terça-feira, 15 de maio de 2012

A crise e os sindicatos (Ricardo Antunes)



Este texto, do professor Ricardo Antunes,  foi publicado em 1993, na  revista Teoria e Debate, da Fundação Perseu Abramo. Foi escrito em meio à arrancada neoliberal no Brasil. Assim como o texto do teórico Ernest Mandel, precisa ser avaliado dentro de um contexto histórico, no entanto, será que muitas críticas contidas no artigo não poderiam ser perfeitamente aplicáveis à CUT e ao movimento sindical nos dias de hoje?
Boa leitura:

A crise e os sindicatos


As perspectivas generosas de emancipação humana, tão caras a Marx, foram ou estão sendo pouco a pouco trocadas pelos valores da acomodação social-democrata. Ao movimento sindical impõe-se a decisão: vamos elaborar um programa de emergência para gerir a crise do capital sob sua ótica ou avançar na elaboração de uma alternativa?

A crise que atinge o mundo do trabalho, seus organismos sindicais e partidários é de proporções ainda não de todo assimiladas. Sua intensidade e agudeza devem-se ao fato de que, simultaneamente, atingiu a materialidade e a objetividade do ser-que-vive-do-trabalho. Não foram poucas as transformações vivenciadas nesta última década, atingindo centralmente os países capitalistas desenvolvidos, mas com repercussões fortes, decorrentes da mundialização e globalização do capital, no conjunto de países do Terceiro Mundo, especialmente aqueles intermediários, com um significativo parque industrial, como é o caso do Brasil.

Indico, a seguir, alguns elementos que, no seu conjunto, compõem a causalidade deste quadro agudamente crítico: a automação, a robótica e a microeletrônica possibilitaram uma revolução tecnológica de enorme intensidade. O taylorismo e o fordismo já não são únicos, convivendo, no processo produtivo do capital, com o “toyotismo”, o “modelo sueco”, entre outros. Tais mudanças têm consequências diretas no mundo do trabalho, especialmente na classe operária. A flexibilização da unidade fabril, a desconcentração da produção, a arrasadora desregulamentação dos direitos do trabalho, os novos padrões de gestão e “envolvimento” da força de trabalho, como os Círculos de Controle de Qualidade (CCQ), experimentados no Japão – em realidade uma apropriação do fazer e saber do trabalho, sob o comando manipulatório do capital dos nossos dias, levando o estranhamento do trabalho (no sentido marxiano) ao seu limite – tudo isso, feito sob um “inquestionável domínio” da “produtividade” e da “modernidade social”, acabou afetando a forma de ser do proletariado fabril, tradicional. A classe-que-vive-do-trabalho metamorfoseou-se.

Se já não bastassem estas transformações, a crise atingiu diretamente a subjetividade do trabalho, sua consciência de classe, afetando seus organismos de representação, dos quais os sindicatos e os partidos são expressão. Os primeiros, os sindicatos, foram forçados a assumir uma ação cada vez mais defensiva, cada vez mais atada ao imediatismo, à contingência, regredindo em sua já limitada ação de defesa de classe no universo do capital. Gradativamente foram abandonando seus traços anticapitalistas visando preservar a jornada de trabalho regulamentada, os demais direitos sociais já conquistados e, quanto mais a “revolução técnica” do capital avançava, mais lutavam para manter o mais elementar e defensivo dos direitos da classe trabalhadora, sem o qual sua sobrevivência está ameaçada: o direito ao trabalho. ao emprego.
 
É nesta contextualidade adversa que se desenvolve o sindicalismo de participação em substituição ao sindicalismo de classe. Participar de tudo …. desde que não se questione o mercado, a legitimidade do lucro, o que e para quem se produz, a lógica da produtividade, a sacra propriedade privada, enfim, os elementos básicos do complexo movente do capital. As perspectivas generosas da emancipação humana, tão caras a Marx, foram ou estão sendo pouco a pouco trocadas pelos valores da acomodação social-democrata. Entre o estrago neoliberal e a bancarrota do Leste Europeu (equivocadamente assimilada por enormes contingentes da esquerda como o “fim do socialismo e do marxismo”), o universo político e ideológico do mundo sindical de esquerda, incapaz de buscar novas alternativas socialistas, refundidas, redescobertas e radicais, se insere cada vez mais na preservação do chamado welfare state, no universo da ação social-democrata. A luta pelo controle social da produção, presente com intensidade nos anos 60/70 e em tantos outros momentos da luta dos trabalhadores, parece cada vez mais distante. O moderno é o mercado, a produtividade, a integração, a negociação, o acordo, a conciliação, a concertação.

Incapaz de apreender a amplitude e a dimensão da crise do capitalismo, postado numa situação desfavorável que lhe obsta a possibilidade de visualizar e agir para além do capital, o sindicalismo, em seus traços e tendências dominantes, conduzido pelo ideário que tem conformado suas lideranças, a cada passo dado recua a um patamar anterior, assemelhando-se a um indivíduo que, embora pareça caminhar para frente, desce uma escada de costas, sem visualizar o último degrau e menos ainda o tamanho do tombo. Cada vez mais atuando sob o prisma institucional, distanciando-se dos movimentos sociais autônomos, o sindicalismo, vive uma brutal crise de identidade. Penso que se trata mesmo da mais aguda crise no universo do trabalho, com repercussões fortes no movimento dos trabalhadores. A simultaneidade da crise, tanto na materialidade quanto na subjetividade da classe-que-vive-do-trabalho, a torna muito mais intensa. Quais foram as consequências mais visíveis destas transformações?

No que diz respeito ao mundo do trabalho, as respostas são complexas e envolvem múltiplas processualidades que aqui somente podemos indicar, de modo a tentar configurar um esboço explicativo para a crise que assola a classe trabalhadora e em particular o movimento sindical. É visível a redução do operariado fabril, industrial, gerado pela grande, indústria comandada pelo binômio taylorismo-fordismo, especialmente nos países capitalistas avançados. Porém, paralelamente a este processo, verifica-se uma crescente, subproletarização do trabalho, através da incorporação do trabalho precário, temporário, parcial etc. A presença imigrante no Primeiro Mundo cobre fatias dessa subproletarização. Ora se confundindo, ora se diferenciando desta tendência. há um fortíssimo processo de terceirização do trabalho, que tanto qualifica como desqualifica e com certeza desemprega e torna muito menos estável a condição operária. Deslancha o assalariamento dos setores médios, incorpora-se o trabalho das mulheres no processo produtivo. Há qualificação em vários setores, como no ramo siderúrgico, acarretando, enquanto tendência, um processo de intelectualização do trabalho industrial (o trabalhador como “supervisor e regulador do processo de produção”, conforme a antecipação genial de Marx nos Grundrisse), e desqualificação em outros, como no mineiro. A processualidade é complexa e multiforme e tem como resultado uma classe trabalhadora mais heterogeneizada,fragmentada e complexificada.
 
O sindicalismo não permaneceu inume a estas tendências: diminuíram as taxas de sindicalização, na(s) últimas) década(s) nos EUA, Japão, França, Itália, Alemanha, Holanda, Suíça, Reino Unido, entre outros países. Com o aumento do fosso entre operários estáveis e precários, reduz-se fortemente o poder dos sindicatos, historicamente vinculados aos primeiros e incapazes, até o presente, de incorporar os segmentos não estáveis da força de trabalho. Houve, na década de 80, redução do número de greves em vários países do centro. Aumentaram os casos de corporativismo, xenofobia, racismo, no interior da própria classe trabalhadora. Tudo isso permite constatar que o movimento sindical encontra-se numa crise de proporções nunca vistas. Que atingiu com intensidade, na década de 80, o sindicalismo nos países avançados e que, na virada de 80 para 90, tocou diretamente os países subordinados, especialmente aqueles dotados de um parque produtivo relevante, como o Brasil. Quando se reflete sobre as transformações vivenciadas no sindicalismo nos países centrais e seus paralelos com aquele praticado no Brasil, é preciso fazer as devidas mediações. Participamos de um contexto econômico, social, político e cultural que tem traços universais do capitalismo globalizado e mundializado, mas que tem singularidades que, uma vez apreendidas, possibilitam resgatar aquilo que é típico deste canto do mundo e, desse modo, reter a sua particularidade. Trata-se, portanto, de uma globalidade desigualmente combinada, que não deve permitir uma identificação acrítica ou epifenomênica entre o que ocorre no centro e nos países subordinados.

O nosso sindicalismo viveu, na década de 80, ora no fluxo, ora no contrafluxo das tendências acima descritas. Diria que, na contabilização da década, seu saldo foi muito positivo. Houve um enorme movimento grevista; ocorreu uma expressiva expansão do sindicalismo dos assalariados médios e do setor de serviços; houve continuidade no avanço do sindicalismo rural, em ascenso desde os anos 70; surgiram centrais sindicais, como a CUT; procurou-se, ainda que de maneira muito insuficiente, avançar nas tentativas de organização nos locais de trabalho, debilidade crônica do nosso movimento sindical; efetivou-se um avanço na luta pela autonomia e liberdade dos sindicatos, onde sobressai a presença organizacional dos funcionários públicos; houve aumento nos níveis de sindicalização, configurando-se um quadro nitidamente favorável para o novo sindicalismo ao longo da última década.

