sexta-feira, 7 de junho de 2013

Revolucionar é preciso: a crise portuguesa (e nós?)


 MARCELO BADARÓ MATTOS   no CORREIO DA CIDADANIA


Entre o Brasil e Portugal há laços históricos e, em muitas de nossas famílias, sanguíneos, que nos fazem ter uma sensação muito própria de proximidade. No entanto, não temos visto muito espaço na imprensa empresarial brasileira para notícias e análises da crise por que passa a sociedade portuguesa no momento atual. Nem mesmo a esquerda brasileira parece muito interessada em prestar atenção ao que acontece daquele lado do Atlântico.

A direita, porém, está sempre atenta ao que lhe parece ameaçador. Faz alguns dias, Reinaldo Azevedo, colunista da revista Veja, publicou em seu blog uma nota sobre um debate ocorrido dias antes na TV portuguesa, tendo por tema “Mudamos de país ou mudamos o país?”, no qual, em determinado momento, uma das entrevistadas se envolveu em uma polêmica com um jovem da platéia*. Na versão de Azevedo, a debatedora é “a Marilena Chauí” de Portugal e o jovem um herói do “empreendedorismo”, que aos 15 anos criou uma marca de roupas e está tendo sucesso em tempos difíceis, demonstrando que a iniciativa individual é a saída para a crise. Como o jovem respondeu à debatedora, que o questionava sobre o valor dos salários dos trabalhadores da indústria têxtil, dizendo que era melhor ganhar o salário mínimo do que ficar no desemprego, sendo aplaudido por parte dos presentes, esse take do programa foi reproduzido pelo colunista, com os comentários de praxe. Exaltou-se a perspicácia do garoto moderno e apontou-se o atraso da pesquisadora acadêmica.

Não perderei tempo analisando Reinaldo Azevedo, a Veja, ou mesmo comentando a tal ideia do tipo é melhor comer só farinha que passar fome, exposta pelo raciocínio do rapaz, ao defender implicitamente o programa de redução salarial em curso em Portugal. Não merecem. Apenas preciso que a “Marilena Chauí” portuguesa é Raquel Varela, historiadora reconhecida internacionalmente por seus estudos sobre a Revolução dos Cravos e sobre os trabalhadores do setor da construção naval e militante política cada vez mais conhecida dos portugueses por suas intervenções em dezenas de debates públicos, em centros sociais, rádios e TVs. Neles tem demonstrado (ancorada em estudos sérios e pormenorizados) as falácias da argumentação dominante sobre os altos custos do Estado Social, empregadas para justificar os cortes em salários, aposentadorias e outros direitos dos trabalhadores. Já o jovem “empreendedor” é Martim Neves, cuja fala, devidamente editada, foi reproduzida imediatamente após o programa em páginas eletrônicas como a do “microcrédito” do banco Millenium BCP e as de editores de grandes jornais diários. Como se apurou pouco depois, o seu “empreendimento” resume-se a estampar a sua logomarca (cujo registro só foi requerido no dia seguinte ao programa) em camisetas e moletons simples. Mas é claro que a propaganda feita durante e após o debate o levou a um novo “patamar de vendas”, conforme se depreende pelos pedidos não atendidos registrados no facebook do “empreendimento”.

O que estava em debate, entretanto, é algo mais importante. Para além do trecho recortado por Azevedo e pela direita portuguesa de forma geral, há uma resposta de Raquel Varela omitida na edição que circula na rede. Nela, a historiadora classifica o salário mínimo português (de 432 euros) como “uma vergonha”, e demonstra como esse valor é insuficiente para sustentar dignamente os trabalhadores e trabalhadoras portugueses, assim como do resto do mundo, e lembra que tanto a redução da massa salarial interna quanto a imigração de portugueses que se quer hoje forçar visam simplesmente instalar uma arena de competitividade por baixos salários na Europa, de forma a ampliar a margem de lucro dos capitalistas que, desde 2008, têm se fartado de demitir, achatar salários e ainda assim serem prodigamente subsidiados pelo Estado. Defendendo a estatização dos bancos, a ruptura com a “troika” (FMI, Banco Central Europeu e Comissão Europeia), o não pagamento da dívida e a ruptura com o euro, além de relembrar o 25 de abril para propor a atualidade da saída revolucionária, Raquel Varela realmente tem incomodado à classe dominante portuguesa.

A referência que faço ao debate na TV e à replicação por aqui da grita da direita portuguesa contra a representante de uma proposta política radicalmente alternativa tem também um outro objetivo: chamar a atenção para o fato de que a sociedade portuguesa vive um momento de crise econômica, social e política. A taxa de desemprego atingiu 17,8% em abril, sendo da ordem de 42,5% o desemprego entre os jovens (segundo os dados da agência europeia Eurostat). Dados locais indicam 1 milhão e 400 mil desempregados em uma população economicamente ativa de 5,4 milhões de pessoas (no total de 10 milhões e meio de portugueses e portuguesas). Ao mesmo tempo, aposentadorias e salários do setor público foram cortados e 80% dos empregados ganham menos de 900 euros por mês. A precarização das relações de trabalho atinge boa parte desses que ainda não vivem o desemprego completo, numa força de trabalho que é relativamente jovem e altamente qualificada. São 1,3 milhão de graduados com nível superior e mais de 30 mil doutores formados pelas Universidades portuguesas.

Momentos como esses abrem espaço para o acirramento dos conflitos sociais e é a isso que estamos assistindo em Portugal. Foram já cinco greves gerais nos últimos cinco anos. A próxima já está convocada para 27 deste mês de junho. Há manifestações todos os dias (não é exagero retórico) nas ruas portuguesas. E são, algumas delas, as maiores manifestações da história do país, como a de 2 de março último, que levou às ruas de dezenas de cidades portuguesas mais de 1 milhão e 500 mil pessoas. A luta, é certo, não é apenas portuguesa. No último dia 1 de junho, um chamado à mobilização continental reuniu manifestantes em centenas de cidades europeias, do sul “periférico” (Portugal, Espanha, Grécia) ao centro financeiro do euro, em Frankfurt.

Mesmo com esse elevado nível de mobilização social, até aqui, o regime tem resistido. Nem mesmo o gabinete ministerial português caiu, apesar de todos os cartões vermelhos que a população acuada pelo desemprego e o avanço da miséria lhes apresenta. Tanto a direita declarada (PSD e CDS) no governo quanto os “socialistas” (PS) compartilham da mesma submissão aos desígnios da troika e o PS não parece querer se arriscar a ganhar eleições para se desgastar fazendo mais do mesmo. Já a oposição parlamentar de esquerda (especialmente o PCP e o Bloco de Esquerda), embora tenha sido progressivamente empurrada pelo povo nas ruas a uma posição de defesa da “demissão” do gabinete, não apresentou até aqui um projeto radicalmente distinto, propondo “renegociações”, políticas compensatórias e medidas “soberanas”, mas temendo sempre o “imponderável” da moratória ou da saída do euro. Nos sindicatos, a grande central – a CGTP –, dirigida principalmente pelos militantes do PCP, tende a limitar as mobilizações ao domínio econômico-corporativo da defesa dos salários e direitos do grupo cada vez mais reduzido de trabalhadores protegidos por contratos estáveis.

O resultado dessa combinação entre mobilizações multitudinárias de descontentamento e ausência de alternativas programáticas das direções mais representativas tem sido, até aqui, a sobrevivência de um regime democrático em que o teatro das eleições referenda governos títeres do poder de fato, emanado dos organismos supranacionais do capital, a ditarem as regras do jogo contra os interesses das maiorias trabalhadoras.

Pode uma situação dessa natureza se sustentar por muito tempo? Não há previsões infalíveis para o desenrolar da história. Podemos assistir na sequência à desmoralização completa das manifestações de massa. Afinal, como sustentar que milhões possam ir às ruas a cada mês, que diversas greves gerais se sucedam em poucos anos e que ainda assim nem um reles ministro caia de sua cadeira? Ou, de outro lado, é possível que se abra um período de inversão da correlação de forças a favor dos “de baixo”?

A segunda hipótese não pode ser dada como certa, mas está no horizonte de possibilidades, especialmente porque falamos de um país que, há quase quarenta anos, viveu a última revolução social do Ocidente. Nele convivem uma geração de portugueses que protagonizou a Revolução dos Cravos e as gerações seguintes, que se beneficiaram das conquistas revolucionárias, mas são agora mais fortemente impactadas pelo retrocesso social pós-2008. Mesmo derrotada a revolução, seu legado de conquistas garantiu um Estado Social (como o chamam por lá), que permitiu aos que foram às ruas em 1974 ver seus filhos e netos completarem os estudos universitários num sistema público de educação, usufruírem de um sistema de saúde pública exemplar, se informarem através de um sistema de rádio e televisão públicos em que as telenovelas importadas do Brasil têm que competir em audiência com programas de debate político, como o citado no início deste texto, entre outras conquistas, sintetizadas pela transferência de renda de cerca de 15% do capital para o trabalho no período de 1974-1975.

Essa geração está hoje, em grande medida, aposentada (reformada, como dizem por lá) e, apesar dos cortes em seus rendimentos, vem equilibrando orçamentos familiares em meio a filhos e netos precarizados e desempregados. A construção de uma unidade nas lutas entre os “reformados”, com o aprendizado organizativo das jornadas de 1974-1975, os precarizados/desempregados – que começam a ir para as ruas na conjuntura atual desprovidos do aparato sindical dos trabalhadores formais – e os setores mais combativos da classe trabalhadora sindicalmente organizada, pode fazer a diferença e significar o ponto de inflexão na correlação de forças. Resta saber se os que propõem tal estratégia conseguirão representatividade em meio às organizações que surgiram do 25 de abril e às novas formas organizativas que emergem das lutas de hoje, e ainda se encontrarão eco social para suas propostas.

De qualquer forma, olhando aqui do Brasil, não consigo deixar de pensar em algumas questões. Sou historiador e estou acostumado a ouvir falar sobre presumidas “heranças” portuguesas na ex-colônia das Américas, como a ideia de um “patrimonialismo ibérico”, uma suposta confusão entre “público” e “privado”, que de fato só existe na cabeça daqueles que se recusam a aceitar o fato de que o Estado (o “público”) existe historicamente para sustentar os interesses – econômicos inclusive – das classes dominantes (o “privado”). Mais recentemente virou moda dizer que fomos aqui uma extensão territorial nos trópicos do “Antigo Regime” português, em chave explicativa que menospreza tanto o caráter escravista da sociedade que se desenvolveu nestas terras quanto o sentido de exploração que motivou a empreitada colonizadora. Queria eu, porém, ouvir falar de outras heranças e homologias entre Brasil e Portugal, num período mais recente. Preferiria, com certeza, ter assistido a algum tipo de influência mais direta da saída revolucionária de um regime ditatorial, como a de 1974 em Portugal, na chamada “transição democrática” brasileira. Assim como espero que o exemplo das mobilizações atuais daquele lado do Atlântico faça algum eco deste lado de cá.

