quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Racismos, incêndios e ditaduras

  Tito Tricot   no CORREIO DA CIDADANIA

Os caminhos da memória são indissociáveis, como o canto das corujas nas noites sombrias de inverno. Não se sabe de onde vem, tampouco para onde se dirige aquele ulular obscuro e melancólico que parece buscar companhia, mas que, na verdade, apenas esconde os mistérios do universo na caverna do esquecimento. Porque os humanos não entendem a memória sem o esquecimento e aqueles no poder se encarregam de pouco a pouco nos recordar que é melhor esquecer do que revelar segredos da história que são seus próprios segredos.

Terríveis e ferozes são, como o medo de que se descubram e redescubram, escrevam e reescrevam, os racismos, incêndios, ditaduras das classes dominantes que de tanto ocultá-los terminaram por fazer muitos acreditarem que jamais existiram. Mas, apesar dos oligarcas de antigo ou novo signo, no barco da memória sempre viajam marinheiros irredutíveis que guardam ânforas de prata com lembranças dolorosas da barbárie daqueles que dizem ter construído a república em nome da civilização, ou que, um século depois, clamam ter restaurado a democracia em nosso país, instalando somente um regime militar, não uma ditadura. São os mesmos que chamam de terroristas os índios mapuche enquanto os assassinam à bala.

Mas chamemos as coisas pelo seu nome: aqui não há nada novo. Basta de enterrar a superfície de nossa historia para exumar aquilo que se pretendeu esconder por vergonha ou descaro. Entre eles, o racismo entronizado nas elites chilenas, que é de longa data e se transformou em ideologia e política pública desde as origens da república, que, aliás, nada teve de democrática. Pois teve um parlamento elitista, excludente e oligárquico que permitia que um reputado intelectual e político, como foi Benjamin Vicuña Mackenna, declarasse, referindo-se aos mapuche, que o índio era “... se não um bruto indomável, inimigo da civilização porque só adora todos os vícios em que vive submergido, a ociosidade, a embriaguez, a mentira, a traição e todo esse conjunto de abominações que constituem a vida selvagem...”.

Apesar de ter a delicadeza de assinalar que “a conquista não quer dizer sob nenhum conceito extermínio; e que é possível subjugar os indígenas sem matá-los”. O objetivo, sem dúvida, era se apropriar do território mapuche para – como propunha claramente o diário Mercurio em 1859 – “fazer das duas partes separadas de nossa república um complexo interligado; trata-se de abrir um manancial inesgotável de novos recursos em agricultura e mineração; novos caminhos para o comércio em rios navegáveis e passagens finalmente acessíveis sobre as cordilheiras dos Andes... enfim, trata-se do triunfo da civilização sobre a barbárie, da humanidade sobre a bestialidade”.

Nem para Vicuña Mackenna nem para o jornal El Mercurio importavam os mapuche, pelo contrário, constituíam um estorvo para o que consideravam o desenvolvimento e progresso chilenos. É o mesmo que aconteceu mais de um século depois, quando se fomentou a expansão da indústria florestal em território mapuche, acrescentando-se o despojo desse povo originário. Depois de tudo, como sustentou Juan Agustín Figueroa, ex-ministro da Agricultura da Concertação, deve-se reciclar os mapuches.

Assim como o lixo, supomos, como o desperdício ou a limpeza étnica, supomos, como a limpeza que se fez com suas terras para a instalação de colonos estrangeiros no século 19, porque o maior incêndio que se tem memória em nosso país não foi provocado pelos mapuche, turistas ou cidadãos comuns e contemporâneos, mas pelo Estado do Chile. Claro, porque a colonização do sul do país foi uma política de ocupação impulsionada pelo Estado com grandes recursos econômicos e institucionais. De fato, o presidente Manuel Montt designou Vicente Pérez Rosales como agente da Colonização de Valdivia e Llanquihue e esse último procedeu não somente em facilitar a chegada de alemães e outros imigrantes europeus, como também em arrasar o bosque nativo, incendiando a floresta valdiviana para “limpar” o território e torná-la apta à agricultura e usufruto dos europeus. Uma vez mais, não importou que ali habitassem os mapuche, que, imaginamos, contemplavam estupefatos como ardiam suas terras, lugares sagrados e espaços de reprodução cultural.

Os incêndios foram atos de terrorismo de Estado, como foram as violações dos direitos humanos verificadas no Chile durante a ditadura militar. Pela mesma razão, a mudança que o governo pretende realizar nos textos escolares para suprimir o termo ditadura e trocá-lo por regime militar não é algo inocente. É um perigoso giro ideológico que busca bloquear a memória e seguir escondendo os ferozes segredos das classes dominantes, como sempre fizeram.

Loreto Fontaine, coordenadora nacional da Unidade de Currículo e Avaliação do Ministério da Educação, sustentou que a “mudança é de índole mais geral. Não se refere só a uma palavra, mas a ensinar a pensar”. Ensinar a pensar o que?! Que não existiram os torturados, os assassinados, os presos, as mulheres estupradas, os desaparecidos? Que não se viveram e sobreviveram 17 anos de repressão e terror?

Pode ser que os caminhos da memória sejam sinuosos e que aqueles no poder tentem de qualquer maneira esconder seus segredos, mas no barco da memória sempre viajam marinheiros irredutíveis que conservam em suas vetustas lembranças a verdade oculta: que o Estado provocou mais incêndios que qualquer um; que o racismo aflora o tempo todo, seja em relação aos atuais e lamentáveis incêndios no sul contra a causa mapuche – sem prova alguma – ou na aplicação da Lei Anti-terrorista também contra os mapuche, simultaneamente pretendendo atingir a história recente, eliminando por decreto uma ditadura terrorista das salas de aula. Se é pra falar de racismos, incêndios e ditaduras, deve-se chamar as coisas pelos seus nomes.