Porém, paralelamente a este processo, nos últimos anos da década de 80 acentuaram-se as tendências econômicas, políticas e ideológicas que inseriam o nosso sindicalismo na onda regressiva. A automação, a robótica e a microeletônica, desenvolvidas dentro de um quadro recessivo intensificado, desencadearam um processo de desproletarização de importantes contingentes operários, de que a indústria automobilística é um exemplo forte. As propostas de desregulamentação, de flexibilização, de privatização acelerada, de desindustrialização, tiveram no neoliberalismo do projeto Collor forte impulso.
Esta nova realidade arrefeceu e acuou o novo sindicalismo que se encontrava, de um lado, frente à emergência de um sindicalismo neoliberal, expressão da nova direita, sintonizada com a onda mundial conservadora, (dê que a Força Sindical é o melhor exemplo) e de outro, frente às próprias lacunas teóricas, políticas e ideológicas no interior da CUT. Estas lacunas lhe dificultavam enormemente o avanço qualitativo, capaz de transitar de um período de resistência, como nos anos iniciais do novo sindicalismo, para um momento superior, de elaboração de propostas econômicas alternativas, contrárias ao padrão de desenvolvimento capitalista aqui existente, que pudessem contemplar prioritariamente o amplo conjunto de nossa classe trabalhadora. Neste caso, além da combatividade anterior, era necessária a articulação de uma análise aguda da realidade brasileira com uma perspectiva crítica e anticapitalista, de nítidos contornos socialistas, de modo a dotar o novo sindicalismo dos elementos necessários para resistir aos influxos externos, à avalanche do capital, ao ideário neoliberal, no lado mais nefasto e, ainda, à acomodação social-democrática, que apesar de sua crise no centro, aumentou fortemente seus laços políticos e ideológicos com o nosso movimento sindical, apresentando-se cada vez mais como a única alternativa possível para se combater o neoliberalismo.

Não é preciso dizer que o quadro hoje é agudamente crítico. O sindicalismo da Força Sindical, com forte dimensão política e ideológica, preenche o campo sindical da nova direita, da preservação da ordem, da sintonia com o desenho do capital globalizado, que nos reserva o papel de país montador, sem tecnologia própria, sem capacitação científica, dependente totalmente dos recursos externos.

Na CUT o quadro também é de grande apreensão. Ganha cada vez mais força, dentro da Articulação Sindical, a postura de abandono de concepções socialistas e anticapitalistas, em nome de uma acomodação dentro da ordem, daquilo que, dizem, é o possível. O culto à negociação, às câmaras setoriais, ao programa econômico para gerir pelo capital a sua crise, está inserido num projeto de maior fôlego, cujo oxigênio é dado pelo ideário e pela prática social-democrática. Trata-se de uma crescente definição política e ideológica no interior do movimento sindical. É uma postura cada vez menos respaldada numa política de classe. E cada vez mais apoiada numa política para o conjunto do país, o país integrado do capital e do trabalho.
No campo que se reconhece como socialista e anticapitalista no interior da CUT, as dificuldades também são de grande monta. Como é possível resistir a uma onda tão intensa? Como é possível elaborar um programa econômico alternativo que incorpore os milhões de trabalhadores que não participam do mercado e que vivem da miséria da economia informal? Como é possível gestar um novo modelo econômico que elimine definitivamente a superexploração do trabalho? Quais são os contornos básicos desse modelo econômico alternativo, cuja lógica deverá iniciar o desmonte do padrão de acumulação vigente no país? Como é possível pensar numa ação que não impeça o avanço tecnológico, mas o faça em bases reais, com ciência e tecnologia de ponta desenvolvida em nosso país? Como é possível um caminho alternativo que recupere valores socialistas originais, verdadeiramente emancipadores? Que não aceite uma globalização e uma integração impostas pela lógica do capital, integradora para fora e desintegradora para dentro? Como é possível, hoje, articular valores inspirados num projeto que olha para uma sociedade para além do capital, mas que tem que dar respostas imediatas para a barbárie que assola o cotidiano do ser que vive do trabalho? Em outras palavras, como superar um caminho meramente doutrinário e buscar a difícil e imprescindível articulação entre os interesses imediatos e uma ação estratégica, de longo prazo, de clara conformação anticapitalista? São, como se pode perceber, desafios enormes.

Se, entretanto, consegui traçar um quadro crítico aproximado, o desafio mais urgente do nosso sindicalismo pode ser assim sintetizado: como se efetiva, no contexto de uma situação defensiva, uma ação sindical que dê respostas às necessidades imediatas do mundo do trabalho, preservando elementos de uma estratégia anticapitalista e socialista?

Recorro a uma síntese que me parece feliz, para expor o “espírito” da resposta que me parece possível indicar:
“Sob pena de divisão, desmoralização e derrotas certas, o movimento operário não pode se contentar em opor à crise a simples proclamação da necessidade de uma luta anticapitalista de conjunto. A crise confronta os trabalhadores com problemas concretos angustiantes: dispensas, perdas de empregos, fechamento de empresas, ataques aos salários e à assistência social, aceleração dos ritmos, ataques aos direitos sindicais e políticos conquistados. Recusar o combate defensivo, através de reivindicações imediatas, sob pretexto de que não há saída no quadro do capitalismo, é condenar toda a classe operária à impotência… Não há melhor meio para desencadear um combate geral do que alguns combates parciais plenamente coroados de sucesso, que demonstrem na prática, aos trabalhadores, que eles podem defender o emprego, os salários e os direitos conquistados.
 
Mas é verdade que todo sucesso em um combate defensivo será frágil e provisório. É verdade que a longo prazo a lógica do capital se imporá, na medida em que continuamos no regime capitalista. Essa lógica do capital coloca-se de forma especial contra a classe operária em um período de desemprego massivo e de depressão econômica. Por isso, todo combate defensivo deve se integrar em uma estratégia anticapitalista de conjunto, que procure efetivamente favorecer a mobilização do operariado por reivindicações transitórias, que sejam contrárias às causas fundamentais do mal que o atinge”. (Ernest Mandel, “O movimento operário diante da crise”, A crise do capital, Editora da Unicamp).

Que caminho vamos adotar: negociar dentro da ordem ou contra a ordem? Elaborar um programa de emergência para gerir a crise do capital sob sua ótica ou vamos avançar na elaboração de um programa econômico alternativo, formulado sob a ótica dos trabalhadores, capaz de responder às reivindicações imediatas do mundo do trabalho, mas tendo como horizonte uma organização societária fundada nos valores socialistas e efetivamente emancipadores? Pode-se responder que para tanto é preciso muito mais que a ação sindical. É verdade. Mas pode-se responder que a ação sindical no Brasil dos nossos dias seguramente auxiliará, numa ou noutra direção, o que lhe confere uma enorme responsabilidade. E que não se pode permitir a omissão de todos aqueles que estão envolvidos na luta dos trabalhadores.

Ricardo Antunes é professor de Sociologia do Trabalho na Unicamp.
Original em: Teoria e Debate

Sindicatos promovem ato para criticar 500 dias de Dilma e Tarso


Cristiano Estrela / CPERS
Centenas de manifestantes cobraram compromissos de campanha de governador do RS e da presidenta | Foto: Cristiano Estrela / CPERS

Rachel Duarte no SUL21

Ao completar 500 dias, as gestões da presidenta Dilma Rousseff (PT) e do governador gaúcho Tarso Genro (PT) receberam críticas públicas de sindicatos de diversas categorias em um ato unificado realizado no Rio Grande do Sul. A manifestação ocorreu em frente ao Palácio Piratini desde as primeiras horas desta segunda-feira (14) e durou toda a manhã. O carro de som e centenas de manifestantes fecharam a Rua Duque de Caxias e gritavam palavras de ordem cobrando compromissos de campanhas dos gestores públicos e criticando medidas adotadas pela União e o governo Tarso em relação aos servidores públicos.
Diversos cartazes expressavam problemas comuns na esfera federal e regional, na avaliação dos sindicatos. Como o não cumprimento dos índices mínimos constitucionais em saúde e educação. No âmbito nacional, os protestantes acusavam o governo Dilma de desonerar a folha de servidores e priorizar terceirizações e privatizações nas ações de gestão. Já no caso do governo gaúcho, a cobrança era pelo não pagamento das RPVs, elevados juros do Banrisul, sucateamento do Instituto de Previdência do RS (IPE) e o já conhecido grito dos professores pelo não pagamento do piso nacional do magistério.
“O Tarso que tanto quis subir nos caminhões dos movimentos sociais durante a campanha eleitoral, completa 500 dias do segundo ano de mandato com reajustes e aumentos de Cargos em Comissão e benefícios de isenções fiscais para os empresários”, comparou o presidente da Associação dos Servidores da Caixa Econômica Estadual do Rio Grande do Sul – ASCE, Érico Côrrea.
Eduardo Quadros
Grito de guerra dos servidores: “Um, dois, três, quatro, cinco, mil. Ou param as reformas ou paramos o Brasil” | Foto: Eduardo Quadros

A mini-reforma da previdência apresentada pelo executivo gaúcho ainda no ano passado e que foi novamente enviada para aprovação do legislativo gaúcho, alterando aumentando a alíquota da previdência para 13,5%, também esteve na lista de reinvidicações levadas na porta do governador Tarso Genro.
“Um, dois, três, quatro, cinco, mil. Ou param as reformas ou paramos o Brasil”, gritavam os servidores oriundos de diversas localidades do estado. Os líderes do ato salientavam dos microfones do carro de som às 12 horas de luta de algumas classes trabalhadoras que vieram de São Borja e outros locais distantes de Porto Alegre. Aos que entravam no Palácio Piratini, os manifestantes mandavam recados ao governador. “CCs entram a essa hora para trabalhar (quase 10 horas). Operários estão de pé desde as 5 da manhã. E, os reajustes só saem com muita luta”, disse a porta-voz do carro de som.