* O programa chama-se “Prós e Contras”, é transmitido pela RTP1 e, embora seja transmitido após as 22h, possui enorme audiência para os padrões portugueses. A edição comentada foi ao ar em 20 de maio último pode ser assistida em http://www.rtp.pt/programa/tv/p29826/e15

Marcelo Badaró Mattos é professor da Universidade Federal Fluminense

terça-feira, 4 de junho de 2013

Avalanche ‘neoconservadora’ une grande mídia e governo


ESCRITO POR VALÉRIA NADER, DA REDAÇÃO  do CORREIO DA CIDADANIA





Medidas governamentais e noticiários dos últimos dias têm deixado de olhos arregalados uma boa porção daqueles que acompanham e creem no ‘neodesenvolvimentismo’ do governo atual, assim como no progressismo da mídia e na sua defesa diuturna da pluralidade e da liberdade de expressão. Neste sentido, dentre tantos acontecimentos e respectivas versões que têm dominado a pauta de governo e imprensa, dois deles podem ser tomados como ilustrativos: o último aumento da taxa de juros pelo Banco Central e mais um assassinato dentre os povos indígenas.

Voltando o olhar primeiramente para o contexto da nossa imprensa – afinal, quase onipresente na contemporaneidade em ditar as regras de corpos e mentes –, tais acontecimentos foram objeto de extensas reportagens pelos maiores veículos de comunicação nos dias que passaram. O tom maior foi de indisfarçado triunfalismo, no que diz respeito à decisão do Banco Central em elevar os juros para combater a inflação, afinal, uma prova de um governo que estaria tomando ‘juízo’. E quanto aos índios, escancarou-se, em linhas e entrelinhas, a visão dos povos originários como bárbaros invasores.

Grande mídia, Folha de S. Paulo e os juros

Entre estes veículos, os enunciados e análises da Folha de S. Paulo podem ser tomados como termômetro das falas e visões da quase maioria dos grandes órgãos de comunicação, para evitar delongas e a fim de não se cometer alguma injustiça. Afinal, ao contrário dessa maioria de veículos, que escancara seu conservadorismo, trata-se a Folha do órgão de mídia que, não raras vezes, se compraz em sua auto-identificação como progressista. Um coro que tem como portavozes, inclusive, colaboradores e colunistas já escalados para, vez ou outra, verbalizar e lembrar aos leitores das ações do diário em prol da democratização da informação.

No que diz respeito à nova taxa de juros, nas suas edições a partir de quarta-feira, 29 de maio, o diário trouxe extensa lista de matérias, editoriais e reportagens. Mesmo para quem já há bom tempo não mais se ilude com o tal ‘progressismo’ da Folha, chega a surpreender o tom monocórdio de tantas reportagens. Um legítimo ‘samba de uma nota só’, verdadeiro tratado em defesa da agenda conservadora, aquela que dita as regras do mercado financeiro, que tem por trás os grandes grupos econômicos, que obviamente lucram com a subida da taxa de juros em função de suas bilionárias aplicações nos títulos da dívida pública.

Luiz Carlos Mendonça de Barros, economista famoso e colunista do jornal, foi dos únicos estudiosos com espaço profuso a emitir sua opinião. No texto chamado ‘Um dia de cão na economia’, de sexta-feira, 31 de maio, aliviou-se com a ideia de que “um novo Banco Central emergiu das cinzas da instituição que comandou com mão de ferro o sistema de metas de inflação nos oito anos do governo Lula”. E comemorou sem volteios o fato de que “os mercados financeiros vão reagir com força à decisão tomada pelo Copom sobre os juros”. Para Mendonça, a presidente Dilma, quiçá, e finalmente, teria entendido que o aumento de juros é a melhor forma de controlar a inflação e promover o crescimento.

Segundo, ainda, o Editorial de sábado, 1 de junho, ‘Alta de credibilidade’, “a decisão do BC, apesar de amarga, vem em boa hora. Talvez consiga devolver alguma firmeza à gestão da economia, perdida em devaneios intervencionistas”. Pregando ainda uma ‘política fiscal mais responsável’ no lugar da ‘frouxidão orçamentária’, conclui que a nova decisão, à medida que incidir na queda da inflação, deve ajudar a presidente na corrida eleitoral do próximo ano. Ideias reforçadas no Editorial de domingo, 2 de junho, o qual, sob o título ‘Um Plano para Dilma’, faz uma série de sugestões, sempre de cunho liberal e privatizante, para o restante de seu mandato.

Engrossando, finalmente, este coro esteve ninguém menos que o ex-presidente do Banco Central sob Lula, o também colunista da Folha Henrique Meirelles. Citando o polêmico e emblemático caso chinês, Meirelles tem uma pista para a solução dos graves problemas do país: “medidas têm sido tomadas para transferir poder de decisão à iniciativa privada, eliminando controles e burocracia para facilitar o desenvolvimento dos negócios. Se exitosas, transformarão a China em competidor ainda mais forte e inovador, com maior equilíbrio no investimento e no consumo”.

E onde estão as vozes dissonantes de reconhecidos estudiosos, não necessariamente identificados à direita ou à esquerda do espectro político, e que têm visão diametralmente oposta, ou ao menos conflitante, com a ideia convencional de que a subida da taxa de juros é a solução para a inflação que se diz estar a galope no país? Aqueles que, por exemplo, ressaltam a influência da especulação nas bolsas de mercadorias de commodities agrícolas na atual oferta e preços de produtos comercializados internamente? E outros mais que destacam que, mediante a queda das exportações de commodities agrícolas e, por conseguinte, o menor resultado no saldo da balança comercial, o aumento da taxa de juros seria a forma de atrair capitais financeiros e especulativos, com o intuito de fechar o balanço de pagamentos? Provavelmente, estão em algum lugar bem distante da rua Barão de Limeira.

A Folha de S. Paulo e os índios

Não fosse pouco um culto escancarado da ortodoxia por aqueles que se dizem arautos da liberdade de expressão, mais atenção chama ainda um enviesamento jornalístico a cada dia mais próximo do obscurantismo na área de direitos humanos.

Após mais um confronto entre policiais e indígenas, envolvendo índios terenas no Mato Grosso do Sul, outro índio foi morto pela polícia. Na sexta-feira, 31 de maio, a chamada para matéria,‘Índio morre em confronto com a polícia’, é no mínimo muito ambígua, uma vez que pode sugerir uma ação mais deliberada dos indígenas – geralmente armados de arcos, flechas, lanças e facas – em seu confronto com a polícia – munida de armas de fogo de algo calibre. No sábado, 1 de junho, nova chamada induz o leitor a enxergar índios como bárbaros e baderneiros, ao dizer que ‘Índios invadem novamente fazenda em MS’. Afinal, estão entrando, e não invadindo, em áreas que lhes pertencem, de direito ancestral, e que somente não ocupam até hoje em função de uma homologação de terras indígenas que nunca se completa.

E aqui nem é preciso ir tão longe na denúncia da estreiteza de visão, desrespeito e afronta aos direitos dos povos originários, reconhecidos pela Constituição, mas secularmente negados pelos governantes de turno. É um dos próprios colunistas do jornal, daqueles poucos que têm independência opinativa em nossa grande mídia, que denuncia, em sua coluna de domingo, 2 de junho, a desconsideração para com estes povos. “A facilidade com que ainda se massacram os direitos e as vidas dos índios é uma homenagem que o Brasil presta ao seu passado genocida (...) As liminares e outros volteios judiciais que facilitam a usurpação de terras reconhecidamente indígenas, como se dá agora com a área Buriti, em Mato Grosso do Sul, são uma via direta para a miséria e a morte das populações indígenas”, declara Jânio de Freitas.

E o governo, por onde anda?

É de se pensar, nesta altura dos acontecimentos, onde está o governo em meio a tal conjuntura.

O lugar em que se coloca não é nada mais admirável que aquele ocupado pela mídia, pelo menos para quem se propõe a enxergar a realidade menos desavisadamente, ou com possibilidades de despir-se de noções falseadoras.

No que se refere à temática econômica, o governo Dilma e, anteriormente, o próprio governo Lula, tem sido acusado recorrentemente, pela imprensa e analistas conservadores, de intervencionista, dirigista e outros termos correlatos. Isso de forma a associá-lo a um ente distante dos ideais hipoteticamente criativos e libertadores decorrentes de um funcionamento mais livre das forças de mercado.

A ideia do intervencionismo é, por um lado, evitada pelos próprios governistas, de modo a não se indispor com sua base de apoio mais conservadora; mas, por outro lado, acalentada em meio à noção de neodesenvolvimentismo, sob a qual se tenta erigir a imagem de um governo progressista, que tem papel ativo em incluir os pobres ao mesmo tempo em que promove o desenvolvimento. Qual é, portanto, o teor de verdade dessa ideia de intervencionismo do governo Dilma?

Aqui são novamente os fatos que podem sugerir a melhor resposta. É inegável a maior atenção ao social, ainda que em sua maior parte focada em uma vertente assistencialista, assim como algum grau de ‘provocação’ (e não enfrentamento) ao capital financeiro, promovidos pelos presidentes petistas. Estão aí o Bolsa Família, os reajustes do salário mínimo, taxações impostas sobre a entrada do capital externo especulativo, dentre outros, para comprovar. No entanto, também estão presentes, de modo cabal, e desde o mandato lulista, a privatização das infraestruturas econômicas do país – mais sorrateira e disfarçadamente sob Lula e, agora, de forma mais escancarada. Portos, ferrovias, aeroportos, petróleo, energia e também o que restou das telecomunicações estão, a cada dia, mais distantes não somente das mãos do governo, mas também do controle público, em uma nação em que as agências reguladoras são, comprovadamente, bem mais articuladoras dos interesses econômicos do que dos direitos dos cidadãos. Os maiores beneficiários, ao final, e como a história do país tem confirmado, são os grandes grupos econômicos e privados externos, a partir da posição subalterna e associada do Estado nacional e da burguesia interna.

E a lista de submissão aos poderosos lobbies econômicos não para por aí. A desoneração da folha de pagamento de vários setores da economia interna, assim como uma série de medidas que vêm sendo levadas a cabo sob o rolo compressor da bancada ruralista, implicam no baixo grau de independência e autonomia na tomada de decisões internas de política econômica.

O intervencionismo, ou dirigismo, tão aventados por aí, não passam, assim, de mero jogo de palavras. Palavras, no entanto, com forte poder de persuasão sobre um governo que se perde em meio a uma extensa base de apoio e a poderosos lobbies econômicos. A atual subida da taxa de juros é acontecimento bastante sintomático desse quadro, vez que era a própria presidente Dilma que, até pouquíssimo tempo atrás, negava capitular frente às pressões para a sua elevação.

O chamado ‘neodesenvolvimentismo’ pode, portanto, ser tomado como uma ficção. Face a uma conjuntura internacional fortemente financeirizada e oligopolizada, com a crescente independentização do movimento internacional de capitais, resta exígua margem de manobra para a condução autônoma de políticas econômicas internas. Conjuntura que, obviamente, é agudizada pela dependência e subserviência de governos amparados em extensas e heterogêneas alianças políticas, reféns dessas alianças e, portanto, pouco propensos a promoverem confrontos mais pesados.

E resta uma palavra sobre a questão indígena, no caso, o assassinato de mais um índio no Mato Grosso do Sul, acima referido. Aqui, onde está o governo Dilma?

