sexta-feira, 23 de março de 2012

A EXTREMA DIREITA E OS ATENTADOS NA FRANÇA

Mauro Santayana



A polícia francesa se encontrava, na noite de ontem, mobilizada a fim de identificar o homem que matou quatro pessoas, entre elas três crianças, e feriu outras, em uma escola judaica de Toulouse. Houve, tanto em França, como em Israel, preocupação em culpar os demônios do momento, ou seja, os “terroristas muçulmanos”. Antes de qualquer manifestação das testemunhas, os meios de comunicação e os porta-vozes oficiais quiseram inculpar os islamitas. Coube aos próprios policiais relacionar o atentado contra a escola judaica de Toulouse à morte de dois paraquedistas franceses, e graves ferimentos em dois outros, na mesma região, nestes mesmos dias, e de forma semelhante.
O detalhe que Tel Avive esqueceu: os dois paraquedistas mortos em Montauban, a 40 quilômetros ao norte de Toulouse, quinta-feira passada, eram muçulmanos, do norte da África: Abel Chenouf e Mohamed Legouard. Um terceiro muçulmano, Imad Ibn Ziaten também militar e igualmente paraquedista, fora alvejado na mesma cidade de Toulouse, no domingo anterior. Em todos os atentados, o assassino usava uma motocicleta. A arma que matou os soldados franceses é do mesmo calibre da que foi usada na escola judaica, ontem pela manhã. Apesar disso, há ainda quem tente atribuir os dois atentados aos muçulmanos. Quando examinamos os fatos com ódio, ou com leniência, é difícil ver as coisas em sua clareza. E há quem atribua os crimes aos muçulmanos em razão de seu próprio e calculado interesse.
Tudo é possível, em atos semelhantes, mas os primeiros indícios relacionam a brutalidade do matador de crianças judaicas à rearticulação da extrema direita racista na Europa de hoje. O atentado de Toulouse lembra - ainda que o número de vítimas tenha sido menor - a chacina da Noruega, plenamente assumida por um neonazista. As elites européias repetem os mesmos movimentos econômicos, políticos e culturais que promoveram, nos anos 20 e 30, o nazifascismo no continente, com os resultados conhecidos. Quando perceberam que Hitler tinha seu próprio projeto de ditadura universal, era quase tarde. Só a resistência desesperada dos russos, na defesa de sua pátria, pôde conte-los e empurra-los de volta a Berlim, onde foram vencidos. É de se ressaltar, também, o heróico sacrifício dos ingleses, durante os ataques aéreos sistemáticos a Londres e a outras cidades.
Os novos nazistas são os velhos nazistas e já não se inibem em manifestar-se. Um membro do SPD, Thilo Sarrazin, nascido no mesmo ano da derrota alemã, 1945, publicou violenta proclamação racista contra os muçulmanos - por ironia, seu sobrenome, vindo do francês, significa Sarraceno. Não poupou, como bom nazista, os judeus, insistindo na tese de que eles têm um gene particular e único. Seu livro “Deutschland Schafft Sich Ab” (A Alemanha se destrói) está sendo dos mais vendidos nos país. Apesar do caráter nazista do livro, o SPD ainda não o expulsou de seus quadros. Depois da morte de Willy Brandt, muitos socialistas alemães em nada diferem de seus adversários da CDU.
O caso mais grave, neste momento, é o da Hungria, onde o primeiro ministro Viktor Orban retorna aos anos terríveis da ditadura de Horthy, com a censura à imprensa e o racismo ensandecido. As milícias de seu partido, o “Jokkib”, semelhantes às S.A. dos nazistas, estão caçando ciganos a porretadas e aterrorizando as aldeias do país. Na Itália, os neofascistas atuam com toda ousadia, desde que Berlusconi, à frente de seu partido de extrema direita, assumiu o poder.
Para eles, judeus e muçulmanos pertencem a um só grupo de “inferiores” que devem ser eliminados, em nome da pureza dos soi-disant arianos. Em nosso país há também os que defendem a pureza racial européia e o seu direito a nos dominar. É hora de contê-los, antes que se faça tarde. Não podemos tolerar nenhuma violência racista, seja contra judeus ou muçulmanos, negros ou nordestinos. Se outra razão não houvesse, a imensa maioria de brasileiros é constituída de mestiços, e temos nos dado muito bem com essa mescla de sangues e de culturas diferentes.

quinta-feira, 22 de março de 2012

7% do PIB não são suficientes para a Educação, dizem especialistas


Em audiência pública na Câmara, professores e representantes da sociedade civil demonstram que são necessários mais de 10% do PIB para garantir uma educação com padrões mínimos de qualidade. Para professor da FGV, se o Brasil investir apenas 7% do PIB na área, só atingirá o nível das nações ricas entre 2040 e 2050. Com base nos estudos apresentados, deputados exigem debate com equipe econômica do governo antes de aprovarem o relatório sobre o Plano Nacional de Educação (PNE).


Brasília - Os especialistas que participaram da audiência pública para discutir o Plano Nacional de Educação (PNE), nesta terça (20), na Câmara, foram unânimes ao afirmar que os 7% do Produto Interno Bruto (PIB) do país, propostos pelo governo federal para serem investidos na área, até 2020, não serão suficientes para garantir um padrão mínimo de qualidade para o setor.

O relator do projeto, deputado Ângelo Vanhoni (PT-PR), reafirmou que, a despeito da opinião contrária dos convidados, manterá no seu substitutivo o percentual de 7,5%, já renegociado com a equipe econômica do governo. “Esse percentual será suficiente para promover uma verdadeira revolução na área”, garantiu.

Os deputados presentes à audiência, entretanto, não se convenceram. E defenderam que o relatório só seja colocado em votação após uma reunião da Comissão Especial do PNE com a equipe econômica para discutir valores.

O coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, disse que um estudo realizado pelo coletivo, que reúne diversas entidades da sociedade civil organizada, concluiu que, para financiar as metas previstas no PNE, será necessário investir 10,4% do PIB. “Se a gente não investir 10%, não vamos conseguir expandir a educação como determina o PNE, com um padrão mínimo de qualidade”, afirmou.

Segundo ele, os estudos feitos pelo Ministério da Educação (MEC) que apontaram que o percentual de 7% é suficiente não obedecem aos critérios definidos pelo Custo Aluno Qualidade Inicial (CAQi).

Ele também defendeu a necessidade do aumento dos investimentos federais no setor. De acordo com Cara, durante os governos dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, a união se desresponsabilizou progressivamente pela área. “O esforço real do financiamento da educação se dá pelos estados e municípios”. Conforme o coordenador-geral, os estados arcam com 41% dos custos do setor, os municípios com 31% e a união, com 20%.

Professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Nelson Amaral afirmou que a dificuldade em estabelecer os parâmetros de cálculos para o percentual do PIB a ser empregado na área decorrem da dificuldade brasileira em definir qual educação ela quer para o país. O professor mostrou estudos baseados no custo anual dos alunos matriculados em creches para demonstrar a discrepância entre os parâmetros possíveis de serem adotados.

Ele afirmou que o MEC estima em R$ 2,5 mil o custo/aluno creche por ano. Para a União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), o valor é de R$ 5,1 mil. O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) aponta para R$ 6,4 mil. E o Custo Aluno Qualidade Inicial (CAQi) fixa em R$ 7,4 mil. “A questão é definir que qualidade queremos”, provocou.

O professor demonstrou também que as discrepâncias obedecem às desigualdades regionais brasileiras. No nordeste, esse custo é estimado em R$ 1,8 mil, enquanto na região sudeste fica em R$ 8,2 mil. O investimento dos países desenvolvidos é ainda maior. Nos Estados Unidos, chega a US$ 14 mil.

“Se o Brasil aplicar 10% do PIB em educação, atingirá um padrão de qualidade próximo ao da média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que é de US$ 6 mil por aluno, entre 2020 e 2030. Se investir apenas 7% do PIB, se irá se equipar aos países desenvolvidos somente entre 2040 e 2050”, apontou.

O professor da Universidade de São Paulo (USP), José Marcelino de Rezende Pinto, calculou em 10,7% o percentual do PIB necessário para financiar as metas educacionais previstas pelo PNE. Segundo ele, os 7% apontados pelo governo correspondem às necessidades apenas deste ano.

O representando do Conselho Todos pela Educação, Mozart Neves Ramos, criticou a falta de qualidade do ensino brasileiro. “Em vários estados, em cada 100 alunos que terminaram o ensino médio, apenas dois aprenderam o esperado em matemática”, exemplificou. Segundo ele, o Brasil possui um custo médio por aluno/ano de R$ 3,5 mil, enquanto os países da comunidade europeia investem R$ 9 mil. “É uma diferença enorme”.

O relator, Ângelo Vanhoni, defendeu seu substitutivo, afirmando que ele avança muito a partir das metas elaboradas inicialmente pelo governo, em 2010. No caso das crianças de 0 a 3 anos, matriculadas nas creches, o substitutivo fixa em R$ 3,5 mil o custo anual por aluno, enquanto o governo emprega, hoje, R$ 2,2 mil.

No final do debate, o deputado Arthur Bruno (PT-CE) propôs que a Comissão só vote seu relatório após debate com o ministro da Fazenda, Guido Mantega. “Precisamos discutir os números com ele. Investir 7,5% do PIB em ensino é um avanço, mas precisamos ouvir o ministro”, afirmou.

O deputado Paulo Rubem Santiago (PDT-PE) reforçou a proposta. “Não há restrição fiscal para destinar os 10% do PIB para a educação. O relatório simplesmente enquadra a proposta que veio do Palácio do Planalto”, disse.

O deputado Newton Lima (PT-SP), concordou com o debate, mas ressaltou que os deputados não devem criar um antagonismo entre a política de responsabilidade fiscal e a política educacional. “Se a gente fizer isso, vamos cometer um grave equívoco, porque temos um país em reconstrução, inclusive na sua macroeconomia”, justificou.

Para Lima, a atual situação de instabilidade econômica mundial não permite que o governo faça uma estimativa supervalorizada dos recursos disponíveis para investir mesmo em setores imprescindíveis, como educação ou saúde.


Fotos: Luis Alves/Agência Câmara

Reino Unido reduz imposto para ricos enquanto taxa idosos e corta benefícios sociais

Roberto Almeida no OPERAMUNDI

Novo orçamento britânico, que acaba com isenção para pessoas com mais de 65 anos, é criticado pela oposição a David Cameron


Efe

Britânicos protestaram nesta quarta contra projeto de orçamento que corta benefícios sociais e cria a "taxa da vovó"


Em meio a um discurso de austeridade e sob a tormenta de um déficit projetado de 126 bilhões de libras esterlinas para 2012, o ministro das Finanças britânico, George Osborne, braço-direito do premiê conservador David Cameron, causou polêmica ao anunciar nesta quarta-feira (21/03) um corte no imposto sobre altos salários no Reino Unido. A medida, parte do novo orçamento da ilha para o ano, trouxe a reboque o fim de isenções para aposentados acima de 65 anos e cortes em benefícios sociais.
O imposto sobre grandes salários, chamado de “50p tax”, foi elaborado pelo partido trabalhista, opositor da dupla Cameron/Osborne, e adotado em 2010. O britânico com rendimentos acima de 150 mil libras esterlinas por ano (cerca de 420 mil reais) era obrigado a pagar 50% de imposto sobre cada libra extra, acima desse valor, que entrasse em seu bolso. A taxa atingia cerca de 300 mil dos 29 milhões de pagadores de impostos do Reino Unido.
A cartada fiscal de Osborne, operada em conjunto com os liberais democratas, reduziu a alíquota para 45%, alegando que o imposto não gerava resultados claros para o Tesouro britânico. A medida entra em vigor em abril do ano que vem. Havia, quando da criação da “50p tax”, uma expectativa de arrecadação de 2,4 bilhões de libras para abastecer os cofres públicos. Para o ministro, porém, a taxa resultou apenas em perdas inestimáveis nos negócios da ilha.
No final de fevereiro, um grupo de 537 empresários do Reino Unido fez forte lobby para eliminar o imposto, combatido desde sua criação. Em carta enviada ao jornal Daily Telegraph, eles afirmaram que a “50p tax” era apenas um bom motivo usar empresas offshore e driblar o governo. Osborne recebeu sua dose direta de críticas e foi tratado como “populista” por não ver a “economia real”.
O líder trabalhista, Ed Miliband, disse que as medidas significam que “milhões terão de pagar mais, e milionários terão de pagar menos”. Para ele, o orçamento do governo conservador se baseia em “escolhas erradas, prioridades erradas e valores errados”.
Osborne disse que está “recompensando o trabalho e ajudando principalmente os negócios”. Ele levantou a faixa de isentos em 1.100 libras, ou seja, trabalhadores britânicos que receberem menos de 9.205 libras não pagarão impostos. Segundo seus cálculos, 24 milhões de britânicos terão 220 libras extra no bolso por ano.
“Taxa da vovó”

Os resultados da nova alíquota sobre os grandes salários ainda não foram medidos, mas seu principal efeito colateral foi destaque nos principais jornais britânicos: Osborne usou o plano orçamentário para mexer no sistema de aposentadoria da ilha, retirando benefícios de pessoas acima de 65 anos.
Efe

Estamos “recompensando o trabalho e ajudando principalmente os negócios”, disse Osborne

A medida foi bombardeada por críticas e virou trending topic no Twitter com a hashtag #grannytax, ou “imposto da vovó”. Segundo o jornal The Guardian, a nova taxa vai gerar causar 1 bilhão em perdas aos aposentados por ano.
A ONG AgeUK, dedicada à terceira idade no Reino Unido, disse estar “desapontada” com o governo. De acordo com a entidade, alguns aposentados terão de pagar até 259 libras esterlinas (cerca de 780 reais) em impostos por ano. A medida deve atingir 4,5 milhões de pessoas. Segundo Osborne, este é o primeiro passo para uma simplificação no pagamento de aposentadorias no Reino Unido.
Em paralelo a essa mudança, houve um corte de 10 milhões de libras em benefícios sociais para 2012. Os principais atingidos serão pais que tenham rendimentos acima de 50 mil libras anuais (cerca de 140 mil reais). Eles perderão auxílio do governo para criar seus filhos.