Dr. Tito Tricot é sociólogo, diretor do Centro de Estudos da América Latina e Caribe (CEALC), Chile.

Tradução: Gabriel Brito, jornalista do Correio da Cidadania.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Jornalismo B lança projeto para financiar jornal



Alexandre Haubrich, do Jornalismo B, elaborou um projeto para financiar o jornal em 2012. Disponível no Catarse (site que busca financiamento para projetos culturais), o projeto, além de garantir a impressão dos jornais, quer viabilizar o pagamento do diagramador que até hoje trabalha gratuitamente e a contratação de um estagiário. O blog Jornalismo B nasceu em outubro de 2007, dedicando-se a “desconstruir o discurso anti-democrático da mídia dominante, com análises equilibradas e a defesa intransigente da democratização da comunicação”. Em maio de 2010 nasceu o Jornalismo B Impresso, com 500 exemplares quinzenais de distribuição gratuita, uma extensão do projeto do blog. O projeto de financiamento do Jornalismo B em 2012 pretende arrecadar R$ 13.500,00 até o dia 31 de março. Esse projeto merece apoio. Veja como fazer isso.

Diretor do Psicotropicus defende regulamentar as drogas no Brasil


Campanha do Psicotropicus para conscientizar a população carioca | Foto: Divulgação

Rachel Duarte no SUL21

Ao contrário do que se popularizou mundialmente sobre a descriminalização das drogas, particularmente a maconha, o país em que a legislação é mais liberal não é a Holanda. Segundo dados do Instituto Cato, de Massachusetts (EUA), a experiência de Portugal mostra-se mais bem sucedida. Além de ser o primeiro país europeu a abolir oficialmente todas as penas criminais para porte de maconha, cocaína, heroína e metanfetaminas, Portugal conseguiu reduzir em dez anos o consumo de drogas, o número de infectados pelo HIV e ampliar o número de dependentes em tratamento.
Na América Latina também tivemos avanços. Porém, no caso brasileiro há um atraso no tema e alguns retrocessos no período, na avaliação do psicólogo e diretor do Centro Brasileiro de Política de Drogas, Psicotropicus, Luiz Paulo Guanabara. Para ele, a atitude do governo federal deve ir além do enfrentamento da onda de crack do país.
Ele critica o programa ‘Crack, é possível vencer’, lançado no final de 2011 em parceria com a igreja evangélica e que irá destinar R$ 4 bilhões para tratamento de dependentes químicos, repressão do tráfico e crime organizado e prevenção ao consumo de drogas. “Está sendo uma inabilidade enfrentar o crack querendo curar as pessoas com Jesus. Não será lendo a bíblia todo dia que o usuário dependente de crack, porque nem todos que usam são dependentes, vai deixar de usar a droga”, critica.

Luiz Paulo Guanabara, diretor e fundador do Centro Brasileiro de Políticas de Drogas | Foto: Divulgação

Ele explica que o crack surgiu em substituição à cocaína e é a droga com menor consumo nos países da América Latina. “As pessoas não se injetam mais. Migraram da seringa de injeção de cocaína ou outras substâncias psicoativas para o crack, por ser uma droga com efeito imediato como a injeção na veia, mas sem o risco da seringa. Mas o nosso maior consumo são as drogas lícitas”, aponta.
Segundo o psicólogo, “o álcool e o tabaco são as drogas que mais causam problema de saúde pública e mortes, mas não são tratados com a mesma ênfase do que as drogas pesadas. Por outro lado, pessoas ainda estão sendo presas por porte de maconha como se fossem traficantes no Brasil”. Guanabara argumenta que o cárcere de usuários aumentou após a alteração da Lei de Drogas, no governo Lula. “Ela excluiu a pena ao usuário, mas permite a interpretação do policial sobre quem é usuário e quem é traficante”, afirma.
Diretor do Psicotropicus, que funciona há nove anos no Rio de Janeiro, Luiz Guanabara explica que a milícia é o principal elo da ‘cadeia alimentar’ das drogas. “Para o negócio ilícito de drogas existir, tem que a ver a sociedade da política, se não, não há. Quem não é preso por uso de droga não dá dinheiro para a polícia, ela prende quem usa. Principalmente se ele for pobre, preto e de baixa escolaridade”, denuncia.

Foto: Agência Brasil
Pedro Abramovay teria sido demitido por pedir flexibilização na punição ao porte de drogas | Foto: Agência Brasil

O enfrentamento ao tráfico de drogas no Brasil é outro ponto criticado pelo psicólogo. Desde 2006, quando se alterou a Lei de Drogas, aumentou em mais de 60% o número de presos por tráfico. Favorável à adequação deste brecha da lei, o advogado Pedro Abramovay foi demitido da Secretaria Nacional de Política sobre Drogas (Senad) no começo do governo Dilma.
“Ele falou uma verdade. Ele defendia que pessoas que não são violentas e são pegas com pequenas quantias de drogas não fossem para a cadeia. Um morador da zona sul do RJ nunca vai para prisão por estar com a mesma quantidade de droga que o pobre negro da favela. No México, por exemplo, a lei estipula que até tantas gramas configura usuário. Como não há esta delimitação no Brasil, fica na mão do policial. Pessoas com menos de 100 gramas de maconha e desarmadas vão parar na cadeia”, argumenta.