Certamente, este é tema para bem mais do que mil palavras, cabíveis em novo e profundo artigo. No entanto, forçoso é dizer que o atual mandato petista tem se mostrado, no mínimo, bem menos aberto ao diálogo com os movimentos e demandas sociais em geral do que o anterior. E, no caso em questão, são novamente os fatos que podem falar por si mesmos.

Morta a liderança indígena, a primeira providência do Planalto foi a convocação de uma reunião. Os convidados iniciais foram os interlocutores da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), ligados ao Ministério da Agricultura, sabidamente influenciado por representantes da bancada ruralista. A Funai, que tem visto seu papel na demarcação de terras indígenas cada vez mais reprimido, não foi convocada.

Em tempo

Talvez fosse interessante ao governo começar a avaliar uma troca de termos para se autodefinir. O neoconsevadorismo há tempos poderia lhe cair melhor que neodesenvolvimentismo.

Valéria Nader, jornalista e economista, é editora do Correio da Cidadania.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

A questão do Estado, questão central de cada revolução

A questão do Estado, questão central de cada revolução

Álvaro Cunhal

O odiario.info vem, com a publicação deste texto do grande patriota, internacionalista, político comunista, revolucionário e multifacetado intelectual que foi Álvaro Cunhal, associar-se às comemorações do centenário do seu nascimento.
No momento em que amplas massas da juventude portuguesa manifestam nas ruas, nos blogues, nas acções de contestação do governo da burguesia que nos oprime, esclarecer o que é o Estado numa sociedade de classes, como, por que se formou e para que serve, e que a superação da ditadura da burguesia, desta ou de qualquer outra, não se faz no quadro da importante luta dentro das instituições, enfim, divulgar Álvaro Cunhal, o seu pensamento e a política do Partido por ele dirigido é, seguramente, a melhor forma de o recordar.




A 30 quilómetros a noroeste de Leninegrado, Razliv é hoje um lugar histórico. Aí, num sítio ermo, se pode ver a reconstituição da cabana onde Lénine viveu clandestinamente em Agosto de 1917. Aí se pode ver também o cepo de uma árvore que Lénine utilizava como mesa para escrever.
O Verão de 1917 foi um momento de viragem decisiva na revolução russa. Terminara a dualidade de poderes, situação original criada pela revolução, em que, ao lado do governo provisório, governo da burguesia, se formara um outro governo com «uma existência real e incontestável»: os sovietes de deputados operários e soldados (Lénine, «Sobre a dualidade dos poderes», Obras, edição francesa, vol. 24, p. 28) [1]. Os mencheviques e socialistas-revolucionários, impedindo que todo o poder fosse entregue aos sovietes e entrando num «governo de coligação», entregaram de facto todo o poder à burguesia. A contra-revolução passou à ofensiva. Novas tarefas se colocaram ao proletariado e ao seu partido, o Partido Bolchevique. Como escreveu Lénine, se até [4 de] Julho «o desenvolvimento pacífico da revolução russa era ainda possível», a partir de então a questão punha-se em novos termos: «ou a vitória completa da contra-revolução, ou uma nova revolução» (“Resposta», Obras, edição francesa, vol, 25, pp. 231 e 236).
Nas vésperas da «nova revolução», que problema considerava Lénine necessário abordar sem perda de tempo e o levava a escrever febrilmente no cepo de árvore em Razliv? Esse problema era o problema do Estado, e a obra que então Lenine escrevia viria a constituir uma obra fundamental: O Estado e a Revolução.
Já nas Teses de Abril Lénine caracterizara a situação como a transição da primeira etapa da revolução, que deu o poder à burguesia, para a segunda etapa, que deveria dar o poder ao proletariado e às camadas pobres do campesinato (Ver Obras, edição francesa, vol. 24, p. 12) [2].
De Abril a Julho de 1917, em numerosos artigos e discursos, Lénine insiste na importância do problema do Estado. É porém em O Estado e a Revolução que não só expõe de uma forma sistematizada a teoria de Marx e a defende dos seus detractores, como a aprofunda e enriquece com a sua investigação teórica criadora assente nas experiências do movimento revolucionário.
Nas vésperas da revolução socialista, a ideia fundamental que Lénine julga necessário demonstrar exaustivamente e defender com paixão é que, conquistando o poder, o proletariado não se pode limitar a tomar conta do aparelho do Estado burguês, mas tem de destruí-lo e substituí­-lo por um novo Estado.

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A teoria marxista da luta de classes permite explicar a origem e a natureza do Estado e os seus diversos tipos e formas.

Marx descobriu e demonstrou que o Estado é um poder que nasce da sociedade numa fase determinada do seu desenvolvimento, como resultado da divisão da sociedade em classes, como necessidade do recurso à coacção por uma minoria exploradora para manter a exploração da maioria.
O Estado é uma «organização especial do poder», «um poder especial de repressão», «a organização da violência», um aparelho militar e burocrático constituído especialmente pelas forças armadas, pela polícia, pelos tribunais, pelos órgãos legislativos e executivos, pelo funcionalismo.
Aparentemente acima da sociedade e das classes, o Estado é na realidade um instrumento de dominação e opressão de uma classe sobre outras classes.
A correcta compreensão da natureza do Estado é essencial para toda a acção revolucionária do proletariado, particularmente quando se coloca na ordem do dia a tomada do poder.
Marx descobriu que a luta de classes que se trava na sociedade capitalista conduz necessariamente à revolução, à conquista do poder político pelo proletariado, a um novo Estado definido no Manifesto Comunista como o «proletariado organizado como classe dominante» (Obras Escolhidas, em dois volumes, edição inglesa, vol. 1, p. 53) [3].
Esta é a conclusão fundamental da teoria marxista da luta de classes. Não podem pretender ser marxistas aqueles que a rejeitam. Falando da sua teoria da luta de classes, Marx lembrava que não lhe cabia a ele o mérito nem de ter descoberto a existência das classes, nem de ter descoberto a luta de classes. «O que fiz de novo (sublinhava) foi demonstrar: 1) Que a existência das classes não está ligada senão a determinadas fases do desenvolvimento histórico da produção; 2) Que a luta de classes conduz necessariamente à ditadura do proletariado; 3) Que esta ditadura não constitui ela própria senão a transição para a abolição de todas as classes e para uma sociedade sem classes» (Carta a Weydemeyer, 5-3-1852, Obras Escolhidas, em dois volumes, edição inglesa, vol. 2, p. 452) [4].
O papel do proletariado na revolução socialista decorre das suas próprias características como classe na sociedade capitalista. «De todas as classes que hoje defrontam a burguesia (proclamava o Manifesto Comunista) só proletariado é uma classe realmente revolucionária.» «Os proletários só têm a perder as próprias algemas. Eles têm um mundo a ganhar.” (Obras Escolhidas, em dois volumes, edição inglesa, vol. 1, pp. 43 e 65.) [5]
Defendendo e desenvolvendo as ideias de Marx, Lénine insistiu em que só o proletariado, como «única classe revolucionária até ao fim», pode ser «o guia de todas as massas laboriosas e exploradas, que frequentemente a burguesia explora, oprime e esmaga não menos mas mais que aos proletários, e que são incapazes de uma luta independente pela sua libertação». Por isso, o poder da burguesia só pode ser abatido «se o proletariado se transforma em classe dominante capaz de reprimir a resistência inevitável, desesperada, da burguesia e de organizar para um novo regime económico todas as massas laboriosas e exploradas» («O Estado e a Revolução», Obras, edição francesa, vol. 25, p. 437) [6].
O proletariado «transformado em classe dominante», como escreveu Lénine, o proletariado «organizado como classe dominante», como definiu o Manifesto, é precisamente a ditadura do proletariado, o novo Estado Proletário. «O proletariado (insistia Lénine) tem necessidade do poder de Estado, de uma organização centralizada da força, de uma organização da violência, tanto para reprimir a resistência dos exploradores, como para dirigir a grande massa da população - os camponeses, a pequena burguesia, os semiproletários - na edificação da economia socialista» (Ibid.) [7]
Mas como organizar o poder do Estado? A conquista do poder significará a conquista do aparelho do Estado? A esta questão capital, Marx deu uma primeira e clara resposta, que depois Lenine desenvolveu.
Estudando atentamente a experiência revolucionária, Marx sublinhava em 1852 que até então as revoluções políticas não tinham feito mais do que aperfeiçoar a máquina do Estado, pois «os partidos que lutavam uns após outros pelo poder consideravam a conquista deste imenso edifício do Estado como a principal presa do vencedor» («O 18 Brumário», Obras Escolhidas em dois volumes, edição inglesa, vol.1, p. 333) [8]. A experiência da grande revolução proletária do século XIX, a Comuna de Paris de 1871, permitiu a Marx avançar e precisar a sua doutrina. Essa experiência comprovou que, ao contrário do sucedido nas revoluções burguesas, «a classe operária (ao conquistar o poder político) não pode contentar-se com o tomar a máquina completamente pronta do Estado e fazê-la funcionar para a realização dos seus fins» («A Guerra Civil em França», 1871, Obras Escolhidas, em dois volumes, edição inglesa, vol, 1, p. 463) [9].
É nessa conclusão fundamental que Lénine insiste e é sobre ela que escreve no cepo da árvore em Razliv, no Verão de 1917, no momento em que ao proletariado russo se colocava a tarefa de realizar a sua revolução.
A libertação da classe oprimida (escreve Lénine) é impossível «sem a supressão do aparelho do poder de Estado criado pela classe dominante” e a sua substituição «por um poder especial de repressão” exercido contra a burguesia pelo proletariado» («O Estado e a Revolução», Obras, edição francesa, vol. 25, pp. 420 e 430) [10].
Lénine alertava contra quaisquer ilusões que pudessem existir acerca da possibilidade de realizar a revolução socialista se o proletariado e as classes oprimidas se limitassem a tomar conta do aparelho do Estado, cuidando poder utilizá-lo contra a burguesia. Em conformidade com tal conclusão, indicava ao proletariado russo e ao seu partido uma tarefa capital para a conquista do poder pelos trabalhadores: a destruição do Estado burguês e a construção dum novo Estado, dum Estado dos operários e camponeses que, sob a direcção da classe operária, quebrasse a resistência decerto encarniçada da burguesia, suprimisse a exploração do homem pelo homem, pusesse termo à divisão da sociedade em classes, assegurasse a transformação revolucionária da sociedade capitalista em sociedade socialista.
Tal é a essência da ditadura do proletariado.

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Quando se fala da teoria marxista-leninista do Estado deve ter-se sempre presente o significado da palavra «ditadura» empregada tanto em relação aos Estados capitalistas - à «ditadura da burguesia», como em relação aos Estados socialistas - à «ditadura do proletariado». A clara explicação desse significado é essencial para a compreensão da teoria do Estado e da teoria da revolução e para a determinação da posição das várias classes e forcas políticas em relação ao problema da democracia. Os ideólogos burgueses, incluindo os liberais e socialistas, baralham os dados do problema e procuram mostrar que os comunistas, defendendo a ditadura do proletariado, se opõem à democracia, e que os burgueses liberais e socialistas é em nome da democracia que se opõem à ditadura do proletariado. A ditadura do proletariado, como «ditadura», seria um regime de opressão, enquanto a democracia burguesa, como «democracia», seria um regime de liberdade.

