domingo, 7 de julho de 2013

Cidadania e Vandalismo

Cidadania e Vandalismo
                              Guto Nadal – Secretario de Habitação-Bagé-RS – arquiteto e urbanista -especialista em Gestão Pública Participativa

Ingredientes para fermento na massa:
Lei FIFA com restrições do espaço territorial público + passagem de ônibus mais cara do mundo no comparativo do custo por hora de trabalho + violência policial abusiva em um ato pacífico + manipulação da grande mídia + instrumento de comunicação alternativo e instantâneo de abrangência mundial (WEB) com doses de mentiras e desinformações

                Sou da geração que passou a infância convivendo com a ditadura. Conheci movimentos de massa, no final da década de 70 a partir das greves de bancários, trabalhadores da construção civil, metalúrgicos e estudantes. E que resultaram em importantes avanços para os trabalhadores, estudantes e na construção do primeiro partido do país construído a partir de bases: o Partido dos Trabalhadores. No início da década de 80 (83 e 84) lutamos pelas eleições diretas que resultou na abertura política em 1985, na constituinte de 86-88 e na primeira eleição direta para presidente do nosso país em 1989. Em 1992, foi a vez de lutarmos frente a um mar de corrupção e o avanço do Neoliberalismo. O impeachment foi conquistado, à derrota neoliberal foi mais demorada. Começamos a derrota-lo a partir do Rio Grande do Sul, com a eleição de Olívio Dutra (1999-2002) o primeiro gestor público a implantar o Orçamento Participativo em um estado subnacional no mundo. Convivemos neste período com a era de FHC quando o avanço neoliberal fez com que o patrimônio dos brasileiros fosse vendido por valores irrisórios e ocorreu a precarização dos serviços públicos e a estagnação de nosso país. O salário mínimo chegava a 67 dólares em dezembro/2002 e apenas 95 mil jovens tinham acesso a universidade, a distribuição de renda era apenas um vale, nosso país era a 11ª economia mundial e os juros eram de 44 %, 33 milhões de brasileiros encontravam-se na linha de pobreza absoluta e o IDH ( Índice de Desenvolvimento Humano) era o mesmo dos países do terceiro mundo.

                Foi necessário elegermos (2002), reelegermos (2006) um trabalhador e uma mulher (2010) para presidente do país, para termos os mais diferentes avanços em políticas públicas. O salário mínimo, hoje supera a 300 dólares, 2 milhões de jovens tiveram acesso a universidade e a distribuição de renda beneficiou a mais de 27,9 milhões de brasileiros* que saíram da linha da pobreza absoluta e outros 40,3 milhões que ascenderam à classe C a partir da geração de 18 milhões de novos empregos, a geração de trabalho e renda para trabalhadores e a formalização de milhões de microempreendedores e trabalhadoras domésticas. Já foram construídas e entregues mais de um milhão de moradias. Para combater a corrupção as informações foram publicadas via WEB e foi criado o Conselho de Justiça, hoje nosso país é a 7ª Economia Mundial e os juros foram reduzidos para 8%, temos um IDH semelhante aos países desenvolvidos, para os capacitados vivemos uma situação de pleno emprego e estamos desenvolvendo um plano de capacitação de dimensões inéditas.

Hoje o mundo vive a luta contra a crise econômica,recessão, desemprego e a miséria. Enquanto, em nosso país vivemos um momento de estabilidade, de desenvolvimento econômico com distribuição de renda e inclusão social de milhões de brasileiros e brasileiras, contudo muito ainda falta a ser feito. Nos grandes centros os problemas de mobilidade urbana decorre do excessivo uso individual do automóvel. É necessário maior investimentos em mobilidade urbana de massas e valorização de alternativas de transporte não motorizados, nossa educação necessita de mais qualidade e valorização de nossos educadores, nossa saúde requer mais ações de descentralização com valorização dos trabalhadores da saúde e criação de centros de excelência regionais e maior valorização de médicos clínicos gerais. O combate a corrupção tem que ser constante e vigilante, temos que avançar em gestão pública participativa para que a cidadania tenha controle na aplicação dos recursos públicos.

                Nos últimos dias o Brasil foi chocalhado por manifestações articuladas a partir de redes sociais ( Faceboock, Twitter... ) que colocam nosso país na agenda de mobilização de massas tendo como com instrumento de comunicação a Web ( nova mídia), mobilizações semelhantes como já ocorreram em países como Espanha, Portugal, Grécia, França e Turquia. Porém oportunistas facistas querem disputar e despolitizar o movimento. Inclusive fazendo uso da violência para amedrontar a militância de centro-esquerda que sempre lutaram uma vida inteira pela qualificação dos serviços públicos e pela ética na política.

                Meu repúdio aos atos de vandalismo, banditismo, opressão e violência praticados nas manifestações que queremos que sejam pacíficas e democráticas, e não onde facistas agridem militantes de partidos de centro-esquerda e de esquerda. É importante resgatar que foi a polícia do governador do PSDB-SP que reprimiu violentamente a primeira manifestação de 5000 pessoas deste ciclo e que alimentou o noticiário inclusive provocando uma linha editorial da grande mídia de apoio a violência militar contra manifestações, onde trabalhadores, estudantes e jornalistas foram feridos.

                Somos solidários a juventude e a cidadania brasileiras que mobilizam-se pelo direito a mobilidade de qualidade, ao zelo pelo dinheiro público, por melhores políticas públicas para que nosso país continue a avançar. Mas não queremos ver em nosso país discurso e atos de despolitização usando os jovens e a cidadania para o retrocesso de nosso país. Queremos avançar, as bandeiras presentes de norte a sul, de leste ao oeste por um Brasil melhor são nossas bandeiras. O Brasil acordou? Para nós o Brasil nunca adormeceu, somos militantes no dia a dia, na sociedade, em nossos partidos, no serviço público e nos movimentos populares, lutamos para aprofundar e avançarmos para uma sociedade justa e democrática.

                Sou de esquerda e luto para fortalecer os fóruns e instrumentos da democracia participativa. Além dos movimentos que mencionei também participei de todas as Conferências das Cidades desde 2003. Fórum que também pauta avanços em questões defendidas pelo Movimento Cidadania Web: o transporte público e a mobilidade urbana. O Brasil esta neste momento fazendo o debate em diversas Conferências Setoriais para que os problemas de hoje serviam como solução para os de amanhã. Participar é exercer a cidadania, permitir que sejamos manipulados e oprimidos é defender aqueles que vencemos com a constituinte/88. Nossa Constituição não avançou tudo o que queríamos, por isso que defendemos também a Reforma Política. Defender a Cidadania e a Democracia é um dever de todos nós, coibir a repressão injustificada, o vandalismo e o facismo também. A jovem democracia brasileira merece nossa maturidade e nossa vigilância. Manifestação é um ato político. Parabéns a nova geração que quer dar continuidade ao que construímos até aqui. Vamos em frente, falta muito o que fazer. Vamos semear ? Passaremos por espinhos, apreciaremos as flores e finalmente colheremos os frutos que serão usufruídos pelas gerações atuais e futuras que estão por vir.
Brasil país justo, democrático e sem miséria é nosso sonho, e o seu ? A construção de um Brasil melhor iniciou a partir do Fórum Social Mundial, do qual somos protagonistas ontem, hoje, amanhã e sempre. Vamos a luta nosso país precisa de todos nós!

