quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Elizângela Araújo: O câncer de Lula e o preconceito

por Elizângela Araújo no VIOMUNDO

Muitos conhecidos e até amigos meus têm compartilhado o que parece ser uma campanha cômica – porém sem graça – pelo tratamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Sistema Único de Sáude (SUS). Obviamente, têm sido contra-atacados por aqueles que têm grande apreço e identificação ideológica ou partidária com o ex-presidente. Como a maioria dos brasileiros já deve saber, Lula teve câncer na laringe diagnosticado no último sábado (29/10) e começou nesta segunda-feira (31/10) seu tratamento quimioterápico no hospital Sírio-Libanês, em São Paulo-SP. A brincadeira tem um quê de estupidez e oportunismo e acirra novamente os ânimos do que parece ser dois grupos distintos de pessoas: os pró-Lula e os anti-Lula.
Eu, que até o momento me coloco fora desse terreno de paixões exacerbadas, de repente me vi tendo que pensar algo a respeito da cizânia. A primeira conjectura que me surgiu foi sobre o José Alencar, ex-vice-presidente morto em razão de um câncer no dia 29 de março deste ano, depois de lutar por mais de dez anos contra a doença, não ter sido alvo de uma “campanha” semelhante. Ou foi?
De acordo com a agência de notícias IDGNow, especializada em tecnologia, houve 120 mil compartilhamentos da foto do ex-presidente com a mensagem “Lula, faça o tramento pelo SUS”, no Facebook, desde sábado à tarde até esta segunda. Ainda não há números sobre a repercussão no Twitter. Se o número é pequeno diante do total de usuários – 31 milhões de brasileiros utilizam o Facebook, segundo pesquisa do Ibope realizada em agosto – não deixa de assustar pelo nível dos comentários.
Outros políticos brasileiros enfrentaram a mesma doença – alguns morreram e outros a superaram – sem que houvesse semelhante “campanha”. A presidenta Dilma Rousseff, por exemplo, também tratou-se no Sírio-Libanês. Mário Covas, morto em 2001 depois de perder a luta contra um câncer na bexiga, também não foi alvo de semelhante galhofa. Roseana Sarney, cujo sobrenome dispensa maiores apresentações, também foi vítima de câncer em 1998 (pulmão) e em 2002 (mamas), assim como seu pai, que enfrentou a doença, localizada na próstata, entre 1985 e 1990.
Paulo Maluf, que também dispensa mais detalhes de sua biografia, também foi acometido pela doença em 1997, quando era governador de São Paulo e candidato à Presidência da República. Enfim, há outros inúmeros casos de políticos menos ilustres que tiveram câncer e comoveram mais ou menos brasileiros. No entanto, em nenhum desses casos houve tamanha falta de sensibilidade e oportunismo como no caso do ex-presidente-metalúrgico.
E fico me perguntando por quais razões as pessoas acham jocoso ou mesmo inteligente montar uma “campanha” fajuta a essa altura do campeonato, depois de terem se comovido tanto com a morte do empresário Steve Jobs, morto no dia 5 de outubro também vítima de câncer. Não tenho nenhuma intenção de comparar biografias, malfeitos ou benfeitos de todos que citei aqui, mas convocá-los para expôr minha curiosidade sobre a brincadeira de mau gosto que pede ao ex-presidente que se trate no SUS, porque como dizem seus admiradores, não se trata de uma campanha pelo fortalecimento do sistema, mas de uma campanha anti-Lula. E se tantas pessoas passam a reproduzir uma brincadeira inconsequente como essa sem se importar de tripudiar de uma pessoa que acaba de receber um diagnóstico inquietante como esse, seja quem for, é sinal de que estamos consolidando uma sociedade com valores bem equivocados.
Andaram relembrando, por exemplo, que o Lula declarou, ainda em 2006, que o SUS estaria à beira da perfeição. Assim como ele, porém, todos os governantes deixam o poder público gabando-se de terem deixado evoluções nos serviços públicos. Cá com meus botões, acho que a declaração foi, certamente, infeliz, mas nem por isso vou fazer coro com os que agora tentam achincalhar o ex-presidente num momento em que ser humano nenhum merece tal tratamento.
No fim das contas, acho que todos devem ter o direito de dizer o que querem, desde que também aceitem a contrapartida de ouvir o que não querem. E acho que, no fim, toda essa bobagem evidencia dois grandes grupos que se negam ao amadurecimento político. Os que utilizam a paixão por Lula para desqualificar a indignação do demais pelo sucateamento do SUS, e os que se valem da mesma moeda para tripudiar de uma pessoa acometida com câncer.
Se queremos mesmo a melhoria do nosso sistema público de saúde, por favor, iniciemos uma campanha séria e apartidária pelo fim da corrupção em todos os níveis do poder público, contra a terceirização de serviços essenciais – por meio dos quais muitas secretarias municipais de saúde desviam dinheiro junto com médicos e empresários inescrupulosos do ramo, e pela fiscalização rigorosa da aplicação dos recursos públicos destinados ao setor. Sem esquecer, obviamente, que como população que mais consome agrotóxicos no planeta estamos cada vez mais sujeitos a contrair câncer e outras doenças somente por ingerir alimentos contaminados (embora tenha lido jornalista experiente dizer que Lula contraiu câncer por causa “do fumo e da cachaça”).
Não deixemos que o pior câncer de todos, o do preconceito e da falta de informação, corroa nosso humanismo.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Eu Não Vou me Mover - Curta Metragem - Uma obra prima sobre a Hipocrisia

Repúdio ao tribunal midiático no Brasil


Moção apresentada no Encontro Mundial de Blogueiros:

Do sitio do Miro
 
Nas últimas semanas, a mídia hegemônica mostrou mais uma vez suas garras. De forma inescrupulosa, se aproveitou de denúncias vazias para governar o país no grito.

Inconformados com o fato de terem perdido nas urnas a eleição presidencial, tentam impor uma agenda negativa para a nova presidente, tendo como foco a desmoralização dos quadros políticos que ocupam seu primeiro escalão. Com muito orgulho, os barões da mídia se vangloriam de ter derrubado o 6º ministro de estado em 10 meses de governo.

O alvo da vez foi o ex-ministro do Esporte Orlando Silva. Baseados em afirmações feitas por um homem com extensa ficha corrida na justiça, acionado por ter desviado milhões dos cofres públicos e que não apresentou nenhuma prova contra o ex-ministro, a mídia criou um tribunal de exceção para julgar e condenar publicamente Orlando Silva. Num primeiro momento, a presidente Dilma Rousseff resistiu à investida da mídia, mas não suportou a pressão e cedeu à chantagem midiática.

Ao se curvar, mais uma vez, aos interesses dos grandes conglomerados de comunicação e se pautar pela efemeridade das pesquisas de opinião, a presidente Dilma cria um perigoso precedente para a democracia brasileira e uma arapuca para o seu governo.

No primeiro caso, porque qualquer pessoa pública passa a ter o ônus da prova de sua inocência, violando um princípio Constitucional, e pode ser fuzilada no paredão da sanha reacionária. No segundo, porque a mídia e a elite conservadora que ela representa se sentem fortes para continuar a investida contra o seu governo. Já há, inclusive, os que apontam os próximos alvos. Engana-se a presidente se ela acredita que adotando uma postura subserviente à mídia ela estará fora do alcance dos seus fuzis.

Nessa guerra midiática, a estratégia da mídia e das elites é desmoralizar os partidos que compõe a base do governo e seu primeiro escalão com o objetivo de enfraquecer a presidente, que pode ser o próximo alvo.