Dia Mundial da Água: estudos decifram o diálogo entre a selva amazônica e sua água


Em 1993, a ONU definiu o dia 22 de março como o Dia Mundial da Água. A data ficou destinada à discussão sobre os diversos temas relacionados a este importante bem natural. Cerca de 0,008 %, do total da água do nosso planeta é potável (própria para o consumo). E, como sabemos, grande parte de suas fontes  (rios, lagos e represas) está sendo contaminada, poluída e degradada pela ação predatória do homem. O Dia Mundial da Água tem como objetivo principal criar um momento de reflexão, análise, conscientização e elaboração de medidas práticas para resolver tal problema. O Sul21 transcreve abaixo um artigo de Alice Marcondes sobre as trocas que a selva amazônica realiza com a água da região e as alterações que têm sido verificadas na região.

Por Alice Marcondes, Tierramérica via SUL21

Foto: Lubasi/Flickr

Havendo alteração na relação entre a selva amazônica e os bilhões de metros cúbicos de água que circulam pelo ar, desde o Oceano Atlântico equatorial até os Andes, estará em risco a resiliência deste bioma crucial para o clima do planeta, alerta um experimento de duas décadas. A Amazônia é um ser vivo de 6,5 milhões de quilômetros quadrados, que ocupa metade do território do Brasil e parte de outros oito países (Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana Francesa, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela), e abriga a maior reserva de água doce do planeta.
Para entender plenamente esse complexo sistema, cientistas do Brasil e do mundo criaram o Experimento em Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia (LBA, sigla em inglês). Após 20 anos de pesquisas, os dados coletados constituem um alerta. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que participa do experimento, se nos próximos anos não houver políticas efetivas para reduzir a emissão de gases causadores do efeito estufa, a Amazônia chegará ao final do Século 21 com 40% menos chuva, com temperaturas médias de até oito graus acima do normal.
Isso converteria a Amazônia em uma fonte emissora de dióxido de carbono, em lugar de um depósito desse gás-estufa. A Agência Internacional de Energia estima que, em 2010, a população mundial lançou na atmosfera o recorde de 30,6 gigatoneladas de dióxido de carbono, principalmente procedente da queima de combustíveis fósseis. “As pesquisas nos mostram que a floresta tem um grande poder de resiliência, mas também que este poder tem limites”, disse ao Terramérica o físico Paulo Artaxo, presidente do Comitê Científico Internacional do LBA.
Foto: Douglas Fernandes/Flickr

“Se continuarmos queimando tanto carbono, o cenário climático para a região amazônica será bastante desfavorável a qualquer resiliência que a selva possa desenvolver. Dificilmente sobreviverá a um estresse climático tão grande”, acrescentou Paulo. Para a coleta de dados o LBA contou, entre outros instrumentos, com 13 torres de 40 a 55 metros de altura, instaladas em diferentes pontos da selva, para medir o fluxo de gases, o funcionamento das propriedades básicas do ecossistema, a radiação e muitos outros parâmetros ambientais. A informação coletada é analisada por cientistas de várias áreas, com a finalidade de entender a selva como um sistema interrelacionado.
“A percepção da comunidade científica, de que os estudos individuais ou disciplinares não eram competentes para explicar a Amazônia, levou ao LBA. Percebia que era necessário um esforço integrado para explicar a floresta tropical, a partir das ciências físicas, químicas, biológicas e humanas, e também da relação entre elas”, disse ao Terramérica o engenheiro agrônomo Antônio Nobre, destacado cientista que também integra o LBA. “Quando comecei os estudos no LBA, minha parte principal no projeto era o carbono. Mas o carbono sem água fica seco e a floresta pega fogo. Se não há transpiração, não há sequestro de carbono, porque não ocorre a fotossíntese. Percebi que o ciclo da água e o do carbono são inseparáveis”, afirmou Antônio.
Foto: Jorge Andrade/Flickr

Essa análise integrada demonstrou que a Amazônia está absorvendo uma pequena quantidade de dióxido de carbono da atmosfera, estimada em meia tonelada por hectare ao ano. Contudo, esta fixação varia muito por região, segundo o grau das alterações ambientais. Em áreas próximas a lugares onde a ação humana causou uma degradação significativa, a absorção diminui, e a Amazônia, em lugar de incorporar carbono, o emite.
Além disso, a absorção de dióxido de carbono enfrenta “as emissões causadas pelo desmatamento e pelas queimadas” provocadas para expandir a agricultura, destacou Paulo. Como nos últimos anos as queimadas diminuíram drasticamente, de 27 mil quilômetros quadrados em 2005 para cerca de sete mil quilômetros quadrados em 2010, “hoje a selva tem como característica predominante a absorção”, explicou. Porém, com as mudanças causadas pelo efeito estufa e o aquecimento da selva, a estação seca tende a aumentar, criando um cenário propício para mais incêndios e mais emissões de dióxido de carbono.
Segundo Paulo, “o lançamento na atmosfera de partículas sólidas pelas queimadas altera a microfísica das nuvens e o regime de precipitações. Em um dos estudos do experimento se constatou que o aumento das queimadas em Rondônia estende de duas a três semanas a estação seca, retroalimentando a incidência das queimadas e piorando ainda mais seu efeito sobre o funcionamento do ecossistema”. Na “muito severa” seca de 2005, “a Amazônia perdeu muito carbono”, contou Paulo. Em uma situação de “grandes secas” mais frequentes, é possível que a selva se converta em “emissora de dióxido de carbono e deixe de cumprir um importante serviço ambiental”, alertou.
A extensão da temporada seca causa outro fenômeno, a emissão de carbono dos rios, que também foi estudado no LBA. “Os cursos de água de pequeno e médio portes emitem quantidades significativas de gás. Ocorre o que chamo evasão de dióxido de carbono dos corpos aquáticos, e isto acontece porque a maior parte desses rios está saturada de carbono dissolvido na água”, afirmou Paulo. Com o passar do tempo, este carbono “é lançado na atmosfera em quantidades bastante significativas. Todos os fenômenos que alteram o ecossistema amazônico têm um forte impacto na evasão de gases dos rios. Com o aumento da temperatura, aumenta a emissão de gás”, acrescentou.
Foto: Jorge Andrade/Flickr