* OIT- Organização Internacional do Trabalho (2013)

quarta-feira, 3 de julho de 2013

A covardia europeia contra o presidente Evo Morales


Os europeus, os campeões da defesa da democracia, do Estado de Direito e da liberdade, demonstraram que suas relações com a Casa Branca estão acima de tudo e que podem pisotear os direitos de um avião presidencial caso isso seja preciso para que o grande império não se incomode com eles. Um rumor infundado sobre a presença no avião presidencial boliviano do ex-espião estadunidense Edward Snowden, conduziu a um sério incidente diplomático aeronáutico entre Bolívia, França, Portugal e Espanha. Por Eduardo Febbro.


Paris - Os europeus são incorrigíveis. Para não ficar mal com o império norteamericano são capazes de violar todos os princípios que defendem nos fóruns internacionais. O presidente boliviano Evo Morales foi o último a experimentar as consequências dessa política de palavras solidárias e gestos mesquinhos. Um rumor infundado sobre a presença no avião presidencial boliviano do ex-membro da Agência Nacional de Segurança (NSA) norteamericana, o estadunidense Edward Snowden, conduziu a um sério incidente diplomático aeronáutico entre Bolívia, França, Portugal e Espanha. 

Voltando de Moscou, onde havia participado da segunda cúpula de países exportadores de gás, realizada na capital russa, Morales se viu forçado a aterrissar no aeroporto de Viena depois que França, Portugal e Espanha negaram permissão para que seu avião fizesse uma escala técnica ou sobrevoasse seus espaços aéreos. Os “amigos” do governo norteamericano avisaram os europeus que Morales trazia no avião Edward Snowden, o homem que revelou como Washington, por meio de vários sistemas sofisticados e ilegais, espionava as conversações telefônicas e as mensagens de internet da maioria do planeta, inclusive da ONU e da União Europeia.

O certo é que Edward Snowden não estava no avião de Evo Morales. No entanto, ante a negativa dos países citados em autorizar o sobrevoo do avião presidencial, Morales fez uma escala forçada na Áustria. As capitais europeias coordenaram muito bem suas ações conjuntas para cortar a rota de Evo Morales. Surpreende a eficácia e a rapidez com que atuaram, tão diferente das demoradas medidas que tomam quando se trata de perseguir mafiosos, traficantes de ouro, financistas corruptos ou ladrões do sistema financeiro internacional.

Segundo a informação da chancelaria boliviana, o avião havia obtido a permissão da Espanha para fazer uma escala técnica nas Ilhas Canárias. Essa autorização também foi cancelada e, finalmente, o avião teve que aterrissar no aeroporto de Viena. Segundo declarou em La Paz o chanceler boliviano David Choquehuanca, “colocou-se em risco a vida do presidente que estava em pleno voo”. “Quando faltava menos de uma hora para o avião ingressar no território francês nos comunicam que tinha sido cancelada a autorização de sobrevoo”. O ministro pediu uma explicação tanto da França quanto de Portugal, país que tomou a mesma decisão que a França.

“Queremos nos amedrontar. É uma discriminação contra o presidente”, disse Choquehuanca. Em complemento a esta informação, o portal de Wikileaks também acusou a Itália de não permitir a aterrisagem do avião presidencial boliviano. Em Paris, o conselheiro permanente dos serviços do primeiro-ministro Jean-Marc Ayrault disse que não tinha nenhuma informação sobre esse assunto. Por sua vez, a chancelaria francesa disse que não estava em condições de comentar ocaso. Bocas fechadas, mas atos concretos.

Ao que parece, todo esse enredo se armou em torno da presença de Snowden no aeroporto de Moscou. Alguém fez circular a informação de que Snowden estava no aeroporto da capital russa com a intenção de subir no avião de um dos países latino-americanos dispostos a lhe oferecer asilo político. Snowden é procurado por Washington depois de revelar a maneira pela qual o império filtrava as conversações no mundo. O chanceler boliviano qualificou como uma “injustiça” baseada em “suspeitas infundadas sobre o manejo de informação mal intencionada” o cancelamento das permissões de voo para o avião de Evo Morales. “Não sabemos quem inventou essa soberana mentira; querem prejudicar nosso país”, disse Choquehuanca. “Não podemos mentir à comunidade internacional e não podemos levar passageiros fantasmas”, advertiu o responsável pela diplomacia boliviana.

Em La Paz, as autoridades adiantaram que não receberam nenhum pedido de asilo por parte de Edward Snowden. Evo Morales havia evocado a possibilidade de conceder asilo a Snowden, mas só isso. O mesmo ocorreu com outra vítima da informação e da perseguição norteamericana, o fundador do Wikileaks, Julian Assange. O mundo ficou pequeno para Edward Snowden. 

Assange está refugiado na embaixada do Equador em Londres e Snowden encontra-se há dez dias na zona de trânsito do aeroporto de Sheremétievo, em Moscou. Segundo Dmitri Peskov, o secretário de imprensa do presidente Vladimir Putin, o norteamericano havia solicitado asilo a Rússia, mas depois “renunciou a suas intenções e a sua solicitação”. Peskov esclareceu, porém, que o governo russo não entregaria o fugitivo para a administração norte-americana: “o próprio Snowden por sincera convicção ou qualquer outra causa se considera um defensor dos direitos humanos, um lutador pelos ideais da democracia e da liberdade pessoal. Isso é reconhecido pelos ativistas e organizações de direitos humanos da Rússia e também por seus colegas de outros países. Por isso é impossível a entrega de Snowden por parte de quem quer que seja a um país como os EUA, onde se aplica a pena de morte.

Quando se referiu ao caso de Snowden em Moscou, Evo Morales assinalou que “o império estadunidense conspira contra nós de forma permanente e quando alguém desmascara os espiões, devemos nos organizar e nos preparar melhor para rechaçar qualquer agressão política, militar ou cultural”. Os europeus, os campeões da defesa da democracia, do Estado de Direito e da liberdade, demonstraram que suas relações com a Casa Branca estão acima de tudo e que podem pisotear os direitos de um avião presidencial caso isso seja preciso para que o grande império não se incomode com eles.