Este episódio só fortalece a necessidade de o Brasil discutir urgentemente um marco regulatório para as comunicações. A mídia ataca os que defendem a regulação porque tem o monopólio da capacidade de gerar escândalos – mesmo que a partir de fatos que não os justifiquem – ou de abafá-los, quando lhes interessa. O país não pode mais ser refém das vontades políticas das poucas famílias que controlam 80% do conteúdo dos meios de comunicação. Só por meio da regulação é possível garantir a liberdade de expressão para todos, ampliar o pluralismo e a diversidade da comunicação brasileira.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Lula e os porões da política



Ontem, assistimos, mais uma vez, ao espetáculo deprimente que é a política sendo feita sem pudor, sem tergiversações. A repercussão da doença de Lula na mídia revela que essa atividade se baseia, hoje, em absoluta falta de decência e de lealdade nos embates entre os que deveriam terçar idéias para melhorar a vida das pessoas.
Na busca por causar o maior abatimento moral possível ao adversário, vale tudo. Principalmente chocá-lo com ausência de um traço de humanidade em seus adversários e, assim, deixá-lo assustado ao imaginar a que ponto chegariam para destruí-lo.
Nos últimos dias, dois casos se encadearam em demonstrações análogas, ainda que em níveis extremamente desiguais, de como, não raro, a política passa até pelo ato supremo de tirar a vida de um adversário da forma mais selvagem que se possa conceber.
Um desses casos reside nos detalhes sobre como Muamar Kadafi, ex-ditador da Líbia, foi assassinado por seus adversários… políticos. O outro caso, de nível de virulência infinitamente menor, mas igualmente assustador, foi ver a forma como a mídia tratou a doença de Lula.
Melhor não entrar nos detalhes sobre o assassinato de Kadafi, pois ainda visualizo a imagem mental que se me formou ao saber das sevícias que sofreu antes de colocarem fim ao seu suplício. Sobre Lula, a mídia o acusou de supostamente ter se causado o mal que o acomete, e comemorou a possibilidade de a doença ter êxito onde seus adversários “humanos” falharam.
A política, como a conhecemos, não requer capacidade, honestidade, talento ou boas intenções; requer capacidade de ser canalha ao impensável, de trair sem culpa, de não ter piedade ou comedimento algum na busca por atingir o oponente. Para vencer o adversário, vale tudo. Principalmente cinismo, muito cinismo.
É uma atividade para profissionais com “couro duro”. Nesse aspecto, somente alguém que saiu de uma região miserável, que passou fome e privações de toda sorte, que sofreu humilhações que arrasariam moralmente qualquer pessoa pode suportar a deslealdade da política em suas manifestações menos contidas.
Enganam-se, porém, os que julgam que um tumorzinho conterá alguém que, apesar de tudo pelo que passou, fez do Brasil a terra de promessas mil que jamais sonhamos que se tornaria. A selvageria dos adversários é antiga, conhecida e previsível. Lula, portanto, só precisa se precaver contra a traição, que se confunde com a política.
Por fim, resta, apenas, uma dúvida: será que esses 80% dos brasileiros que pesquisas recentes mostraram que devotam carinho extremado a Lula estão gostando de ver a mídia comemorar a sua doença?
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Conheçam melhor, abaixo, quem é a comentarista da CBN que atribuiu a doença de Lula ao “alcoolismo”


domingo, 30 de outubro de 2011

Em cúpula no Paraguai, países ibero-americanos defendem desenvolvimento com justiça social



 

Brasília – A Declaração de Assunção, adotada pela Cúpula Ibero-Americana, que terminou ontem (29) na capital paraguaia, fez um forte apelo para a mudança do papel do Estado como um instrumento de “promoção do desenvolvimento sustentável com justiça social inclusiva e com vista a alcançar a boa vida”.
A declaração, aprovada pelos representantes dos 22 países que integram o grupo – os da América Latina, além da Espanha, de Portugal e Andorra – enfatizou a necessidade de encontrar uma reformulação do Estado para garantir o bem comum.
O texto ressalta que “a transformação do Estado é um processo contínuo e constante que afeta as estruturas públicas nas relações entre governo e cidadãos, adequando o seu conteúdo para a condução de melhoria contínua e gestão dos assuntos públicos, para promover o desenvolvimento sustentável com justiça social, inclusiva e com vista a alcançar a boa vida”.
O comunicado acrescenta que, para desenvolver as capacidades nacionais a fim de erradicar a pobreza, é importante “promover o desenvolvimento sustentável e o equitativo crescimento econômico e o desenvolvimento sustentável como um objetivo central da cooperação para o desenvolvimento”.
Os países ibero-americanos reiteraram “os princípios e valores do acervo político, econômico e social da Conferência Ibero-Americana, convencidos da necessidade de reforçar os Estados para desempenhar o seu papel de direito na condução da estratégia de desenvolvimento global, em defesa da democracia e da governabilidade, de promover a igualdade, a justiça social e garantir e ampliar os direitos dos cidadãos”.
Os signatários da declaração reconheceram o contexto “de crise econômica e financeira que afeta vários países do mundo, com profundos ajustes e reajustes que colocam pressão sobre as instituições de todos os níveis”.
No documento, os países também ressaltam que “a participação do cidadão é um componente essencial da gestão democrática e de tomada de decisão no desenvolvimento sustentável”. Reconhecem ainda que “as políticas fiscais podem contribuir significativamente para a melhorar a distribuição, aumentar a cobertura e melhorar a qualidade e acesso aos serviços públicos”.
Entre os acordos fechados durante a cúpula estão a decisão de promover a cooperação entre as administrações públicas dos países ibero-americanos, em busca da integração regional e da criação de oportunidades e canais “para a transferência e o intercâmbio de conhecimentos e experiência em processos, projetos e programas bem-sucedidos”.
O texto também lista acordos sobre questões como o apoio a “redes regionais de governo eletrônico” e promoção de “mudanças progressivas na estruturas fiscais para consolidar um sistema de coleta mais eficiente”. A declaração destaca ainda a necessidade de se “criar condições para uma maior igualdade nos níveis de bem-estar, enfatizando o papel do governo na erradicação da pobreza e redução da desigualdade por meio do investimento social sustentado”.