Para ilustrar as consequências que um desequilíbrio da Amazônia poderia acarretar ao clima mundial, Antônio citou a pesquisa que se popularizou com o nome de “rios voadores”, iniciada na década de 1970 e convertida em um projeto consolidado desde 2007. “Descobrimos que a ação do Sol sobre a região equatorial do Oceano Atlântico evapora grande quantidade de água. Esta umidade é transportada pelos ventos para o norte do Brasil. São cerca de dez bilhões de metros cúbicos de água por ano, que chegam à Amazônia em forma de vapor. Parte cai como chuva, e parte segue até encontrar a muralha da Cordilheira dos Andes”, descreveu Antônio.
Na região andina, o vapor cai como neve e, ao derreter, “alimenta os rios da bacia amazônica. A maior parte da chuva que cai sobre a floresta volta a evaporar”, esclareceu Antônio. Esta umidade flutua sobre Bolívia, Paraguai e os Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, no oeste; Minas Gerais, no leste; São Paulo no sudeste e inclusive até Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, no sul. “E leva a maior parte das chuvas para todas essas regiões”, explicou. A seca da Amazônia prejudicaria esse rio aéreo e “o ciclo de chuvas nessas regiões, que são muito ricas em agricultura”, alertou Antônio.
O LBA é hoje um programa do Ministério de Ciência e Tecnologia, coordenado pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, com apoio de outras entidades. Seus pesquisadores estão ampliando esse trabalho para outras áreas, como os sistemas agropastoris e o comportamento do dióxido de carbono nas plantações de soja. “Temos um trabalho enorme pela frente para compreender os processos naturais e o que os humanos fazem quanto à alteração dos ecossistemas”, concluiu Paulo.

Fidel Castro: Os caminhos que conduzem ao desastre



Esta Reflexão poderá ser escrita hoje, amanhã ou qualquer outro dia sem risco de equívoco. Nossa espécie se defronta com problemas novos. Quando expressei há 20 anos, na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento no Rio de Janeiro, que uma espécie estava em perigo de extinção, tinha menos razões do que hoje para advertir sobre um perigo que via talvez à distância de 100 anos.


Então uns poucos líderes dos países mais poderosos dirigiam o mundo. Aplaudiram por mera cortesia minhas palavras e continuaram placidamente cavando a sepultura de nossa espécie.

Parecia que em nosso planeta reinava o senso comum e a ordem. Há tempos que o desenvolvimento econômico apoiado pela tecnologia e a ciência parecia ser o Alfa e o Ômega da sociedade humana.

Agora tudo está muito mais claro. Verdades profundas foram abrindo caminho. Quase 200 Estados, supostamente independentes, constituem a organização política à qual teoricamente corresponde a tarefa de reger os destinos do mundo.

Cerca de 25 mil armas nucleares em mãos de forças aliadas ou antagônicas dispostas a defender a ordem em mutação, por interesse ou por necessidade, reduzem virtualmente a zero os direitos de bilhões de pessoas.

Não cometerei a ingenuidade de atribuir à Rússia ou à China a responsabilidade pelo desenvolvimento desse tipo de armas, depois da monstruosa matança de Hiroshima e Nagasaki, ordenada por Truman, após a morte de Roosevelt.

Tampouco cairia no erro de negar o holocausto que significou a morte de milhões de crianças e adultos, homens e mulheres, principalmente judeus, ciganos, russos e de outras nacionalidades, que foram vítimas do nazismo. Por isso, repugna a política infame dos que negam ao povo palestino seu direito a existir.

Alguém pensa por acaso que os Estados Unidos serão capazes de atuar com a independência que o preserve do desastre inevitável que os espera?

Em poucas semanas os US$ 40 milhões que o presidente Obama prometeu arrecadar para sua campanha eleitoral só servirão para demonstrar que a moeda de seu país está muito desvalorizada e que os Estados Unidos, con sua insólita e crescente dívida pública que se aproxima dos US$ 20 trilhões, vive do dinheiro que imprime e não do que produz. O resto do mundo paga o que eles dilapidam.

Ninguém crê tampouco que o candidato democrata seja melhor ou pior que seus adversários republicanos: chame-se Mitt Romney ou Rick Santorum. Anos-luz separam os três de personagens tão relevantes como Abraham Lincoln ou Martin Luther King. É realmente inusitado observar uma nação tão poderosa tecnologicamente e um governo ao mesmo tempo tão órfão de ideias e valores morais.

O Irã não possui armas nucleares. Acusa-se o país de produzir urânio enriquecido que serve como combustível energético ou componente de uso médico. Queira-se ou não, sua posse ou produção não é equivalente à produção de armas nucleares. Dezenas de países utilizam o urânio enriquecido como fonte de energia, mas este não pode ser empregado na confecção de uma arma nuclear sem um processo prévio e complexo de purificação.

Contudo, Israel, que com a ajuda e a cooperação dos Estados Unidos fabricou o armamento nuclear sem informar nem prestar contas a ninguém, até hoje sem reconhecer a posse destas armas, dispõe de centenas delas. Para impedir o desenvolvimento das pesquisas em países árabes vizinhos, atacou e destruiu os reatores do Iraque e da Síria. E declarou o propósito de atacar e destruir os centros de produção de combustível nuclear do Irã.

Em torno desse crucial tema tem girado a política internacional nessa complexa e perigosa região do mundo, onde se produz e fornece a maior parte do combustível que move a economia mundial.

A eliminação seletiva dos cientistas mais eminentes do Irã, por parte de Israel e de seus aliados da Otan, se converteu em uma prática que estimula os ódios e os sentimentos de vingança.

O governo de Israel declarou abertamente seu propósito de atacar a usina produtora de urânio enriquecido no Irã, e o governo dos Estados Unidos investiu centenas de milhões de dólares na fabricação de uma bomba com esse propósito.

Em 16 de março de 2012 Michel Chossudovsky e Finian Cunningham publicaram um artigo revelando que “um importante general da Força Aérea dos EUA descreveu a maior bomba convencional – a antibunkers de 13,6 toneladas – como ‘grandiosa’ para um ataque militar contra o Irã”.

“Um comentário tão loquaz sobre um artefato assassino em massa teve lugar na mesma semana na qual o presidente Barack Obama se apresentou para advertir contra a ‘fala leviana’ sobre uma guerra no Golfo Pérsico.”

“…Herbert Carlisle, vice-chefe do Estado Maior para operações da Força Aérea dos EUA. [...] agregou que provavelmente a bomba seria utilizada em qualquer ataque contra o Irã ordenado por Washington.”