Tradução: Marco Aurélio Weissheimer

terça-feira, 2 de julho de 2013

CAFEZINHO X GLOBO: "NÃO É SÓ O DARF!

segunda-feira, 1 de julho de 2013

Noam Chomsky: os EUA estão a acelerar a destruição do mundo


No seu ensaio mais recente, Noam Chomsky afirma: “pela primeira vez na história da espécie humana, temos claramente desenvolvida a capacidade para nos destruir a nós próprios”. Refere-se não apenas à ameaça do holocausto nuclear, presente desde 1945, mas também “a processos de longo prazo como a destruição ambiental que conduzem na mesma direcção”. E sublinha que a nação mais poderosa do mundo continua a agir como se desejasse efectivamente essa destruição.


Desde a Crise dos Mísseis de Cuba até ao frenesim dos combustíveis fósseis, os EUA têm a intenção de ganhar a corrida para o desastre. Essa é a opinião do filósofo, linguista e activista estado-unidense Noam Chomsky.
“Pela primeira vez na história da espécie humana, temos claramente desenvolvida a capacidade para nos destruir a nós próprios. Isto tem sido assim desde 1945. Agora, finalmente, reconhece-se que há processos de longo prazo como a destruição ambiental que conduzem na mesma direcção”, assegura Chomsky no seu ensaio mais recente, publicado em Tomdispatch.com.
Segundo o linguista, as sociedades menos desenvolvidas estão a tratar de mitigar ou de superar estas ameaças. “Não estão a falar de guerra nuclear ou de desastre ambiental, estão realmente a tratar de fazer alguma coisa a esse respeito”, diz.
O filósofo destaca as políticas de países como Bolívia, que tem “uma maioria indígena e requisitos constitucionais que protegem os direitos da natureza”, e Equador, que também tem uma grande população indígena “e é o único exportador de petróleo que conheço onde o Governo procura ajudar a que esse petróleo permaneça no solo em lugar de o produzir e o exportar, e é no solo que ele deve permanecer”.

Segundo Chomsky, no outro extremo, as sociedades “mais ricas e poderosas da história do mundo, como Estados Unidos e Canadá, correm a toda a velocidade para destruir o meio ambiente o mais rapidamente possível. Ao contrário de Equador e das sociedades indígenas em todo o mundo, querem extrair até à última gota de hidrocarboneto da terra à maior velocidade possível”.
O outro assunto que Chomsky analisa é a guerra nuclear. “Acaba de passar o 50º aniversário da Crise dos Mísseis, que foi considerado o momento mais perigoso da história pelo historiador Arthur Schlesinger, assessor do presidente John F. Kennedy. Entretanto, o pior destes nefastos acontecimentos é que a lição não tenha sido aprendida ” afirmou.
“Neste momento el tema nuclear surge frequentemente nas primeiras páginas dos jornais, como sucede com a Coreia do Norte e o Irão”, aponta o activista.
Os recentes exercícios militares da Coreia do Sul e dos EUA na península coreana, que suscitaram ameaças de Pyongyang de realizar um ataque nuclear, ter-se-ão certamente apresentado como ameaçadores do ponto de vista do Norte. “Também nós os veríamos como ameaçadores se tivessem ocorrido no Canadá e nos tomassem como alvo”, acrescentou.
“Isto desperta, sem dúvida, alarmes do passado. Eles recordam esse passado, e portanto reagem de forma muito agressiva e extrema. O problema não é que não existam alternativas, é que essas alternativas não sejam concretizadas. Isso é perigoso. E assim, se nos interrogamos acerca de como é que o mundo vai a parecer, a imagem que surge não é bonita imagem. A menos que as pessoas façam alguma coisa a esse respeito”, conclui Chomsky.

* Serviço da Novosti
Texto completo em http://actualidad.rt.com/actualidad/view/96580-chomsky-eeuu-destruccion-mundo

sábado, 29 de junho de 2013

Paco De Lucia - Live At 31st Leverkusener Jazztage 2010

João Pedro Stedile: O significado e as perspectivas das mobilizações de rua


João Pedro Stedile: O significado e as perspectivas das mobilizações de rua

Nesta entrevista concedida ao jornal Brasil de Fato, João Pedro Stedile, um dos líderes do MST, analisa a onda de manifestações pelo país e diz que "estamos em plena batalha ideológica". "Os jovens e as massas estão em disputa. Por isso, as forças populares e os partidos de esquerda precisam colocar todas suas energias para ir para a rua", afirmou.

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1. Como você analisa as recentes manifestações que vem sacudindo o Brasil nas ultimas semanas? Qual é base econômica para elas terem acontecido?
Há muitas avaliações de porque estão ocorrendo estas manifestações. Me somo à analise da professora Erminia Maricato, que é nossa maior especialista em temas urbanos e já atuou no Ministério das cidades na gestão Olivio Dutra. Ela defende a tese de que há uma crise urbana instalada nas cidades brasileiras provocadas por essa etapa do capitalismo financeiro. Houve uma enorme especulação imobiliária que elevou os preços dos alugueis e do terrenos em 150% nos últimos três anos. O capital financiou sem nenhum controle governamental, a venda de automóveis, para enviar dinheiro pro exterior e transformou nosso transito um caos. E nos últimos dez anos não houve investimento em transporte publico. O programa habitacional minha casa, minha vida, empurrou os pobres para as periferias, sem condições de infra-estrutura. Tudo isso gerou uma crise estrutural em que as pessoas estão vivendo num inferno, nas grandes cidades, perdendo, três quatro horas por dia no transito, quando poderiam estar com a família, estudando ou tendo atividades culturais. Somado a isso, a péssima qualidade dos serviços públicos em especial na saúde e mesmo na educação, desde a escola fundamental, ensino médio, em que os estudantes saem sem saber fazer uma redação. E o ensino superior virou lojas de vendas de diplomas a prestações, aonde estão 70% dos estudantes universitários.

2. E do ponto de vista político, por que aconteceu?
Os quinze anos de neoliberalismo e mais os últimos dez anos de um governo de composição de classes transformou a forma de fazer política em refém apenas dos interesses do capital. Os partidos ficaram velhos em suas praticas e se transformaram em meras siglas que aglutinam, em sua maioria, oportunistas para ascender a cargos públicos ou disputar recursos públicos para seus interesses. Toda juventude nascida depois das diretas já, não teve oportunidade de participar em política. Hoje, para disputar qualquer cargo, por exemplo, de vereador o sujeito precisa ter mais de um milhão de reais, deputado custa ao redor de dez milhões. Os capitalistas pagam e depois os políticos obedecem. A juventude está de saco cheio dessa forma de fazer política burguesa, mercantil. Mas o mais grave foi que os partidos da esquerda institucional, todos eles, se moldaram a esses métodos. Envelheceram e se burocratizaram. E por tanto gerou na juventude uma ojeriza a forma dos partidos atuarem. E eles tem razão. A juventude não é apolítica, ao contrario, tanto é que levou a política para as ruas, mesmo sem ter consciência do seu significado. Mas está dizendo que não agüenta mais assistir na televisão essas práticas políticas, que seqüestraram o voto das pessoas, baseadas na mentira e na manipulação. E os partidos de esquerda precisam reapreender que seu papel é organizar a luta social e politizar a classe trabalhadora. Senão cairão na vala comum...da historia.