Dostoiévski: um gênio ainda atual aos 190 anos de nascimento


 
Milton Ribeiro no SUL21

Há um período de nossa adolescência ou logo após, quando somos ou não universitários com algum tempo tempo livre — como diria Kafka, com mais energia do que necessidade de produzir –, em que usamos nosso tempo lendo clássicos. Neste período, procuramos ler os maiores ícones e, dentre estes, estará inevitavelmente Dostoiévski. E ele costuma ser uma experiência inesquecível. Como literatura e visão de mundo, é algo arrebatador. Se a aventura de lê-lo jovem nos causa profundas marcas, também tolhe-nos, pela inexperiência, a análise das razões de tal assombro.
Fiódor Mikhailovich Dostoiévski (Moscou, 30 de Outubro de 1821 — São Petersburgo, 28 de Janeiro de 1881) foi um escritor russo, considerado um dos maiores romancistas e um dos mais inovadores artistas de todos os tempos.
Fiódor foi o segundo dos sete filhos nascidos do casamento entre o médico Mikhail Dostoiévski e Maria Fedorovna. A mãe do escritor morreu quando ele ainda era muito jovem, de tuberculose, e o pai foi provavelmente assassinado pelos próprios servos, que o consideravam autoritário. Alguns biógrafos afirmam que o assassinato do pai causou a primeira crise epilética em Dostoievski, fato considerado controverso por seus atuais estudiosos.
A obra dostoievskiana explora a autodestruição, a humilhação e aspectos ético-religiosos, além de analisar os estados patológicos que levam ao suicídio, à loucura e ao homicídio. A literatura moderna e várias escolas da teologia e psicologia foram influenciadas por suas ideias. Por exemplo, seu último romance, Os Irmãos Karamazovi, foi considerado por Sigmund Freud como o melhor romance até então escrito e uma grande influência.
Porque Dostoiévski é diferente?
Há um outro clássico russo — Problemas da Poética de Dostoiévski, de Mikhail Bakhtin — ,que investiga os procedimentos ficcionais do escritor russo e aquilo que neles há de original. Em um dos capítulos, A Ideia em Dostoievski, é analisado o motivo do assombro e sedução que um escritor nascido há quase dois séculos ainda exerce sobre seus leitores.
Antes de chegar a Dostoiévski, Bakhtin nos fala de Sócrates e sobre a natureza dialógica da idéia. Segundo o grego, o habitat natural das idéias é o diálogo. A idéia internalizada é algo inútil e morto; porém, se a mera divulgação de uma idéia já a altera pelas limitações da linguagem e de quem a expressa, imaginem as transformações que nela ocorrem quando em choque com outras. O diálogo socrático influenciou tanto Dostoievski que ele direcionou sua arte no sentido de tornar-se principalmente um regente de personagens, retirando de seu texto a voz onisciente (que tudo sabe) do autor. Seu objetivo era o de deixar suas criaturas livres e de colocar-se à altura delas, nunca acima. Para fazer isto, o escritor tinha de converter seu pensamento numa arena na qual as diversas vozes do romance lutavam, sofriam, amavam, decidiam e se debatiam, sempre com sua própria lógica interna e verossimilhança — mas sem a aparente mediação do autor. Com esta disposição, Dostoiévski coloca-se como um criador de biografias pessoais e de situações que falam simbolicamente por si mesmas; mas que, pronto isto, deixa seus personagens livres, agindo e opinando de forma independente, enquanto anota o que dizem. Não é simples.
A tal projeto artístico, a esta quase insanidade de tornar sua obra uma arena, temos que acrescentar o fato de que Dostoiévski dá razão a todos e a ninguém, pois NUNCA EMITE JULGAMENTOS DEFINITIVOS. O escritor-voz-da-razão, o que elabora belas teses e aforismos infalíveis foi misturado a seus personagens. Dostoiévski não é divino nem definitivo.
A partir de Crime e Castigo – isto significa eliminar apenas as obras da juventude – só se conhecem as ideias de cada personagem, não a opinião do autor sobre elas. E muito menos se saberá quem o representa dentre os personagens. Ele não nos deixa pistas, pois permanece distante. Some-se a isto uma imensa capacidade de observação, um talento artístico ímpar e o fato de ser um manancial de preocupações éticas muito a frente de seu tempo, e estaremos no caminho de entender porque Dostoiévski é tão apaixonante.
Dostoiévski ou Tolstói?
Esta é uma pergunta provocativa não somente porque coloca frente a frente dois monstros do romance russo do século XIX, mas também porque compara dois projetos literários muitíssimo bem sucedidos e distintos. Não chega a ser lógica uma comparação entre seres humanos e romancistas tão diferentes entre si — seja nas posturas, seja nas vivências de cada um — , porém, ao mesmo tempo sabemos que nada é mais lógico do que comparar dois contemporâneos importantíssimos, como hoje fazemos com Saramago e Lobo Antunes, por exemplo. Aqui a armadilha que devemos evitar é o elogio de um para desvalorizar o outro. Eram ambos autores de grandes painéis. Seus romances eram tudo: psicológicos, sociais, filosóficos, picarescos, metafísicos (no caso de Dostoiévski) e tão grandes que empurraram as fronteiras dos gêneros para poderem se acomodar dentro delas.
Tolstói talvez seja o maior de todos os narradores clássicos — por que mesmo não recebeu o Nobel se faleceu em 1910? Seus romances são perfeitos, têm ritmo, excelente prosa, envolvem. Se fossemos obrigados a compará-lo com alguém, seria com Turguênev ou com certa parte da obra de Tchékhov. E aqui voltamos às questões de foco narrativo. Tolstói era o típico narrador onisciente que, apesar de detalhista, não era capaz de abandonar sua posição aristocrática, o senso comum da época e o certo e errado da concepção cristã do mundo. Já Dostoiévski, quando comparado a Tolstói, parece um alucinado. O narrador de Dostoiévski localiza-se sob a pele dos personagens, saltando de um para outro, deixando-se reger de tal forma por suas lógicas (ou loucuras) que faz sumir o narrador-julgador.
Tolstói, é claro, chamava os romances de Dostoiévski de mal-acabados. O acabamento era fundamental para clássicos como ele e Thomas Mann, por exemplo. Tolstói não tinha razão ao chamar os romances de Dostoiévski de mal-acabados. Eram muito diferentes. Pois livros como Crime e Castigo e O Idiota — sôfregos, nervosos e tão viscerais — , sob o filtro de Tolstói se transformariam em outra coisa. Quem pensa em acabamento quando quer descobrir quem matou o velho Fiódor? E quem criticaria o acabamento absolutamente impecável da Parábola do Grande Inquisidor — apenas para me referir a dois temas de Os Irmãos Karamázovi? Ora, Dostoiévski não estava preocupado com o acabamento porque as regras vigentes da beleza literária o atrapalhavam; porém, quando precisou, fez uso delas brilhantemente. Na verdade, uma das últimas preocupações que temos ao ler Dostoiévski é com o acabamento. Os personagens de Tolstói sofrem com dignidade, os de Dostô berram e se escabelam. Não obstante, o horror metafísico que cresce de O Idiota não fica nada a dever ao de Ivan Illich.
Enquanto Guerra e Paz é um panorama, Os Irmãos Karamázovi aponta para o fim de uma era, como Dostoiévski já mostrara em Os Demônios. Tolstói é um burguês, Dostoiévski pensa um apocalipse ético e moral. São muito diferentes. E muito bons.
Dostoiévski, o que e que traduções ler?
As gerações passadas leram Dostoiévski nas Obras Completas do autor russo da Editora José Olympio. Hoje sabemos que não era nada completa. Eram livros bonitos, vermelhos, de capa dura, o que havia de melhor. Os tradutores eram Rachel de Queiróz, Ledo Ivo, Brito Broca, etc. Todos os livros vinham com esplêndidos prefácios de gente como Otto Maria Carpeaux e Wilson Martins. Minha geração engoliu aqueles livros como se fossem o melhor Dostoiévski possível. Não eram. O que tinham de bom eram os prefácios…
Nos anos 80, começaram a aparacer novas traduções, totalmente diferentes. A explicação era incrível. As traduções antigas, aquelas da José Olympio, eram feitas a partir de outras traduções, francesas, do início do século XX. Os tradutores franceses daquela época não eram nada respeitosos, açucaravam expressões, situações e até criavam frases facilitadoras. Ou seja, eles adaptavam os autores ao gosto francês, aparavam as arestas, retiravam espinhos, deixavam-no… mais bonitos…
Porém, nos anos 90, a Editora 34 montou um time de tradutores para retraduzir todo Dostoiévski. Antes, aqui e ali, já aparecera o verdadeiro autor: havia as traduções de Boris Schnaiderman dos grandes russos; nos anos 80, Moacir Werneck traduziu O Jogador e O Eterno Marido direto do russo. O resultado foi um autor muito mais direto e sem firulas. Muito melhor, limpo e impactante, certamente. Mas a revelação do verdadeiro e completo Dostoiévski veio nos anos 90 com Paulo Bezerra na Editora 34. Digo com a maior tranquilidade que quem leu O Idiota e Crime e Castigo nas traduções antigas, leu outros livros. Dizem meus olhos e minha mente que estes romanções só foram verdadeiramente traduzidos há pouco. As novas versões estão certamente bem mais próximas de Dostoiévski, por mais que Brito Broca tenha feito milagres com sua versão francesa de Crime e Castigo.
Então, indicamos a coleção da 34 ou outras traduções diretas. Para este humilde leitor, O Idiota só se tornou uma obra-prima após a leitura da tradução de Bezerra. A tradução da José Olympio tem todos os méritos associados ao pioneirismo e às parcas possibilidades dos anos 50, mas vão me desculpar, os dois Idiotas têm pouco a ver um com outro. Toda a transcedência e o valor altamente filosófico da obra perdeu-se na passagem para o francês ou para o português.
Dostoiévski não é nada, mas nada romântico. É um escritor bem mais duro do que fazem crer as antigas traduções. Porém, se não houver dinheiro e o leitor do Sul21 encontrar uma das antigas traduções que têm reaparecido ainda hoje a preços módicos, compre do mesmo jeito. Um mau Dostoiévski é superior a quase tudo que haverá em torno.
O que ler? Ora, tudo o que foi escrito após Crime e Castigo, incluindo este, com destaque para Os Irmãos Karamazóvi, Os Demônios, O Idiota, O Jogador e O Eterno Marido.. São todos volumes de mais de 500 páginas, mas é puro tempo ganho.