“O MOP, ao qual também se referem como ‘a mãe de todas as bombas’, está projetado para perfurar através de 60 metros de concreto antes de detonar sua bomba. Acredita-se que é a maior arma convencional, não nuclear, no arsenal estadunidense.”

“O Pentágono planifica um processo de ampla destruição da infraestrutura do Irã e massivas vítimas civis mediante o uso combinado de bombas nucleares táticas e monstruosas bombas convencionais com nuvens em forma de cogumelo, incluídas a MOAB e a maior GBU-57A/B ou Massive Ordenance Penetrator (MOP), que excede a MOAB em capacidade de destruição.”

“A MOP é descrita como ‘uma poderosa nova bomba que aponta diretamente para as instalações nucleares subterrâneas do Irã e Coreia do Norte. A imensa bomba – maior do que que 11 pessoas colocadas ombro a ombro, ou mais de 6 metros desde a base até a ponta.”

Peço ao leitor que me desculpe por esta complicada linguagem do jargão militar.

Como se pode verificar, tais cálculos partem do pressuposto de que os combatentes iranianos, que totalizam milhões de homens e mulheres conhecidos por seu fervor religioso e suas tradições de luta, se renderão sem disparar um só tiro.

Em dias recentes os iranianos viram como os soldados dos Estados Unidos que ocupam o Afeganistão, em apenas três semanas, urinaram sobre os cadáveres de afegãos assassinados, queimaram os livros do Corão e assassinaram mais de 15 cidadãos indefesos.

Imaginemos as forças dos Estados Unidos lançando monstruosas bombas sobre instituições industriais capazes de penetrar 60 metros de concreto. Jamais semelhante aventura tinha sido concebida.

Não é preciso uma palavra mais para compreender a gravidade de semelhante política. Por esse caminho nossa espécie será conduzida inexoravelmente para o desastre. Se não aprendemos a compreender, não aprenderemos jamais a sobreviver.

De minha parte, não abrigo a menor dúvida de que os Estados Unidos estão a ponto de cometer e conduzir o mundo ao maior erro de sua história.

Fidel Castro Ruz
21 de março de 2012, 19h35

Fonte: Cubadebate

Tradução de José Reinaldo Carvalho, da redação do Vermelho

Juremir Machado: Nós, os revanchistas

<br /><b>Crédito: </b> ARTE JOÃO LUIS XAVIER

Crédito: ARTE JOÃO LUIS XAVIER

Questões complexas exigem tratamento complexo, não? Parece simples, mas não é assim que acontece. Tem gente que acha melhor simplificar o complexo por entender que este é muito complicado. Eu, imbecil permanente que sou, costumo ter, em certos temas, as mesmas posições de organismos nacionais e internacionais despreparados como a OEA, a OAB e a ONU. Se eu fosse inteligente e bem preparado, jamais pensaria em assunto algum como essas instituições levianas e protetoras de terroristas e guerrilheiros urbanos. Depois que um grupo de procuradores do Ministério Público Federal pediu abertura de processo contra o "Major Curió", agente da repressão na Guerrilha do Araguaia, eu aplaudi essa possibilidade de superação da Lei da Anistia, mecanismo pelo qual a ditadura militar brasileira "perdoou" os seus opositores já punidos (prisão, tortura, exílio, mutilações e cassações) e protegeu-se contra qualquer punição futura.

Os procuradores exploram uma brecha chamada crimes continuados, aqueles que, como os sequestros, não tendo tido um desfecho (libertação do sequestrado ou descoberta do corpo da vítima), permanecem passíveis de punição. O STF concedeu extradição de repressor com base nessa interpretação. Os organismos internacionais não reconhecem a legitimidade da Lei da Anistia brasileira. A ONU, ao tomar conhecimento da representação dos procuradores brasileiros contra Curió, manifestou-se considerando essa ação como "um primeiro passo crucial na luta contra a impunidade que rodeia o período do regime militar no Brasil". Mais: "Estamos esperançosos de que o Judiciário brasileiro vai defender os direitos fundamentais das vítimas à verdade e à justiça, permitindo que esse processo muito importante vá para a frente". Como é despreparada essa ONU! A Justiça do Pará rejeitou a denúncia. Curió declarou-se feliz. Outro despreparado, o presidente da Academia Brasileira de Direito Constitucional, Flávio Pansieri, disse que a "simples leitura da Constituição e da lei deixa claro que os crimes cometidos por militares não foram anistiados".

Ainda mais despreparada, a OAB sustenta que "as Nações Unidas e o Tribunal Penal Internacional entendem que os crimes contra a humanidade cometidos por autoridades estatais não podem ser anistiados por leis nacionais". De quebra, pede que o STF dê o seu pitaco sobre a aplicação da Lei de Anistia a crimes continuados, pois, explica, "em regra, esses crimes só admitem a contagem de prescrição a partir de sua consumação - em face de sua natureza permanente". O procurador gaúcho Ivan Marx salienta que essa interpretação vale para os "dois lados". Se há algum sequestro praticado pelos opositores da ditadura ainda pendente, caberia denúncia, julgamento e punição.

Marx aproveitou para derrubar outra falácia, a de que o Brasil teria adotado a mesma estratégia da África do Sul. Nada disso. Lá, a anistia foi concedida a quem reconheceu seus crimes e se arrependeu. Não se passou a borracha sem citar nomes. Estou mal-acompanhado. Um grupo de juízes lançou manifesto pela Comissão da Verdade. Só gente e instituições despreparadas e revanchistas. Uau!

Juremir Machado no Correio do Povo

quarta-feira, 21 de março de 2012

Boitempo lança "O socialismo jurídico", de Engels e Kautsky


O socialismo jurídico é uma das obras clássicas do marxismo sobre a relação entre o direito e o capitalismo. “Engels e Kautsky dedicam esta obra justamente a combater o socialismo dos juristas – ou o socialismo por meio do direito. O direito é, irremediavelmente, uma forma do capitalismo. Assim sendo, é a revolução – e não a reforma por meio de instituições jurídicas – a única opção realmente transformadora das condições das classes trabalhadoras”, diz o professor Alysson Leandro Mascaro (Direito/USP).


São Paulo - Planejado por Friedrich Engels e Karl Kautsky, o artigo “O socialismo jurídico” foi publicado sem assinatura na revista da social-democracia alemã, Neue Zeit, em 1887. O objetivo era dar uma resposta aos ataques à teoria econômica de Karl Marx, assim como elaborar uma crítica ao reformismo jurídico e combater a sua influência no movimento operário.