Contra auxílio-moradia de juízes 

O recente reajuste aprovado no Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (TCE-RS) que permite o pagamento de auxílio-moradia aos juízes ainda não foi digerido pelo Sindicato dos Servidores da Justiça no RS (Sindjus-RS). Presentes no ato, os sindicalistas criticaram o direito concedido aos magistrados de receber R$ 115 mil de auxílio moradia. O valor é distribuído de forma parcelada ao longo dos meses sobre um salário que já está dentre os mais altos do Estado.
“Enquanto isso nos sobra o arrocho salarial, um rombo na previdência e rotineiras práticas de assédio moral no judiciário. Somos explorados com um volume de demandas humanamente impossível de vencer nos cartórios na mesma velocidade que os despachos são feitos nos gabinetes dos juízes. Recorrentes casos de lesões físicas por esforço repetido são registrados e nos acusam de fazer corpo mole para o trabalho”, exemplificou o sindicalista Osvaldir da Silva.

Um governo ainda fora da lei

A principal motivação do ato unificado de algumas centrais sindicais foi atender a convocação do Cpers/Sindicato que organizou um dia estadual de paralisação para esta segunda-feira (14). A data é considerada marco por completar 500 dias do governo gaúcho, que ainda não cumpre os critérios da Lei Nacional do Piso do Magistério no estado.
Cristiano Estrela / CPERS
Rejane de Oliveira não poupa críticas a Tarso Genro: "“É um governador que não honra o que disse e escreveu ao Cpers" | Foto: Cristiano Estrela / CPERS

Uma solução parcial e provisória para adequar o Rio Grande do Sul à lei federal assinada por Tarso Genro quando era ministro da Justiça foi proposta pelo governo estadual no final de abril. Em acordo com o Ministério Público Estadual do RS, a proposta foi o pagamento de uma parcela complementar a 20 mil professores que ainda não recebem R$ 1.451, valor estipulado como piso nacional da categoria. “Eles sentam às escondidas e depois apresentam um acórdão já assinado e homologado e explicando como eles pretendem fazer para não pagar o piso e atacar as nossas carreiras. Servidores do MP com salários de R$ 24 mil se acharam no direito de sentar com o goverandor para definir como um governo não cumprirá uma lei que irá afetar e trazer consequências para os trabalhadores”, acusou a presidente do Cpers, Rejane de Oliveira.
Como a medida proposta como pagamento parcial do piso não irá incidir sobre o plano de carreira do magistério, Rejane alegou que o sindicato dos professores não irá permitir “que um órgão público como o MP-RS, que deveria garantir a legislação, se atrele ao executivo para legitimar artimanhas para o descumprimento da lei do piso”.
De acordo com a legislação federal, em seu artigo quinto, o piso deve ser reajustado anualmente tendo como base o custo por aluno do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Entretanto, o governo gaúcho sempre reitera que o piso dos professores deve ser corrigido pela variação da inflação, calculada pelo INPC.
Para ilustrar o discurso dos dirigentes sindicais, falas do governador Tarso Genro quando ainda era candidato nas eleições de 2010, em debates com as categorias, foram reproduzidos no carro de som. “Eu estou formalmente, politicamente e moralmente comprometido com o piso salarial dos professores”, ouvia-se Tarso dizer em uma dessas gravações, onde o agora governador acrescentava que “a lei que instituiu o piso teve o seu parecer de constitucionalidade no ministério da Justiça, quando eu era ministro, e essa lei leva a minha assinatura”.
Ao final da reprodução da fala de Tarso Genro um coro de vaias foi feito em frente ao Palácio Piratini.
Foto: Cristiano Estrela / CPERS
Ao final do protesto, servidores soltaram balões pretos para marcar luto pelo não cumprimento de promessas de campanha | Foto: Cristiano Estrela / CPERS

“É um governador que não honra o que disse e escreveu ao Cpers. Que vergonha para o nosso estado ter um governador que coloca um conjunto de projetos em regime de urgência para evitar debate com o serviço público. Por isso que estamos aqui para marcar os 500 dias de um governo fora da lei que não cumpre o que prometeu. Se alguém tinha ilusão que este governo iria ser de palavra, agora já sabe”, afirmou Rejane.
Ao final do protesto, os manifestantes soltaram balões pretos simbolizando o luto em relação aos 500 dias dos governos Dilma e Tarso. Antes de deixar os materiais e voltar aos municípios de origem, os sindicalistas se comprometeram em retornar ao Palácio Piratini para novas manifestações. Por parte do Cpers, no dia 30 de maio está organizada uma redução nos horários nas escolas estaduais.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

“A Dilma vai vetar”, diz ministro do Desenvolvimento Agrário


“O Código Florestal não será sancionado da forma como a Câmara aprovou”, garante Pepe Vargas | Foto: Brizza Cavalcante/Ag.Câmara

Samir Oliveira no SUL21

O ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas (PT), é categórico ao afirmar que a presidente Dilma Rousseff (PT) irá vetar o novo Código Florestal que foi aprovado pela Câmara dos Deputados no dia 25 de abril. “A Dilma vai vetar. Se no todo ou em parte, essa é a discussão”, assegura o petista nesta entrevista ao Sul21.
Pepe garante que o texto não permanecerá intocado. “O Código Florestal não será sancionado da forma como a Câmara aprovou. Terá ou um veto total, ou um veto parcial”, comenta.
O ministro considera que há dois extremos nesse debate: o dos ruralistas que somente querem flexibilizar a legislação e o dos ambientalistas que defendem o que ele chama de “conservacionismo elitista”. Pepe diz que o governo federal não está comprometido com nenhuma dessas duas agendas.
Nesta entrevista ao Sul21, o ministro fala também sobre as perspectivas para a reforma agrária no país e critica a proposta de emenda à Constituição (PEC) que transfere responsabilidade sobre a titulação de terras indígenas ao Congresso Nacional.
“Além de anistiar grandes desmatadores, a Câmara diz que o pequeno produtor tem que recompor igual ao grande”
Sul21 – Como o senhor avalia o texto do novo Código Florestal aprovado na Câmara dos Deputados?
 
Pepe – A Dilma vai vetar. Se no todo ou em parte, essa é a discussão. Parte do texto final aprovado é consenso entre Câmara e Senado. O texto do Senado é muito mais equilibrado, mas algumas coisas aprovadas representam avanços importantes. Há uma legislação bastante protetora para aquilo que não foi desmatado. As disposições permanentes têm pontos muito positivos. E tem um capítulo inteiro sobre a agricultura familiar que é importante que seja preservado. Se o veto for total, zera todo esse avanço. Mas também há aspectos extremamente negativos, como a parte que previa a recomposição de áreas de preservação que foram devastadas. Queremos que haja recomposição e admitimos que ela tenha diferenciações. O agricultor que possui até quatro módulos fiscais não pode ter o mesmo tratamento de quem tem 400 módulos. Defendemos que até quatro módulos fiscais haja diferenciação nas exigências de recomposição de reserva legal. O Senado também tinha entendido assim, mas a Câmara botou isso a perder. Além de anistiar grandes desmatadores, o que é inadmissível, e prever que não haverá recomposição nenhuma em determinadas áreas de preservação permanente, a Câmara diz que o pequeno produtor tem que recompor igual ao grande.
Pepe Vargas: " Há dois extremos nocivos a esse debate. O primeiro é o polo que defende as piores práticas agropecuárias. Mas há um ambientalismo que defende um conservacionismo elitista" | Foto: Marcelo Brandt/Ag.Câmara

Sul21 – Então o texto final terá artigos vetados pela presidente?
 
Pepe – O Código Florestal não será sancionado da forma como a Câmara aprovou. Terá ou um veto total, ou um veto parcial. Há dois extremos nocivos a esse debate. O primeiro é o polo que defende as piores práticas agropecuárias, é a turma da motosserra. Mas no outro polo, há um ambientalismo que defende um conservacionismo elitista. Não entendem que a parte ambiental precisa estar ligada à inclusão social de assentados, de quilombolas, de comunidades de povos tradicionais e de pequenos agricultores. Não concordamos com esse conservacionismo elitista que desconsidera a dimensão social vinculada à ambiental. Esse ambientalismo conservador e elitista não é o nosso horizonte. Queremos denunciar esse tipo de gente, que muitas vezes está a serviço de interesses daqueles que querem mercantilizar a natureza, colocando papeis financeiros para especular na Bolsa. Aí os países em desenvolvimento se limitam a vender serviços ambientais enquanto as nações ricas podem desmatar e comprar esses papeis de serviços.