Protocolos dos Sábios de Sião, aqui, não!


 
Por Katarina PeixotoCarta Maior

Tem gente querendo reprisar a farsa dos Protocolos dos Sábios de Sião na política brasileira. Pouco importa que haja emprego e que as crianças pobres do Recife não expilam lombrigas pela boca nos sinais de trânsito. A farsa está na invenção de um inimigo bestial a ser revelado e denunciado como responsável por uma suposta onda gigantesca de corrupção.

“Há uma grande conspiração em curso no Brasil. Trata-se da conspiração do PT e da esquerda em geral para assaltar o bolso das famílias, para imporem um modo politicamente correto de pensar, para censurarem o machismo, a homofobia, o sexismo e o nosso direito de andar armados. Essa gente quer assaltar os cofres públicos para nos fazer pagar impostos, com os quais eles só fazem roubar e enriquecer, enquanto eu me sinto vilipendiado e cada vez mais envergonhado. Nunca houve tanta corrupção neste país, nunca. É aquela coisa do pobre que jamais teve algo e que agora se lambuza, minha avó já dizia. Aqui, comediante é levado a sério, só porque é fascista, homofóbico, machista e age contra a lei, enquanto os políticos, ah, os políticos, esses seguem sem ser levados a sério. Por isso eu gosto mesmo é do Bolsonaro, inclusive. Ele vem sendo vítima do festival de autoritarismo e corrupção que assolam este país. Esses petralhas que estão mais preocupados em atacar a liberdade de imprensa do que em governar o país. Sim, porque o país só vai bem graças a Fernando Henrique, que não fosse ele, esses petralhas iam ver. O PT não faz nada que preste e só rouba o nosso dinheiro. O filho de Lula é milionário, Dilma sabe e acoberta Orlando Silva, aquele moleque safado que está podre de rico, caiu porque é culpado, óbvio”.
“Outro dia um jornal muito importante disse no seu editorial que o país precisava de uma limpeza ética! Eu concordo! Cresce no país a consciência de que chega de tudo isso que aí está! E ainda querem mais imposto para a saúde, e fraudam até provas de ensino médio, que são de alta importância para os nossos filhos! Como eles terão certeza de que entrarão por seus próprios méritos na Universidade? Não basta ter direitos negados pelas vagas dadas de presente – às nossas custas – a quem se diz negro (como se houvesse racismo no Brasil, ora essa!), aos desqualificados das escolas públicas e, pasmem, para indígenas. Chega! Está na hora da nossa marcha, da marcha pela dignidade, contra essa gente que quer mandar em nós, que quer controlar o nosso modo de pensar, que pretende ganhar dinheiro às minhas custas e fazer demagogia com os impostos que eu e minha família e você paga!”
Diariamente a Carta Maior recebe comentários de leitores que compartilham o balaio de enunciados contraditórios acima. Essa babilônia de crenças incompatíveis, que não sobrevivem a um inquérito minimamente lógico a respeito da relação entre uma e outra reina na mídia e, até aqui, parece apavorar setores poderosos do governo. Trata-se de uma onda de depravação consciente e deliberada, que convida a barbárie para uma grande orgia semântica, voltada para criar uma farsa. Não porque é contra o PT ou o governo ou a esquerda. A farsa está na invenção de um inimigo a ser revelado e denunciado como responsável pelas ameaças e fragilidades que o poder vem enfrentando. Mas que poder? O da mídia, o do tal do PIG, o da CIA e do FMI? E que fragilidades?
O Protocolo dos Sábios de Sião é uma farsa criada por um serviçal do Czar Nikolai II para tentar, sem sucesso, enfrentar as ameaças ao seu poder. Essa farsa, da virada do século XIX para o XX, denuncia a existência de um grupo de judeus que se reúnem e deliberam como controlar o mundo. Eles traçam planos e estabelecem metas para a empreitada. O texto é tão autêntico que todo judeu denega a sua veracidade, revelando, assim, a sua força, dizem as sumidades de todo tipo que acreditam nessa mentira.
O modelo desse embuste é muito simples e imbecilizante: ele mobiliza o medo do lobo mau que habita as memórias infantis apontando um inimigo ao mesmo tempo genérico e específico que introduz, contamina e assegura a permanência de todo o mal na floresta, quer dizer, na sociedade. Na Rússia czarista, eram os judeus. Depois, no nazismo, eram os judeus comunistas, porque, como se sabe, a Revolução de 17 foi coisa de judeu, segundo nos disse Hitler, o sábio. Já na década de 30, quando as trevas do stalinismo assaltaram o Partido Comunista, os Protocolos foram recuperados, porque ali estariam claros os planos trostskistas – portanto judeus – para atacar o guia dos povos.
Quando os delinquentes argentinos que agora estão sendo condenados (finalmente) deram o golpe de estado em 1976, com a missão de exterminar a esquerda, usaram essa bíblia de oligofrenia e irracionalidade para levarem a cabo o extermínio de aproximadamente 30 mil pessoas. Talvez fosse o caso dizer que, no caso da Argentina dos anos Videla-Massera – com o auxílio de refugiados nazi –, da Alemanha nazista e da barbárie stalisnista os tais sábios de Sião tenham aumentado um pouco o número. Porque somando esse horrores se chega na casa dos milhões de “sábios”. Mas não é o caso dizer, quando se respeita a verdade e a razão que viabiliza o seu acesso.
A Política e a inocência são e devem ser inimigas desde a gestação. Disso obviamente não se segue que a Política seja coisa de bandidos; só as pedras são inocentes, disse Hegel, dessa vez com razão: disso se segue que a defesa da inocência é a defesa de uma quimera, não apenas do reino que seria próprio às coisas do poder, mas do da razão. A origem da reclamação de inocência e pureza no mundo está na crônica mítica do pecado original, a primeira corrupção que teve sua CPI vendida pelo governo de Deus, no caso em tela.
 
