem um centavo nem do FMI nem do Banco Mundial (mais um exemplo de barbárie de Gaddafi, que não se deve deixar vazar para o resto do mundo subdesenvolvido).
O sistema GMMRP fornece água para Trípoli, Benghazi e todo o litoral da Líbia. A quantidade de água disponível, estimada por especialistas, é o equivalente à toda a água que corre pelo Nilo por 200 anos. Comparem-se esses números os números das chamadas “Três Irmãs” – empresas Veolia (ex-Vivendi), Suez Ondeo (ex-Generale des Eaux) e Saur – as empresas francesas que controlam mais de 40% do mercado global de água.
Todos os olhos devem-se focar, atentos, para ver se algum dos aquedutos da GMMRP serão bombardeados. Cenário altamente possível, caso sejam bombardeados, é que imediatamente comecem a ser negociados os gordos contratos de “reconstrução” – que beneficiarão a França. Será o passo final para privatizar toda aquela – até o momento gratuita – água. Da doutrina do choque, chegamos à doutrina da água.
Essa lista dos que ganham com a guerra está longe de ser completa – ainda não se sabe quem ficará nem com o petróleo nem com o gás natural da Líbia. Enquanto isso, o show (das bombas) tem de continuar. Não há business como o guerra-business.

Servidores divergem sobre adesão a órgão de diálogo com governo criado por Tarso

Rachel Duarte no Sul21

Ramiro Furquim/Sul21

Uma questão de interpretação, um entrave ou um erro político e conceitual. Estas foram algumas opiniões das entidades que representam os servidores públicos gaúchos convidadas a integrar o Comitê de Diálogo Permanente (Codipe), sobre a metodologia de participação proposta pelo executivo estadual. A primeira reunião do comitê ocorreu nesta terça-feira (29) e provocou um intenso debate sobre a oferta do governo de que as entidades assinem um “Termo de Adesão” ao Codipe, a fim de que efetivem participação no espaço criado para discutir as necessidades dos servidores públicos.
Das 22 entidades presentes na reunião, 15 já aderiram ao termo proposto pelo governo estadual. O documento conceitua o Comitê de Diálogo Permanente como um espaço de negociação com os servidores públicos e o governo estadual. As entidades contrárias ao termo, como a presidente do Cpers, Rejane de Oliveira, defendem que o termo está equivocado e fere a autonomia dos sindicatos. “Estamos (Cpers) dispostos a participar deste espaço, mas não assinaremos termo de adesão. Isto é um gesto que fere a constituição e a história do sindicalismo”, disse.
Ramiro Furquim/Sul21

O Cpers foi a primeira entidade a fazer uso da palavra e também a reiterar sua posição ao final da reunião, contestando a posição final da secretária Stela sobre considerar a discussão sobre o termo “adesão” um entrave ao processo de construção do comitê. Rejane apresentou um parecer jurídico à secretária e aos demais colegas de sindicato, argumentando a necessidade de as entidades rejeitarem a adesão.
Segundo o parecer do Cpers, o Decreto nº 47.897 – que instalou o Codip em 16 de março de 2011 -, é inaceitável do ponto de vista político e democrático. “Não podem os sindicatos aderir organicamente a uma estrutura de governo e muito menos, dela participando, se submeter a um programa de conteúdo, sob pena de estarem, neste ato, renunciando a sua independência e autonomia. Além de um erro conceitual e político, o Decreto, com seu programa associado ao ‘Termo de Adesão’, concretizam uma forma de intervenção do estado na organização sindical”, diz o texto apresentado pelo Cpers. Entidades como o Sindicaixa-RS e o Centro de Auditores do Tribunal de Contas do Estado também se manifestaram contra a assinatura do termo.
Por outro lado, entidades como a Associação dos Oficiais de Nível Superior da Brigada Militar (ASOFBM) e o Sindicato dos Empregados em Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas e de Fundações Estaduais (Semapi), afirmaram acreditar na proposta do Codipe e consideraram uma contradição não participar de espaços de diálogo promovidos pelo Governo do Estado. “Aderir é aceitar o convite. Não significa que vamos concordar com tudo que será dito. Eu não poderia me furtar desta possibilidade de aceitar esta oportunidade que está sendo oferecida pelo governo. A minha impressão é que cada um tem uma leitura diferente sobre o que está sendo propondo pelo Codipe”, afirmou o tenente-coronel José Carlos Ricardi Guimarães, presidente da ASOFBM.