“À época da escrita deste livro, os reformistas, em combate às idéias revolucionárias de Marx, apontavam para uma transição controlada, objetivando ganhos por meio do aumento de direitos, sem transformar plenamente as contradições da exploração capitalista”, afirma na orelha do livro o professor da Faculdade de Direito da USP, Alysson Leandro Mascaro, para quem O socialismo jurídico é uma das obras clássicas do marxismo sobre a relação entre o direito e o capitalismo.

“Engels e Kautsky dedicam esta obra justamente a combater o socialismo dos juristas – ou o socialismo por meio do direito. O direito é, irremediavelmente, uma forma do capitalismo. Assim sendo, é a revolução – e não a reforma por meio de instituições jurídicas – a única opção realmente transformadora das condições das classes trabalhadoras”, conclui Mascaro.

O texto é também uma crítica ao livro O direito ao produto integral do trabalho historicamente exposto, do sociólogo e jurista burguês austríaco Anton Menger, publicado em 1886, e que vinha obtendo grande repercussão. Em tal obra, Menger tentou provar que a teoria econômica de Marx fora plagiada dos socialistas utópicos ingleses da escola ricardiana, especialmente William Thompson. Essas afirmações, bem como a falsificação da essência da teoria marxiana efetuada por Menger, não poderiam passar despercebidas a Engels, que decidiu interceder.

Além do artigo que dá título ao livro, este volume agora publicado pela Boitempo – traduzido do alemão por Lívia Cotrim e Márcio Bilharinho Naves, filósofo do direito brasileiro e autor do livro Marxismo e direito: um estudo sobre Pachukanis (Boitempo) – traz ainda duas cartas de Engels a Laura Lafargue (filha de Marx) escritas em Londres, em 1886, que também tratam do tema.

Trecho do prefácio de Marcio Bilharinho Naves
 
“O texto de Engels e Kautsky tem grande importância teórica e política e é de impressionante atualidade. Nestes tempos, em que se abate sobre o marxismo uma avassaladora ofensiva em nome da democracia, isto é, do direito, e em que a ideologia jurídica penetra profundamente no movimento operário e em suas organizações, vale a pena voltar a atenção para o ataque sem concessões que Engels e Kautsky dirigem contra o núcleo duro da ideologia burguesa, a sua concepção jurídica de mundo. [...]

A crítica à visão jurídica aparece, de modo ainda mais expressivo, na análise que Engels e Kautsky realizam da passagem da concepção teológica de mundo feudal à concepção jurídica de mundo burguesa, na qual se revela a natureza especificamente burguesa do direito, como forma social relacionada de maneira íntima com o processo de trocas mercantis: Visto que o desenvolvimento pleno do intercâmbio de mercadorias em escala social – isto é, por meio da concessão de incentivos e créditos – engendra complicadas relações contratuais recíprocas e exige regras universalmente válidas, que só poderiam ser estabelecidas pela comunidade – normas jurídicas estabelecidas pelo Estado –, imaginou-se que tais normas não proviessem dos fatos econômicos, mas dos decretos formais do Estado.

Temos aqui alguns elementos que autorizam a formulação de uma ideia crítica do direito, que permita denunciar o “fetichismo da norma” e se oponha à teoria normativista para a qual o direito aparece somente como um conjunto de normas garantido pelo poder coercitivo do Estado.”


Trecho do livro
 
“O direito jurídico, que apenas reflete as condições econômicas de determinada sociedade, ocupa posição muito secundária nas pesquisas teóricas de Marx; ao contrário, aparecem em primeiro plano a legitimidade histórica, as situações específicas, os modos de apropriação, as classes sociais de determinadas épocas, cujo exame interessa fundamentalmente aos que veem na história um desenvolvimento contínuo, apesar de muitas vezes contraditório, e não simples caos [Wust] de loucura e brutalidade, como a via o século XVIII.

Marx compreende a inevitabilidade histórica e, em consequência, a legitimidade dos antigos senhores de escravos, dos senhores feudais medievais etc. como alavancas do desenvolvimento humano em um período histórico delimitado; do mesmo modo, reconhece também a legitimidade histórica temporária da exploração, da apropriação do produto do trabalho por outros; mas demonstra igualmente não apenas que essa legitimidade histórica já desapareceu, mas também que a continuidade da exploração, sob qualquer forma, ao invés de promover o desenvolvimento social, dificulta-o cada vez mais e implica choques crescentemente violentos.”


Sobre a coleção
 
A publicação de "O socialismo jurídico" dá continuidade ao projeto da Boitempo de traduzir o legado de Karl Marx e Friedrich Engels, contando com o auxílio de especialistas renomados. Com 14 volumes publicados, a coleção Marx-Engels teve início com a edição comemorativa dos 150 anos do Manifesto Comunista, em 1998. Em seguida foi publicada A sagrada família (2003), obra polêmica que assinala o rompimento definitivo de Marx e Engels com a esquerda hegeliana. Os Manuscritos econômico-filosóficos (2004) vieram na sequência, ao qual se seguiram os lançamentos de Crítica da filosofia do direito de Hegel (2005); Sobre o suicídio (2006); A ideologia alemã (2007); A situação da classe trabalhadora na Inglaterra (2008); Sobre a questão judaica (2010); Lutas de classes na Alemanha (2010); O 18 de brumário de Luís Bonaparte (2011); A guerra civil na França (2011), em comemoração aos 140 anos da Comuna de Paris; os Grundrisse (2011); Crítica do Programa de Gotha (2012); e agora O socialismo jurídico. Ainda neste ano, a editora planeja publicar o primeiro volume de O capital.

Aos que lutaram e continuam a lutar...

TARSO GENRO: UM GOVERNADOR FORA DA LEI

Parabéns a todos e todas, trabalhadores em educação do Rs, comunidades escolares e simpatizantes que marcharam juntos pela Implementação do PISO NACIONAL DOS PROFESSORES que infelizmente, no nosso estado(RS) está sendo aviltado e surrupiado por um governo, cujo representante maior, Tarso Genro, ser o AUTOR DA LEI quando estava no Ministério da Justiça. Ontem a noite, apesar de toda a mobilização da sociedade civil, dos trabalhadores em Educação e de todos aqueles comprometidos com uma sociedade democratica e séria, os DEPUTADOS ESTADUAIS DO RS, acabaram votando a favor de uma proposta governista numa  claran ação de subserviência e de total desprezo pela educação de nosso estado: abaixo as fotos da caminhada e da assembleia realizada na frente do Palácio Piratini, sede do MAIOR TRAIDOR DO MAGISTÉRIO ESTADUAL, sr. Tarso Genro.