Sul21 – O senhor assumiu no dia 14 de março. Quais são as metas do ministério para este ano?
 
Pepe – A prioridade é fortalecer os instrumentos de apoio e fomento à agricultura familiar. Dos 5,1 milhões de estabelecimentos rurais no Brasil, cerca de 4,3 milhões são unidades produtivas de agricultores familiares. Elas representam 84% dos estabelecimentos e ocupam 74% da mão de obra no meio rural. Há propriedades familiares já bem desenvolvidas e inseridas no mercado, com capacidade de comercialização e produção, mas que precisam do nosso apoio. E há também as propriedades que ainda estão em desenvolvimento.

Sul21 – Que tipo de apoio o governo federal dá a esses produtores?
 
Pepe – Queremos fortalecer os instrumentos de acesso a crédito, como o Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), que tem financiamento para custeio de safra e para investimentos. Há também os instrumentos de apoio à comercialização. Queremos consolidar a Rede Brasil Rural, que é uma plataforma eletrônica que viabiliza que as cooperativas e associações de produtores cadastrem seus produtos. Já temos mais de 400 cooperativas cadastradas e um universo grande de fornecedores de insumos participando. Além disso, queremos fortalecer a assistência técnica da extensão rural, que é muito importante para o desenvolvimento produtivo das propriedades. E há os programas de garantias de preços mínimos, que são importantes para dar estabilidade a essa parcela de agricultores familiares que já está numa situação desenvolvida ou em desenvolvimento.
"Criou-se a ideia que só o agronegócio exporta e é responsável pela balança comercial brasileira. Temos que pensar em uma estratégia de desenvolvimento da agricultura familiar" | Foto: Gustavo Lima/Ag.Câmara
“O Estado brasileiro, ao longo da história, assentou pessoas e as deixou abaixo da linha da pobreza”
Sul21 -  E que tipo de assistência pode ser dada às famílias que tentam chegar a esse estágio?
 
Pepe – Há uma parcela da agricultura familiar que vive na extrema pobreza. Para isso temos o programa Brasil Sem Miséria, que é coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Social. Como metade das 16 milhões de pessoas que estão abaixo da linha da pobreza vivem no meio rural, uma parte do programa fica sob nossa responsabilidade. Estamos antecipando todas as metas de 2013 para 2012. São metas de atendimento a famílias com assistência técnica diferenciada e continuada, e um subsídio de fomento para atividade produtiva com fornecimento de sementes. Começou ano passado no Nordeste, mas vamos atender também o Sul e o Sudeste, desde que os estados entrem com a assistência técnica. No Rio Grande do Sul, por exemplo, já acertamos com o governo. Nossa meta era atender três mil famílias, mas o Estado nos disse que tem condições de atender 6 mil famílias.

Sul21 – Como estão as demarcações e desapropriações para a reforma agrária no país?
 
Pepe – A reforma agrária é um instrumento de combate à extrema pobreza no campo. A agricultura familiar tem um papel importante no projeto nacional de desenvolvimento, porque distribui melhor a renda, ocupa mais gente no campo e produz 70% dos alimentos no país. Criou-se a ideia que só o agronegócio exporta e é responsável pela balança comercial brasileira. O peso do setor agrário nas exportações brasileiras foi de 36% do total exportado em 2011. Nesse montante, 28% é relativo à agricultura familiar na base. Temos que pensar em uma estratégia de desenvolvimento da agricultura familiar para que ela exporte ainda mais. Há um grande mercado a ser conquistado nos Estados Unidos e na Europa. Segmentos das classes médias e altas desses países querem comprar produtos feitos de forma justa e sustentável. Países com menor capacidade estão ocupando esse nicho.
Pepe Vargas garante que há disposição para dialogar com movimentos sociais do campo a melhora na infraestrutura dos assentamentos | Foto: Janine Moraes/Ag.Câmara

Sul21 – E como estão as demarcações de terras atualmente?
 
Pepe – Não temos contingenciamento de recursos orçamentários para obtenção de terras. Temos condições de executar todo o orçamento – previsto em R$ 106 milhões. Já liberamos R$ 200 milhões em Títulos da Dívida Agrária (TDAs) para que o Incra possa encaminhar o pagamento de decretos de desapropriação. Liberamos também R$ 44 milhões para pagamento de benfeitorias de imóveis cujas TDAs já estavam lançadas. Só com essa liberação, já atendermos 11 mil famílias. Estamos mudando o processo para fortalecer a infraestrutura dos assentamentos, começando pela moradia. Historicamente, a moradia entrava no crédito de habitação do Incra. O valor era R$ 15 mil por família, com três anos de carência e 17 anos para pagar. Mas temos o Minha Casa, Minha Vida, que financia residências no valor de R$ 25 mil e tem 96% de subsídio. Não há por que não colocarmos esse programa nos assentamentos. Iremos atender melhor e o assentado irá gastar menos. Aceitamos discutir com os movimentos sociais do campo uma nova metodologia do crédito de instalação. Estamos debatendo uma melhor maneira, não formatamos nada ainda, mas vai haver uma mudança. Queremos também levar os programas Água Para Todos e Luz Para Todos para dentro dos assentamentos. Não há por que o Incra assumir o financiamento dessas infraestruturas se existem programas que podem arcar com esses custos. Com isso o Incra pode usar seus recursos para priorizar outras questões fundamentais.

Sul21 – Como conciliar a realização de novos assentamentos com a melhoria dos já existentes?
 
Pepe – Tem anos que assentaram 100 mil famílias, mas davam terra sem infraestrutura. Temos um passivo social a ser resgatado. Há assentamentos que se desenvolveram, exportam e possuem tecnologia aplicada. Mas há um número expressivo de assentamentos com famílias que vivem na linha da pobreza. O Estado brasileiro, ao longo da história, assentou pessoas e as deixou abaixo da linha da pobreza. A estratégia do Brasil Sem Miséria é recuperar as estruturas desses locais. Vamos reconhecer que assentados da reforma agrária também são cidadãos que precisam ter acesso aos programas do governo federal. Não podemos achar que só o Incra tem responsabilidade de resolver essas questões.
“A turma da casa grande, que sempre defendeu a predação do país por uma elite minoritária, articulou a PEC 215 para impedir que o Estado brasileiro reconheça os direitos dos quilombolas e dos povos indígenas”
Sul21 – O MST diz que o governo federal possui um teto de até R$ 100 mil para desapropriações de terras. Os Sem-Terra alegam que isso faz com que 90% das propriedades permaneçam intocáveis.
 
Pepe – Não há nada que defina a existência de um teto de R$ 100 mil. Mas é verdade que, quando se vai desapropriar uma terra, o custo dela interessa. Quando o poder público vai desapropriar uma área para construir uma escola ou fazer um projeto habitacional, o preço da terra é levado em consideração. E, eventualmente, se a terra é muito cara, se opta por outro lugar. Na reforma agrária não pode ser diferente. O valor por hectare e o custo por família assentada são elementos importantes. O administrador precisa zelar pelo princípio da economicidade. Isso não significa dizer que se vá deixar de comprar terras. Mas também não iremos comprar terras que custem R$ 30 mil por hectare. Assim como não iremos comprar uma propriedade que custe R$ 2 mil por hectare e jogar as famílias num local onde não há estrada, água ou luz. É preciso bom senso.
"O trabalho escravo é uma abominação. Quem utiliza trabalho escravo na produção precisa ter suas terras desapropriadas" | Foto: Leonardo Prado/Ag.Câmara

Sul21 – O que encarece o custo das desapropriações?
 
Pepe – Há um processo de encarecimento do preço da terra no Brasil. Precisamos que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgue a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) que questiona a medida provisória que estabeleceu que os juros compensatórios de uma terra desapropriada seriam de 6% e não de 12% – fixados por uma jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Nenhum fundo de investimento remunera a esse valor. O Judiciário brasileiro estabelece juros compensatórios numa desapropriação de terras que remunera muito mais do que qualquer aplicação no sistema financeiro. É possível especular muito mais tendo uma terra desapropriada do que no mercado financeiro. Isso é um absurdo. O governo, há muitos anos, fez uma medida provisória fixando os juros em 6% e houve uma Adin que foi acolhida pelo STF em caráter liminar. Continua-se pagando juros compensatórios de 12% e o julgamento do mérito é aguardado há mais de 10 anos. Isso impacta o orçamento do Incra. Quando o proprietário de uma terra não concorda com a avaliação do Incra, o Judiciário demora cinco anos para decidir quanto é o preço de uma terra desapropriada. Nesse meio tempo, o governo fica pagando 12% de juros compensatórios. É óbvio que isso diminui a capacidade do Estado brasileiro de desapropriar áreas para fins de reforma agrária. O orçamento não é um elástico que pode ser esticado. Precisamos que o Supremo julgue essa Adin. Se a taxa Selic está em 9%, por que os juros compensatórios são 12%?