3. E porque as manifestações eclodiram somente agora?
Provavelmente tenha sido a soma de diversos fatores de caráter da psicologia de massas, do que de alguma decisão política planejada. Somou-se todo o clima que comentei, mais as denuncias de superfaturamento das obras dos estádios, que é um acinte ao povo. Vejam alguns episódios. A rede globo recebeu do governo do estado do Rio e da prefeitura, 20 milhões de reais de dinheiro publico, para organizar o showzinho de apenas duas horas, do sorteio dos jogos da copa das confederações. O estádio de Brasília custou 1,4 bilhões e não tem ônibus na cidade! A ditadura explícita e as maracutais que a FIFA/CBF impuseram e os governos se submeteram. A reinauguração do Maracanã foi um tapa no povo brasileiro. As fotos eram claras, no maior templo do futebol mundial não havia nenhum negro ou mestiço! E aí o aumento das tarifas de ônibus, foi apenas a faísca para ascender o sentimento generalizado de revolta, de indignação. A gasolina para a faísca, veio do governo Alkmin, que protegido pela mídia que ele financia, e acostumado a bater no povo impunemente, como fez no Pinheirinho, e em outros despejos rurais e urbanos, jogou sua polícia para a barbárie. Ai todo mundo reagiu. 
Ainda bem que a juventude acordou. E nisso houve o mérito do Movimento passe Livre, que soube capitalizar essa insatisfação popular e organizou os protestos na hora certa.

4. Por que a classe trabalhadora ainda não foi à rua?
É verdade a classe trabalhadora ainda não foi para a rua. Quem está na rua são os filhos da classe média, da classe media baixa, e também alguns jovens do que o Andre Singer chamaria de sub-proletariado, que estudam e trabalham no setor de serviços, que melhoraram as condições de consumo, mas querem ser ouvidos. Esses últimos apareceram mais em outras capitais e nas periferias.
A redução da tarifa interessava muito a todo povo e esse foi o acerto do Movimento passe livre, soube convocar mobilizações em nome dos interesses do povo. E o povo apoiou as manifestações e isso está expresso nos índices de popularidade dos jovens, sobretudo quando foram reprimidos. 
A classe trabalhadora demora a se mover, mas quando se move, afeta diretamente ao capital. Coisa que ainda não começou acontecer. Acho que as organizações que fazem a mediação com a classe trabalhadora ainda não compreenderam o momento e estão um pouco tímidas. Mas a classe, como classe acho que esta disposta a também lutar. Veja, que o numero de greves por melhorias salariais, já recuperou os padrões da década de 80. Acho que é apenas uma questão de tempo, e se as mediações acertarem nas bandeiras que possam motivar a classe a se mexer. Nos últimos dias, já se percebe que em algumas cidades menores e nas periferias das grandes cidades já começam a ter manifestações com bandeiras de reivindicações bem localizadas. E isso é muito importante.

5. E vocês do MST e dos camponeses também não se mexeram ainda...
É verdade. Nas capitais onde temos assentamentos e agricultores familiares mais próximos já estamos participando. E inclusive sou testemunho que fomos muito bem recebidos com nossa bandeira vermelha e com nossa reivindicação de Reforma agrária e alimentos saudáveis e baratos para todo povo. Acho que nas próximas semanas poderá haver uma adesão maior, inclusive realizando manifestações dos camponeses nas rodovias e municípios do interior. Na nossa militância está todo mundo doido para entrar na briga e se mobilizar. Espero que também se mexam logo.... 

6. Qual é na sua opinião a origem da violência que tem acontecido em algumas manifestações?
Primeiro vamos relativizar. A burguesia através de suas televisões tem usado a tática de assustar o povo colocando apenas a propaganda dos baderneiros e quebra-quebra. São minoritários e insignificantes diante das milhares de pessoas que se mobilizaram. Para a direita interessa colocar no imaginário da população que isso é apenas bagunça, e no final se tiver caos, colocar a culpa no governo e exigir a presença das forças armadas. Espero que o governo não cometa essa besteira de chamar a guarda nacional e as forças armadas para reprimir as manifestações. É tudo o que a direita sonha!
Quem está provocando as cenas de violência é a forma de intervenção da Policia Militar. A PM foi preparada desde a ditadura militar para tratar o povo sempre como inimigo. E nos estados governados pelos tucanos(SP, RJ e MG), ainda tem a promessa de impunidade. 
Há grupos direitistas organizados com orientação de fazer provocações e saques. Em são Paulo atuaram grupos fascistas. E leões de chácaras contratados. No Rio de Janeiro atuaram as milícias organizadas que protegem seus políticos conservadores. E claro, há também um substrato de lumpesinato que aparece em qualquer mobilização popular, seja nos estádios, carnaval, até em festa de igreja, tentando tirar seus proveitos.

7.Há então uma luta de classes nas ruas ou é apenas a juventude manifestando sua indignação?
É claro que há uma luta de classes na rua. Embora ainda concentrada na disputa ideológica. E o que é mais grave, a própria juventude mobilizada, por sua origem de classe, não tem consciência de que está participando da de uma luta ideológica. Vejam, eles estão fazendo política da melhor forma possível, nas ruas. E ai escrevem nos cartazes: somos contra os partidos e a política? E por isso tem sido tão difusa as mensagens nos cartazes. Está ocorrendo em cada cidade, em cada manifestação, uma disputa ideológica permanente da luta dos interesses de classes. Os jovens estão sendo disputados pelas idéias da direita e pela esquerda. Pelos capitalistas e pela classe trabalhadora.
Por outro lado, são evidentes os sinais da direita muito bem articulada,e de seus serviços de inteligência, que usam a internet, se escondem atrás das mascaras e procuram criar ondas de boatos e opiniões pela internet. De repente uma mensagem estranha alcança milhares de mensagens. E ai se passa a difundir o resultado como se ela fosse a expressão da maioria. Esses mecanismos de manipulação foram usados pela CIA e o departamento de estado Estadunidense, na primavera árabe, na tentativa de desestabilização da Venezuela, na guerra da Síria. E é claro que eles estão operando aqui também para alcançar os seus objetivos.