Regulamentar pode ser a saída

No debate sobre as políticas de drogas, os profissionais do Psicotropicus separam o joio do trigo e defendem a regulamentação das drogas de forma global. Segundo o instituto, por mais fama que a Europa tenha levado no consumo de maconha em coffes e comercialização para fins medicinais, a droga não é liberada em nenhum lugar do mundo. “O que acontece é que os países driblam as organizações internacionais”, afirma o psicólogo Luiz Guanabara.
De acordo com a Convenção Internacional de 1988, as drogas são classificadas em substâncias controladas, substâncias proibidas e substâncias proibidas sem valor medicinal. “A maconha inclusive configura na lista das sem valor medicinal, embora se saiba do potencial da planta há milênios e ela seja utilizada para estes fins em países andinos, por exemplo”, ressalta o psicólogo.
A regulamentação das drogas poderia, na avaliação de Guanabara, render ao Brasil resultados parecidos como os de Portugal, que descriminalizou a maconha em 2001. “Discriminalizou o uso e o porte para uso medicinal. Se permite o porte até cinco gramas. A Europa achou que não ia dar certo quando se começou a experiência de Portugal. Mas, contrariando a sanha punitiva dos que defendem que qualquer pessoa que usa droga tem que ser punida, lá se fez um ensaio de legalização para o usuário. Os resultados na diminuição da criminalidade e de causos de contaminação de HIV e diminuição de consumo são impressionantes”, afirma.

Em Portugal descriminalizar a maconha reduziu o HIV, as mortes e o consumo da droga

Drogas injetáveis não mais tão usadas na América Latina. O maior consumo são as drogas licitas | Foto: Divulgação

Portugal teve alguns dos mais altos níveis de uso de drogas pesadas na Europa. No entanto, relatório do instituto norte-americano Cato, divulgado em 2010, sugere o contrário. De acordo com o estudo, cinco anos após o porte de drogas ser descriminalizado, o uso de drogas ilícitas entre os adolescentes em Portugal diminuiu, e as taxas de novas infecções por HIV causada por compartilhamento de seringas contaminadas caíram, enquanto o número de pessoas que procuram tratamento para dependência química mais do que duplicou.
Na sequência da descriminalização, Portugal teve a menor taxa de uso de maconha durante a vida em pessoas com mais de 15 anos (considerando a na UE): 10%. O cenário mais próximo disso nos Estados Unidos é em pessoas acima de 12 anos: 39,8%. Proporcionalmente, mais norte-americanos usaram cocaína durante a vida do que Português usaram maconha.
O relatório do Cato informa que entre 2001 e 2006, as taxas de uso durante a vida de qualquer droga ilegal entre os estudantes do ensino médio caiu de 14,1% para 10,6%, e a mesma queda se registrou entre os adolescentes mais velhos. O consumo de heroína entre 16 a 18 anos de idade caiu de 2,5% para 1,8% (embora tenha havido um ligeiro aumento no consumo de maconha nesta faixa etária). Novas infecções pelo HIV em usuários de drogas caíram 17% entre 1999 e 2003, e as mortes relacionadas com a heroína e drogas similares caíram pela metade. Além disso, após a descriminalização, o dinheiro economizado com as sanções aos usuários permitiu aumentar o financiamento do tratamento livre de drogas.
O estudo de caso em Portugal já desperta interesse aos parlamentares dos EUA. Quatro estados norte-americanos estão pressionando o governo de Barack Obama para mudar a política linha-dura de drogas do país. Hoje, os EUA apenas apoiam acordos internacionais que impõem a proibição das drogas e impõe aos seus cidadãos, as mais duras sanções do mundo por posse e venda de drogas. “Não sabemos como será o mundo com a regulamentação das substâncias proibidas. A população fica com medo do que irá acontecer quando regulamentar. Será que vão todos correr atrás das drogas quando liberar? Pode haver um acréscimo na maconha, mas enquanto for novidade. Depois irá se equilibrar. Tem que haver restrições severas como com o tabaco e muita campanha educativa e de orientação sem relação ao consumo”, sugere.