A verdade é que a palavra «ditadura», na teoria marxista-leninista do Estado, não significa uma forma particular de dominação de uma ou várias classes por outra ou outras classes, mas o próprio facto dessa dominação. Segundo a teoria leninista, o Estado numa sociedade dividida em classes antagónicas é sempre uma ditadura. A expressão “ditadura» sublinha que o Estado não está acima das classes, não é um instrumento de conciliação das classes nem um árbitro entre elas, antes é a «organização da violência», é um «poder especial de repressão», é um organismo de dominação de umas classes sobre outras. Em resumo: numa sociedade dividida em classes antagónicas, Estado é sinónimo de Ditadura.
As formas de dominação, tanto na ditadura da burguesia como na ditadura do proletariado, é que podem ser diversas. A ditadura burguesa pode exercer-se através de variadas estruturas dos órgãos do poder e da administração, ou seja, sob regimes políticos diferentes: república parlamentar, monarquia constitucional, governo militar, ditadura fascista, etc. Em qualquer caso é sempre a «ditadura burguesa». A ditadura do proletariado pode também exercer-se com a existência de um ou mais partidos, com um sistema soviético ou uma assembleia parlamentar, ou outras formas de organização do poder. As experiências históricas das democracias populares já mostraram que o sistema soviético não é o único possível para o exercício da ditadura do proletariado, não é a forma única e obrigatória dum Estado socialista.
O facto de quaisquer que sejam as formas de dominação da burguesia se tratar sempre de uma ditadura da burguesia não torna a classe operária indiferente a essas formas de dominação.
Nada tem a ver com o marxismo-leninismo a opinião anarquizante segundo a qual é indiferente à classe operária que o poder da burguesia se exerça num regime parlamentar ou numa ditadura fascista, uma vez que num caso e noutro se trata de capitalismo. A repressão e o terror são utilizados precisamente contra o proletariado, para impedir o desenvolvimento da sua organização e da sua luta, para aniquilar os seus quadros, para cortar o caminho à revolução socialista. Enquanto subsistir o capitalismo o proletariado está interessado em lutar para que a ditadura da burguesia se exerça através de formas o mais democráticas possível, pois estas não só são as que menos sofrimentos lhe acarretam, como são aquelas que melhor lhe permitem defender os seus direitos, forjar a sua unidade, reforçar as suas organizações, limitar e enfraquecer o poder dos monopólios, ganhar as massas para a causa da revolução socialista. Nesse sentido se afirma que a luta pela democracia é parte constitutiva da luta pelo socialismo.
Nada tem também a ver com o marxismo-leninismo a posição de alguns «ultra-revolucionários» ao afirmarem que, nas condições do Portugal de hoje, a instauração das liberdades democráticas, se não fosse acompanhada pela conquista do poder pelo proletariado, seria ainda pior que a ditadura fascista, uma vez que representaria a consolidação do poder da burguesia, cuja crise se agrava nas condições do fascismo. O Partido Comunista Português não considera a revolução antifascista como uma revolução democrático-burguesa, mas como uma revolução democrática e nacional, de natureza profundamente popular. Mas insiste que o fim do fascismo e a instauração das liberdades fundamentais constituem um passo primeiro, fundamental e indispensável da revolução antifascista. Assim, não só formula uma reivindicação central, compreendida e sentida pelas mais vastas massas populares, como indica o caminho que pode conduzir à realização dos outros objectivos da revolução democrática e nacional e ao socialismo. Lénine numerosas vezes sublinhou que os comunistas russos «nunca separaram a luta pelo socialismo da luta pela liberdade política» («As tarefas dos sociais-democratas russos», Obras, edição francesa, vol. 2, p. 347).
Ao mesmo tempo que indicamos a conquista da liberdade política como um primeiro objectivo central da revolução antifascista, afirmamos como marxistas-leninistas, como partido do proletariado, como revolucionários que pretendem pôr fim à exploração do homem pelo homem, que a mais democrática das democracias burguesas serve a burguesia contra o proletariado, protege e defende a exploração dos trabalhadores e, se a luta destes põe em perigo os interesses do capital, a burguesia dominante, por muito «liberal» e «democrática» que seja, não hesita em violar a lei, retirar as liberdades e recorrer a métodos abertamente terroristas.
Como marxistas-leninistas, esclarecemos a classe operária e as massas da verdadeira natureza do Estado e da democracia. Quaisquer que sejam as formas do Estado burguês e do Estado proletário, o Estado proletário, tanto pela sua natureza como pela política que realiza, é sempre mais democrático que o Estado burguês. O Estado da burguesia é o instrumento de dominação por uma ínfima minoria de exploradores da maioria esmagadora da população; o Estado proletário é o instrumento da grande maioria contra uma ínfima minoria. O Estado burguês é um instrumento de exploração e subjugação das classes trabalhadoras e visa perpetuar a divisão da sociedade em classes antagónicas, o Estado proletário é o instrumento da liquidação da exploração do homem pelo homem e do termo da divisão da sociedade em classes.
Uma democracia burguesa, por mais amplas que sejam as «liberdades democráticas», e por muito grande que seja a autoridade do parlamento, é sempre uma ditadura da burguesia; qualquer ditadura do proletariado, mesmo quando assume formas «ditatoriais», é sempre mil vezes mais democrática do que qualquer democracia burguesa.

A Revolução de Outubro trouxe a grande primeira comprovação histórica desta verdade. Desde o início e no seu desenvolvimento, o primeiro Estado de operários e camponeses mostrou ser o Estado de mais profundo conteúdo democrático jamais existente na história da humanidade.
Notas:
[1] Cf. V. I. Lénine, Obras Escolhidas em seis tomos, Edições «Avante!” -Edições Progresso, Lisboa-Moscovo, 1984-1989, t. 3, p. 132. (N. Ed.)
[2] Cf. V 1. Lénine, Obras Escolhidas em três tomos, Edições “Avante!”-Edições Progresso, Lisboa-Moscovo, 1977-1979, t. 2, p. 14. (N. Ed.)
[3] Cf. K. Marx/F. Engels, Manifesto do Partido Comunista, Edições «Avante!», Lisboa, 1997, p. 56. (N.Ed.)
[4] Cf. K. Marx/F. Engels, Obras Escolhidas em três tomos, Edições «Avante!»-Edições Progresso, Lisboa-Moscovo, 1982-1985, t. 1, p. 555. (N. Ed.)
[5] Cf. K. Marx/F. Engels, Manifesto do Partido Comunista, ed. cit., pp. 46 e 73. (N. Ed.)
[6] Cf. V. I. Lénine, Obras Escolhidas em seis tomos, ed. cit., t. 3, pp. 207-208. (N. Ed.)
[7] Cf. Ibidem, pp. 208-209. (N. Ed.)
[8] Cf. K. Marx/F. Engels, Obras Escolhidas em três tomos, ed. cit., t. 1, p. 502. (N. Ed.)
[9] Cf. Karl. Marx/F. Engels, Obras Escolhidas em três tomos, ed. cit., t 2, p. 237. (N. Ed.)
[10] Cf. V l. Lénine, Obras Escolhidas em seis tomos, ed. cit., t. 3,pp. 194 e 202. (N. Ed.)

Texto (Introdução, 1 e 2) e notas da 2ª edição, Editorial “Avante!”, 2007

sábado, 1 de junho de 2013

Há muito negro francês na escola pública

Há gênios demais nas secretarias de educação do Brasil todo, e talvez no MEC também. São gênios caolhos. Eles possuem ideias fantásticas, mas como são como o coelho do Maurício de Souza, procriam muito e enxergam pouco. Ideias não lhes faltam, mas alguma que funcione não aparece de modo algum em seus cérebros.
Um desses gênios colocou sua cabeça para fora da toca em Campinas.  Deve ter assistido algum filme desses em que um pobre encontra uma pessoa culta (e rica ou menos pobre) e convive com ela, e então, logo após uns meses, “absorve” (“assimila” – essas metáforas digestivas para o aprendizado cultura me torturam) as informações desse seu amigo e eis que se torna uma pessoa “interessante”. Vendo um filme assim, o coelho campineiro teve a brilhante ideia de “levar a cultura” para o “lugar carente”. Concretamente, eis a ideia: acho que deveríamos levar a cultura musical sofisticada para a escola pública atual.
A escola pública que um dia teve seu professor de música e que hoje, se tiver algum som com nome de música, é o Michel Teló gritando em algum aparelho colado às orelhas dos desgraçados que sobraram por lá, foi escolhida então para ser premiada com óperas, pianistas tocando clássicos etc. O resultado foi que durante a ópera os alunos gritaram e vaiaram e depois, no dia do pianista, os alunos resolveram também mostrar que cantavam, e entoaram um coro de “merda, merda, merda”, “filho da puta-aa, filho da puta-aa”, e assim presentearam o músico. Não foi só “zoeira”, como eles próprios, essa raça de bonés, dizem hoje em dia. Foi a própria barbárie. Manifestou-se ali não a bagunça, mas o ódio. Funcionou assim a cabeça dos ainda chamados estudantes: o que vem do âmbito da cultura sofisticada é o que eu não entendo e, por não entender, sei perfeitamente que pertence aos ricos e aos seus sabujos, os intelectuais, e não vou deixar isso aí me oprimir.  Não vão me fazer perder tempo com esse lixo. (Pianista hostilizado em Campinas)
Bagunça se fazia no meu tempo de escola pública.  Não há qualquer bagunça na escola pública atual. O que há é que ela é o lugar da bandidagem porque se tornou o último recanto do Brasil em que uma pessoa com dignidade e inteligência quer ficar. Qualquer coisa mais sofisticada posta na escola pública, hoje, vai gerar o comentário acertado de quem vê de fora: “pérolas aos porcos”. O gênio que fez o projeto “vamos levar os clássicos para a escola pública” não sabe disso porque ele se recusa a entender o seguinte: se aquele que é chamado de professor se sujeita a trabalhar pelo que o MEC colocou como “salário mínimo da educação” ou “piso” (só o nome “piso”, que é “chão”, já deveria mostrar a intenção do governo!), que vai de 1200 a 800 reais no ensino básico, então esse ambiente é completamente avesso a qualquer coisa que mereça o adjetivo “bom”. Essa é a verdade. A escola pública é hoje o lugar dos degradados, desgraçados e fracassados. Tudo que Deus não quis, e doou para o Diabo, está lá.
Mesmo aqueles que fazem dela um “bico” e, enfim, ou têm famílias que os sustentam ou têm muitos anos de trabalho e acumularam algum benefício trabalhista, se lá estão, também já estão um pouco fracassados, no mínimo desmotivados e, se são bons professores, nadam contra a corrente. Quando olho para o salário do professor imagino o tipo de aluno que ele tem e, então, a última coisa que penso oferecer para um tal aluno é música clássica. Não porque o pobre e idiotizado não mereça a música clássica, mas porque música clássica, como cinema ou filosofia, é para todo mundo mas não é para qualquer um. Quem não é o “qualquer um”? Aquele que obtém informação porque teve formação.  Ninguém pode levar um negro francês para ver ópera e esperar que ele não diga “esse cara lá cantando, ele está passando mal”, e comece a rir (cena de Os intocáveis, onde o negro, na verdade, é queniano). Nossos alunos são todos negros franceses, embora já não saibam nada de francês e, agora, nem mais de inglês, uma vez que também não sabem a língua materna.
Para que se possa receber informação sofisticada tudo que precisamos é de educação, de formação. Um ouvido não treinado não entende os sons que merecem analiticidade. Não é porque um som é consagrado pela parte culta da Humanidade que ele, não vindo em livros, é possível de ser popular. E assim é com tudo. Pois tudo tem seu lado sofisticado. O sofisticado não depende, para ser compreendido, de ser apresentado. Depende de uma familiaridade. Essa familiaridade depende de disciplina, o que se adquire por ser um iniciado. A iniciação nas “artes, ciências e filosofia” é um processo escolar e não-escolar, mas em nosso mundo moderno ocidental, os povos menos embrutecidos forjaram a escola como lugar dessa iniciação.
A escola pública, principalmente a de nível médio, era o nosso elemento principal de iniciação intelectual. Pegávamos com ela quase toda a classe média e alguns filhos de pobres e dizíamos para eles: alguns de vocês não vão para a universidade, mas o que aprendem aqui, já é em parte o saber do mundo, até mesmo mais sofisticado que alguns dos saberes da universidade. Essa escola pública era povoada por professores que, em cultura e em altivez, eram até superiores ao que é hoje os nossos doutores universitários. Não eram professores ricos. Eram também de classe média. Mas eram distintas figuras da cidade. Eram os intelectuais da cidade. Eram as autoridades. O salário do professor era um salário que permitia que ele entendesse o seu lugar de trabalho como um lugar de dignidade. E assim toda a sociedade via a escola.
Não soubemos preservar esse tipo de escola. Deixamos os ricos sair dessa escola à medida que a democratizamos e, paralelamente, abrimos escolas particulares para os ricos. Achatamos então o salário do professor de um modo geral. O que temos hoje é isso: uma escola pública que é o lixo da sociedade, uma escola particular que sabe que vai se tornar rapidamente um espelho desse lixo.
Em todos os países com diferenças grandes entre pobres e ricos, e onde a política é comandada pelos ricos, se os ricos saem de um lugar público, esse lugar perde a atenção das instituições mantenedoras e se deteriora. Quando decretamos que a escola pública era para os pobres, nós iniciamos a sua derrocada. Agora, corremos o risco de repetir esse erro com a universidade pública.
Estamos todos contentes com isso, porque somos gênios que acreditamos no projeto levado adiante em Campinas. Vamos apenas dizer: ah, deu um problema lá, mas o pobre não é ruim, ele tem lá sua cultura popular, pode também ter a cultura erudita e blá blá blá. Achamos mesmo que negros franceses aprendem se os deixamos expostos à cultura erudita. Não nos passa pela cabeça que antes de tudo ele vai é roubar ou simplesmente destruir o aparelho de som que ali deixamos para que ele escutasse o que queríamos que ele escutasse. E se nos passa isso pela cabeça, sentimos vergonha de nós mesmos e, então, nos calamos.
© 2013 Paulo Ghiraldelli Jr., filósofo, escritor, cartunista e professor da UFRRJ