“Não queremos instrumentalizar sindicatos”

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Na linha de frente com os ex-colegas de Cpers, a secretária da Administração e dos Recursos Humanos, Stela Farias, coordenou os trabalhos por parte do Executivo. A reunião que deveria definir as câmaras temáticas para encaminhar as reivindicações prioritárias dos servidores acabou sendo um momento de o  governo ouvir as posições das entidades convidadas para aderir ao Codipe. “A proposta do governo é a explicitada e construída em campanha. Nós não queremos enganar ninguém nem utilizar este espaço para instrumentalizar os sindicatos”, disse, ressaltando sua intimidade com as causas dos sindicalistas. E reforçou: “As questões levantadas por representantes de algumas categorias, como o Cpers, podem ser perfeitamente ajustadas. O Codipe não será um espaço para represar demandas das categorias, pelo contrário, nós queremos produzir acordos, a partir de diálogos”, disse.
Sobre a retirada do “Termo de Adesão”, Stela disse que irá analisar o termo jurídico apresentado pelo Cpers e a comissão técnica que criou o comitê poderá refazer a metodologia de participação das entidades. “Nós entendemos que é perfeitamente possível descompatibilizar o termo de adesão e fazer uma carta convite”, falou.
As sugestões, críticas e apontamentos feitos pelas entidades de classe dos servidores deverão ser analisadas em reunião com as secretarias que compõem o Comitê no início da próxima semana e as conclusões apresentadas na segunda quinzena de abril em nova reunião do Codipe.

O Codipe

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As discussões do Codipe serão mensais e ocorrerão em dois espaços: um mais amplo, que vai tratar de temas como concepção do Estado e dos serviços públicos, a relação dos servidores com o Estado, o programa do Governo eleito e sua relação com os servidores; o outro espaço, funcional e de gestão de pessoas, que terá câmaras temáticas e setoriais. As câmaras temáticas vão discutir temas como Saúde do Trabalhador, Previdência, Capacitação continuada, Convenção 151 – OIT, Modernização e tecnologia e diretrizes para planos de cargos, carreiras e salários. Já as setoriais vão tratar de assuntos específicos dos quadros de pessoal da Segurança, Educação, Saúde, Quadro Geral e técnicos-científicos.
O Codipe abrange os servidores e empregados públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações, autarquias, empresas públicas e sociedades de economia Mista. Do governo estadual, integram o Codipe as secretarias da Fazenda, Educação, Saúde, Segurança Pública, Casa Civil, Planejamento, Secretaria-Geral de Governo e Procuradoria Geral do Estado.
Antes das inscrições dos interessados em falar, a secretária Stela explicou por uma hora as intenções do comitê. Segundo ela, o órgão tem poder deliberativo, mas não decidirá nada por voto e sim por consenso. Os encaminhamentos tirados dos encontros mensais do Codipe deverão ocorrer por consenso entre as partes e serão registrados em ata para encaminhamento ao gabinete do governador. “A ideia é que a reunião aconteça em uma segunda-feira, na tarde de expediente dos servidores. Precisamos montar os temas e definir as câmaras. Serão seis representantes de categorias por câmara temática”, sugeriu a secretária.

Recuperar a confiança

O discurso coletivo da maioria das entidades presentes na primeira reunião do Codipe foi de que é preciso construir uma relação de confiança entre o novo governo e os servidores públicos. Todos reclamaram da falta de valorização e espaço de participação no governo de Yeda Crusius (PSDB) e depositam elevadas expectativas com o governo de Tarso Genro (PT). Porém, defenderam a legitimidade de suas entidades e os pleitos de suas categorias.
Ramiro Furquim/Sul21

O grupo de servidores recordou o que considerou como “uma experiência traumática”: o Grupo de Assessoramento Estadual para Política de Pessoal (GAE) criado no governo Yeda. Segundo o representante do Centro de Auditores do Tribunal de Contas do Estado, Amauri Peruso, o órgão era um instrumento do gabinete da ex-governadora e pouco contribuía com as necessidades dos servidores. “Era um inibidor dos anseios dos servidores. Não produzia resultados, mas contenções. A própria Secretaria de Administração nunca teve peso”, disse.
Ciente do desafio para com a gestão e o funcionalismo, a secretária de Administração e Recursos Humanos, Stela Farias, propôs ao governador a participação dos servidores na definição do Plano Plurianual Participativo (PPA). E salientou que, apesar de não definir as câmaras temáticas do Codipe no encontro, já tem em vista alguns encaminhamentos com setores do funcionalismo. “Os empregados dos serviços públicos estaduais em fundações, autarquias e empresas de economia mista estão em plena database. Então não temos saída. Mesmo sem tempo para fechar acordo com as entidades, nós vamos ter que chamar individualmente as setoriais destes servidores e debater suas demandas salariais”, explicou.