8. E quais são os objetivos da direita e suas propostas?
A classe dominante, os capitalistas, os interesses do império Estadunidense e seus porta-vozes ideológicos que aparecem na televisão todos os dias, tem um grande objetivo: Desgastar ao máximo o governo Dilma, enfraquecer as formas organizativas da classe trabalhadora, derrotar qualquer propostas de mudanças estruturais na sociedade brasileira e ganhar as eleições de 2014, para recompor uma hegemonia total no comando do estado brasileiro, que agora está em disputa.
Para alcançar esses objetivos eles estão ainda tateando, alternando suas táticas. Às vezes provocam a violência, para desfocar os objetivos dos jovens. Às vezes colocam nos cartazes dos jovens a sua mensagem. Por exemplo, a manifestação do sábado, embora pequena, em são Paulo, foi totalmente manipulada por setores direitistas que pautaram apenas a luta contra a PEC 37, com cartazes estranhamente iguais e palavras de ordem iguais. Certamente a maioria dos jovens nem sabem do que se trata. E é um tema secundário para o povo, mas a direita está tentando levantar as bandeiras da moralidade, como fez a UDN em tempos passados. Isso que já estão fazendo no congresso, logo logo, vão levar às ruas.
Tenho visto nas redes sociais controladas pela direita, que suas bandeiras, alem da PEC 37, são: Saída do Renan do senado; CPI e transparência dos gastos da COPA; Declarar a corrupção crime hediondo e fim do foro especial para os políticos. Já os grupos mais fascistas ensaiam FORA DILMA e abaixo-assinados pelo impechment. Felizmente essas bandeiras não tem nada ver com as condições de vida das massas, ainda que elas possam ser manipuladas pela mídia. E objetivamente podem ser um tiro no pé. Afinal, é a burguesia brasileira, seus empresários e políticos que são os maiores corruptos e corruptores. Quem se apropriou dos gastos exagerados da copa? A rede globo e as empreiteiras!

9.Quais os desafios que estão colocados para a classe trabalhadora e as organizações populares e partidos de esquerda?
Os desafios são muitos. Primeiro devemos ter consciência da natureza dessas manifestações, e irmos todos para a rua, disputar corações e mentes para politizar essa juventude que não tem experiência da luta de classes. Segundo, a classe trabalhadora precisa se mover. Ir para a rua, manifestar-se nas fábricas, campos e construções, como diria Geraldo Vandré. Levantar suas demandas para resolver os problemas concretos da classe, do ponto de vista econômico e político. Terceiro, precisamos explicar para o povo quem são os principais inimigos do povo. E agora são os bancos, as empresas transnacionais que tomaram conta de nossa economia, os latifundiários do agronegócio, e os especuladores.
Precisamos tomar a iniciativa de pautar o debate na sociedade e exigir a aprovação do projeto de redução da jornada de trabalho para 40 horas; exigir que a prioridade de investimentos públicos seja em saúde, educação, reforma agrária. Mas para isso o governo precisa cortar juros e deslocar os recursos do superávit primário, aqueles 200 bilhões que todo ano vão para apenas 20 mil ricos, rentistas, credores de uma divida interna que nunca fizemos, deslocar para investimentos produtivos e sociais. E é isso que a luta de classes coloca para o governo Dilma: os recursos públicos irão para a burguesia rentista ou para resolver os problemas do povo?
Aprovar em regime de urgência para que vigore nas próximas eleições uma reforma política de fôlego, que no mínimo institua o financiamento publico exclusivo da campanha. Direito a revogação de mandatos e plebiscitos populares auto-convocados. 
Precisamos de uma reforma tributaria que volte a cobrar ICms das exportações primárias e penalize a riqueza dos ricos, e amenize os impostos dos pobres, que são os que mais pagam.
Precisamos que o governo suspenda os leilões do petróleo e todas as concessões privatizantes de minérios e outras áreas publicas. De nada adianta aplicar todo royalties do petróleo em educação, se os royalties representarão apenas 8% da renda petroleira, e os 92% irão para as empresas transnacionais que vão ficar com o petróleo nos leilões!
Uma reforma urbana estrutural, que volte a priorizar o transporte publico, de qualidade e com tarifa zero. Já está provado que não é caro, e nem difícil instituir transporte gratuito para as massas das capitais. E controlar a especulação imobiliária. 
E finalmente, precisamos aproveitar e aprovar o projeto da conferencia nacional de comunicação, amplamente representativa, de democratização dos meios de comunicação. Para acabar com o monopólio da Globo, e para que o povo e suas organizações populares tenham ampla acesso a se comunicar, criar seus próprios meios de comunicação, com recursos públicos. Ouvi de diversos movimentos da juventude que estão articulando as marchas, que talvez essa seja a única bandeira que unifica a todos: Abaixo o monopólio da Globo! 
Mas para que essas bandeiras tenham ressonância na sociedade e pressionem o governo e os políticos, somente acontecerá se a classe trabalhadora se mover.

1O. O que o governo deveria fazer agora?
Espero que o governo tenha a sensibilidade e a inteligência de aproveitar esse apoio, esse clamor que vem das ruas, que é apenas uma síntese de uma consciência difusa na sociedade, que é hora de mudar. E mudar a favor do povo. E para isso o governo precisa enfrentar a classe dominante, em todos os aspectos. Enfrentar a burguesia rentista, deslocando os pagamentos de juros para investimentos em áreas que resolvam os problemas do povo. Promover logo as reformas políticas, tributárias. Encaminhar a aprovação do projeto de democratização dos meios de comunicação. Criar mecanismos para investimento pesados em transporte público, que encaminhem para a tarifa zero. Acelerar a reforma agrária e um plano de produção de alimentos saídos para o mercado interno.
Garantir logo a aplicação de 10% do PIB em recursos públicos para a educação em todos os níveis, desde as cirandas infantis nas grandes cidades, ensino fundamental de qualidade até a universalização do acesso dos jovens a universidade publica.
Sem isso, haverá uma decepção, e o governo entregará para a direita a iniciativa das bandeiras , que levarão a novas manifestações, visando desgastar o governo ate as eleições de 2014. É hora do governo aliar-se ao povo, ou pagar a fatura no futuro. 

11. E que perspectivas essas mobilizações podem levar para o país nos próximos meses?
Tudo ainda é uma incógnita. Porque os jovens e as massas estão em disputa. Por isso que as forças populares e os partidos de esquerda precisam colocar todas suas energias para ir para a rua. Manifestar-se, colocar as bandeiras de luta de reformas que interessam ao povo. Porque a direita vai fazer a mesma coisa e colocar as suas bandeiras, conservadoras, atrasadas, de criminalização e estigmatização das idéias de mudanças sociais. Estamos em plena batalha ideológica, que ninguém sabe ainda qual será o resultado. Em cada cidade, cada manifestação, precisamos disputar corações e mentes. E quem ficar de fora, ficara de fora da historia.