Terceirização do trabalho

Marcio Pochmann

A terceirização do trabalho expressa uma das maiores alterações no modo de produção e distribuição de bens e serviços verificados durante a passagem para o século XXI nas economias capitalistas. Mesmo assim, preponderam diferenças importantes e inegáveis no movimento geral de terceirização do trabalho entre países.
Nas economias desenvolvidas, por exemplo, a terceirização do trabalho resulta, muitas vezes, da opção patronal pela ampliação dos ganhos de produtividades. A partir da adoção de novos meios de gestão da mão de obra e incorporação tecnológica, o processo produtivo passou a ser crescentemente compartilhado por um conjunto de diversas empresas que subcontratam seus empregados. Nos países não desenvolvidos, a terceirização do trabalho expandiu-se mais recentemente. A principal motivação do processo de terceirização tem sido geralmente a busca da redução do custo do trabalho como mecanismo de maior competitividade e ampliação da margem de lucro diante da exposição do setor produtivo à concorrência internacional. Em função disso, a terceirização apresenta predominantemente a modalidade de contratações de trabalhadores com remuneração e condições de trabalho inferiores aos postos de trabalho anteriormente existentes e aos equivalentes não submetidos à subcontratação da mão de obra.
Para o Brasil, a terceirização do trabalho ganhou importância a partir dos anos 1990, coincidindo com o movimento de abertura comercial e de desregulamentação dos contratos de trabalho. Ao mesmo tempo, a estabilidade monetária alcançada a partir de 1994 vigorou associada à presença de ambiente competitivo desfavorável ao mercado interno. Ou seja, baixo dinamismo econômico, com contida geração de empregos em meio a taxa de câmbio valorizada e altas taxas de juros. Frente ao desemprego crescente e de ofertas de postos de trabalho precários, as possibilidades de atuação sindical exitosas foram diminutas, ao mesmo tempo em que ocorria a expansão de políticas de desregulação do mercado de trabalho.
Hoje, o trabalho terceirizado perdeu importância relativa no total do emprego formal gerado no Brasil, embora seja crescente a expansão absoluta dos postos de empregos formais. Por ocupações de menor remuneração e maior descontinuidade contratual, os empregos terceirizados atendem fundamentalmente a mão de obra de salário de base. Desta forma, as ocupações geradas em torno do processo de terceirização do trabalho tendem a se concentrar na base da pirâmide social brasileira. O uso da terceirização da mão de obra tem se expandido fundamentalmente pelo setor de serviços, embora esteja presente em todos os ramos do setor produtivo.
Em síntese, a terceirização do trabalho transformou-se num dos principais elementos de modificação do mundo do trabalho, capaz de equivaler quase a uma reforma trabalhista, visto que o país não passou por uma reforma trabalhista de corte neoliberal, conforme verificado em outros países. Mesmo assim, várias ações em direção à desregulamentação do mercado de trabalho foram adotadas, especialmente nos anos 1990, quando as políticas neoliberais estiveram em maior evidência no país. Por conta disso, o país registrou quatro trajetórias distintas durante os últimos 25 anos na dinâmica da terceirização do trabalho. A primeira, observada durante a década de 1980, expressou o movimento de focalização de atividades especializadas. Em geral, a terceirização da mão de obra correspondeu à externalização de partes das atividades que anteriormente eram realizadas, sobretudo nas grandes empresas privadas estrangeiras. A internalização de novos métodos de organização da produção e gestão da força de trabalho adotada originalmente nas economias desenvolvidas permitiu que a taxa de terceirização fosse crescente. Entre 1985 e 1990, a taxa de terceirização do emprego formal no estado de São Paulo passou de 11,7% para 58,2% do saldo líquido das ocupações geradas a cada ano.
Com a recessão econômica no início dos anos 1990, concomitante com os fracassos dos planos de estabilização monetária e abertura comercial, a dinâmica da terceirização da mão de obra como mecanismo de modernização das grandes empresas perdeu sentido. O corte generalizado do emprego em um contexto de altas taxas de inflação permitiu ao setor patronal encontrar ajustes de custos alternativos à terceirização de mão de obra. Entre 1990 e 1995, por exemplo, a taxa de terceirização no estado de São Paulo decresceu, de 58,2% para 8,9% do saldo total líquido de postos de trabalho formais abertos.
Além da estabilização monetária a partir do Plano Real, com impacto inegável na redefinição da estrutura de preços e competição no interior do setor produtivo, teve importância o Enunciado 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que definiu os setores cabíveis da terceirização da mão de obra, e concedeu segurança jurídica às empresas. Em virtude disso, a trajetória da contratação de empregados formais entrou na sua terceira dinâmica. Por consequência, a taxa de terceirização registrou elevação inédita, passando de 8,9% a 97,6% do saldo líquido dos empregos gerados no estado de São Paulo entre 1995 e 2002. Desta forma, o movimento de terceirização da mão de obra que até então se encontrava relacionado ao interesse das grandes corporações transnacionais passou a ser difundido no conjunto das empresas em operação no Brasil.
Pelas condições da estabilidade monetária, alcançada com altas taxas de juros reais e valorização do real, as condições de competição interempresarial tornaram-se mais acirradas. A redução do custo do emprego da força de trabalho estimulou o crescimento da terceirização, inclusive no aparecimento de empresas sem empregados. A quarta dinâmica na trajetória da contratação de empregos formais ganhou importância desde o início da década de 2000, com a queda na taxa de terceirização. Entre 2000 e 2010, a taxa de terceirização passou de 97,6% para 13,6% do saldo líquido de empregos formais constituído no estado de São Paulo.
Este artigo é parte integrante da edição 104 da revista Fórum.

Os abusos de um programa cretino e imbecil...


Ela bebe até cair, ele abusa dela e a sua família assiste



Vejamos do que se trata o caso. A garota e o rapaz participam de uma festa televisionada para dezenas de milhões de brasileiros. Durante a transmissão, vão entornando litros incontáveis de álcool. Previsivelmente, com a autocensura entorpecida, moça e rapaz atendem ao chamado da natureza e trocam beijos e carícias sem se importar com quem estiver assistindo.
O interessante desse caso do integrante do programa Big Brother que está sendo acusado de fazer sexo com uma “sister” alcoolizada e supostamente desacordada é que nem bem termina o programa (que vai para a tevê aberta) e todos já correm para a tevê a cabo para verem o previsível desenrolar da insinuação de sexo, agora sem censura.
Como o programa vai para a tevê aberta, todos sabem o que procurar no You Tube e nas redes sociais, blogs etc. Os modernos celulares, no dia seguinte, já estão reproduzindo o vídeo do suposto estupro, mas não só. Antes, todos viram a situação que levou a moça a supostamente ser abusada, ou seja, ela ter bebido até cair em um lugar cheio de gente desconhecida.
Passei o dia lendo ou ouvindo discutirem se essa moça “pediu” ou não pelo abuso e se o suposto abusador deveria ou não ser expulso do programa ou até sofrer sanções legais caso fique comprovado que fez sexo com ela sem que a mesma estivesse em condições de decidir se queria ou não, já que tomara álcool em quantidade exagerada.
Diante disso, a ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres, Iriny Lopes, oficiou ao Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro para que tome “providências” contra o suposto abuso sexual devido a “demandas encaminhadas por cidadãs de várias cidades brasileiras à Ouvidoria da SPM, pedindo providências”.
Ótimo. A lei considera crime fazer sexo com alguém desacordado, mesmo que antes essas pessoas tenham trocado beijos e carícias íntimas. Mas fiquei me perguntando por que ninguém reclamou com o governo ou com alguma instância qualquer por essa safadeza toda ter começado na tevê aberta e instigado até crianças a acompanharem seu desenrolar.
Detalhe: conheço ao menos duas meninas de dez anos que já sabem de tudo mesmo sem ter assistido ao programa no dia, porque viram tudo na escola no dia seguinte.
Se fosse só sexo, vá lá. Mas aquelas jovens serem postas em situação de vulnerabilidade pela oferta de álcool que o programa fez e, assim, tornarem-se presas fáceis para um bando de “garanhões” igualmente irresponsáveis e alcoolizados e isso tudo ser servido à sociedade, tenho certeza de que em qualquer país civilizado seria considerado uma afronta.
A glamourização da bebedeira e do sexo irresponsável e o decorrente abuso de vulnerável na tevê são exatamente o que precisa um país campeão de gravidez precoce, de desastres de trânsito causados por condutores alcoolizados e de tudo mais que condutas como a que o Big Brother estimula causam. E a sua família vendo isso na tevê, na internet ou no boca a boca.
Mas disso ninguém reclama. Até porque, como não há regulamentação da mídia no Brasil, não há a quem reclamar.