Sul21 – Qual sua posição sobre PEC 215, que transfere para o Congresso Nacional a titulação de terras indígenas?
 
Pepe – A PEC 215 é uma reação dos setores mais retrógrados e conservadores que querem impedir o reconhecimento por parte do Estado brasileiro dos direitos dos povos e comunidades tradicionais. Temos uma posição contrária a essa PEC e defendemos a constitucionalidade do decreto que regulamenta a demarcação e o reconhecimento dos territórios quilombolas, que está sendo julgado pelo STF. A turma da casa grande, que sempre defendeu a predação do país por uma elite minoritária, articulou a PEC 215 para impedir que o Estado brasileiro reconheça os direitos dos quilombolas e dos povos indígenas.

Sul21 – Há também a PEC do trabalho escravo, que propõe o confisco das propriedades que utilizem mão de obra escrava.
 
Pepe – Queremos que seja aprovada. O trabalho escravo é uma abominação. Quem utiliza trabalho escravo na produção precisa ter suas terras desapropriadas para que elas cumpram uma função social.

sexta-feira, 11 de maio de 2012

O BOM EXEMPLO PORTUGUÊS


Com a descriminalização, mortes relacionadas às drogas caíram 50%

 
 
O governo de Portugal não planeja voltar atrás. Apesar da Holanda ser o país europeu mais associado à legislação liberal de drogas, já faz 10 anos que Portugal se tornou a primeiranação europeia a dar o passo corajoso de descriminalizar a posse de todas as drogas dentro de suas fronteiras – de maconha até heroína, e tudo o mais. Esta medida controversa entrou em vigor em junho de 2001 em resposta às crescentesestatísticas de HIV/AIDS.
Enquanto muitos críticos do país pobre e amplamente conservador atacavam a mudança radical na política de narcóticos, temendo que levasse a um turismo de drogas e ao mesmo tempo agravasse a já assustadora alta taxa de uso de drogas pesadas no país, um relatório publicado em 2009 pelo Cato Institute contauma história diferente. Glenn Greenwald, o advogado e autor que conduziu a pesquisa, disse à Time: “A descriminalizaçãodas drogas em Portugal tem sido um sucesso estrondoso. Ela permitiu que o governo português pudesse gerenciar e controlar a questão muito melhor do que praticamente todos os outros países ocidentais”.
Em 2001, Portugal tinha o índice mais alto da União Europeia de vírus HIV entre usuários de drogas injetáveis – incríveis dois mil novos casos por ano, em um país com população de somente 10 milhões. Apesar da controvérsia previsível, o governo português sentiu que não havia nenhuma outra forma com a qual poderia efetivamente dominar este problema crescente. Enquanto nos Estados Unidos os pedidos por descriminalização total das drogas ainda são descartados como uma espécie de preocupação marginal, os portugueses decidiram fazê-lo, e têm silenciosamente lidado com isso há uma década. Surpreendentemente, a maioria dos relatórios confi áveis parecem apontar que a descriminalização tem sido um sucesso impressionante.
 
Programas de tratamento
 
O DEA (Drug Enforcement Administration), órgão que centraliza o combate às drogas nosEUA, vê esta questão de uma maneira diferente. Portugal, eles afirmam, era um desastre, com taxas de heroína e HIV fora do controle. “A população viciada de Portugal e os problemas que acompanham o vício continuam a crescer”, afi rma o DEA. “Em um esforço para reduzir o número de dependentes no sistema prisional, o governo português tem promulgado algumas políticas radicais nos últimos anos com a eventual descriminalização de todas as drogas ilícitas em julho de 2001”.
 
Contudo, a situação é outra, como explica Greenwald: ao libertar seus cidadãos do medo da perseguição e prisão por uso de drogas, Portugal melhorou drasticamente sua habilidade em encorajar os dependentes a recorrerem ao tratamento.
Os recursos antes destinados para a perseguição e prisão dos viciados em drogas estão agora disponíveis para prover programas de tratamento para eles”, diz. Sob o sistema perfeito, o tratamento também seria voluntário, mas como alternativa à prisão, o tratamento obrigatório economiza dinheiro. Mas, por ora, “a maioria dos Estados da União Europeia tem taxas de consumo de drogas que são o dobro ou o triplo das taxas portuguesas pós-descriminalização”, diz Greenwald.
 
Para aqueles que procuram dicas de como o governo dos Estados Unidos pode enfrentar seu problema doméstico de drogas, os números portugueses são atraentes. Após a descriminalização, Portugal acabou vendo-se com a menor taxa do uso de maconha por pessoas acima de 15 anos da União Europeia: por volta de 10%. Compare isso com os 40% de pessoas acima de 12 que fumam maconha regularmente nos Estados Unidos, um país com algumasdas leis antinarcóticos mais punitivas no mundo desenvolvido. O uso de drogas de todos os tipos diminuiu em Portugal: o uso na vida entre adolescentes de 12 a 15 anos caiu de 14,01% para 10,6%. O de heroína na vida entre jovens de 16-18 anos caiu de 2,5% para 1,8%. E aquelas taxas horríveis de infecção do vírus HIV que causou, em primeiro lugar, a mudança? Astaxas de infecção de HIV dentre os usuários de droga caiu incríveis 17%, enquanto as mortes relacionadas às drogas foram reduzidas para mais do que a metade.
 
Não há dúvidas de que o fenômeno do vício esteja em declínio em Portugal”, disse João Goulão, presidente do Instituto da Droga e Toxicodependência, numa entrevista coletiva que marcou o décimo aniversário da lei.
 

 
Tradução: Jessica Grant 
Publicado originalmente no site The Fix e reproduzido no número 02 da revista Samuel

Segunda Guerra Mundial: vitória do socialismo


Por Osvaldo Bertolino no GRABOIS
 
Há exatos 67 anos, à meia-noite de 8 para 9 de maio de 1945, os canhões silenciaram fogo na Europa pela primeira vez desde 1939. Estava encerrada a mais sangrenta guerra de todos os tempos. A grande vítima e o grande vitorioso do conflito foi o socialismo.
 
Não deixarei o Volga! Não sairei de lá! Os gritos de Adolf Hitler, tomado por um acesso de cólera, eram a expressão do desastre causado pela sua ordem de manter o 6º Exército ao redor da simbólica cidade soviética de Stalingrado. A derrota nazista naquele local representou uma reviravolta na Segunda Guerra Mundial e um êxito incalculável dos comunistas em todo o planeta.
A reviravolta se consolidaria em janeiro de 1942, quando o Exército Vermelho lançou a ofensiva geral em uma ampla frente e em alguns setores avançou mais de 400 quilômetros para o ocidente, afastando a fera nazista que rugia às portas de Moscou. Os comunistas soviéticos, artífices da vitória, ganharam enorme prestígio internacional. A importância militar e política fora gigantesca — pela primeira vez durante toda a guerra o exército nazista sofria uma derrota séria.
Poucos meses antes, em 7 de novembro de 1941 — 24º aniversário da revolução socialista de 1917 —, o líder revolucionário Josef Stálin dissera ao Exército Vermelho e aos guerrilheiros comunistas que o mundo via neles “a força capaz de destruir as hordas rapaces dos invasores alemães”. Adolf Hitler, o senhor absoluto de Berlim, determinara que em 2 de outubro seria desencadeada a grande ofensiva. Tufão era o seu nome em código, um verdadeiro ciclone que devia abater-se sobre os soviéticos, destruindo as últimas forças combatentes diante de Moscou e fazendo desmoronar a pátria do socialismo.
 
Tudo para frente, tudo para a vitória!

A história não conhecia guerras libertadoras como aquela. Já nos primeiros movimentos, ficara demonstrado que na União Soviética os combates seriam diferentes dos que ocorreram na Europa. Além das debilidades daqueles exércitos, o trabalho de sapa dos colaboracionistas fora determinante para o avanço alemão. No país socialista, as bases sociais para a organização de contrarrevolucionários não existiam mais — ao contrário do que ocorreu na guerra civil, após a Revolução de 1917.
Os soviéticos, com o lema “Tudo para frente, tudo para a vitória!”, estavam conscientes do que representava aquela guerra. Em muitos locais os combatentes deixaram inscrições de loas à pátria gravadas nas ruínas. Eram exemplos do elevado moral comunista, que levaram os Estados Unidos e a Inglaterra a declarar, em 22 de junho de 1941, que estavam dispostos a prestar ajuda à União Soviética. Havia, até então, uma passividade das potências ocidentais. Para as velhas senhoras da Europa e seu aliado norte-americano, o problema de Adolf Hitler era com os soviéticos.
Em janeiro de 1933, quando se tornou chanceler alemão, Adolf Hitler já havia publicado sua plataforma política. Era o livro Mein Kampf  (Minha Luta), um best-seller que naquele tempo contava com mais de um milhão de exemplares vendidos. Nele, estavam claras as idéias do novo chanceler alemão: ódio aos comunistas, aos judeus, aos eslavos, aos proletários, etc. Logo, a venda da obra nazista explodiria. "Com exceção da Bíblia, nenhum outro livro foi tão vendido durante o regime nazista", escreveu William L. Shirer no livro Ascensão e Queda do 3° Reich, parcialmente traduzido para o português pelo histórico dirigente do Partido Comunista do Brasil, Pedro Pomar.
Na obra, Hitler expôs com clareza o modelo de governo que ele queria implantar na Alemanha. A "nova ordem" que o líder nazista pretendia impor ao mundo tinha no Estado de seu país — que um dia se tornaria "o soberano da terra" — o alicerce para uma ditadura absoluta. A "nova ordem" nazista também teria uma "ideologia universal". Para tanto, segundo Minha Luta, a Alemanha deveria ajustar contas com a França, "o inexorável e mortal inimigo do povo alemão". Hitler considerava esse passo decisivo como meio para mais tarde "dar ao nosso povo a expansão que venha a ser possível alhures".
 