terça-feira, 28 de maio de 2013

VIII CONGRESSO DO CPERS-SINDICATO - TESE 2

TESE 2

CPERS DE LUTA, CLASSISTA E INDEPENDENTE

O VIII CONGRESSO DO CPERS/SINDICATO ocorre no marco conjuntural do avanço da
crise econômica mundial. Diante desta realidade, será fundamental que os educadores possam
debater as consequências para a vida dos trabalhadores e também discutir as alternativas do
ponto de vista da nossa classe.

1. CONJUNTURA

A crise capitalista internacional e a reação dos trabalhadores

O capitalismo vive uma de suas maiores crises. Iniciada em 2008, nos Estados Unidos,
centro do capitalismo mundial, esta crise determinou um significativo aumento nos níveis de
exploração do trabalho e grandes ataques aos direitos dos trabalhadores em todo o mundo. As

causas que deram origem a esta verdadeira avalanche nos mercados mundiais iniciaram a
partir do crescimento na especulação imobiliária, da redução na oferta de créditos e do

descontrole do sistema financeiro. Em um mundo globalizado, diante da complexidade das
relações estabelecidas entre os mercados financeiros, é inevitável a repercussão dos efeitos da
crise nas diversas economias ao redor do mundo.
Esta situação levou à falência bancos e outras instituições financeiras, como, por
exemplo, o Lemans Brothers, um dos maiores bancos americanos. A “farra financeira” que
levou estas instituições a emitir papéis – chamados “podres” (subprimes) – e, por
consequência, a aumentarem demasiadamente os riscos destas operações. Isto se alastrou
rapidamente para a Europa e Japão, levando o imperialismo a adequar suas políticas e impor
aos demais países planos de austeridade para tentar resolver a crise capitalista.
Desta forma, os custos e as principais medidas de controle foram bancados pelos
governos, demonstrando claramente seu papel de subordinação aos interesses do capital.
Pacotes bilionários de auxílio e de empréstimos para suprir os déficits das empresas e deixar a
salvo o capital especulativo. Assim, permanece intacta a regra número um do neoliberalismo:
os capitalistas, quando estão lucrando, acumulam capitais e ficam cada vez mais ricos, porém,
quando entram em crise, recebem o dinheiro público para se salvar e os governos transferem a
conta para os ombros da classe trabalhadora!

O agravamento da crise levou as empresas a aplicarem medidas de redução de salários,
transferências de fábricas para países onde a exploração é ainda maior e aumentou o
desemprego em vários países centrais. A crise atingiu em cheio muitos países europeus, que, a
exemplo dos Estados Unidos, impuseram medidas de austeridade que provocaram bruscas
quedas nos níveis de salário e emprego, especialmente no serviço público e na juventude. No
entanto, como em todas as crises capitalistas, esta também seguiu a hierarquia dos
acontecimentos: primeiro a crise econômica, depois, a crise social e, por fim, a política. Com
as manifestações de massas crescendo e os governos sem condições para resolver os
problemas, inicia-se a repressão aberta contra as manifestações dos trabalhadores.
A Europa é, hoje, o epicentro da crise mundial, que atingiu proporções colossais no
continente. Com o aprofundamento dos planos de austeridade, os trabalhadores passaram a
reagir. Inicialmente, houve uma tentativa do imperialismo de difundir a crise como um
problema de países menores como Islândia, Irlanda ou Grécia, o que, rapidamente, foi
desmentido pelos fatos. A Grécia, pressionada pela Troika (Banco Central Europeu, FMI e
Comissão Europeia), realizou uma série de cortes nos gastos sociais e demitiu milhares de
servidores públicos.
Foi exatamente pela Grécia que iniciou a reação dos trabalhadores na Europa. A partir
daí, várias greves e até mesmo uma inédita greve geral no continente aconteceu. Na Espanha,
os mineiros do carvão realizaram uma grande greve entre maio e junho de 2012. A repressão
do governo foi violenta, chegando a assassinar vários manifestantes. Dois meses depois, em
protesto contra a violência, uma marcha percorreu centenas de quilômetros, terminando numa
manifestação de mais de 200 mil pessoas. Também entraram em greve os trabalhadores em
educação e os da saúde. Nas greves gerais, organizadas por fora das “burocracias sindicais”,
pararam setores fundamentais, como transporte público e ferrovias.
Grandes manifestações também aconteceram em Portugal, na França, na Itália e
também na Alemanha, chamada de “locomotiva da economia europeia”. No dia 14 de
novembro de 2012, uma greve geral unificada atingiu praticamente todos os países da Europa.
Este movimento foi chamado devido ao anúncio de mais cortes sociais em todos os países da
comunidade europeia, atingindo a previdência, a educação, a saúde, a assistência social e até
mesmo os salários dos servidores públicos.
Simultaneamente às greves na Europa, ocorreram processos revolucionários no mundo
árabe, na Tunísia, no Egito, no Iêmen, na Líbia, na Palestina e na própria Síria. A luta por
liberdades democráticas e melhores condições de vida, no norte da África e nos países árabes,
derrubaram vários governos e seguem buscando caminhos para construir sociedades mais
justas.
A luta dos trabalhadores, em todo mundo, continua. Nos EUA, país cuja dívida pública
é hoje de U$ 16 trilhões, maior que seu próprio PIB (U$ 15 trilhões), não ocorriam greves
desde a década de 1980. Em 2012, os professores de Chicago promoveram uma grande
paralisação, assim como os trabalhadores da WallMart, maior empregador privado daquela
nação.

O CPERS participou de recente encontro de sindicalistas, em Paris, em março deste
ano, que reuniu lutadores de mais de 30 países. O encontro debateu a necessidade da unidade
da classe para: lutar contra os ataques do capital, avançar na organização internacional,
defender um sindicalismo combativo, democrático e independente de patrões e de governos,
defender os direitos dos trabalhadores e também o combate às opressões, especialmente às
mulheres. Por fim, defender o respeito à autodeterminação dos povos, tendo como símbolo a
luta da Palestina.

No Brasil, também são os trabalhadores que pagam a conta

Diante da crise mundial, o Brasil viu diminuir bruscamente a exportação de
commodities e a aceleração do processo de desindustrialização do país. Apesar disto,
sustentada pelo minério de ferro e pelos produtos agrícolas, especialmente a soja, a economia
conseguiu uma sobrevida em relação ao avanço da recessão mundial.
Mas o governo brasileiro seguiu a cartilha neoliberal e aprofundou medidas para conter
o avanço da crise. Em primeiro lugar, arrochando salários e aumentando as concessões para os
empresários. A renúncia fiscal, somente com desonerações, ultrapassa a casa dos R$ 70
bilhões. Mais de 40 setores da economia já estão isentos do recolhimento da cota patronal para
a previdência, além de outras isenções. Medidas de redução de impostos para a cesta básica ou
para os medicamentos não significaram queda nos preços para o consumidor.
A inflação avança. O prejuízo, evidentemente, será para os trabalhadores, pois a alta
dos preços garante o lucro dos empresários. Os juros também voltaram a subir. Além disto, o
governo tem aplicado uma política de privatizações que nada deve ao auge do governo FHC:
hospitais universitários, hidroelétricas, estradas, jazidas petrolíferas, metrôs, portos e
aeroportos estão sendo entregues à iniciativa privada.
Dilma, assim como fez Lula, se tornou gerente do capitalismo e, para isso, não vacila
em fazer todas as alianças possíveis. Sarney, Collor de Melo, Renan Calheiros, Jader Barbalho
e até mesmo o pastor Marcos Feliciano ocupam importantes postos na organização política do
país, para garantir a estabilidade social e política necessárias para a governabilidade. Assim,
Dilma bate recordes de popularidade.
Como isto se explica? Em primeiro lugar pelas chamadas “políticas compensatórias e
transitórias”, como o “Bolsa-Família”. Auxiliar os miseráveis mantém um “feudo eleitoral” e
dialoga com os setores de esquerda. Depois, com o amplo apoio da burguesia, satisfeita com
os ajustes da economia e com a manutenção da “ordem social”, fruto da cooptação das
organizações sociais pelo governo. Portanto, com a classe dominante – e sua mídia – apoiando
e com a “gratidão” das camadas populares, o governo se sustenta com altos índices de
avaliação.
O fenômeno que possibilitou ao governo federal distribuir recursos para as camadas
mais necessitadas é chamado de “expansão da base salarial”, sem, no entanto, significar
distribuição de renda! Assim, o mesmo montante, 42% do PIB, em 2002, se mantém em 2012.
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Isto é, a parte da riqueza do país que cabe aos trabalhadores passou a ser distribuída para uma
base bem maior, com a inclusão social, mas manteve intacto o lucro dos empresários, a
riqueza acumulada por menos de 5% da população brasileira.
Na mesma direção, seguem os problemas estruturais do Brasil. Saúde, educação,
habitação, saneamento e outros serviços essenciais para a vida da população continuam sendo
de péssima qualidade e recebendo cada vez menos investimentos. Por outro lado, somente em
2012, mais de R$ 1 trilhão foram entregues diretamente para o sistema financeiro, por
conta da ilegítima dívida pública, que só cresce!
Neste cenário, os trabalhadores começaram a reagir. Em 2012, centenas de greves
ocorreram. Porém a mais importante, sem dúvida, foi a do setor público federal, que, por sua
força, impôs uma derrota política ao governo Dilma e levou muitos setores a concluírem suas
experiências com o governo e seus partidos aliados. Além disto, houve a Marcha de 24 de
Abril deste ano, com mais de 20 mil trabalhadores indo a Brasília protestar contra as políticas
do governo.
A Marcha marcou uma nova etapa na reorganização do movimento sindical no Brasil.
Chamada pelo CPERS Sindicato, CSP-CONLUTAS, CUT PODE MAIS, independentes da
CONDSEFE, FERAESP, CNTA, INTERSINDICAL e outras entidades que integram o
Espaço de Unidade de Ação, obteve a adesão de amplos setores do campo e da cidade, com
massiva presença de educadores de todos os estados, funcionários públicos e demais
trabalhadores.