Até hoje há gente séria da teologia que debate se Adão levou a serpente a sério por curiosidade intelectual ou por desejo. A primeira vertente de interpretação defenderia que o livre arbítrio dos homens deriva da sua racionalidade; a segunda vertente, que deriva do seu desejo. Mas a coisa mais importante é que a liberdade dos homens, na qual, aliás, veio a se fundar a Política, não deriva nem pode derivar da inocência. Já na sua origem, a liberdade tem a ver com as condicionalidades da contingência.
É claro que não é por isso que o Ministro x ou y cai ou não; por isso se torna evidente, apenas, que a gritaria por inocência não é nem pode ser inocente: ou tem alguma racionalidade, ou tem um desejo incontrolável. Em ambos os casos, é o poder, e não a inocência e a pureza de intenções, que organiza a sua inteligibilidade.
Essas observações também vigoram quanto ao PT e aos seus aliados, em tempo. Não são poucos os que se lembram dos anos 90, no Brasil. Mas eu lembro como se fosse ontem do quanto me indignava com o PT, com o PCdoB e com muitos outros da oposição ao governo Fernando Henrique e Paulo Renato, no MEC de então, naqueles anos tristes. Enquanto a Vale do Rio Doce era entregue à iniciativa privada com financiamento do BNDES, enquanto a CSN e as companhias de energia elétrica eram entregues, enquanto bancos públicos estatais eram praticamente doados, enquanto tudo isso acontecia com o discurso de que era para se qualificar o Estado e este, no período em que o dinheiro das supostas vendas de patrimônio público deveriam estar entrando nos seus cofres, definhava, com os banheiros nas universidades fedendo e os professores doutores ganhando salários ridículos, o que fazia a esquerda, em geral?
Denunciava a corrupção e berrava por CPIs, no Congresso. Eram poucos os que, à esquerda, investigavam e buscavam, amiúde, diagnosticar a destruição que estava em curso no país e que apontavam as dificuldades que viriam pela frente, não apenas para um eventual governo do PT, mas para o país mesmo – este que não se resume ao bolso e ao imaginário classe média cuja vida é do tamanho do sábado com uísque e os amigos, para reclamar do que a revistinha semanal declara.
No início dos anos 2000 e no começo da primeira gestão de Lula na presidência ficou claro que essa tática tinha sido inconsequente: a destruição do Estado, o definhamento da República e o sequestro de seu financiamento pela política parasitária do sistema financeiro causaram uma gigantesca confusão em muitos que, como eu, tinham apostado na interdição do horror que assolou o país nos anos 90. A confusão não acabou, mesmo que muito daquele horror tenha sido revertido, pelo menos quanto ao futuro ou às gerações posteriores às dos beneficiários do Bolsa Família, quanto ao futuro da pesquisa, da Universidade, da ciência, do financiamento público-estatal por meio dos bancos públicos do Estado, do PAC, do Minha Casa, Minha Vida, da redução das desigualdades, enfim, de tudo isso que se tornou o Brasil, dos últimos 6 anos para cá, ao menos.
E qual é a inconsequência, mesmo? É trazer a farsa dos Protocolos dos Sábios de Sião para a cena Política. A inconsequência, que emergiu na mais regressiva e violenta campanha eleitoral da jovem democracia brasileira, em 2010, é convidar o adão de antes da maçã para juiz das coisas do poder. Pouco importa que ditadura alguma leve a sério a pesquisa e a universidade, como se leva a sério no Brasil, hoje. Não interessa à imbecilidade que não entendeu o que aconteceu há quinze anos, saber o que realmente aconteceu no Ministério dos Esportes hoje ou no do Planejamento, em 1995. Pouco importa que haja emprego e que as crianças pobres do Recife não expilam lombrigas pela boca nos sinais de trânsito. Nada importa que a abundância tenha se tornado regra até para a classe média, mesmo que nos cartões de crédito. Não se preocupam com o valor, sobretudo nas próprias vidas, do automóvel, desde que se angustiem com os impostos a pagar. Desde que os Sábios de Sião sejam os culpados.
É desnecessário e inútil dizer o quanto esse convite à orgia semântica dos Protocolos dos Sábios de Sião é depravado e perigoso. É desnecessário porque na mídia das oito famílias abundam declarações com documentos e atas das reuniões dos Sábios que conspiram para prejudicar as pessoas de bem deste país. E é inútil porque parte do PT aceitou esse convidado indecente, o adão de antes da maçã, para juiz da Política. Então, não é útil, aqui, lembrar que não adianta denunciar a mídia das 8 famílias, nem lembrar que houve, sim (mesmo que seja verdade), um gigantesco e brutal saque do erário no processo de privatização. Não se combate a criação de monstros com uma briga de arquibancada. Na melhor das hipóteses, a briga contra o tal do PIG enche o saco de quem pensa e quer saber o que diabos está acontecendo, até mesmo quando não se tem mais muita esperança de que se vai, afinal, ter alguma ideia do que realmente ocorreu com aquela licitação ou com aquela fraude declarada numa manchete daquele panfleto com papel jornal.
A história dos Protocolos dos Sábios de Sião não parece nem próxima do fim, mas isso não implica que o seu uso seja ou deva ser triunfante. Porque a única vitória dessa irracionalidade é a destruição e o empobrecimento, a morte e a barbárie. No início dos anos 2000, o Rio Grande do Sul foi sequestrado pelos profetas que denunciavam uma grande conspiração petista para destruir a propriedade, os valores das famílias de bem e as mentes das criancinhas. O que aconteceu aqui não se compara à tragédia argentina nem ao horror alemão e nem mesmo ao stalinismo, obviamente.
Mas é um bom exemplo de um estado que, “livre dos Sábios de Sião”, empobreceu, destruiu suas escolas, sucateou os serviços públicos, empobreceu no campo e dilacerou-se nas cidades, com o aumento da violência e do tráfico. É um exemplo de emburrecimento midiático, de estupidez cultural, de indigência literária, de depauperamento geral.
Não dá para dizer quem é o Nikolau II da vez, no Brasil. Quem está exatamente frágil e quem se sente ameaçado, porque a confusão não é pouca e porque o governo não parece estar contribuindo muito para elucidar o estado do que é racional e do que não pode sê-lo. Mas dá para dizer, e se deve dizer, que essa imbecilidade dos balaios de crenças contraditórias e incompatíveis deve ser combatida.
Aqui, na Carta Maior, essa farsa não tem vez.

Agora que o bando ao serviço da CIA assassinou Kadafi, que país se seguirá à Líbia?


Paul Craig Roberts
Paul Craig Roberts 
Com a Líbia conquistada, o AFRICOM arrancará para os outros países africanos em que a China tem investimentos em energia e mineração. Washington ressuscitou o Jogo da Superpotência e está a competir com a China. Mas enquanto a China faz investimentos e ofertas de infra-estrutura à África, Washington envia tropas, bombas e bases militares. Mais cedo ou mais tarde a agressividade de Washington em relação à China e à Rússia irá explodir nas nossas caras.