Religiões afro-brasileiras preparam direito de resposta coletivo contra TV Record

SUL21

No final de 2011, entidades afro-brasileiras foram autorizadas pelo Ministério Público a produzir um vídeo com um direito de resposta coletivo a uma reportagem veiculada pela TV Record. O vídeo ainda não foi exibido no ar, pois a emissora recorreu da decisão – mas encontra-se disponível online, podendo ser assistido no YouTube. Entre os entrevistados no vídeo, estão Iran Castelo Branco, do movimento Mídia Pela Paz, representantes do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT) e do Instituto Nacional da Tradição e Cultura Afro-Brasileira (INTECAB), além do professor Laurindo Leal Filho, da ECA-USP. Assista o vídeo abaixo, que traz cerca de 15mins dos 60mins de duração do direito de resposta.


segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Cpers critica concurso por não resolver déficit de pessoal no magistério do RS

Correio do Povo

Rejane de Oliveira voltou a cobrar do governador Tarso Genro que cumpra a lei do piso nacional da categoria

A realização de concurso público para o magistério não estancou as criíticas do Cpers Sindicato ao governo Tarso Genro. A abertura das inscrições para preencher 10 mil vagas ocorre nesta segunda-feira. A presidente do sindicato frisou que, em campanha, a promessa assinada por Tarso em documento era de um primeiro concurso, ainda no segundo semestre de 2011, e também para servidores de escola. Rejane de Oliveira ponderou que somente o déficit de professores é de 33 mil, somando 26 mil contratos emergenciais e mais uma falta de 7 mil em disciplinas dos ensinos médio e fundamental.

Mas a principal argumentação do Cpers para atacar o Piratini segue sendo o não cumprimento do piso nacional da categoria. Assim que retornou das férias, o governador deu coro à justificativa do secretário da Casa Civil. Carlos Pestana declarou que para adotar a medida até o final do mandato é preciso alterar o indexador de reajuste para o INPC. Hoje, o Fundeb é usado como indexador para o aumento do piso. Em 2012, os valores do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica terão 22% de acréscimo, enquanto o INPC variou 6,5%. Rejane ironizou dizendo lembrando que governador quer alterar a Lei criada por ele mesmo, quando ocupava o cargo de ministro da Educação.

O secretário da Fazenda, Odir Tonollier, ressaltou, ao longo da semana, que a média dos índices do Fundeb torna inviável o pagamento do piso até 2014. A expecativa do Palácio Piratini é aguardar o término do recesso parlamentar, em Brasília, para a votação de um projeto que muda o indexador para o INPC. Conforme o resultado em plenário, até o início do ano letivo, o governo do Estado leva uma proposta aos professores.

O Cpers marcou para esta semana a segunda etapa de campanha contra o governo, que também pode envolver outdoors. Na sexta-feira uma nova reunião do conselho do sindicato estabelece as ações para confrontar o governo em fevereiro e as vésperas do começo das aulas. "Se não houver evolução, a volta às salas de aula nas escolas gaúchas não será de forma acomodada pelos professores", alertou a presidente do Cpers.

Concurso mantém prazo de inscrições aberto até três de fevereiro

Termina em três de fevereiro o prazo para que os interessados em participar do Concurso do Magistério gaúcho façam a inscrição, exclusivamente pela internet, no Formulário Eletrônico específico disponível no site da Fundação para o Desenvolvimento e Recursos Humanos (FDRH): www.fdrh.rs.gov.br.

O custo da inscrição é de R$ 121,70 (nível superior) e R$ 53,38 (nível médio). O pagamento da taxa deve ser feito até 6 de fevereiro, por meio de boleto bancário.

O concurso abre 10 mil vagas, com nomeação a partir de julho. A expectativa é de que a seleção ocorra entre março e abril e a intenção da Secretaria da Educação é de que os nomeados sejam convocados ainda em 2012. O salário inicial para 40 horas é, hoje, de R$ 790, ainda que o piso nacional do magistério, sem a correção anual, seja de R$ 1.187.

Novidades
Dez por cento das vagas serão destinadas a candidatos com deficiência e 18% para negros. Outra novidade em relação às provas é que, neste concurso, elas serão por disciplinas e por áreas de conhecimento.

Também diferentemente dos concursos anteriores, os candidatos não se habilitarão para uma cidade, e sim para a abrangência da Coordenadoria Regional de Educação (CRE). Ou seja, ao se inscrever, o candidato a professor da rede estadual escolhe a CRE onde pretende atuar.

Além disso, o concurso prevê a nomeação de professores para educação indígena.

Provas
O Concurso é constituído de duas provas objetivas, de caráter eliminatório, e de prova de títulos, de caráter classificatório, de acordo com o cargo pretendido. A validade é de dois anos, podendo ser prorrogada por outros dois.