Governo Tarso: os CCs e os empresários estão muito contentes!

No Rio Grande do Sul, depois de um governo de conflitos e intensos ataques aos
direitos dos funcionários públicos, promovido por Yeda Crusius, cuja principal marca foi a
corrupção, a população elegeu, em primeiro turno, o candidato do PT, Tarso Genro.
Os conflitos na área da educação causaram grande desgaste ao seu governo, desgaste
esse que se agravou com os recentes escândalos de corrupção na área do meio ambiente. Em
sua política de “faz de conta”, Tarso visita a Palestina, mas faz negócios com Israel, inclusive
com empresas de segurança. Defende Cuba e, ao mesmo tempo, agrada ao empresariado,
concedendo cada vez mais isenções fiscais e empréstimos.
Na relação com os servidores, a política é a mesma. Aumento das contribuições
previdenciárias de 11% para 13,25%, arrocho salarial e muita enganação. Recente
“reestruturação” do Quadro Geral resultou em insignificantes R$ 80,00 de reajuste para estes
trabalhadores. Yeda pagou, em 2010, R$ 500 milhões de RPVs. Tarso, por sua vez, pagou
somente R$ 340 milhões em 2012! Isto representa uma diminuição de R$ 160 milhões.
Os investimentos sociais seguem nos mesmos patamares de antes, embora tenha havido
um incremento de praticamente 10% na arrecadação. Tarso permanece não cumprindo os
mínimos constitucionais em saúde e educação. Além disto, de forma escandalosa, retirou R$
4,2 bilhões das contas judiciais!
Escândalos de corrupção na concessão de licenças ambientais, que atingiram
diretamente seus aliados do PC do B, mostram outra face deste governo: as relações espúrias
para manter maioria parlamentar. O governo, numa atitude de profundo desrespeito com a
sociedade, simplesmente manteve a situação como se nada tivesse acontecido.

Agora, Tarso prepara a sua candidatura à reeleição. Embora com sua popularidade
desgastada e sua imagem arranhada em função da marca da mentira, deve ser a opção,
inclusive respaldada por organizações que tentam confundir os trabalhadores. Com seus
subordinados, muitos saídos das fileiras do CPERS, tanto na SEC quanto no Palácio Piratini, o
governador articula o combate ao sindicato, tentando atrair setores da base para fortalecer sua
política de ataque aos direitos dos educadores. Com isso, deseja enfraquecer esta importante
ferramenta de luta para poder governar com tranquilidade.
Portanto, neste próximo período, é fundamental que o CPERS/SINDICATO mantenha
sua independência diante dos governos e autonomia frente aos partidos políticos. Que continue
chamando a categoria para a mobilização, mas que construa uma plataforma programática de
acordo com os interesses da nossa classe para continuar disputando a consciência dos
trabalhadores.
Também será muito importante que este Congresso reafirme que a decepção dos
educadores com governos e partidos traidores da nossa classe não significará um retrocesso,
portanto, os conhecidos partidos da direita, que sempre sustentaram os interesses da burguesia,
continuarão não tendo a confiança da nossa categoria.

2. BALANÇO DO CPERS

CPERS reafirma sua independência

A atuação do CPERS, com independência e autonomia na defesa dos direitos da
categoria e da classe trabalhadora, tem se constituído num exemplo político importante para o
conjunto dos trabalhadores.
No último Congresso do CPERS/Sindicato, a Articulação Sindical levou o então
candidato, Tarso Genro, para reforçar nos educadores a ilusão de que, votando nele, os
professores e funcionários de escola receberiam o piso salarial. Como se não bastasse, Juçara
Dutra, ex-presidente do CPERS, transmitiu a mentira de Tarso, de que, se eleito fosse, retiraria
a ADIN da Yeda do STF. Além disso, acusaram a direção do sindicato de sonegar uma
informação como esta, tão importante para a categoria.
No entanto, não demorou muito para a máscara cair. A confusão que, naturalmente, se
estabelece em relação ao papel que cumprem estes governos, que saem do seio da classe
trabalhadora e que contam com o apoio de organizações de massas, às vezes, demora muito
para ser dissipada.
A Direção do CPERS tratou, logo cedo, de acabar com a confusão. Primeiro, não
aceitando participar do Conselhão (órgão governamental com a participação majoritária do
empresariado), verdadeiro instrumento da política de conciliação de classes, sempre para
controlar os trabalhadores e, depois, desconstituindo o CODIPE (outra farsa deste governo).
Assim, o CPERS demonstrou, inequivocamente, que não seria um braço do Palácio Piratini
para ajudar a enganar a categoria.
Infelizmente, o mesmo não aconteceu com a Articulação Sindical, que é a direção
majoritária da CUT e de outras entidades, pois, ao legitimar esta política, alimenta a ilusão dos
trabalhadores de que Tarso é um governo diferente.
A campanha salarial, logo no início do governo, mobilizou a categoria e respondeu, de
forma categórica, que nada nos faria recuar da luta pelo piso e da cobrança da pauta aprovada
no último congresso e prometida pelo candidato Tarso Genro.
Foi realizando uma batalha sem trégua contra o “PACOTARSO” que esta direção se
reelegeu. Várias reuniões e atividades de mobilização unitárias com o conjunto dos servidores
foram realizadas, num período muito curto, já que este pacote foi colocado na Assembleia

Legislativa em regime de urgência. Este projeto, que criou o Fundo de Previdência e deu um
calote nas RPVs, entre outras “maldades”, foi votado no dia da eleição do CPERS/Sindicato.
A categoria saiu da votação do “pacote” com uma amarga derrota. Mas também soube
dar o troco. Outdoors foram espalhados por todo o estado, milhares de cartazes foram colados,
mostrando “A nova face dos inimigos da educação”. Sem dúvida, a política do governo Tarso
e a sustentação dos deputados do PT, PC do B, PSB, PDT, PTB e PRB serviram muito para
que a experiência com o parlamento se aprofundasse, pois a base de sustentação do atual
governo se comportou exatamente como a “base de direita”, que sempre votou contra os
trabalhadores na Assembleia Legislativa.
Também é importante salientar que, depois de ter garantido, através de “troca de
favores”, uma base sólida na Assembleia Legislativa para retirar os direitos dos servidores
públicos, Tarso deixou de fingir que negociava com os educadores.
Apesar disso, o CPERS/Sindicato não deixou de buscar a negociação. Claro que
negociação sempre respaldada pela mobilização da categoria, pois esta entidade não seguirá o
exemplo das organizações dirigidas pelos “amigos do Tarso”, que, estando de joelhos para o
governo, nada mais fazem que entregar os direitos dos trabalhadores.
Foram inúmeras as formas de luta para buscar a implementação do piso salarial para os
professores e funcionários de escola: atos públicos, caravanas, marchas – tanto regionais como
estaduais – pressão em Câmaras de Vereadores, no Legislativo Estadual, paralisações, redução
de períodos, ocupações na Secretaria de Educação, no Palácio Piratini e na bancada do PT,
atividades com alunos e pais, além de várias campanhas de mídia, outdoors e colagens.
Devemos também destacar que, junto com a luta do Piso, sempre esteve presente a
defesa da educação. A greve, no final de 2011, contra a Reforma do Ensino Médio foi um
exemplo contundente disso.
Quanto à participação na Greve Nacional de 2012 e, agora, de 2013, não temos dúvida
de que o índice de adesão no Rio Grande do Sul foi o maior do país. Realizamos o Encontro
dos Funcionários de Escola, o Encontro de Educação, com o tema da Reforma do Ensino
Médio e, no ano passado, uma Conferência de Educação.
Construímos um Projeto que trata da Saúde dos Trabalhadores em Educação,
realizamos uma pesquisa que comprovou o quanto a nossa categoria sofre pelas péssimas
condições de trabalho, realizamos seminários para formar as representações dos núcleos e
estamos na fase da organização das comissões por núcleos, para documentarmos os problemas
causadores do adoecimento da nossa categoria.
Além disso, aprofundamos a estratégia de construir a unidade da nossa categoria com
os demais trabalhadores. Na primeira gestão, foi aqui no estado, unificando os Servidores
Estaduais no Fórum dos Servidores Públicos, mas, nestes últimos dois anos, os nossos passos
foram maiores, tivemos a coragem de colocar o nosso sindicato a serviço de construir a
unidade nacional com aqueles que querem lutar.
Isto tem um significado enorme para ajudar a avançar a consciência da nossa categoria,
para fortalecer a luta “em defesa da educação pública”, mas, principalmente, para construir
uma nova direção para a classe trabalhadora brasileira.
Por fim, salientamos que nos orgulha muito o fato de que este bloco que dirige o
CPERS tem e teve uma política que, de forma categórica, fortaleceu o CPERS como um
símbolo de resistência na luta contra o governismo e o burocratismo. Esta conclusão não
significa pouco, numa conjuntura marcada por traições da maioria das direções construídas
pela nossa classe.