Se os planos de Washington tiverem êxito, a Líbia tornar-se-á mais um estado fantoche americano. A maior parte das cidades e infra-estruturas foi destruída por ataques das forças aéreas dos EUA e dos seus fantoches da NATO. Firmas dos EUA e europeias agora obterão contratos sumarentos, financiados pelos contribuintes estado-unidenses, para reconstruir a Líbia. O novo parque imobiliário será cuidadosamente concedido a uma nova classe dirigente escolhida por Washington. Isto colocará a Líbia firmemente sob a pata de Washington.
Com a Líbia conquistada, o AFRICOM arrancará para os outros países africanos em que a China tem investimentos em energia e mineração. Obama já enviou tropas americanas para a África Central sob o pretexto de derrotar o Exército da Resistência de Deus, uma pequena insurgência contra o ditador vitalício. O porta-voz republicano da Câmara, John Boehner, saudou a perspectiva de mais uma guerra ao declarar que o envio de tropas dos EUA para a África Central “promove os interesses estado-unidenses de segurança nacional e a sua política externa”. O senador republicano James Inhofe acrescentou uns litros de palração acerca de salvar “crianças ugandesas”, uma preocupação que o senador não tem para com crianças da Líbia ou da Palestina, do Iraque, do Afeganistão e do Paquistão.
Washington ressuscitou o Jogo da Superpotência e está a competir com a China. Mas enquanto a China faz investimentos e ofertas de infra-estrutura à África, Washington envia tropas, bombas e bases militares. Mais cedo ou mais tarde a agressividade de Washington em relação à China e à Rússia irá explodir nas nossas caras.
De onde está a vir o dinheiro para financiar o Império Africano de Washington? Não do petróleo líbio. Grandes porções do mesmo foram prometidas aos franceses e britânicos por lhe proporcionarem cobertura a esta última guerra aberta de agressão. Não de receitas fiscais de uma economia estado-unidense em colapso onde o desemprego, se medido correctamente, é de 23 por cento.
Como o défice do orçamento anual de Washington tão enorme como é, o dinheiro só pode vir das máquinas de impressão.
Washington já fez as máquinas de impressão trabalharem o suficiente para elevar o índice de preços no consumidor para todos os consumidores urbanos (CPI-U) a 3,9% ao ano (até o fim de Setembro), o índice de preços no consumidor para assalariados e empregados administrativos (CPI-W) a 4,4% ao ano e o índice de preço no produtor (PPI) a 6,9% ao ano.
Como mostra o estatístico John Williams ( shadowstats.com ), as medidas oficiais de inflação são manipuladas a fim de manter baixos os ajustamentos de custo de vista para os que recebem da Segurança Social, portanto poupando dinheiro para as guerras de Washington. Quando medida correctamente, a presente taxa de inflação nos EUA é de 11,5%.
Que taxa de juro podem obter os poupadores sem assumir riscos maciços com títulos gregos? Os bancos dos EUA pagam menos do que meio por cento nos depósitos de poupança assegurados pelo FDIC (Federal Deposit Insurance Corporation). Títulos a curto prazo do governo dos EUA pagam essencialmente zero.
Portanto, de acordo com estatísticas oficiais do governo estado-unidense, os poupadores americanos estão a perder anualmente entre 3,9% e 4,4% do seu capital. Segundo a estimativa de John Williams da taxa real de inflação, os poupadores dos EUA estão a perder 11,5% das suas poupanças acumuladas.
Quando americanos reformados não recebem juros sobre as suas poupanças, eles têm de gastar o seu capital. A capacidade de mesmo os mais prudentes reformados sobreviverem com as taxas de juro negativas que estão a receber e a erosão pela inflação de quaisquer pensões que recebam chegará a um fim uma vez que os seus activos acumulados sejam exauridos.
Excepto para os mega-ricos protegidos de Washington, o um por cento que capturou todos os ganhos de rendimento dos últimos anos, o resto da América foi remetido para o caixote do lixo. Nada, o que quer que seja, foi feito para eles desde o golpe da crise financeira de Dezembro de 2007. Bush e Obama, republicanos e democratas, centraram-se em salvar o 1 por cento enquanto faziam um manguito para os 99 por cento.
Finalmente, alguns americanos, embora não os suficientes, entenderam o “patriotismo” do desfraldar a bandeira que os remeteu para o caixote do lixo da história. Eles não vão afundar sem um combate e estão nas ruas. O Occupy Wall Street propaga-se. Qual será o destino deste movimento?
Será que a neve e o gelo do tempo frio acabará os protestos, ou os remeterá para dentro de edifícios públicos? Quanto tempo as autoridades locais, subservientes a Washington como são, toleram o sinal óbvio de que falta à população qualquer confiança que seja no governo?
Se os protestos perdurarem, especialmente se crescerem e não declinarem, as autoridades infiltrarão os manifestantes com provocadores da polícia que dispararão sobre a polícia. Isto será a desculpa para abaterem os manifestantes e prenderem os sobreviventes como “terroristas” ou “extremistas internos” e enviá-los para os campos de 385 milhões de dólares construídos por contrato do governo dos EUA pela Halliburton de Cheney.
A SEGUIR AO ESTADO POLICIAL AMERIKANO
O Estado Policial Amerikano terá dado seu passo seguinte para o Estado de Campo de Concentração Amerikano.
Enquanto isso, perdidos na sua inconsciência, conservadores continuarão a resmungar acerca da ruína do país devido ao casamento homossexual, ao aborto e aos media “liberais”. Organizações liberais comprometidas com a liberdade civil, tais como a ACLU, continuarão a equiparar o direito da mulher a um aborto com a defesa da Constituição dos EUA. A Amnistia Internacional apoiará Washington demonizando o seu próximo alvo de ataque militar enquanto fecha os olhos aos crimes de guerra do presidente Obama.
Quando consideramos que Israel, sob a protecção de Washington, tem escapado impune – apesar de crimes de guerra, assassinatos de crianças, a expulsão em total desrespeito do direito internacional de palestinos da sua terra ancestral, do arrasamento das suas casas com bulldozers e do arrancamento dos seus olivais a fim de entregar terras a “colonos” fanáticos – podemos apenas concluir que Washington, o viabilizador de Israel, pode ir muito mais longe.
Nestes poucos anos de abertura do século XXI, Washington destruiu a Constituição dos Estados Unidos, a separação de poderes, o direito internacional, a responsabilidade do governo e sacrificou todo princípio moral a fim de alcançar hegemonia no mundo todo. Esta agenda ambiciosa está a ser empreendida enquanto simultaneamente Washington removeu toda regulamentação sobre a Wall Street, o lar da cobiça maciça, permitindo ao horizonte de curto prazo da Wall Street arruinar a economia dos EUA, destruindo portanto a base económica para o assalto de Washington ao mundo.
Será que os EUA entrarão em colapso, num caos económico, antes de dominarem o mundo?