Equador renuncia a privilégios dos EUA e lhe oferece ajuda para formação em Direitos Humanos




AFP

Tradução:ADITAL

Em resposta às ameaças dos Estados Unidos de bloquear a renovação de preferências tarifárias ao Equador caso outorgue asilo político a Edward Snowden, o governo equatoriano anunciou que renuncia de forma "unilateral e irrevogável” a esses privilégios.
O Secretário de Comunicação do Equador, Fernando Alvarado, explicou em uma conferência de imprensa que a decisão do governo foi tomada "ante a ameaça, insolência e prepotência de certos setores políticos, grupos midiáticos e poderes fáticos estadunidenses que têm pressionado para retirar as preferências tarifárias –ATPDEA, sigla em inglês- a nosso país”.
"O Equador não aceita pressões nem ameaças de ninguém e não negocia com os princípios, nem os submete a interesses mercantilistas por mais importantes que sejam”, declarou Alvarado.
O Equador oferece ajuda econômica aos Estados Unidos
O Secretário de Comunicação não se limitou a essas declarações e anunciou que o "Equador oferece aos Estados Unidos uma ajuda econômica de 23 milhões de dólares anuais, montante similar ao que recebíamos pelas preferências tarifárias, com a finalidade de oferecerem capacitação em matéria de direitos humanos que contribua para evitar atentados à intimidade das pessoas, torturas, execuções extrajudiciais e demais atos que denigrem a humanidade”.
"Expressamos o carinho, o apreço e o respeito ao povo estadunidense com o qual sempre mantemos excelentes relações e nos solidarizamos com ele devido à espionagem massiva da qual também tem sido objeto”, concluiu Alvarado.
Desse modo, o secretário equatoriano de Comunicação responde às ameaças de certos legisladores estadunidenses sobre a possível retirada dessas preferências tarifárias e sobre outras represálias de caráter econômico e comercial caso Quito ofereça asilo a Snowden.
O senador democrata estadunidense Robert Menéndez advertiu na quarta-feira passada (26/06) que a concessão de asilo ao ex-empregado da CIA poderia colocar "gravemente em jogo” a renovação da Lei de Promoção Comercial Andina e Erradicação da Droga (ATPDEA) e também do Sistema Generalizado de Preferências (GSP), que caducam no dia 31 de julho.
Assegurou também que o governo dos Estados Unidos "não vai recompensar países por seu mal comportamento” e chamou o presidente equatoriano Rafael Correa a que "faça o correto para os EUA e para Equador e rejeite a solicitação de asilo de Snowden”.
Anteriormente, outro legislador estadunidense, o congressista democrata Sander Levin, também ameaçou o Equador com a revogação da renovação da ATPDEA.

O cavalo selado e as esquerdas


Por Ricardo Gebrim, no jornal Brasil de Fato: via Blog do miro

O revolucionário salvadorenho Jorge Schafik Handal (1930-2006), entre tantas contribuições teóricas deixou um texto que é uma verdadeira aula para os que pensam a política como arte da transformação social. Ao analisar um episódio ocorrido às vésperas do golpe militar de 1973, ele mostra como as maiores forças de esquerda perderam uma oportunidade histórica que poderia ter alterado o desfecho que já se anunciava.


Em 29 de junho de 1973, enquanto o Alto Comando das Forças Armadas Chilenas já conspirava com a CIA a preparação do golpe militar, um pequeno grupo de oficiais fascistas, “fora do controle”, se precipita e lança uma sublevação antes da hora. Este episódio ganhou o nome de Tancazo, por utilizarem tanques. Foram rapidamente derrotados pelas tropas leais comandadas pelo General Prats e pela população, criando um clima de autoestima popular que se converteu no auge da luta popular daquele processo histórico.

Sufocada aquela sublevação, o General Prats alerta para o verdadeiro golpe em andamento e exige o afastamento do Alto Comando conspirador. O texto de Schafik mostra como nenhuma das forças de esquerda conseguiu interpretar a importância do episódio, embora as forças da reação tenham rápido entendido com precisão aquele momento.

Ele explica:

“Como atuaram as forças revolucionárias frente a esse fenômeno? Ninguém definitivamente defendeu o Prats e a parte do exército que ele encabeçava. Uns o sacrificaram em interesse de manobras políticas acreditando honradamente que estas trariam a saída da crise; e, os outros, consideraram que a presença de Prats no governo era “a presença da burguesia”, que o pacto com Prats era “a traição à revolução” e decidiram constituir-se na “oposição operária camponesa”. Quando a corrente de Prats era forte e predominante, quando derrotou o “Tancazo” (junho/1973), as massas intuíram a importância daquele momento para resolver revolucionariamente o problema do poder; se lançaram à rua, como todos sabemos, exigindo golpear profundamente a reação, fechar o parlamento, depurar o exército, mas a direção daquele processo não tomou resolutamente em suas mãos estas bandeiras. Não estou defendendo a idéia de que tudo se resolveria no Chile organizando a luta em torno de Prat; creio sim, que o aparecimento da corrente encabeçada por ele e a onda de massas que seguiu à sua vitória sobre Tancazo foi o mais próximo que houve durante o governo da Unidade Popular para a solução do problema do poder para a revolução. Essa possibilidade apareceu objetivamente e se constituiu assim numa prova para medir a clareza das forças revolucionárias para a tese do marxismo-leninismo de que “o problema do poder é o problema fundamental de toda revolução”.

Guardadas as imensas proporções, uma vez que não estamos vivenciando nenhum processo de natureza revolucionária, é inevitável recordar este texto quando olhamos para os fatos que aceleradamente ocorrem nestes dias.

Qual é o principal desafio político para esquerda na tática da luta eleitoral atualmente?

As conquistas eleitorais que asseguraram a vitória do PT nas eleições presidenciais de 2002, 2006 e 2010 e possibilitaram a conquista de governos estaduais, senadores, deputados e prefeituras também para o PCdoB, PSOL e setores de esquerda em outras agremiações, esbarram, para além da correlação de forças em limites concretos do Estado brasileiro.

Os três principais limites estruturais, que aparecem nas análises de várias organizações de esquerda podem ser resumidos nos seguintes:

1) Um Sistema Político que favorece o poder econômico. Das muitas leituras que podem ser feitas sobre o chamado “mensalão”, uma é evidente. O tratamento escandalosamente diferenciado dado ao “mensalão mineiro do PSDB” e ao caso do PT contém um recado claro, se a esquerda utilizar o expediente do “caixa 2” será duramente criminalizada. O Sistema Político favorece, mesmo nas legendas de esquerda, aqueles que através de um comportamento dócil conseguem obter os recursos financeiros para custear as campanhas cada vez mais milionárias. Um processo que converte qualquer governo progressista no refém de interesses fisiológicos que asseguram a governabilidade.

2) A Concentração dos Meios de Comunicação. Generalizou-se a correta compreensão de que os grandes meios de comunicação atuam como o “partido político” dos grupos dominantes.

3) O Poder Judiciário. Completamente impermeável à participação popular, exerce a linha de frente na contenção das lutas populares, criminalizando, construindo uma jurisprudência restritiva ao direito de greve, contendo lutas e conquistas populares.