Áreas
As vagas previstas se dividem entre as seguintes áreas: Linguagens e suas Tecnologias; Matemática e suas Tecnologias; Ciências da Natureza e suas Tecnologias; Ciências Humanas e suas Tecnologias, Educação Básica: etapas e modalidades; e Educação Profissional e suas Tecnologias.

Serra comprou livros da PRIVATARIA TUCANA e não tem onde colocar...

Via Campesina: usurpação de terras é um fenômeno global promovido pelas elites


Leia declaração final da conferência dos movimentos da Via Campesina, realizada entre 17 a 19 de novembro de 2011, em Nyeleni.

Declaração da Conferência : Parar a usurpação de terras, Já!

Nós, camponeses e camponesas, pastores, povos indígenas e nossos aliados reunidos em Nyeleni de 17 a 19 de Novembro de 2011, viemos de todos os cantos do mundo para partilhar, pela primeira vez, nossas experiências de luta contra a usurpação de terras.
Há um ano atrás apoiamos o Apelo de Kolongo das organizações camponesas de Mali que foram lideres na organização da resistência local contra apropriação de terras camponesas em África. Viemos agora a Nyeleni em resposta ao Apelo de Dakar, que convoca a criação de uma aliança global contra a usurpação de terras, pois estamos decididos a defender a soberania alimentar, os bens comuns e o direito aos recursos naturais dos/as produtores/as de alimentos em pequena escala.
No Mali, o governo comprometeu- se a entregar 800 mil hectares de terra a investidores empresariais. Trata- se de terras que têm pertencido às comunidades durante gerações, inclusive séculos, enquanto o Estado do Mali existe desde apenas os anos 1960. esta situação se verifica em muitos outros paises onde os direitos consuetudinários não são reconhecidos. Despojar as comunidades de suas terras é uma violação de seus direitos históricos.
O acesso seguro e o controle da terra e os recursos naturais estão estreitamente ligados ao usufruto dos direitos consagrados na Declaração Universal dos Direitos Humanos- e em outros tratados regionais e internacionais- tais como o direito à livre-determinação, o direito a um padrão adequado de vida, à moradia, à alimentação, à saúde, à cultura, à propriedade e à participação.
Constatamos com grande preocupação que os Estados não estão cumprindo com as suas obrigações a este respeito e colocam os interesses de negócios por cima dos interesses dos povos.
A usurpação de terras é um fenômeno global promovido pelas elites e os investidores locais, nacionais e transnacionais, bem como pelos governos, com o objetivo de controlar os recursos mais valiosos do planeta. As crises alimentares, financeiras e climáticas globais ocasionaram um aperto entre investidores e governos ricos por adquirir e apropriar- se de terras e recursos naturais já que estes são os únicos portos a salvo que restam para garantir rendimentos financeiros. Os fundos de pensões e outros fundos de investimento transformaram- se em poderosos actores na usurpação de terras, ao mesmo tempo que continua havendo guerras pela apropriação do controle das riquezas naturais.
O Banco Mundial e os bancos regionais de desenvolvimento estão facilitando a usurpação de terras e da água ao promoverem políticas e leis convenientes às corporações empresariais, ao facilitarem o acesso a capital e garantias para os investidores e ao fomentarem um modelo de desenvolvimento econômico extrativo e destrutivo. O Banco Mundial, o FIDA, a FAO e a Conferência da ONU sobre Comércio e Desenvolvimento propuseram sete princípios que legitimam a usurpação de de terras por parte de empresas comerciais e estados investidores. Dirigida por várias das maiores corporações transnacionais, a Aliança pela Revolução Verde na África visa a transformar a agricultura camponesa em agricultura industrial e a integrar os/as camponeses/as às cadeias globais de valor assim aumentando em grande medida sua vulnerabilidade ao despojo de terras.
A usurpação de terras vai além das estruturas imperialistas tradicionais Norte- Sul; as corporações transnacionais podem ter suas sedes nos Estados Unidos, Europa, Chile, México, Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Tailândia, Malásia e Coréia do Sul, entre outros países.
As terras estão sendo açambarcadas na Ásia, África, Américas e Europa para a agricultura industrial, as plantações de árvores, a mineração, os projetos de infraestruturas, as represas, o turismo, os parques naturais, a indústria, a expansão urbana e as finalidades militares. Povos indígenas e minorias étnicas estão sendo expulsas de seus territórios por forças armadas, aumentando sua vulnerabilidade e em alguns casos inclusive resultando em sua escravização. As falsas soluções de mercado à mudança climática estão criando novas formas de alienar as comunidades locais de suas terras e recursos naturais.
Apesar de as mulheres produzirem a grande maioria dos alimentos no mundo e de serem responsáveis pelo bem- estar familiar e comunitário, as estruturas patriarcais existentes continuam provocando que elas sejam despossuidas das terras que cultivam e de seu direito aos recursos. Levando em consideração que a maioria das camponesas não têm direitos à terra garantidos e legalmente reconhecidos, estão particularmente expostas a sofrer despejos.
A luta contra a usurpação de terras é uma luta contra o capitalismo, o neoliberalismo e contra um modelo econômico destrutivo. Os testemunhos de nossas irmãs e irmãos da África do Sul, Brasil, Burkina Fasó, Colômbia, França, Gana, Guatemala, Guiné Bissau, Honduras, Índia, Indonésia, Mali, Mauritânia, Moçambique, Nepal, Níger, República Democrática do Congo, Senegal, Tailândia e Uganda nos mostraram como a usurpação de terras ameaça a agricultura familiar em pequena escala, a natureza, o meio ambiente e a soberania alimentar. A usurpação de terras desloca e espalha as comunidades, destrói as economias locais e o tecido sócio- cultural e coloca em perigo as identidades das comunidades, sejam de camponeses/as, pastores/as, pescadores/as artesanais, trabalhadores/as, dalits ou povos indígenas.
Aqueles que se erguem para defender seus direitos estão sendo espancados, presos e assassinados. Não há forma de mitigar os impactos deste modelo econômico e as estruturas de poder que o promovem. Nossas terras não estão à venda nem para serem arrendadas.
Mas não estamos vencidos. Através da organização, a mobilização e a unidade em nossas comunidades, fomos capazes de deter a usurpação em muitos lugares. Além disso, nossas sociedades reconhecem cada vez mais que a agricultura familiar e a produção de alimentos em pequena escala é o modelo mais sustentável do ponto de vista econômico, social e ambiental de usar recursos e garantir o direito à alimentação para todos/as.