O original encontra-se em
http://www.globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=27205
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/

sábado, 29 de outubro de 2011

Notícias da Antiguidade Ideológica - Marx, Eisenstein, O Capital

extraído do MAKINGOFF por rpessoa
(Nachrichten aus der ideologischen Antike - Marx, Eisenstein, Das Kapital)
Nachrichten aus der ideologischen Antike - Marx – Eisenstein – Das Kapital
Poster
Sinopse
Filme baseado no projeto inacabado do diretor russo Sergei Eisenstein de filmar O Capital, de Karl Marx, a partir da estrutura literária de Ulisses, de James Joyce. Realizado em 2008, no auge da crise financeira mundial, Notícias é uma obra que reflete sobre a atualidade do pensamento de Marx na sociedade capitalista contemporânea.
Screenshots




Elenco
Informações sobre o filme
Informações sobre o release
Galina Antoschewskaja, Claudia Buckler, Oksana Bulgakowa, Jan Czajkowski, Dietmar Dath, Hans Magnus Enzensberger, Agnes Ganseforth, Boris Groys, Durs Grünbein, Ute Hannig, Johannes Harneit, Hannelore Hoger, Rudolf Kersting, Sophie Kluge, Felix Kramer, Charlotte Müller, Oskar Negt, Thomas Nichans, Heather O’Donnell, Gabriel Raab, Lucy Redler, Irmela Roelcke, Sophie Rois, Helge Schneider, Werner Schroeter, Peter Sloterdijk, Rainer Stollmann, Andreas Tobias, Joseph Vogt, Samuel Weiss, Stephanie WüstGênero: Documentário
Diretor: Alexander Kluge
Duração: 570 minutos
Ano de Lançamento: 2008
País de Origem: Alemanha
Idioma do Áudio: Alemão
IMDB: http://www.imdb.com/title/tt1423964/
Qualidade de Vídeo: DVD Rip
Vídeo Codec: XviD
Vídeo Bitrate: 1301 Kbps
Áudio Codec: AC3
Áudio Bitrate: 224 Kbps
Resolução: 640 x 496
Formato de Tela: Tela Cheia (4x3)
Frame Rate: 25.000 FPS
Tamanho: 6,12 Gb
Legendas: No torrent e em anexo
Sumário


Sumário das 3 partes

I. Marx e Eisenstein na mesma casa
Uma aproximação àquilo que Eisenstein planejava e ao tom dos textos de Marx como ecos de um tempo distante


1. Dos cadernos de trabalho de Eisenstein, com Heather O’Donnell (piano), Irmela Roelcke (piano), Hannelore Hoger (narradora), Charlotte Müller, Thomas Niehans (15’07”); 2. Projetos 1927 – 1929, com a biógrafa de Eisenstein, Oskana Bulgakowa, Saudade da infância dos pensamentos. Como soam os textos de Marx no ano de 2008?; 3. Três textos do Capital e dos Grundrisse (2’30”); 4. deve/é. Linha de montagem ainda com muitos vivos (1’30”); 5. Paisagem com indústria pesada clássica Música: Maeror Tri, “The Revenger”, do disco Multiple Personality Disorder (Korm Plastics1993) (1’40”); 6. O livro das forças essenciais humanas, com Sir Henry; música: Guiseppe Verdi, Rigoletto (2’10”); 7. “Um homem é o espelho do outro”, com Sophie Rois (narradora) e Jan Czaikowski (piano); música: Vincenzo Bellini, Norma (2’00”); 8. O lamento da mercadoria não comprada (3’18”); 9. Máquinas abandonadas pelos homens (2’11”); 10. O habitante do cosmos (3’26”); 11. “Magia da Antiguidade”, com Sophie Rois (narradora) e Jan Czaikowski (piano); música: Vincenzo Bellini, Norma (1’22”); 12. “Tornar líquido” (3’08”); 13. “Poder soviético e eletrificação” ou Duas agentes da Stasi se preparam para sua missão (6’45”); 14.O latim de Marx ou preparação para o exame para a escola de suboficial no exército popular (9’13”); 15. “Foram tempos desconfortáveis”, Hans Magnus Enzensberger sobre seu ano de nascimento 1929 (23’); 16. A sexta-feira negra (25 de outubro de 1929): O Capital refuta a si mesmo (4’49”); 17. A sobrinha-neta da intérprete de Lênin: “A formação dos cinco sentidos é um trabalho de toda a história do mundo.”, com Galina Antoschewskaja (23’01”); 18. “O capital pode dizer “eu”?, com Dietmar Dath (45’00”); 19. Amor mais duro do que cimento, com Sophie Rois (15’00”); 20. O renascimento do Tristão no espírito do Encouraçado Potemkin, com Werner Schroeter (12’)


II. Todas as coisas são pessoas enfeitiçadas
Sobre o assim chamado fetiche da mercadoria e a ressonância de revoluções passadas


1. O homem na coisa, um filme de Tom Tykwer (12’); 2. Tocha da liberdade (7’25”); 3. O monumento e o verdadeiro túmulo (4’58”); 4. “Todas as coisas são pessoas enfeitiçadas”, Peter Sloterdijk sobre as metamorfoses da mais-valia (46’30”); 5. Gravação em aúdio de uma luta trabalhista que não existe mais (10’10”); 6. Canção do Krans Milchsack nº4 (2’14”); 7. O que significa falhar alegremente na sociedade do risco?, com Oskar Negt (4’50”); 8. Breve história da burguesia, por Hans Magnus Enzensberger (3’13”); 9. Revoluções são locomotivas da história, com Oskar Negt (4’15”); 10. A razão é uma tocha. Um artigo de Condorcet da Enciclopédia (1’48”); 11. Demanda de tempo da revolução. Um episódio da Revolução Francesa (1’50”); 12. Despedida da revolução, com Peter Konwitschny, Martin Kusej e Martin Harneit; trecho de Luigi Nono, Al gran sole carico d’amore (Sob o grande sol cheio de amor), Azione scenica de Luigi Nono; com um comentário de Joseph Vogls sobre a questão: “O que é um revolucionário?” (8’02”); 13. “Guerra antes do que a paz”, Texto da introdução aos Grundrisse. Com Sophie Kluge und Gabriel Raab (1’40”)


Extras da parte II

1. Manifestos da imortalidade, Boris Groys sobre utopias biopolíticas na Rússia – antes e depois de 1917 (15’); 2. Rosa Luxemburgo e o chanceler do Império (8’); 3. “Eu acredito em solidariedade!”, Lucy Redler sobre greve política e resistência social (15’); 4. Rainha vapor, imperatriz eletricidade, de Rudolf Kersting e Agnes Ganseforth (6’); 5. O que significa subjetivo-objetivo?, com Joseph Vogl (12’49”); 6. O trabalhador total diante de Verdun, com Helge Schneider (17’)


III. Paradoxos da sociedade de troca
Sobre a presença geral da troca e a chance de responder a isso de modo multimidiático

1. A teoria do ataque relâmpago de Karl Korsch (2’18”); 2. Navios na neblina, com Sophie Kluge e Gabriel Raab (0’46”); 3. A Concierge de Paris, com Ute Hannig (2’01”); 4. Sobre a gênese da burrice, de “Dialética do Esclarecimento” de Max Horkheimer e Theodor W. Adorno (6’32”); 5. Maquinista Hopkins, Ópera industrial de Max Brand do ano de 1929 (10’10”); 6. O primeiro Marx e o Marx tardio (3’36”); 7. O hexâmetro de Brecht sobre o Manifesto Comunista, com Durs Grünbein (21’30”); 8. Despedida da revolução industrial: Poderiam os russos ter comprado o capital? Um episódio por ocasião da quebra da bolsa de 1929 (11’); 9. Como se lê no Capital?, com Oskar Negt (segundo Karl Korsch) (32’30”); 10. “Quanto sangue e horror está sobre o solo de todas as ‘boas coisas’!” (4’9”); 11. Impregnação violenta da troca (3’); 12. “Eu nunca vi dois cachorros trocarem um osso”, Rainer Stollmann sobre o valor de troca (18’17”); 13. Robinsonistas socialistas de 1942 (16’); 14. Palavras-chave: “ideologia”, “alienação”, “vitalidade das coisas?”, “Existe um direito humano das coisas?”, com Joseph Vogl (28’); 15. A grande cabeça de Chemnitz (3’); 16. “Quem tiver a melhor música será o filme principal”, com Helge Schneider como Atze Mückert, como ator de Marx e como compositor do filme de Eisenstein (34’)

Prefácio


Prefácio

Podemos aproximar-nos do projeto de Eisenstein de modo imparcial por vários motivos: ele nos escapou; sob massas de entulho histórico pode-se, de certo modo, desenterrar:

1. um plano do filme, surgido em 1927 e alcançando seu auge em 1929;
2. o livro de Marx (rodeado de fragmentos, excertos e planos).