A LUTA CONTINUA APESAR DA BATALHA PERDIDA

































segunda-feira, 19 de março de 2012

Cristovam Buarque: “Governador que não paga piso deve sofrer impeachment”


"Há muitos anos que defendo a troca dessas dívidas para que o dinheiro seja aplicado em educação" | Foto: Felipe Barra/Ag.Senado

Samir Oliveira no SUL21

O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) faz da educação a sua principal bandeira. Ex-governador do Distrito Federal, ex-reitor da Universidade Nacional de Brasília e ex-ministro da Educação, ele chegou até a ser criticado por falar insistentemente no assunto quando disputou a Presidência da República em 2006.
Autor da lei que institui o piso nacional do magistério, o pedetista não economiza crítica aos governadores que não pagam o salário previsto na norma e regulado pelo Ministério da Educação (MEC). Para o senador, quem não cumpre a lei deveria ser cassado. “O Ministério Público precisa pedir o impeachment dos governadores e prefeitos que não cumprem o piso. Como é possível que um governador não cumpra a lei?”, indigna-se.
Nesta entrevista ao Sul21, Cristovam Buarque avalia a situação do Rio Grande do Sul e a atuação do governador Tarso Genro (PT), que o sucedeu quando deixou o Ministério da Educação – e o PT – em 2004. Para o senador, Tarso está “fora da lei” e não toma atitudes concretas para viabilizar o pagamento do piso.
“Quando o Tarso prometeu que pagaria o piso, ou ele conhecia e lei e foi demagogo, ou ele não conhecia e é despreparado”

Sul21 – Como iniciou o debate em torno da proposta de estabelecer um piso nacional para os professores?
 
Cristovam Buarque – A ideia começou já na Constituinte, quando o deputado Severino Alves apresentou um artigo na Constituição criando o piso. Mas isso ficou parado durante 20 anos. Em 2004 eu apresentei o projeto que criava o piso e em 2008 conseguimos que fosse aprovado, com o apoio do ministro da Educação (à época) Fernando Haddad (PT). Mas, assim que foi sancionada pelo ex-presidente Lula, a lei foi recusada por muitos governadores, que entrara com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF), que acabou validando a norma.

Sul21 – Agora muitos governadores questionam a legalidade do reajuste de 22% determinado pelo Ministério da Educação (MEC), conforme o valor do custo por aluno do Fundeb, como regula a lei.
Cristovam –
A proposta que veio do governo dizia que o reajuste seria no mínimo igual ao INPC. Mas, no mínimo, também, igual ao aumento do valor dos recursos transferidos pelo MEC para as prefeituras (Fundeb). Para o ministério, o aumento seria o maior índice dentre esses dois. E a variação do INPC foi de 6,8%, enquanto a transferência de recursos para as cidades foi de 22%. Então por isso o aumento terminou sendo de 22%. Os governadores tentaram impedir, mesmo depois de isso ser aprovado na Comissão de Educação, que se considerava aprovação terminativa e poderia ter ido direto para a presidente. Tentaram levar o tema para o plenário, mas não conseguiram.
"É preciso negociar com os credores. A dívida com a educação e com as crianças é muito mais importante que a dívida com os bancos e com a União" | Foto: Marcello Casal Jr/ABr

Sul21 – Com esse aumento, o piso passou a ser R$ 1.451. Muitos governadores não cumprem esse valor. O senhor tem defendido medidas enérgicas contra quem não paga o piso.
 
Cristovam – Isso é uma desmoralização das instituições políticas brasileiras.  O Congresso tomou a iniciativa, o Executivo sancionou, o Judiciário legitimou e tem governador que não está cumprindo a lei. O valor de R$ 1.451 ainda é muito pequeno. O Ministério Público precisa pedir o impeachment dos governadores e prefeitos que não cumprem o piso. Como é possível que um governador não cumpra a lei?

Sul21 – Na sua avaliação, por que não pagam o piso?
 
Cristovam – Na maioria dos casos é falta de interesse. Claro que há também falta de dinheiro. Mas, ao lado disso, há a apropriação de recursos públicos. As assembleias legislativas abocanham o dinheiro do Estado. Há também as dívidas dos estados com a União. Há muitos anos que defendo a troca dessas dívidas para que o dinheiro seja aplicado em educação. Defendi isso internacionalmente para o país quando eu era ministro. E o Tarso Genro continuou defendendo, chegou até a negociar a dívida brasileira com a Espanha. O Tarso deveria estar liderando a troca da dívida dos estados com a União para colocar dinheiro na educação. É preciso negociar com os credores. A dívida com a educação e com as crianças é muito mais importante que a dívida com os bancos e com a União. Mas não vejo o governador se mover nessa direção.
“Se o MEC não tivesse legitimidade para determinar o reajuste, o STF já teria dito isso quando julgou a constitucionalidade da lei”
Sul21 – Há uma cobrança muito forte no Rio Grande do Sul, já que o governador foi ministro da Educação e assinou a lei do piso, na qualidade de ministro da Justiça, abaixo da assinatura do ex-presidente Lula, e hoje diz que o salário não deveria ser reajustado pelo MEC e não reconhece o aumento de 22%. O que o senhor pensa disso?
 
Cristovam – Durante a campanha eleitoral, quando o Tarso prometeu que pagaria o piso, ou ele conhecia e lei e foi demagogo, ou ele não conhecia e, nesse caso, é despreparado. Se ele realmente não estava preparado para saber das contas do Estado, deveria entregar as escolas do Rio Grande do Sul para que o governo federal tome conta. O governador Tarso Genro é advogado e foi ministro da Justiça. Não tem como ele dizer que o reajuste do MEC não é válido, ele sabe que isso não é verdade e não faz nenhum sentido. Se o MEC não tivesse legitimidade para determinar o reajuste, o STF já teria dito isso quando julgou a constitucionalidade da lei. Tarso está fora da lei, assim como os outros governadores que não pagam o piso de R$ 1.451.

Sul21 – Os professores dizem que o pai do piso não reconhece mais o seu filho…
 
Cristovam – O pai do piso sou eu. Mas eu não teria conseguido aprovar a lei sem o apoio do Fernando Haddad. Não vi o Tarso Genro em nenhum momento nas discussões que fazíamos para viabilizar a lei. Sem o Haddad, o projeto teria morrido na Câmara.

Sul21 – A lei também prevê que o governo federal ajude os estados que não conseguem pagar o piso. Mas os governadores reclamam que as exigências feitas dificultam isso.
 
Cristovam – O governador precisa pedir a ajuda do governo federal. Conversei com o ministro (da Educação) Aloízio Mercadante (PT) e ele é totalmente de acordo com esse aumento e está disposto a dialogar. Mas Tarso, em vez de conversar, quer que o aumento seja suspenso. Ele vai criar um passivo para o Estado, porque a Justiça irá mandar pagar o piso e com correções. Criar um passivo judicial é feio, mas criar um passivo judicial com os professores é mais feio ainda. Tem muito estado mais pobre que o Rio Grande do Sul que está pagando o piso.
"Os professores precisam de outros instrumentos de luta que não sacrifiquem os alunos" | Foto: Felipe Barra/Ag.Senado

Sul21 – Outra determinação da lei é que os planos de carreira do magistério sejam readequados. O senhor é favorável a isso?
 