Estratégia nazista
 
Ele estava dizendo que a Alemanha tinha como alvo final a União Soviética. "A Alemanha deve expandir-se para o Leste, em grande medida às custas da Rússia", escreveu. No primeiro volume de Minha Luta, Hitler discorreu longamente sobre o problema do "espaço vital" — Lebensraum, em alemão. "Se na Europa de hoje falarmos em terras, haveremos de ter em mente apenas a Rússia e as nações vizinhas a ela subordinadas", afirmou o líder nazista. Ele perseguiria esse objetivo até à morte. Para Hitler, o destino tinha sido generoso ao entregar a região à direção dos comunistas — o que, segundo sua teoria, era o mesmo que entregá-la aos judeus.
A estratégia nazista estava clara. Primeiro, era preciso aniquilar a França apenas como condição para o avanço de seus exércitos rumo ao Leste. No decorrer da guerra, essa promessa foi fielmente executada. Hitler tomou a Áustria, a região dos Sudetos, na Tchecoslováquia, e a parte ocidental da Polônia. Em setembro de 1938, os líderes da Alemanha, Inglaterra e França assinaram o "Pacto de Munique", permitindo ao exército alemão iniciar sua marcha para a Tchecoslováquia. A ameaça à União Soviética estava mais perto do que nunca.
 
Segurança coletiva
 
Logo depois da ocupação nazista da Tchecoslováquia, a União Soviética propôs uma conferência das seis potências (Alemanha, Itália, França, Inglaterra, Estados Unidos e União Soviética) para debater formas de evitar futuras agressões. Mas a proposta foi considerada "prematura". Os movimentos no xadrez político ocidental deixavam claro a intenção de manter a União Soviética fora do concerto das potências européias. Moscou voltou a acenar, em vão, com um pacto de assistência mútua com a França e a Inglaterra. Esses movimentos evoluíram para a aproximação entre União Soviética e Alemanha.
Discursando no VIII Congresso do Partido Comunista da União Soviética, em março de 1939, Josef Stálin disse que Inglaterra e França haviam abandonado o princípio da segurança coletiva, com a finalidade de orientar os Estados agressores para "outras vítimas". Stálin advertiu que os países ocidentais estavam empurrando os alemães ainda mais para o Leste, prometendo-lhes uma presa fácil. Segundo o líder soviético, os princípios orientadores do país socialista eram o de seguir uma política de paz, de fortalecimento das relações econômicas com todos os países e não permitir que a União Soviética fosse arrastada para conflitos pelos provocadores de guerra.
O recado foi entendido em Berlim. A Alemanha tinha interesse em atacar a Polônia sem temer uma intervenção soviética. As conversações evoluíram para o pacto de não-agressão mútua. Quando Hitler invadiu a Polônia, a União Soviética movimentou suas tropas para os Estados Bálticos. A etapa principal do pacto estava vencida. A Alemanha nazista preparava "uma campanha rápida" para "esmagar a União Soviética". Em junho de 1941, um ano depois da queda da França, as tropas nazistas atacaram o país socialista. Um general alemão disse que a guerra estaria ganha em catorze dias.
 
Chegada da reviravolta

A batalha de Stalingrado representou a chegada da reviravolta. Dali para diante, o poder de Hitler declinaria, minado pela crescente contra-ofensiva soviética. Um representante do "Ministério para os Territórios Ocupados do Leste", criado pelo governo nazista, disse na ocasião que os soviéticos "estavam lutando com excepcional bravura e com espírito de renúncia, nada mais visando que o reconhecimento da dignidade humana". O resultado seria o esmagamento da máquina de guerra criada por Hitler.
Em junho de 1944, as forças anglo-americanas atacaram na frente ocidental. A muralha nazista foi rompida em poucas horas. À meia-noite de 8 para 9 de maio de 1945, os canhões silenciaram fogo na Europa pela primeira vez desde 1939. O fim da contenda entre nazistas e soviéticos chegou quando as tropas motorizadas do Exército Vermelho capturaram o coração da cidadela nazista — Berlim. Um soldado anônimo hasteou a bandeira vermelha no topo do Reichstag. Em 2 de setembro de 1945, os japoneses renderam-se a bordo do encouraçado norte-americano Missouri, ancorado na baía de Tóquio. Era o fim de uma luta que se iniciara em meados de 1937, na China, expandindo-se mais tarde para praticamente todo o Pacífico.
A bandeira da liberdade e da democracia passou a flutuar por toda a Europa e em boa parte do mundo. O resultado da guerra fez com que o socialismo ganhasse muito respeito. Na luta pela existência, os povos aprendem a conhecer seus amigos e a reconhecer os seus inimigos. O socialismo bateu de frente com a Alemanha nazista e foi a principal barreira ao III Reich sonhado por Adolf Hitler. No combate, emergiu a União Soviética na sua verdadeira estatura e significação, com seus líderes, sua economia, seu exército, seus povos e, segundo o então secretario de Estado norte-americano, Cordell Hull, “a quantidade épica de seu fervor patriótico”.
 
A ordem de Adolf Hitler
 
Quando o Exército Vermelho empurrava as tropas nazistas para fora do território soviético, em fevereiro de 1942, o general Douglas Mac Arthur, que assinaria a rendição dos japoneses, disse: “Durante a minha vida eu participei de numerosas guerras e testemunhei outras tantas, assim como estudei pormenorizadamente as campanhas dos principais cabos de guerra do passado. Em nenhuma delas observei tão eficiente resistência (…). A escala e grandeza desse esforço assinala-o como o maior feito militar em toda a história.”
Segundo William L. Shirer, o tratamento aos prisioneiros de outros países, especialmente britânicos e americanos, era relativamente mais suave. “Havia, vez por outra, casos de assassínios e massacre deles, mas isso, geralmente, era devido ao excessivo sadismo e crueldade de certos comandantes”, escreveu ele. Quando a maré da guerra começou a virar contra Hitler, com a contra-ofensiva soviética iniciada na batalha de Stalingrado, o líder nazista ordenou o extermínio dos “comandos” aliados capturados, especialmente no ocidente. “Doravante, todos os inimigos em missões denominadas ‘de comando’, na Europa e na Ásia, (…) devem ser mortos até ao último homem”, dizia a ordem de Hitler.
 
Canhões de grande calibre

É impossível calcular o volume de perdas econômicas causadas pela guerra. Quanto à perda de vidas, há uma estimativa, embora longe de ser exata. Morreram cerca de 50 milhões de pessoas, fardadas ou não. Uma média de 8,3 milhões por ano de luta. Tomada em seu conjunto, a Segunda Guerra Mundial é um fato sem paralelo na história. Nunca tantos países haviam se envolvido num conflito armado. Nunca se produziu tanto armamento. Raramente se aplicou tanta pesquisa e dinheiro no desenvolvimento de equipamentos militares.
A guerra começou numa época em que os exércitos ainda usavam cavalos. Quando terminou, os caças a jato já voavam. No final da década de 30, as armas mais destrutivas ainda eram os canhões de grande calibre. Meia dúzia de anos mais tarde o planeta tomava contato com as armas nucleares e com os mísseis balísticos. O mundo não poderia ser o mesmo após o término da Segunda Guerra Mundial.
 
O julgamento de Nuremberg

No dia 20 de novembro de 1945, 21 acusados nazistas sentaram no banco dos réus no Palácio da Justiça, em Nuremberg, Alemanha, para o julgamento por crimes de guerra. Outro acusado, Martin Bormann, foi acreditado como morto. Pela primeira vez, ocorria um julgamento internacional. Para isso, foi criado o Tribunal Militar Internacional (TMI), que combinou elementos do direito anglo-americano e das leis civis do continente europeu, formado pelas quatro potências aliadas: União Soviética, Inglaterra, França e Estados Unidos.
Em agosto de 1945, os aliados reuniram-se em Londres para assinar o acordo que criou o TMI e acertar as regras do julgamento. O documento, conhecido como “Carta de Londres”, tem uma característica salutar: a ausência de palavras como “lei” ou “código”, num esforço para lidar com aquela questão delicada de forma eficiente.