Além disso, outros dois pontos de partida já são passado para nós: a possibilidade de uma revolução europeia parece ter desvanecido; com isso também a confiança num processo histórico que pode ser moldado diretamente pela consciência das pessoas. Por esse desaparecimento cessou a agitação, a pressa que determinou a publicação da segunda edição de O Capital no ano de 1872 (o ano de nascimento de minha avó) e o “caótico ano de 1929” (o ano de nascimento de Hans Magnus Enzensberger e de Jürgen Habermas). Podemos nos confrontar com os pensamentos estranhos de Marx e com o esquisito projeto de Eisenstein como num jardim, porque representam notícias da antiguidade ideológica. Podemos nos confrontar de modo tão imparcial como tratamos da Antiguidade, que abrange os melhores textos da humanidade.

Não precisamos declarar nada de novo, julgar nada de modo conclusivo, podemos mudar pouco e não precisamos imitar nada da realização de Marx e Eisenstein. Isso pode ser considerado como despedida ou como começo.

Quando Marx nasceu em maio de 1818 (cinco anos após Richard Wagner), na Inglaterra ainda havia trabalho infantil e tráfico de escravos. Em novembro de 1918, após o fim da primeira guerra que desolou o século XX, Marx tem cem anos e meio. No ano de 1943 ele tem 125 anos – tráfico de escravos e trabalho infantil foram abolidos, no entanto temos deportação e Auschwitz.

Os instrumentos analíticos de Marx não estão ultrapassados.

Também a abordagem de Sergej Eisenstein me interessa muito. Esse diretor, audacioso e teimoso, não somente quis “cinematizar” O Capital, senão derrubar toda a arte cinematográfica e construí-la novamente. Suas propostas sobre “constelações visuais”, sua continuação da montagem (para além do que alcançara em seus próprios filmes), a inclusão de escritos e pensamentos, as sequências seriais e o tratamento com entretons e harmônicos, em suma: a modernidade de Eisenstein é útil para todos os temas do nosso tempo, não apenas para a filmagem do Capital.

Alexander Kluge

Textos
Notícias da Antiguidade ideológica Marx – Eisenstein – O Capital
Apresentação do filme por Alexander Kluge

Notas para um filme de O Capital
Por Sergei Eisentein

Percursos subterrâneos do Capital: uma entrevista com Alexander Kluge
Por Gertrud Koch

"Todas as coisas são pessoas enfeitiçadas" – anotações sobre Notícias da Antiguidade Ideológica de Alexander Kluge
por Christian Schulte

Marx and Montage
Por Fredric Jameson
Coopere, deixe semeando ao menos duas vezes o tamanho do arquivo que baixar.


As legendas para os trechos falados foram extraídas do DVD lançado no Brasil pela Versátil em parceria com o Goethe Institut, o Instituto de Tecnologia Social e o SESC-SP, revisadas e sincronizadas para o release ripado do DVD da filmedition suhrkamp. As legendas para os letreiros foram criadas por mim utilizando, com poucas modificações, a tradução muito boa feita para o DVD da Versátil. A Versátil, infelizmente, optou por traduzir os letreiros diretamente na tela, e não na legenda, o que impede o acesso ao texto original do filme. Este release postado tem os letreiros originais em alemão. A legenda dos letreiros acabou ficando com algumas entradas um pouco longas, mas foi o jeito que houve para encaixar nessas entradas a quantidade de texto que estava na tela e sendo falado ao mesmo tempo. De qualquer forma, são poucas perto do total.


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Jornalistas de Rebelión e Democracy Now! divergem sobre potencial das novas mídias

O espanhol Pascual Serrano, um dos criadores do site Rebelión, diz que movimentos que derrubaram ditadores em países árabes e seriam baseados em grupos online mudaram pouco a realidade desses países. Já Andrés Thomas Conteris, fundador do serviço em espanhol do site Democracy Now!, defende a força de movimentos como o Occupy Wall Street.


Foz do Iguaçu - É comum ouvir análises sobre a importância da internet e das redes sociais no sucesso de eventos políticos recentes, como a eleição do primeiro presidente negro dos Estados Unidos, Barack Obama, e as revoltas da primavera árabe que derrubaram ditadores na Tunísia e no Egito.

Ainda que reconheça o papel democratizador da rede global, o jornalista espanhol Pascual Serrano, um dos criadores do site Rebelión, contém seu entusiasmo. "As revoluções das redes sociais não mudaram nada nos Estados Unidos e nem nos países árabes", disse ele, com certa ironia, ao participar do 1º Encontro Mundial de Blogueiros, nesta sexta-feira (28). "É aquela história de mudar um pouco para não mudar nada no final", criticou.

O argumento de Serrano é que as novas mídias não são capazes de tratar de assuntos relevantes com profundidade e sem fragmentá-los. Seria o caso do twiter, com seus textos telegráficos, e do youtube, cujos vídeos têm entre três e quatro minutos, os quais perigosamente cruzariam a fronteira entre a informação e o entretenimento. "Há um caráter primário de política em tudo isso", afirmou.

O jornalista espanhol lembrou ainda que as redes sociais estão sob controle de grandes empresas, em geral norte-americanas, que podem fazer uso - e o fazem - da censura para retirar conteúdos políticos que julguem inapropriados. "A possiblidade de intoxicação e manipulação nas redes sociais é muito grande", apontou Serrano, que, no entanto, disse que é possível mudar o rumo dessa história.

Para isso, ele defendeu que as novas mídias adotem "rigor e verdade" como seus valores, denunciem o modelo de oligopólio que predomina no setor da comunicação mundial e invistam em uma nova geração de jornalistas com valores humanísticos. "Precisamos incorporar algumas coisas mesmo que não gostemos delas, porque os novos cenários de comunicação não estarão livres de controle", concluiu.

Contraponto
 
O jornalista Andrés Thomas Conteris, fundador do serviço em espanhol do site Democracy Now!, faz uma avaliação mais positiva sobre o potencial transformador das novas mídias. Segundo ele, que nasceu nos Estados Unidos e possui ascendência uruguaia, veículos alternativos como o Democracy Now! têm colaborado diretamente com movimentos alternativos anti-sistêmicos, do Cairo a Washington.

O exemplo mais recente seria o Occupy Wall Street, através do qual norte-americanos têm ocupado as ruas de várias cidades norte-americanas para protestar contra o sistema financeiro. Através da cobertura alternativa e das mídias sociais, esse movimento, que tem seu DNA nos jovens que tomaram a praça Tahir, no Egito, vem sendo copiado em diversos países do mundo, como Brasil e Alemanha.

Conteris destaca algumas qualidades que têm garantido o sucesso do Occupy Wall Street e suas variantes: há transparência nas ações; há independência de partidos, governos, empresas e corporações; a democracia participativa é exercida através de assembléias gerais; as ocupações são intensas e sem prazo para terminar; há horizontalidade, ou seja, não há chefes e hierarquia; e a visão política possui um caráter global.

"O povo está desempregado e perdeu sua casa, após as fraudes nos bancos. O que o movimento diz é que somos 99% e eles são só 1%, mas, ainda assim, estão no comando do sistema financeiro e são cúmplices dos crimes cometidos. Nós precisamos mudar isso", afirmou o jornalista.