Lançamento de livro vira ato contra a prostituição da
mídia
“É uma triste verdade que a supressão da imprensa não poderia
privar mais completamente a nação de seus benefícios do que se
prostituíssem os jornais, entregando-se à publicação de mentiras”, já
nos alertava em 1807, o então presidente norte-americano Thomas
Jefferson.
Por Leonardo Wexell Severo, no site da CUT
Passados mais de 200 anos, pesos
pesados na luta pela democratização da comunicação – e do próprio país -
como Mino Carta e Fábio Konder Comparato transformaram o lançamento do
livro Liberdade de Expressão x Liberdade de Imprensa, de Venício
Lima, na noite de segunda-feira (21) no Sindicato dos Engenheiros de São
Paulo, em maiúscula manifestação contra a prostituição da mídia.
Em seu livro, didático e direto, o professor Venício lembra, sem
precisar recorrer à demolidora crítica marxista de Lenin ou Gramsci, da
falácia empregada pelos porta-vozes dos conglomerados midiáticos em sua
ânsia de mascarar a dominação e a transformação da informação em
mercadoria.
Cada vez mais convertidos em “partido do capital”, os barões da mídia
buscam “satanizar a expressão controle social” e identificar “liberdade
de imprensa com liberdade de empresa”, denunciou o professor. Nesta
linha, condenou, conseguiram intimidar setores do governo durante a
Conferência Nacional de Comunicação (Confecom).
Pesos pesados pela democratizaçãoAssim, sem necessitar recorrer à
“crítica marxista clássica”, alerta o autor, “refiro-me, apenas, ao
debate interno às premissas liberais, consolidadas e praticadas em
sociedades que têm servido de referência à nossa democracia, na
perspectiva do direito à comunicação centrado no indivíduo (e não em
empresas) – razão última e sujeito de todas as liberdades e direitos”.
Com este norte, Venício faz ecoar as palavras proféticas de Jefferson,
um dos heróis da independência dos EUA: “Não se pode agora acreditar no
que se vê num jornal [ainda não havia rádio e televisão]. A própria
verdade torna-se suspeita se colada nesse veículo. A verdadeira extensão
deste estado de falsas informações é somente conhecida daqueles que
estão em posição de confrontar os fatos que conhecem com as mentiras do
dia. O homem que não lê jornais está mais bem informado do que aquele
que os lê, porquanto o que nada sabe está mais próximo da verdade que
aquele cujo espírito está repleto de falsidades e erros”.
Responsável pelo prefácio do livro, o jurista Fábio Konder Comparato fez
um breve relato histórico sobre a censura exercida pelas autoridades
reais e eclesiásticas da liberdade de imprimir no mundo e de como se
desenvolveu este controle de poder também em nosso país. Na atualidade,
apontou, “o objetivo do oligopólio empresarial é a defesa do sistema
capitalista. A liberdade é a falta de controle, a ausência de leis, isso
é fundamental para os empresários que controlam os meios de
comunicação”.
Na avaliação do jurista, é inaceitável que passados mais de 20 anos da
promulgação da Constituição de 1988, não tenham sido regulamentados os
artigos que dizem respeito à Comunicação. Na verdade, enfatizou, isso se
deve ao fato do “oligopólio empresarial exercer um domínio sobre o
Congresso Nacional”. “Precisamos entrar com uma Ação Direta de
Inconstitucionalidade por omissão dos parlamentares”, declarou
Comparato, sob aplausos.
Expressão maior da revista CartaCapital, o veterano jornalista Mino
Carta ridicularizou os “jornalistas” que acabam se transformando em
“sabujos do dono do meio de comunicação, publicando mentiras”, e que,
pior, “acabam acreditando no que escrevem, enganando-se a si mesmos com
medo de perder o emprego ou por um simples sorriso do patrão”.
Exemplificando o que qualificava como “jornalismo de péssima qualidade”,
Mino Carta fez a plateia vir abaixo com a entrevista de José Serra à
Revista Veja, num simulacro de reportagem.
Primeira pergunta: “Por que para a democracia brasileira é positivo
experimentar uma alternância de poder depois de oito anos de governo
Lula ?”. E outra: “Como o senhor conseguiu governar a cidade e o estado
de São Paulo sem nunca ter tido uma única derrota importante nas casas
legislativas e sem que se tenha ouvido falar que lançou mão de
‘mensalões’ ou outras formas de coerção sobre vereadores e deputados
estaduais?”. O plenário transformou-se em mar de risos.
“O pavor desta mídia é que Lula colha mais uma vitória”, disse Mino
Carta, ressaltando que o processo eleitoral será um divisor de água
importante. Mas há obstáculos a serem removidos, enfatizou o jornalista
da CartaCapital, frisando que “um dos grandes aliados da mídia é o
presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, que é quem mais
contribui com os donos do poder com as altas taxas de juros”.
Em sua intervenção, o jornalista Luis Nassif também citou a
promiscuidade entre o BC e os donos dos meios de comunicação, lembrando
que o Banco Central sinaliza com o aumento da inflação e a mídia “faz um
alarido que dá espaço para o BC aumentar os juros”. “É um jogo de
guerra, de manipulação absoluta, de distorção. Hoje o jornalista vai a
campo, colhe dez informações, distorce duas e deixa a terceira para o
editor distorcer”, explicou.
Paulo Henrique Amorim, do blog Conversa Afiada, relembrou as inúmeras
ações judiciais movidas contra ele por Daniel Dantas — o grande operador
do esquema tucano nas famigeradas “privatizações” da telefonia —,
chamado por FHC de “brilhante”, para reforçar a denúncia de que “a elite
nativa se apropriou da liberdade de expressão para nos calar pelo bolso
através da Justiça”.
Segundo Paulo Henrique, é fundamental respaldar a Adin por omissão,
proposta pelo jurista Fábio Konder Comparato, para garantir a
regulamentação dos artigos que proíbem a formação de oligopólios no
setor, garantem espaço à produção regional e independente e estabelecem a
complementaridade dos sistemas público, privado e estatal.
Para Paulo Henrique, o momento é de somar força e consciência em defesa
da trincheira democrática que — ainda — é a internet, alvo dos que
querem “fechar a linha de oxigênio” da comunicação. Condenando o PUM
(Partido Unificado da Mídia), ressaltou que embora o governo Lula não
tenha avançado neste estratégico quesito, que é a democratização da
comunicação, concorda com Mino Carta que “seu maior legado será a tunda
que vai dar no Serra“.
Entre outros sindicalistas e jornalistas, estiveram presentes o
presidente do Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé,
Altamiro Borges – organizador do evento junto com a Editora Publisher
Brasil; a presidenta do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Juvândia
Moreira; o presidente da Afubesp e diretor da Rede Brasil Atual, Paulo
Salvador; o presidente da Altercom, Joaquim Palhares; Bia Barbosa e João
Brant, do Coletivo Intervozes; Renato Rovai, editor da Revista Fórum;
Renata Mielli, do portal Vermelho, e Wagner Nabuco de Araújo,
diretor geral da Caros Amigos.
Sintetizado em 162 páginas e 23 artigos que aprofundam a análise, a
conceituação e o debate da relação entre liberdade de expressão e
liberdade de imprensa, o livro de Venício conta com cinco enriquecedores
capítulos, didaticamente organizados: “O ensinamento dos clássicos”, “O
ponto de vista dos empresários”, “A posição das ONGs”, “Questões em
Debate”, e “As Decisões Judiciais”.