3. MOVIMENTO SINDICAL

O PAPEL QUE O CPERS TEM CUMPRIDO PARA UNIFICAR OS
TRABALHADORES

Desde 2008, a unidade entre as organizações que dirigem atualmente o CPERS,
permitiu que os educadores apostassem em uma alternativa oposta à política da direção
majoritária da CUT e da CNTE. Esta alternativa surgiu pela necessidade de recolocar o nosso
sindicato no caminho das lutas, mas, principalmente para impedir que este poderoso
instrumento perdesse sua independência frente aos governos, patrões e também ao aparelho do
estado.
A tese apresentada pelo bloco que dirige o CPERS estabelece com clareza as tarefas e
desafios para o próximo período. No entanto, as políticas de desmonte da educação, que
impõem aos educadores muito sofrimento, são aplicadas aqui no estado e também pelos
demais governos estaduais e federal.
Isto já é suficiente para que os professores e funcionários de escola compreendam que
não podem ultrapassar sozinhos estes obstáculos. Também é preciso entender que os
problemas não estão colocados tão somente para uma categoria, mas para o conjunto da classe
trabalhadora. Portanto, para enfrentá-los e superá-los, é preciso se organizar e lutar
conjuntamente.
A partir desta constatação, é muito importante que a nossa categoria faça um balanço
de qual papel tem cumprido a CNTE e a CUT neste último período. Queremos aqui citar
alguns exemplos:
1. Desde que Lula assumiu, em 2003, a CNTE optou pala submissão às políticas educacionais
do governo federal, assumiu o “Pró-funcionário”, que nada mais é do que uma enganação em
termos de qualificação profissional, defende abertamente a alteração do plano de carreira dos
professores do RS, sem esquecer o episódio lamentável de apresentar propostas de alteração
do cálculo de reajuste do piso, ajudando os governos no discurso de que não pagam o Piso
porque os estados não têm como suportar o reajuste do custo aluno. Como se não bastasse, não
articulam as lutas nacionais, pelo contrário, quando chamam dias de greve, não conseguem
nem que os sindicatos que dirigem assumam e façam pra valer;
2. A CUT não é diferente, embora existam setores que militam na central e que defendem uma
política oposta a da direção majoritária, o que temos visto é uma completa adaptação ao
governismo e à política de conciliação de classes. Basta ver a confusão que fazem, levando
representantes de governos para falar nos atos dos trabalhadores, participando de fóruns
governamentais junto com os empresários e semeando ilusões de que governos que atacam os
direitos dos trabalhadores podem ter a confiança da nossa classe.

Contrário a isso, o CPERS tem sido um exemplo da importância em manter o perfil
classista e independente de uma organização. Neste sentido, este congresso tem que deliberar
que o CPERS não meça esforços para se colocar sempre ao lado daquelas organizações que
querem lutar para defender nossos direitos, tendo como princípio a independência de classe.

4. EDUCAÇÃO

Contra os ataques dos governos é preciso defender a educação!

Os projetos governamentais, em sua globalidade, estão direcionados a um objetivo:
enfraquecer a escola pública, reduzindo a qualidade do ensino e deteriorando,
sistematicamente, as condições físicas das escolas. Simultaneamente, desencadeiam ataques
duríssimos às condições de trabalho dos educadores para economizar e desviar recursos, além
de tornar ainda mais bárbaro o cotidiano escolar. O resultado dessas políticas é a existência de
uma crise permanente nas escolas públicas. O adoecimento generalizado é resultado de uma
desmoralização da carreira docente, provocada intencionalmente pelos sucessivos governos.
Esta odiosa ofensiva tem origem no interesse que o “mercado educacional” provoca no
grande capital. No Brasil, este mercado corresponde a mais de US$ 100 bilhões. Diante da
crise econômica mundial, aumentam as pressões para que os governos apliquem “reformas
educacionais” que signifiquem ainda menos recursos para a escola pública. É a
mercantilização avançada de um dos direitos humanos mais fundamentais!
Nos mandatos de Lula e Dilma, houve um aprofundamento desse violento processo de
privatização. Segundo o Censo Escolar do MEC, entre 2002 e 2010 houve uma queda de
12,3% nas matrículas de todo o ensino básico público, enquanto na rede privada houve um
crescimento de 5,2%. Na educação profissional, 56% das matrículas estão na esfera privada.
No ensino superior, 75% das vagas são de instituições privadas, expressando um crescimento
de 227% em apenas 15 anos.
Este avanço do capital sobre a educação está expresso nos objetivos do novo PNE
(Plano Nacional de Educação), que está para ser votado no Congresso Nacional. Com o apoio
da CNTE e das entidades que dão sustentação aos governos, o PNE proposto busca ser o eixo
ordenador dessa política de privatização da educação em nosso país. É o plano que organiza,
de norte a sul do país, a deterioração da escola pública e as atuais reformas, de conteúdo
privatista.
A serviço de uma lógica neoliberal, o PNE expande as parcerias público-privadas e os
projetos (PROUNI, PRONATEC, FIES, Ensino à distância, ENADE, ENEM) que favorecem
o viés mercadológico da educação. E, para piorar a vida dos educadores, o PNE ataca ainda
mais a autonomia docente, por meio do aprofundamento da meritocracia e das avaliações
externas. Impõe uma maior centralização curricular e ameaça a gestão democrática das
escolas. Em resumo, este plano impõe condições mais coercitivas aos educadores, tornando-os
responsáveis pelos fracassos educacionais que o próprio governo gestou.

O desastre educacional do Governo Tarso

A política educacional do governo Tarso é um desastre em todos os aspectos. O atual
governo abandonou, uma a uma, todas as promessas feitas ao povo gaúcho e decidiu voltar-se
contra os educadores. Para agravar mais a situação, assumiu os mesmos métodos truculentos e
antidemocráticos do governo anterior para impor reformas impopulares na educação. O
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exemplo mais categórico é o da reforma do ensino médio (“ensino politécnico”), no qual o
governo assume as exigências do empresariado e impõe um projeto contra a vontade dos
estudantes, dos educadores e da comunidade escolar.
A proposta de reforma do ensino médio do governo Tarso segue o projeto educacional
do governo federal e reforça a situação de discriminação e segregação da juventude proletária.
Disfarçada sob o rótulo de “integração ao mundo do trabalho” e deturpadora do conceito
marxista de politecnia, o objetivo de tal reforma é direcionar, adaptar e formatar a juventude
para inserção como força de trabalho no mercado capitalista.Vale acrescentar que os
estudantes, no estado, procuram reagir a esta reforma.
Tarso e o secretário José Clóvis de Azevedo fazem ressurgir o “regimento padrão”,
ferindo a gestão democrática das escolas e impondo um retrocesso ainda maior no sentido do
cerceamento à liberdade de cátedra dos educadores. Aumenta o controle burocrático e o
método de imposição pedagógica, tornando ainda mais difícil o cotidiano das escolas. A
política de “aprovação automática” vem empobrecer e desqualificar a educação, impedindo
que o conhecimento seja um objetivo para os filhos dos trabalhadores.
Contra tudo o que prometeu antes de se eleger, Tarso se adequa às pautas da Agenda
2020 e de movimentos empresariais como o “Todos pela Educação” e faz proliferar convênios
com fundações e ONGs. Por todos esses desmandos, o governo Tarso vem semeando uma
enorme revolta nas escolas do Rio Grande do Sul. Permanecem os problemas estruturais,
como a falta de professores e funcionários, a ausência de condições físicas adequadas ao
funcionamento de bibliotecas, laboratórios, etc. Faltam, até mesmo, condições básicas, como
luz, água e saneamento. Sequer o PPCI existe nas escolas.
Diante da gravidade dos ataques dos governos Dilma e Tarso, a luta e a resistência dos
educadores adquirem uma importância decisiva para o futuro da nossa classe.
Precisamos seguir lutando por um projeto educacional coerente com as necessidades da
classe trabalhadora e enfrentando as ações dos governos e do grande capital.
Como parte dessa luta em defesa da educação devemos reafirmar as nossas bandeiras:
· Escola pública, gratuita, universal, laica e de boa qualidade.
· 10% do PIB para a educação pública já!
· Não à reforma do ensino médio e à farsa do “ensino politécnico” do governo Tarso.
· Não ao PNE. Por um PNE dos (as) trabalhadores (as): construído pelos estudantes, pais
e organizações da classe trabalhadora.
· Em defesa da autonomia docente. Gestão democrática que compreenda autonomia
pedagógica e administrativa. Conselhos Escolares realmente representativos e com
poder de deliberação, pois a comunidade escolar deve exercer o controle da gestão da
escola.
· Contra a privatização e os fundos que levam à municipalização do ensino. Pelo
cumprimento dos repasses previstos em lei para a educação.
· Combate permanente às ONGs, fundações e institutos, que acabam recebendo dinheiro
público dos governos, que são verdadeiras fontes de corrupção e interferem na
educação dos filhos dos (as) trabalhadores (as).
· Não às avaliações externas (SAEB, ENEM, PROVA BRASIL, SEAP).
· Concurso público para professores e funcionários de escola, com garantia de
nomeação.
· Em defesa dos planos de carreira e pelo pleno cumprimento dos mesmos, pois esta luta
significa impedir a aplicação das diretrizes nacionais, que desestruturam as carreiras e
abrem caminho para a implantação da meritocracia.
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· Pagamento imediato do piso salarial como básico das carreiras para professores (as) e
funcionários (as).
· Defesa dos planos de carreira dos educadores com a garantia do sua efetiva aplicação.
· Cumprimento de 1/3 da hora atividade. Sem a hora-relógio e garantia da hora-aula.
· Combate às falsas propostas de formação para os (as) funcionários (as), como o Prófuncionário,
que têm como objetivo, não a qualificação, mas sim, a negação da
identidade profissional estabelecida no plano de carreira daqueles que, durante anos,
exercem sua profissão dentro das escolas públicas.

5. POLÍTICAS ESPECÍFICAS

Abaixo toda forma de opressão!

O sistema em que vivemos aproveita-se das diferenças de gênero, raça e sexualidade para
colocar parte importante da população em “desvantagem” social e submeter este grupo a
piores condições de vida. Em relação às mulheres, o machismo é uma ideologia que ataca
econômica, política e socialmente. O machismo pode expressar-se de diversas formas: em
piadas que ridicularizam as mulheres, e em muitas formas de violência como verbal, física e
psicológica.
A profissão de professora/professor, historicamente, foi concebida como uma profissão
feminina, uma extensão do lar, algo de cunho estritamente “vocacional”, lugar onde os
trabalhadores podem deixar seus filhos, pois as “cuidadoras” tomarão conta deles. No
governo Dilma, diferente da propaganda eleitoral, não existe nenhuma política efetiva para a
construção de creches públicas e, hoje, apenas 13% das crianças até três anos são atendidas.
Os índices de violência contra a mulher crescem a cada dia. Atualmente, em nosso país, a cada
2 minutos, cinco mulheres são espancadas, e a falta de verba para aplicação da Lei Maria da
Penha é um empecilho na proteção às mulheres que sofrem violência e/ou ameaças. .
O quadro geral de trabalhadores em educação no estado do RS é composto por 85% de
mulheres, divididas entre funcionárias e professoras. A precarização constante a que está
subordinada nossa categoria é uma das expressões da sociedade machista em que vivemos, por
isso acreditamos que é fundamental que compreendamos isto para organizar as trabalhadoras
da educação em torno do tema.
As demandas relacionadas aos problemas das mulheres na categoria são parte das lutas
que todos devemos assumir, assim, o direito de 6 meses de licença maternidade, que foi uma
conquista histórica das mulheres trabalhadoras deve ser expandido até um ano, bem como
devemos exigir licença paternidade de 40 dias para homens, pois os pais também devem ser
responsáveis pelo cuidado de seus filhos.
A creche é um direito para que os pais da classe trabalhadora possam deixar seus filhos
em segurança em um espaço educacional. Logo, enquanto não existem creches públicas no
conjunto das escolas estaduais, devemos lutar por um auxílio creche de acordo com os valores
necessários para que se pague uma escola de educação infantil e a categoria possa trabalhar
tranquila. .
A unidade entre homens e mulheres, tendo as mulheres na vanguarda desta batalha, é
fundamental para que possamos superar esta situação de opressão. Sabemos que o capitalismo
utiliza-se da opressão sobre mulheres, negros e homossexuais para que possa aumentar seus
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lucros e, como consequência, a exploração sobre a classe trabalhadora de conjunto, trata-se de
uma luta dos trabalhadores contra a opressão!
Também será necessário mobilizarmos a nossa categoria para que pressionemos o
governo para o atendimento da nossa pauta específica aprovada, dia 08 de março, na nossa
Assembleia Geral e entregue neste mesmo dia.