Cristovam – Mudança de carreira para prejudicar os professores é uma maneira de burlar a lei. Agora, se for preciso fazer um plano de carreira que melhore a vida dos professores, tudo bem.
“Hoje o que atinge os governos são os estádios da Copa do Mundo. Então os professores do Brasil precisam ocupar esses estádios até que o piso seja pago”
Sul21- Como o senhor avalia as mobilizações feitas pelos professores para exigir o cumprimento da lei?
 
Cristovam – Os professores precisam lutar para que o piso seja adotado com o reajuste correto. Mas não consigo apoiar greve de aulas. As primeiras greves de professores tinham simpatizantes, mas hoje a sociedade já não costuma apoiar. Greve é apenas uma das formas de luta e não é a mais eficiente. É a que mais prejudica a sociedade e as crianças, alem de ser a que menos incomoda os governos, no caso dos professores.  Os professores precisam de outros instrumentos de luta que não sacrifiquem os alunos.

Sul21 – Quais, por exemplo?
 
Cristovam – Defendo uma proposta que muitos dizem que é radical e até anarquista. Os professores precisam ocupar os estádios em reforma ou em construção para a Copa do Mundo. E isso sem parar as aulas. Basta 200 professores ocuparem para inviabilizar as obras de um estádio. Garanto que, se isso acontecer, até o Joseph Blatter vai pedir que o piso seja pago. Os professores deviam enviar uma mensagem à FIFA dizendo: “Senhor Blatter, o país que vai receber a Copa do Mundo não consegue pagar nem R$ 1.451 aos seus professores”. Os governos não se mobilizam diante de uma greve de professores. É preciso uma ação que atinja o governo e hoje o que atinge os governos, mais do que qualquer outra coisa, são os estádios da Copa do Mundo. Então os professores do Brasil precisam ocupar esses estádios até que o piso seja pago.

Sul21 – O senhor é um grande defensor da federalização da educação no país. Essa é realmente a solução para a área?
 
Cristovam – Os governadores dizem que não têm dinheiro para a educação. Está na hora de eles entregarem as escolas ao governo federal. No Brasil, a melhor média no IDEB é das escolas federais, não das particulares. Por que, em vez de 300 escolas federais, não temos 100 mil? Até chegar ao total de 200 mil escolas federais.
"Se entramos no governo deixamos de ser aliados e viramos atrelados" | Foto: Lia de Paula/Ag.Senado

Sul21 – Mas a União teria dinheiro para manter todas as escolas?
 
Cristovam - Hoje não, mas isso pode e deve ser feito ao longo de 20 anos. Meu projeto nesse sentido prevê uma carreira nacional para o magistério pagando R$ 9 mil por mês e com seleção mediante concurso público. Seria uma carreira nobre. Em 20 anos, com 300 mil professores, representaria um gasto de 6,4% do PIB. Já estão falando agora em colocar 8% do PIB em educação a partir do próximo ano, sendo que a luta mesmo é de 10%. Com essa minha proposta ainda sobraria dinheiro para as universidades e outras atividades.
“A universidade brasileira é elitista porque não serve o povo e não deixa o povo entrar. Na universidade devem entrar os melhores, não os mais ricos”
Sul21 – O senhor já foi reitor da UNB. Como vê a situação das universidades brasileiras hoje? O senhor costuma criticar o elitismo das universidades?
 
Cristovam – Uma universidade não é elitista porque recebe poucos alunos, mas sim porque seus profissionais trabalham para poucos. Uma faculdade de Medicina precisa receber os melhores e seus profissionais precisam trabalhar para todos. Democrática é a universidade que serve a todos depois de formar. A universidade brasileira é elitista porque não serve o povo e porque não deixa o povo entrar. Na universidade devem entrar os melhores, não os mais ricos. Mas hoje entram os mais ricos e os pobres ficam de fora. Temos que dar condições para que os pobres disputem a entrada na universidade e isso só irá ocorrer com escola pública de qualidade para todos. Quando os filhos dos pobres e os filhos dos ricos estudarem na mesma escola, só entrarão na universidade os melhores. Não vejo nenhum problema no vestibular, desde que todos tenham um bom Ensino Médio. Como é que pobre vai disputar um vestibular se 10 milhões de pessoas não sabem ler? Dos que estudam, somente dois terços terminam o Ensino Médio e em escolas muito deficientes. Só com escolas iguais para todos conseguiremos que a universidade seja elitista intelectualmente, não socialmente. A universidade tem que representar a elite intelectual, não social.

Sul21 – Como o senhor avalia a situação atual do seu partido? Até agora, a presidente Dilma Rousseff (PT) não indicou um substituto para Carlos Lupi no Ministério do Trabalho.
 
Cristovam – A minha posição hoje é a mesma de quando Lula chamou o Lupi: sou contra. Se  entramos no governo, deixamos de ser aliados e viramos atrelados. Sou favorável a apoiarmos a Dilma, mas não quero estar atrelado a ela. Porque aí o partido morre. E o partido vem morrendo há cinco anos. Em 2006, quando disputamos a presidência, o PDT tinha uma cara, não a minha cara, mas a cara da educação. Hoje, qual é a cara do PDT? Um avião viajando ao Maranhão. O PDT deveria dizer à Dilma que não precisa de um ministério para apoiá-la. Apoiaremos nas coisas boas. Nosso lado é a esquerda, não a direita.
“Devíamos estar lançando já alguns nomes como candidatos à presidência, para deixar claro que em 2014 teremos candidato”
Sul21 – O senhor diria que o PDT hoje é um partido de esquerda?
Cristovam –
Eu sou um homem de esquerda. Quero educação igual para todos. Quero que o filho do patrão estude na mesma escola que o filho do trabalhador. Isso para mim é ser de esquerda. Mas sei que no meu partido tem muita gente que não quer isso. Quero aprovar a PEC que desapropria terras que utilizem trabalho escravo. Certamente no PT, no PDT e no PCdoB poderão ter pessoas votando contra isso. Mas de qualquer maneira nossa herança, com Brizola e o trabalhismo, está muito mais sintonizada com esses partidos do que com o DEM.

Sul21 – Na sua opinião, o PDT deve disputar a Presidência da República em 2014?
 
Cristovam – Devíamos estar lançando já alguns nomes como candidatos à presidência, para deixar claro que em 2014 teremos candidato. Defendo que escolhamos uns quatro nomes e coloquemos a rodar o país na condição de pré-candidato à presidência.

Sul21 – O senhor seria um desses nomes?
 
Cristovam – Sinceramente… Não sei se eu me motivaria. Mas tem outros nomes importantes, como o senador Pedro Traques (PDT-MT).