Lembrando o apelo de Dakar, reiteramos nosso compromisso a resistir ao açambarcamento de terras com todos os meios possíveis, a apoiar a todos aqueles e aquelas que lutam contra as usurpações de terra e a exercer pressão sobre os governos nacionais e as instituições internacionais para que cumpram suas obrigações com os direitos dos povos. Comprometemo-nos especificamente a:
-Organizar as comunidades rurais e urbanas contra todas as formas de usurpação de terras.
-Fortalecer as capacidades de nossas comunidades e movimentos para reclamar e defender nossos direitos, terras e recursos.
-Reclamar e garantir os direitos das mulheres em nossas comunidades à terra e aos recursos naturais.
-Conscientizar a opinião pública sobre como a usurpação de terras está causando uma crise para a sociedade.
-Construir alianças entre diferentes sectores e regiões, e mobilizar nossas sociedades para parar a usurpação de terras.
-Fortalecer nossos movimentos para conseguir e promover a soberania alimentar e uma autêntica reforma agrária.
Para realizar estes compromissos, vamos desenvolver as seguintes acções:
-Quanto à capacitação para organizar a resistência local:
• Informar nossas comunidades das discussões e compromissos desta Conferência.
• Construir nossas próprias fontes de informação sobre a usurpação de terras por meio de documentação de casos, compilação de informação relevante e de provas sobre processos, actores, impactos de açambarcamento de terras.
• Garantir que nossas comunidades recebam a informação que precisam quanto a seus direitos, as leis, as empresas, os contratos, etc., de maneira que possam resistir mais efetivamente aos investidores e os governos que tratem de despossui-las de suas terras.
• Estabelecer sistemas de alerta antecipada para prevenir as comunidades sobre os riscos e ameaças.
• Fortalecer nossas comunidades através da formação política e técnica, e recuperar nosso orgulho de ser produtores/as e fornecedores/as de alimentos especialmente entre os jovens.
• Promover os direitos das mulheres à terra e aos recursos naturais conscientizando nossas comunidades e movimentos sobre a importância de respeitar e proteger os direitos das mulheres à terra especialmente em sistemas consuetudinários de posse.
• Desenvolver e usar os meios de comunicação locais para organizar os membros de nossas comunidades e de outras, e compartir com eles informação sobre a conçentração de terras.
• Fazer que nossos dirigentes cumpram as normas estabelecidas por nossas comunidades e os obrigar a que prestem contas diante de nós, nossas comunidades e organizações.
-Quanto ao utilização da assistência jurídica em nossa defesa:
• Desenvolver nossos próprios sistemas de assistência jurídica e colaborar com expertos jurídicos e em direitos humanos
• Rejeitar todas as formas de violência e criminalização de nossas lutas e mobilizações pela defesa de nosso direitos.
• Trabalhar pela liberação imediata de todas as pessoas presas por causa de suas lutas em defesa das terras e dos territórios; realizar urgentemente campanhas de solidariedade com todas as pessoas vítimas de conflitos.
-Quanto à advocacia e à mobilização:
• Institucionalizar o dia 17 de abril como o dia global da mobilização contra a usurpação de terras; identificar outras datas adicionais de mobilização para defender a terra e os bens comuns.
• Elaborar nossos argumentos políticos para pôr em evidência e desacreditar o modelo econômico que fomenta a usurpação de terras, bem como os diferentes actores e iniciativas que o promovem e o tentam legitimar.
• Estabelecer um Observatório Popular sobre açambarcamento de terras para facilitar a compilação de informações, comunicações, planos de ação, advocacia, pesquisa e análise.
• Promover os direitos das mulheres através de programas de redistribuição específicos para mulheres e outras medidas. Promover leis e políticas que respondam às necessidades das mulheres.
• Construir alianças estratégicas com a imprensa e os meios de comunicação.
• Levar nossas mensagens e reivindicações a nossos deputados, governos e instituições internacionais. Continuar envolvidos no Comitê de Segurança Alimentar Mundial e exigir que seus processos, como o das Diretrizes da FAO sobre governança da terra, a pesca e as florestas contribuam realmente a proteger e promover os direitos à terra e os recursos naturais dos/as fornecedores/as de alimentos em pequena escala.
• Identificar e enfatizar em nível local, nacional e internacional os espaços para a acção, a mobilização e a construção de uma ampla resistência social á usurpação de terras.
• Planear acções de protesto contra corporações (incluindo corporações financeiras), o Banco Mundial e outros bancos multilaterais de desenvolvimento que se beneficiam e incentivam a usurpação de terras e recursos naturais. Manter oposição aos esquemas de auto-regulação do sector privado tais como os princípios RAI do Banco Mundial.
• Expandir e fortalecer nossas ações para conseguir e promover a soberania alimentar e uma autêntica reforma agrária, o reconhecimento dos sistemas consuetudinários sempre que salvaguardem os direitos das mulheres e a realização dos direitos dos/as jovens à terra e aos recursos naturais.
• Apoiar o controle dos povos de seus recursos naturais através de ocupações de terras, ocupações das empresas e corporações investidoras, protestos e outras acções de mobilização de massas para reclamar seus bens comuns.
• Exigir a nossos governos que cumpram com suas obrigações de direitos humanos, que cessem imediatamente a transferência de terras e recursos naturais a investidores empresariais, que cancele os contratos realizados, restituam as terras saqueadas e protejam as comunidades rurais e urbanas da usurpação actual e qualquer açambarcamento que vier a ocorrer.
-Quanto à construção de alianças:
• Construir redes e alianças fortes de organizações em todos os níveis- local, regional e internacional- com base no Apelo de Dakar e colocando os/as produtores/as e fornecedores/as de alimentos no centro das alianças.
• Forjar alianças com membros dos fundos de pensões para evitar que estes fundos invistam em projetos que resultem em usurpação de terras.
• Estabelecer alianças estratégicas com a imprensa e os meios para que transmitam fielmente nossas mensagens e realidades. Refutar os preconceitos difundidos pela imprensa dominante a respeito da luta pela terra e a reforma agrária em Zimbabwe.
Fazemos um apelo a todas aquelas organizações comprometidas com estes princípios e acções para que se unam a nossa Aliança Global contra a Usurpação de Terras que hoje de forma solene lançamos aqui em Nyeleni.
Globalizemos a luta! Globalizemos a esperança!