LGBT

A homofobia é uma opressão que divide a classe trabalhadora e a incorporação das
lutas contra a opressão é muito importante para o fortalecimento e unificação da classe. A
realidade em nosso país, que é refletida no setor educacional com força, é de que a homofobia
acaba por ser um grande obstáculo para que muitos LGBTTT concluam seus estudos e possam
até mesmo realizar seu trabalho com qualidade. Devemos denunciar e repudiar a violência
homofóbica sofrida por LGBTTT da classe trabalhadora, que se expressa em grandes índices
de assassinatos dos mesmos.

A eterna luta dos Funcionários de Escola

Não é de hoje que a necessidade dos agentes educacionais lutarem pelos seus direitos é
uma premissa. No governo Yeda, os ataques aos educadores e à escola pública foram um
projeto cotidiano. Entrou o governo Tarso e nada mudou, aliás, a situação e as condições de
trabalho dos agentes educacionais pioraram e houve um aprofundamento da precarização do
trabalho no ambiente escolar.
Além de todas as demandas históricas, há hoje uma nova ameaça, a extinção da categoria,
pois não há mais concurso público e é grande o número de aposentadorias.
Na questão da saúde, possuímos uma categoria adoecida pelo aumento da carga de
trabalho, agravado pela falta de estrutura e pelo material de trabalho inadequado.
Devemos ressaltar que o CPERS/SINDICATO sempre lutou junto à categoria pela
inclusão de todos os funcionários de escola no Plano de Carreira dos Agentes Educacionais.
Porém, o Governo Tarso aplica um duro golpe, apresentando um projeto de lei para o
funcionalismo público estadual, dividindo mais uma vez a categoria. O mesmo não incorpora
os trabalhadores que atuam nas escolas no novo plano de carreira, jogando-os para o quadro
geral. Com tudo isso, vimos que o governo atual não está preocupado em valorizar os
trabalhadores em educação.
Devido aos ataques do governo, temos que aumentar nossa organização. Continuaremos
sendo educadores com bandeiras de luta por uma educação de qualidade, lutaremos por uma
formação gratuita e pela lei do Piso, também para os Funcionários, aliás, luta que a CNTE
abandonou. Seremos resistentes e estaremos lutando junto à classe trabalhadora e à
comunidade escolar!


Saúde dos educadores, “o quadro da dor”

A situação da escola pública em nada se diferencia da dramática e dolorosa situação
dos professores e funcionários das escolas do RS. O CPERS/Sindicato, através do Projeto de
Saúde dos Trabalhadores em Educação, realizou seminários e pesquisas junto à categoria,
constatando o quadro de desvalorização, desrespeito, assédio moral, sobrecarga de trabalho,
baixos salários e falta de condições estruturais nas Escolas Públicas do RS. Quadro este que
provoca o adoecimento dos educadores.
Esse verdadeiro caos, que vem se agravando a cada governo, continua e se aprofunda
no Governo Tarso.
Infelizmente, os índices alarmantes de adoecimento dos educadores, em virtude da
atividade laboral, apontados em pesquisas, tendem a aumentar. É preciso manter e ampliar a
atenção sindical para saúde, aprofundando estudos, dando continuidade aos seminários e
debates, organizando em cada local de trabalho e em cada núcleo, as Comissões de Saúde do
Trabalhador em Educação para que possamos colocar esses problemas também como centro
das nossas próximas mobilizações.

Direitos para os Contratados

A luta dos educadores por concurso público é histórica no nosso estado. Durante
décadas, esta tem sido uma das principais reivindicações dos educadores e, apesar disso,
quando ocorrem concursos, não são suficientes para preencher as vagas existentes e, por isso,
não conseguem regularizar a situação dos contratados.
Enquanto isso, os contratos emergenciais, tanto para professores como para
funcionários, aumentam a cada ano. Hoje, sem dúvida, já são mais de 20 mil contratados,
numa relação de trabalho quase em “regime de escravidão”.
Neste sentido, este congresso tem que encarar este debate e deliberar que:
· O nosso sindicato tenha uma política unitária de proteção ao emprego dos
educadores contratados;
· Abra-se um debate sobre os direitos trabalhistas destes profissionais;
· Construa-se uma forte mobilização para pressionar o executivo e o legislativo
para que todo educador contratado tenha, no mínimo, os direitos garantidos
pela CLT.

6. PLANO DE LUTAS

A defesa da educação, dos direitos e reivindicações dos educadores e da luta unificada
da classe trabalhadora tem sido o norte da atuação do CPERS/Sindicato ao longo dos últimos
anos. A convicção em estar lado a lado com os trabalhadores na luta de classes fez com que
nosso Sindicato enfrentasse governos como o da Yeda e do Tarso Genro, mantendo-se com a
independência necessária para organizar a luta.
Este firme posicionamento político deve continuar sendo à base do plano de lutas para
o próximo período.
A denúncia sistemática de suas mentiras, de suas promessas não cumpridas, de seus
projetos de ataques aos nossos salários e planos de carreira, de suas reformas neoliberais,
configura a única possibilidade de defesa verdadeira dos educadores e da escola pública. A
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luta contra o atual governo e suas tentativas de enganar o povo gaúcho é condição essencial
para que possamos derrotar os planos de desqualificação e privatização da escola pública.
Nesse contexto, o Congresso deve debater o fortalecimento de nossa luta pelo
pagamento imediato do piso salarial profissional nacional para os professores e criação do piso
salarial para os funcionários, com os mesmos parâmetros.
Será necessário debater a construção de uma forte greve no RS, como único meio de
derrotar o objetivo do atual governo de se recusar a cumprir uma lei favorável aos
trabalhadores. E, assim, derrotar os acordos espúrios que o governo Tarso fez com o
Ministério Público para desrespeitar nosso direito.
Também recordar com força quem são os inimigos da educação, mais ainda em 2014,
que é ano eleitoral. Os ataques da burguesia, dos partidos de direita, que já governaram o
estado e o país, do atual governador e de sua bancada na Assembleia Legislativa deverão
seguir encontrando no CPERS/Sindicato a mais firme resistência, uma forte trincheira de luta
da classe trabalhadora.

EIXOS DE LUTA E REIVINDICAÇÕES DA CATEGORIA

· Cumprimento imediato da Lei do Piso Salarial para Professores, como básico do Plano
de Carreira. Criação do Piso Salarial para os Funcionários. Não às tentativas de
alteração dos critérios de reajuste da Lei do Piso.
· Cumprimento imediato do 1/3 de hora-atividade.
· Defesa dos Planos de Carreira de professores e funcionários.
· Não à reforma do ensino médio e à farsa do “ensino politécnico”.
· Concurso público para professores e funcionários, com taxas menores e regras
razoáveis.
· Não à meritocracia! Anulação do decreto que alterou os critérios da carreira do
magistério. Revisão da lei do vale-refeição para revogar o estorno.
· Inclusão de todos os funcionários no Plano de Carreira.
· Garantia da paridade entre ativos e inativos.
· Promoções dos professores e funcionários de escola.
· Manutenção do IPE-SAÚDE público, obrigatório e de qualidade somente para
servidores. Não ao desmonte do IPE.
· Valorização profissional e condições dignas de trabalho.
· Combate ao descaso dos governos Dilma e Tarso com a educação.
· Não à privatização da escola pública.
· Contra o PNE privatista que está no Congresso Nacional.
· Anulação da Reforma da Previdência comprada com o dinheiro do “mensalão”.
· Não ao Acordo Coletivo Especial – ACE ou qualquer outra proposta que retire direitos
dos trabalhadores.

AÇÕES

· Debater com a categoria a necessidade de uma greve no início de 2014 para obrigar o
governo a negociar o Piso e as demais reivindicações;
· Debate permanente nas escolas, para fortalecer o trabalho de base e preparar a
categoria para os próximos enfrentamentos;
· Continuar mobilizando os aposentados e chamando para fortalecer as instâncias do
Sindicato;
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· Organizar calendário de mobilizações no segundo semestre: redução de períodos e
paralisações;
· Fortalecer os representantes de escola e eleger onde não há;
· Articular lutas unitárias com os trabalhadores em educação de outros estados;
· Continuar, de forma conjunta com os demais trabalhadores, denunciando a tentativa de
criminalização dos movimentos sociais, por parte dos governos e das instituições
burguesas, como o Judiciário e o Ministério Público;
· Participar das lutas gerais em defesa dos direitos dos trabalhadores;
· Apoiar campanhas internacionais de solidariedade;
· Apoiar todas as formas de luta como: greves, ocupações de terra, mobilizações pela
reforma agrária, pelo direito à moradia, etc.
· Continuar fortalecendo a unidade, no RS, mas também em nível nacional, com os
setores que chamaram a marcha do dia 24 de abril, em Brasília.
· Organizar, no CPERS/SINDICATO, para além do que já existe, o debate e a
mobilização contra toda forma de opressão das mulheres, negros (as), LGBTs.
· Realizar um encontro internacional de educação para fortalecer a articulação e a
resistência em defesa da educação pública para a classe trabalhadora.
Integrantes da Direção Central do CPERS Sindicato que subscrevem esta tese:

REJANE SILVA DE OLIVEIRA – PRESIDENTE – A CUT PODE MAIS – MLS
(Movimento de Luta Socialista)
NEIDA PORFÍRIO DE OLIVEIRA – 1ª VICE-PRESIDENTE – CSP/CONLUTAS – CS
(Construção Socialista)
RÉGIS BATISTA ETHUR – 2º VICE-PRESIDENTE – CSP/CONLUTAS
MAIRA IARA DE FARIAS ÁVILA – SECRETÁRIA GERAL – CSP/CONLUTAS – CS
TANIA MARA M. FREITAS – TESOUREIRA GERAL – A CUT PODE MAIS – MLS
ANDREA CEZIMBRA ORTIZ – DIRETORA – CSP/CONLUTAS
DANIELA FABIANA PERETTI – DIRETORA – AE SINDICAL
NEI ALVES DE SENA – DIRETOR – A CUT PODE MAIS – MLS
LUIZ VERONEZI – DIRETOR – AE SINDICAL
ENILSON POOL DA SILVA – DIRETOR
MARIVETE MORAIS DE MELO – DIRETORA – CSP/CONLUTAS – CS
NEIVA INÊS LAZZAROTTO – DIRETORA – INTERSINDICAL
PAULO RENATO DAPPER – DIRETOR – A CUT PODE MAIS – MLS
TERESINHA BULLÉ DA SILVA – DIRETORA – CSP/CONLUTAS – C