Pois bem, quando as massas ganharam as ruas, num processo que foi deflagrado a partir de uma bandeira clara, precisa e progressista – a redução das tarifas de transporte –, assistimos uma intensa disputa política e ideológica, patrocinada pela grande mídia e todas as forças conservadoras pelos rumos do movimento.

Neste momento, tenso, com mobilizações crescentes, com a direita apostando todas as suas fichas em desgastar o governo federal, a resposta da presidenta Dilma é extremamente audaciosa. Anuncia um plebiscito para tratar da Reforma Política e sinaliza a convocação de uma Assembleia Constituinte Específica sobre o sistema político!

Para além das análises diferenciadas que as forças de esquerda possam fazer da natureza e papel deste governo, é forçoso reconhecer a audácia desta proposta.

Embora os setores médios que estiveram massificando os protestos sejam especialmente sujeitos à propaganda conservadora da grande mídia, era evidente seu rechaço ao atual sistema político. Qualquer observador identifica que as mobilizações expressaram um forte sentimento de rejeição ao atual sistema político. Generaliza-se a percepção de que há uma "blindagem" da política aos verdadeiros interesses do povo brasileiro. Os partidos políticos e os próprios políticos são vistos como parte de uma mesma engrenagem subordinada aos interesses das elites e a democracia representativa se apresenta aos olhos da juventude, como um mecanismo que impede a democracia efetiva. Mesmo as bandeiras de partidos de esquerda passam a ser vistas como símbolos da burocracia, independentemente de seu histórico de lutas, elemento que possibilitou a pequenos grupos de extrema direita atacá-las com a complacência da maioria dos manifestantes.

É neste contexto, neste estado de ânimo popular, que a presidenta, audaciosamente, lança uma proposta política a um movimento de reivindicações econômicas!

A direita não vacilou um só segundo. Imediatamente compreendeu o que estava em jogo e abriu todas as suas baterias.

O furibundo ministro Gilmar Mendes deu a linha. “O Brasil dormiu como se fosse Alemanha, Itália, Espanha, Portugal em termos de estabilidade institucional e amanheceu parecido com a Bolívia ou a Venezuela”, proclamou rapidamente.

Imediatamente os articulistas da Rede Globo, Revista Veja etc, proclamaram: “Isso é Chavismo”. O vice-presidente imediatamente reuniu-se com Dilma para sinalizar os riscos de romper a aliança com o PMDB. Toda a oposição de direita passou o dia esbravejando no Congresso. Inúmeros juristas constitucionalistas, tal qual múmias levantando das tumbas, foram imediatamente entrevistados para mostrar a “impossibilidade técnica” desta proposta.

Dois ministros petistas, cujo partido havia aprovado essa proposta meses antes em seu Diretório Nacional, saíram operando o recuo da presidenta. O conservadorismo não titubeou. Compreendeu os riscos, entendeu o que está em jogo.

E as forças de Esquerda?

Atônitas ainda com o impacto e expressão das manifestações, a letargia parece ser a marca predominante na maioria das forças de esquerda.

Uma parte parece contentar-se com o “fato consumado”. Não dá mesmo, a própria presidenta já recuou...

Outros, preocupados com a governabilidade, defendem o recuo e já aceitam até mesmo a trocar o plebiscito por um mero referendo.

Já os setores que se autoproclamam “oposição de esquerda” enxergam no episódio uma manobra governista para esvaziar as mobilizações pela pauta econômica. É significativo o posicionamento do PSTU:

“A Reforma Política que o governo Dilma propõe é uma tentativa clara de desviar as verdadeiras reivindicações colocada pelas mobilizações que sacodem o país. Nas ruas, a pauta é contra as injustiças sociais, por menos dinheiro para Copa e mais para saúde, educação e transporte, investimento público no serviço público, contra as privatizações e combate à corrupção. Essa tentativa de reforma é uma resposta conservadora que pode tornar a política brasileira ainda mais antidemocrática, como o voto distrital e a cláusula de barreira que afeta diretamente os partidos ideológicos, preservando as grandes legendas de aluguel, como o PMDB de Sarney e Renan Calheiros. O Plebiscito é uma cortina de fumaça. A verdadeira mudança será nas ruas.”

Evidente que “a verdadeira mudança será nas ruas”. Mas, o que proporemos aos que lutam nas ruas? Ficaremos apenas nas lutas econômicas, que são legítimas e devem ser assumidas, quando uma proposta de luta política se coloca?

Este é o debate que está em curso.

Vamos ignorar a possibilidade histórica de abrir uma possibilidade de luta contra o atual sistema político?

Deixaremos que as forças de direita ganhem esse embate e determinem o recuo do governo, enquanto seguiremos apenas nas lutas econômicas?

Não há como não se lembrar do texto de Schafik Handal....

Ainda estamos em tempo. O cavalo selado ainda está passando. Ainda é possível interferir nesta luta!

A bandeira de uma Constituinte Exclusiva do Sistema Político, a ser submetida a um Plebiscito Nacional, foi lançada. Podemos ignorá-la, rejeitá-la, ou assumi-la. O reascenso da luta de massas apenas está começando, muita àgua ainda vai rolar, mas a luta política tem ritmos e momentos de alta velocidade. Saber agir neste momento é essencial.

Não nos esqueçamos, um só instante, que a questão central em toda a transformação é a questão do poder.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

À Veja, Bernardo critica o PT, sepulta democratização das comunicações e diz que militância ‘fala besteira’