A “Carta de Londres” criou as regras dos processos de julgamento e definiu os crimes a serem tratados: assassínio, extermínio, escravização, deportação, atos inumanos cometidos contra alguma população de civis antes ou durante a guerra e perseguição política, racial, ou religiosa. Os réus foram acusados de exterminar milhões de pessoas e espalhar a guerra na Europa.
 
O julgamento de Nuremberg

Os processos de Nuremberg certificaram o nascimento do direito internacional. O TMI faria ainda outros julgamentos, principalmente de médicos que realizaram experimentos brutais, e criou um documento que ficou conhecido como “Código de Nuremberg” — considerado um marco na história da humanidade por estabelecer uma recomendação internacional sobre os aspectos éticos envolvidos na pesquisa com seres humanos.
Logo no início dos trabalhos, o juiz norte-americano Robert Jackson, que atuou como promotor-chefe da acusação, declarou: “Não devemos esquecer que os parâmetros pelos quais julgamos hoje estes acusados são os parâmetros pelos quais a história nos julgará amanhã. Passar a estes acusados um cálice envenenado é pôr esse cálice em nossos próprios lábios. Devemos observar em nossa conduta tal imparcialidade e integridade que a posteridade possa elogiar este julgamento por ter cumprido as aspirações da humanidade de que se faça justiça”. A duras penas, o mundo chegava a um ponto decisivo: o que fazer depois daquele conflito gigantesco?
 
Fenda no governo brasileiro
 
No Brasil, a Segunda Guerra Mundial abriu uma fenda no governo, que se estendeu depois que, em 7 de dezembro de 1941, realizou-se na cidade do Rio de Janeiro a Conferência de Chanceleres das Américas em apoio à entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial. Ali se descortinaram caminhos políticos para o progresso do movimento patriótico e antifascista.
O país estava chocado com o torpedeamento de vários navios da Marinha brasileira por submarinos alemães e o governo reagia timidamente devido às suas diferenças internas — o ministro da Guerra, general Eurico Gaspar Dutra — que viria a ser o sucessor de Getúlio Vargas na Presidência da República e aliado incondicional dos Estados Unidos no nascedouro da “Guerra Fria” —, e o aparelho repressivo chefiado por Filinto Muler eram abertamente a favor da Alemanha. Mas a pressão popular levaria, finalmente, o governo a declarar guerra ao Eixo nazi-fascista no dia 22 de agosto de 1942.
 
Manifestação organizada pelo Partido Comunista do Brasil na Praça da Sé, em São paulo, comemora derrota do nazi-fascismo

Outra manifestação da divisão no governo ocorreu quando os estudantes organizaram uma “passeata antitotalitária” no dia da Independência dos Estados Unidos, 4 de julho, que contou com o apoio do ministro das Relações Exteriores, o chanceler Osvaldo Aranha, e a repulsa de Filinto Muller. O chefe da repressão tentou impedir a passeata, desacatou o ministro da Justiça interino, Vasco Leitão da Cunha, foi preso e demitido. Em consequência do episódio, foram demitidos também Francisco Campos, ministro titular da Justiça, e Lourival Fontes, diretor do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). Felisberto Batista Teixeira, diretor do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), foi outro afastado.
 
Organização da FEB

 
Os avanços das forças soviéticas, que impulsionavam a luta democrática em todo o mundo, refletiram fortemente no Brasil. O Partido Comunista do Brasil se empenhou com tenacidade na luta anti-fascista e propôs a organização da Força Expedicionária Brasileira (FEB), que lutaria em Nápoles, Itália. Com essa finalidade, o Partido abriu duas frentes de trabalho — reforçou a União Nacional dos Estudantes (UNE) e relançou a Liga da Defesa Nacional, entidade fundada em 1916 no Rio de Janeiro pelos intelectuais Olavo Bilac, Pedro Lessa e Miguel Calmon, sob a presidência de Rui Barbosa.
No dia 28 de novembro de 1943, o governo decidiu organizar a FEB. “Fomos os primeiros a reivindicar a participação militar do Brasil e o fizemos de maneira consequente”, segundo o histórico dirigente comunista João Amazonas. As Comissões de Ajuda, criadas às centenas em todo o território nacional, angariaram donativos, realizaram conferências e promoveram comícios populares. Todo esse trabalho foi coroado com a organização da FEB.
O desembarque do primeiro escalão da FEB em Nápoles, Itália, em 17 de julho de 1944, coroou o trabalho abnegado daqueles brasileiros que olhavam para o futuro e imaginavam o país livre da ditadura do Estado Novo e das ameaças nazi-fascistas. O Partido Comunista do Brasil mobilizou forças e organizou grandes ações em favor desse objetivo. E, após o término da guerra, enfrentaria seus efeitos.
 
Denúncia de Maurício Grabois
 
No dia 9 de outubro de 1946, o líder da bancada do Partido Comunista do Brasil na Assembléia Constituinte, Maurício Grabois, ocupou a tribuna para denunciar o perigo que a guerra ainda representava. Ele reagiu, indignado, às palavras de Gilberto Freyre (UDN-PE) que, “em nome da consciência universal cristã”, protestou contra a pena de morte imposta aos criminosos nazista julgados em Nuremberg. Grabois disse: “A clemência para com esses bandidos nazistas em Nuremberg poderá significar, para o futuro, a morte de milhões de homens livres.”
O líder da bancada comunista também denunciou a proibição da entrada de judeus no Brasil pelo governo do general Dutra. “Ainda ressoa o eco das bombas da última conflagração e os mesmos preconceitos, as mesmas perseguições, ainda persistem no cenário mundial”, disse Grabois. “Hoje, após a derrota do nazi-fascismo, vemos se levantar as tentativas dos imperialistas norte-americanos e seus aliados para reacender a fogueira ateada por Hitler”, afirmou.
 
Nascimento da “Guerra Fria”

A guerra mostrou ser um negócio lucrativo. Durante os anos da Primeira Guerra Mundial, estima-se que os monopólios americanos obtiveram um lucro líquido de US$ 38 bilhões. Durante a Segunda Guerra Mundial, o lucro líquido foi de US$ 53 bilhões. Logo, uma violenta tempestade se formaria debaixo da calma aparente do pós-Segunda Guerra Mundial. Enormes áreas coloniais e semicoloniais do globo, agitadas com as novas esperanças de liberdade pelo exemplo da vigorosa vitória das forças democráticas, estavam despertando e ameaçando subverter a pesada estrutura do imperialismo. A revolução socialista cintilaria na China e começava a irromper na Coreia.
Eram acontecimentos anunciados como o fim dos tempos, obras de uma “conspiração moscovita”. O mundo capitalista, que se debatia nas garras da crise antes do início da Segunda Guerra Mundial enquanto a União Soviética embarcava em uma era de progresso, armava-se febrilmente para impedir o avanço do socialismo. O mito-propaganda da “ameaça comunista” trazia de volta o rame-rame dos velhos chavões que inundaram o mundo pelas ações do nazi-fascismo no entreguerras. Era o surgimento da nova face do anticomunismo, a “Guerra Fria”.
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Editor do Portal Grabois

Cpers promete parar escolas para "denunciar” 500 dias do governo Tarso na segunda-feira


Sindicato ainda criticou "promoção" de juíza que homologou acordo entre MP e Piratini pelo pagamento do piso

O Cpers-Sindicato reiterou, hoje, paralisação na rede estadual, na segunda-feira, para que a categoria avalie os 500 dias do Governo Tarso. A direção do sindicato sugere que os pais não levem os filhos à escola. A data escolhida é a véspera do dia do pagamento do complemento anunciado pelo Piratini para que nenhum professor ganhe menos de R$ 1.451 para 40 horas semanais de trabalho. O sindicato é contra o abono. “Vamos estar em vigília na frente do Palácio (Piratini) e depois vamos fazer uma caminhada denunciando as políticas que atacam os direitos dos trabalhadores”, disse a presidente da entidade, Rejane de Oliveira.

Na tarde desta sexta, a direção do sindicato esteve no Fórum Central cobrando uma decisão do judiciário sobre os recursos do Cpers contra o pagamento do complemento. A entidade entende que o acordo entre o Ministério Público (MP) e o governo do Estado autorizando a medida é prejudicial à categoria, que quer a integralidade do piso nacional para todos os professores da rede pública.

A juíza Mara Lúcia Cócaro, que homologou o acordo, deixou a 2ª Vara da Fazenda Pública para assumir cadeira na Corregedoria de Justiça. Para Rejane de Oliveira, a promoção é suspeita. “Nós achamos muito estranho que ala tenha tido como último ato (antes de trocar de função) a homologação de um acordo sem a manifestação daqueles que são afetados por esse acordo”, disse. O Tribunal de Justiça garante que a remoção da juíza respeitou critérios técnicos.

O departamento jurídico do Cpers protocolou dois recursos, um na sexta-feira da semana passada e outro hoje, contra o entendimento possibilitando o pagamento a mais de 30 mil professores que recebem menos de R$ 1.451. O sindicato entrou na ação, da qual fazem parte Estado e MP, na condição de prejudicado. Para o MP não há prejuízo aos professores e por isso não cabe recurso. O judiciário ainda não decidiu se vai aceitar as ações.