Um olhar sobre Havana

Do sitio da Luciana Genro em sua visita a Cuba


Cuba é um país complexo. Não é fácil, portanto, emitir uma opinião equilibrada, não  maniqueísta. Em geral as paixões  nos cegam. Quem é socialista, como eu, fica com o estômago virado ao ouvir os profetas do capitalismo, aqueles que endeusam  a sociedade consumista, abissalmente desigual e  superficial, atacarem Cuba. Eles criticam a falta de democracia em Cuba, mas nunca criticam a democracia dos ricos, onde as eleições são a festa dos endinheirados. Enchem a boca para falar que os cubanos “não podem nem comprar um tênis Nike”, mas não falam dos meninos que matam e morrem  por um tênis Nike nas terras da democracia do capital. Se horrorizam com a pena de morte em Cuba, mas não se importam com as execuções sumárias protagonizadas pelas milícias e pelas polícias nos países onde impera o “devido processo legal”.
Começo, então, dizendo que  ao falar de Cuba não tolero o fanatismo, nem um nem outro. Aqui quero apenas dividir as impressões que tenho sobre esta pequena ilha,  onde há pouco mais de 50 anos aconteceu uma revolução que até hoje mobiliza corações e mentes.
(O Museu da Revolução, que conta a história desta luta)

Cuba  conquistou sua soberania pela força da mobilização do seu povo. Os que acham que foi um “bando de barbudos” que pegaram em armas  e tomaram o poder não conhecem a história. A vitória da guerrilha de Fidel e Che Guevara foi o coroamento de uma luta de massas que derrubou uma ditadura sangrenta que fazia do país o quintal de recreação da burguesia americana, à custa da pobreza extrema dos cubanos. Por isso esta revolução ainda é reivindicada pelo povo. Mesmo quem critica o regime  sabe que a revolução cumpriu um papel fundamental para a libertação do país.
( Representação de Che Guevara e Camilo Cienfuegos durante a guerrilha, no Museu da Revolução)

Uma pequena ilha desafiou o império americano a poucos quilômetros da sua Costa e até hoje ele não conseguiu subjugá-la. Além do bloqueio econômico dos EUA, que Obama mantém, até os anos 90 Cuba ainda sofria  atentados terroristas promovidos por organizações  de ultradireita de cubanos que vivem em Miami, com a complacência de todos os presidentes que passaram pela Casa Branca. Sobre isso, leitura obrigatória é o livro de Fernando Morais, “Os últimos soldados da guerra fria”, que conta esta história de forma magistral.
( o Bar La Bodeguita Del Medio, que foi alvo de atentado terrorista na década de 90)

Depois do fim da URSS a situação econômica de Cuba piorou terrivelmente. Não conheci a Cuba de antes, mas hoje a miséria anda nas ruas e contrasta com a opulência ostentada pelos turistas, que inclusive utilizam  outra moeda para consumir o que é inacessível ao cidadão nacional. O que um turista paga por uma refeição em um restaurante médio equivale ao salário de um mês inteiro de um cubano, ou mais, dependendo da profissão.   É verdade que  o abismo entre ricos e pobres que vivemos no capitalismo não existe entre os cubanos, mas ele revela-se de forma cruel no contraste entre a capacidade de consumo dos  cubanos versus  a dos turistas.
( A pobreza  que contrasta com os belos restaurantes freqüentados pelos turistas)

O governo ensaia medidas de “abertura”  capitalista  que só farão piorar a situação. O plano é demitir 500 mil funcionários públicos, permitindo que eles abram pequenos negócios por conta própria, que hoje já são autorizados. Um PDV piorado, pois não há notícia sequer de uma indenização a ser recebida na demissão.

( os pequenos e pobres negócios “por cuenta propia”)

As glórias da revolução não anulam um fato que é claro como o dia: a população não tem canais de expressão. A direção do Partido Comunista Cubano é uma burocracia fossilizada que mantém a política interditada no país. Quem diverge é tratado como traidor e enquadrado como agente imperialista. Se eles lessem este meu relato eu possivelmente  seria assim qualificada.

 
(Capitólio, sede do Parlamento, que só tem sessões duas vezes por ano)

Pois finalizo reiterando as minhas convicções socialistas, reivindicando a revolução russa, chinesa, cubana… e a minha aversão aos burocratas ditos comunistas que desfiguraram o projeto comunista, que na tradição marxista registrada  no Manifesto escrito por Marx e Engels é um projeto de igualdade, solidariedade e libertação de toda a exploração e opressão, seja ela exercida pela burguesia ou pela burocracia.

 
(Na Praça da Revolução, Viva Che Guevara!!)