Reproduzido do Boca Maldita

Jogando em “campo inimigo”, o ministro Paulo Bernardo, das Comunicações, concedeu uma entrevista às páginas amarelas de Veja que tem potencial para acelerar seu divórcio com diversas forças do partido; chamado de “bom petista”, ele defendeu a condenação dos réus na Ação Penal 470, criticou a Lei de Meios, como tentativa de censura à imprensa e ainda garantiu que Lula não voltará em 2014; “A militância extrapola, e eu posso dizer que está errada, que está falando besteira”, disse Bernardo
do 247 – De covardia e medo do confronto, Paulo Bernardo, ministro das Comunicações, não poderá ser acusado. Neste fim de semana, ele é o entrevistado das páginas amarelas de Veja e sua fala tem tudo para aprofundar um cisma no partido em relação à sua posição no governo federal.
Classificado por Veja como um “daqueles raros e bons petistas que abandonaram o radicalismo no discurso e na prática”, Bernardo assume frontalmente sua oposição à uma Lei de Meios, que é uma das bandeiras do PT para democratizar a comunicação. “A militância extrapola, e eu posso dizer que está errada, que está falando besteira. Se ela não gosta da capa da revista, da manchete de jornal, quer que eu faça a regulação. Não vai ter regulação para isso”, avisa.
Sobre as eleições de 2014
Eduardo Campos é um aliado nosso que visivelmente quer ser candidato. A democracia pressupõe disputa. Não podemos achar que a Dilma deve ser a única candidata. Embora as pesquisas mostrem que ela tem todas as condições de ganhar, não vai ser uma eleição fácil (…) Se entrar mesmo na disputa, Eduardo Campos vai ser um candidato qualificado. O Aécio vai ser um candidato qualificado, com uma estrutura partidária maior. E tem a Marina, que é uma incógnita porque ainda não se sabe se conseguirá se viabilizar com tempo de televisão.
Volta de Lula
Ele está em ponto de bala. Se fosse candidato, seria um candidato fantástico, mas eu sei que ele não quer ser. Acho até que não teria justificativa. Nós temos uma presidente da República e vamos substituí-la a troco de quê? (…) Lula vai ser fundamental na campanha da Dilma.
A vaia no Mané Garrincha
Vaia em jogo de futebol não conta. Nós não temos de nos impressionar com isso. Houve uma diminuição na aprovação da presidenta e na aprovação do governo, mas eu não me preocupo.
Sobre os protestos
Nós temos de observar e entender esses protestos. Não dá para procurar chifre em cabeça de cavalo. No começo, eram manifestações contra o transporte público, que, convenhamos, é ruim mesmo.
Sobre a Ação Penal 470
Isso já foi julgado, já aconteceu e nós estamos tocando a vida. O governo tem trabalhado normalmente. Não temos dependência dessa situação. É preciso respeitar o resultado do julgamento. É democrático que haja debate se o veredicto foi rigoroso ou não, mas o debate tem de ser respeitado.
Sobre a Lei de Meios
A militância extrapola, e eu posso dizer que está errada, que está falando besteira. Se ela não gosta da capa da revista, da manchete de jornal, quer que eu faça a regulação. Não vai ter regulação para isso

Uma mulher, em Cuzco...

Elaine Tavares



Hoje celebra-se o Inti Raymi, milenar festa dos aymaras, quechuas, collas e outras etnias dos andes. Dia de dar pago a Pachamama, celebrar as colheitas e encaramujar-se na introspecção do inverno que começa. Por conta disso, lembrei de uma pessoa muito especial que conheci, em 2003, no Peru. Maria, mulher de ascendência inca, que vive na cidade de Cuzco.


Maria é uma dessas mulheres, herdeira dos povos originários, prisioneira de um atávico silêncio. Eu a vi vendendo pulseiras na praça de armas, mas não consegui estabelecer contato na primeira vez que a encontrei. Resmungou alguma coisa que ficou difícil de compreender em função de estarem suas bochechas cheias de folha de coca, as quais mascava lentamente. Foi só no dia seguinte que finalmente nos conhecemos. Ela veio a mim. O corpinho fraco, de costas curvadas, se achegou sem que eu percebesse. Naquela manhã de fevereiro eu chorava desconsolada, sem procurar abafar os soluços. Eu vivera uma odisseia pelas estradas de “nuestra América” para chegar até ali e, na porta de entrada do maior monumento da comunidade inca, não conseguiria chegar. O valor da passagem do trem até Machu Pichu era um absurdo, praticamente o mesmo tanto que eu pagara para chegar no Peru, percorrendo Paraguai, Argentina e Bolívia.

Mostrando que apesar do passar do tempo, tudo seguia muito igual, uma empresa espanhola é quem tem o domínio do caminho e, para chegar até a cidade perdida, havia que se aceitar as regras e o preço. Podia-se ir caminhando, mas, para isso, era preciso ter um guia e toda uma equipagem que, igualmente, encarecia a viagem. Sozinha, sem maiores informações, resolvi chorar. Sonhara com esse encontro por anos a fio e agora morreria na praia. Pensando assim eu me acabava em lágrimas bem em frente a enorme catedral – também espanhola -  aproveitando para atirar sobre ela milhares de maldições.


Foi aí que a mulher inca se acercou. Munida de sua sabedoria ancestral ela percebeu que ali estava uma companheira, talvez pelo ódio que fuzilavam meus olhos em direção às construções espanholas que margeiam a praça. Ainda mascava as folhas de coca, mas eu a compreendi muito bem. “Que pasa, nena?”


E eu desandei a falar do tanto que havia esperado para conhecer Machu Pichu e que agora não poderia, por não ter dinheiro suficiente. Ele me olhava com os olhos mansos. Então, solene, perguntou. “Veniste para sacar fotos o para saludar a los dioses?” Então foi a minha vez de ficar em silêncio. Aquelas gentes já deveriam andar fartas de ver milhares de turistas, com suas máquinas potentes, a caminhar pelas pedras sagradas desfilando suas posses e tirando fotos para os álbuns familiares, pouco se importando com a histórica dominação, até hoje visível. “Saludar los dioses”, respondi, sem titubear.


Então ela me convidou para segui-la. E lá fui eu, esquecida das lágrimas, pelas ruelinhas cuzqueñas, cheias de caminhos internos lotados de barracas de artesanato. Numa delas, Maria entrou. Lá dentro, uma profusão de ervas, ossos e outros instrumentos mágicos davam conta que aquele era o reduto de uma mulher especial. Ela procurou entre as coisas um saquinho cheio de pó e o passou para mim. Disse que se eu queria render homenagens aos deuses não precisava ir a Machu Pichu. Bastava subir, a pé, pelo lado norte, até Sacsayhuaman e lá fazer uma singela celebração. Ensinou algumas palavras do seu idioma e pediu que eu cantasse para os deuses, podia ser na minha língua mesmo. Aquilo seria o suficiente para eu mostrar meu respeito e faria com que a viagem não tivesse sido em vão. “Ellos saberán”, sentenciou. Então, segurou as minhas mãos num gesto de despedida e seus olhos indicaram: vai!


Eu fui e encontrei os deuses. Foi o suficiente. Aquela jornada já valera. Eu estava feliz. E foi lá que encontrei também um pessoal que deu a dica de outro caminho para Machu Pichu, bem mais barato, no trem usados pelas gentes locais. Já nem importava mais. O encontro essencial se fizera. Ainda assim eu subi até a cidade sagrada. Não tirei fotos. Não precisava. Tudo estava cravado em mim.


A lição maior me deu Maria, a inca. Mulher e feiticeira, sacerdotisa de Inti. Com toda a carga da opressão de 500 anos nas costas e na vida, foi capaz de sentir a desolação de uma viajante branca e, solidariamente, ensinar o caminho dos deuses, os seus. Forjada no aço da dor - da invasão, do genocídio, da submissão - ela encontrou espaço para a ternura e abriu fendas no seu silencio milenar. Fez encontro, partilha, comunhão. É essa mulher que quero sempre ser. Dura na luta, mas pronta para gesto mágico do encontro amoroso. Fibra e amor, juntos - tal qual já ensinara el Che – no caminho da libertação que há de chegar. E é essa imagem que compartilho hoje com todas as companheiras e com os varões, também capazes de compreender...