  
 
  Fonte: Samuel Vettori / Rádio Guaíba

Visitar ou (porque não?) revisitar Magritte

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José Goulão no BEINTERNACIONAL


Se estiver por Bruxelas, se passar por Bruxelas, se já visitou ou não visitou vale a pena passar um tempo no Museu Magritte. Não apenas pelo fantástico acervo reunido do pintor do cachimbo que não é um cachimbo, do livro que não é um livro, do surreal como real que ainda não existe. Sobretudo será um reencontro compensador com uma Europa de polémica, criatividade, cultura e ideias que vai desaparecendo a vertiginosa velocidade.
A obra de Magritte foi criada durante períodos gloriosos e trágicos do Continente que é conhecido por “velho” pelo seu papel como epicentro da cultura ocidental, dos movimentos ideológicos, sociais, culturais, filosóficos, científicos e humanistas que o atravessaram com riqueza prodigiosa repercutida em toda a História Universal. Magritte nasceu nas antevésperas do século das luzes e a sua obra cruza as duas guerras mundiais, a loucura dos anos vinte, as esperanças e ilusões do período de quarenta e cinco a cinquenta, o auge da guerra fria e ainda assimilou cores e sons dos renovadores anos sessenta.
Olhar para a sucessão de quadros expostos no museu instalado no Museu Real das Belas Artes de Bruxelas, sem restrições de tempo e obrigações de compromissos, é como deixar-se levar por uma viagem fantástica e pessoal através da Europa em vias de extinção, atingida agora pelos cratas de várias géneses manobrando ali nas vizinhanças, paradoxalmente também em Bruxelas, na ostentação do seu quartel de destruição.
Não há como sentir as cores, as formas, as ilusões, as distorções, as provocações os delírios para se perceber de modo inquietante e assustador o contraste entre a genialidade da criatividade e da liberdade humanas e a brutalidade feroz e repressiva das ideias quadradas com que se procura formatar em sistema operativo global o inesgotável potencial de progresso pulsando nos cérebros individuais.  Está aqui tudo, no espaço de alguns quarteirões - fragmentos do apogeu e armas de liquidação.
A viagem pelo Museu Magritte faz-se de tela em tela e passo a passo por um espólio documental onde encontramos a escrita, o desenho, as edições de revistas e manifestos, os artigos, as polémicas entre os maiores nomes da cultura, do humanismo e da cidadania europeias contemporâneos de Magritte, seus companheiros uns, seus rivais de tendências outros, numa vertigem capaz de derrubar barreiras de preconceitos, demolir muros de práticas inquisitoriais, alguns tão fortes que continuam a resistir – e a reconstruir-se.

Indecisão sobre governo pode levar Grécia à falência

Gabriel Bonis na CARTA CAPITAL

É possível que a Grécia siga o exemplo da Bélgica, que ficou mais de um ano sem um líder eleito. Mas isso seria péssimo, aponta especialista. Foto: AFP

A crise financeira está destruindo a dívida pública da Grécia e os líderes do país sofrem forte pressão da União Europeia e do Fundo Monetário Internacional (FMI) para adotar intensas medidas de austeridade. Em troca, o país receberia dois pacotes de resgate de cerca de 240 bilhões de euros para continuar a tentativa de salvamento de sua economia. O problema é que os líderes políticos não conseguem criar um consenso para formar um novo governo, após as eleições legislativas do último domingo 6.
Alexis Tsipras, líder do Syriza – partido da esquerda radical segundo colocado nas eleições legislativas -, não conseguiu formar uma coalisão, assim como Antonis Samaras, chefe da legenda conservadora Nova Democracia, vencedora do pleito. A tarefa recai sobre Evangelos Venizelos, do Pasok, que terá três dias para tentar sessar a intensa polarização de correntes políticas, a favor e contra o acordo de resgate financeiro do país, enquanto uma nova eleição se torna cada vez mais provável.
Um cenário de incerteza que, segundo analistas ouvidos por CartaCapital, deve levar ao bloqueio de novos empréstimos internacionais, recolocando a falência grega e a possibilidade de saída do euro em discussão – é bom lembrar que o país depende de ajuda externa para pagar seus credores.
A Grécia deveria receber nesta quinta-feira 10 uma parcela de 5,2 bilhões de euros do acordo, mas os governos europeus retiveram 1 bilhão da quantia em um movimento que demostra insatisfação. “O bloqueio deve permanecer até a formação de um governo minimamente a favor dos princípios básicos do plano de resgate. Mas isso já atrasa o processo político em andamento para implementar as medidas de austeridade”, diz Elena Lazarou, doutora em estudos internacionais e especialista em Grécia, a CartaCapital.
Em 15 de maio, o país deve devolver cerca de 450 milhões de euros de obrigações que seus credores se negaram a trocar em uma grande operação realizada em março. Analistas apontam que a Grécia tem reservas apenas até o final de junho. Logo, caso o embargo se confirme, o governo deve enfrentar dificuldades para manter serviços básicos, como escolas e hospitais, o que deve provocar uma piora dos índices sociais e novos protestos.

Centro-direita e centro esquerda punidas nas urnas

Neste cenário, os gregos votaram contra os socialistas do Pasok (centro-esquerda) e o ND (centro-direita), adversários políticos que se uniram em novembro passado em um movimento inédito para formar um governo de coalisão comprometido com o corte de gastos e benefícios sociais.
Após o pleito, o ND saiu de 33,5% nas eleições de 2009 para menos de 19%, ou 108 cadeiras no Parlamento. O Pasok despencou de 43% para 13% dos votos e elegeu apenas 41 deputados, enquanto o Syriza conquistou 52 representantes e tornou-se a segunda força política grega, defendendo a revogação das medidas de austeridade implementadas e a investigação do sistema bancário do país.
Conciliar os interesses e visões destes partidos em um momento de crise é uma tarefa complexa, pois as legendas antiausteridade que ganharam espaço também possuem outros questionamentos sobre a UE. “Esses grupos criticam a maneira como a Grécia se inseriu no grupo e ao paradigma da liberalização financeira e da mobilidade de capital no bloco, mas sem uma política unificada em direitos trabalhistas ou de uma rede de proteção social entre os 27 países membros”, explica Mauricio Santoro, doutor em Ciências Políticas e professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Por isso, Lazarou acredita que as chances de se formar um governo de coalisão com maioria absoluta no Parlamento são remotas. “Mesmo a ND e o Pasok não conseguiram um acordo sobre o plano da UE. Não vejo como formar um governo de salvação nacional”, vaticina Kai Enno, PhD em Relações Internacionais e professor da Universidade de São Paulo.
Segundo ele, uma provável nova eleição fortaleceria ainda mais os partidos extremos da esquerda e direita, “porque a incapacidade [da atual coalisão] em formar um governo evidencia os problemas do país.”
Santoro, no entanto, acredita que uma coalisão instável e sujeita a pressões externas deve se formar. Mas em um novo pleito, diz, as correntes mais afastadas do centro ganhariam espaço, embora seja improvável a formação de um governo contra austeridade entre extrema direita, esquerda e centro-esquerda. “Nunca houve uma coalisão assim, pois mesmo que as visões econômicas sejam semelhantes, há uma diferença grande em outros valores destes partidos.”
A retórica da renegociação do resgate econômico grego proposta pelo Syriza, entre outros partidos menores, vai de encontro às pressões de diversas autoridades europeias, segundo as quais a austeridade é necessária. Não há espaço para uma visão distinta. “Deve ficar claro para a Grécia que não há alternativa ao programa de consolidação acordado, caso queira continuar a ser membro da Eurozona”, alertou Jörg Asmussen, membro da diretoria do Banco Central Europeu no início da semana.

Mas os analistas ouvidos por CartaCapital acreditam que a possibilidade da saída do euro ainda não está posta, embora o cenário possa mudar rapidamente. O fator chave para a manutenção da moeda única na Grécia, apontam, seria o resultado de um acordo entre França, que tem em seu novo presidente, François Hollande, um defensor de estímulos ao crescimento, e a Alemanha de Angela Merkel, pró-austeridade.
“Há uma mudança de visão, temos a ascenção do Hollande na França e talvez a UE vai reconsiderar a forma de enfrentar os problemas. Além disso, os três partidos que ganharam as eleições e parte de legendas menores são a favor do euro”, comenta a professora da FGV.
Santoro também destaca o posicionamento fraco-alemão como fundamental para a Grécia, mas aventa a possibilidade de uma nova moratória do país. “A saída do euro ainda não chegou à mesa.”
Mas a demora para a definição do novo governo também pode forçar a Grécia a deixar o euro, diz Enno. “É possível que a Grécia siga o exemplo da Bélgica, que ficou mais de um ano sem um líder eleito, mas isso seria péssimo. Neste cenário, o país estaria em falência, uma vez que depende de empréstimos, e teria que sair da moeda única. Isso significa que a Zona do Euro enfrentaria um temor de contágio, pois o que impediria a Itália ou outros países de fazer o mesmo?.”