sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Decisão da OEA sobre Guerrilha do Araguaia pode provocar mudanças na Constituição


Reprodução
Guerrilheiros mortos no Araguaia | Foto: Reprodução

Igor Natusch no Sul21

A Corte Interamericana de Direitos Humanos, ligada à Organização dos Estados Americanos (OEA), tomou nesta semana uma decisão que deve modificar a maneira como o Brasil lida com crimes ocorridos durante a ditadura militar. Pela sentença, o Brasil é considerado culpado pelo desaparecimento forçado de pelo menos 70 pessoas ligadas à Guerrilha do Araguaia, entre 1972 e 1974. Trata-se da primeira sentença contra o Brasil por crimes cometidos durante a ditadura militar.
Juristas, entidades de direitos humanos e figuras ligadas aos familiares de desaparecidos acreditam que a decisão forçará mudanças jurídicas no Brasil, invalidando decisão anterior do STF sobre a Lei da Anistia. E que, mesmo com declarações diminuindo o impacto da sentença, como a do ministro da Defesa, Nélson Jobim, nada resta ao Brasil senão trabalhar para se adequar às determinações da OEA, seguindo as medidas de reparação determinadas no parecer final – entre elas, a reparação completa para as vítimas e seus familiares, o que pode provocar até mesmo mudanças na Constituição brasileira.
A decisão foi anunciada pela Corte, nesta terça-feira (14), e segue uma linha comum em julgamentos da entidade, tratando as violações dos direitos humanos como crimes imprescritíveis. A partir da sentença, o Brasil está obrigado a tratar crimes de desaparecimento de guerrilheiros e presos políticos dentro das convenções interamericanas. Isso equivale a dizer que, enquanto não houver uma lei específica, esses crimes deverão ser julgados de acordo com a legislação brasileira, sem que a Lei de Anistia, que se choca com as normas interamericanas, seja um empecilho. Com isso, em teoria, novas ações penais podem ser abertas contra torturadores e a favor da abertura de documentos sigilosos do período militar.
A determinação da OEA refere-se à petição assinada pelo Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro, pelo Centro Pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil) e pela Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos de São Paulo. Essas entidades questionaram decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal em abril deste ano, que consideraram legalmente impossível processar agentes de Estado que atuaram na ditadura contra opositores do regime. A decisão baseou-se em tese do então ministro Eros Grau, que foi relator do processo. Na leitura de Grau, ele mesmo um perseguido pela ditadura militar, não é atribuição do STF a alteração de textos relativos a anistias.
Pela decisão da Corte da OEA, a Lei de Anistia brasileira é um documento incompatível com as convenções interamericanas, não podendo servir de impedimento para a investigação de crimes cometidos durante a ditadura militar. Com a sentença, a Corte Interamericana exige que o Brasil elimine quaisquer obstáculos práticos e jurídicos para a investigação dos crimes e para a responsabilização penal daqueles que os cometeram.

“Lei da Anistia não será empecilho”

Victória Grabois, vice-presidente do grupo Tortura Nunca Mais, comemora a decisão da Corte Interamericana como uma “vitória política e jurídica”. “São mais de 30 anos nessa luta, e a decisão da OEA é uma grande conquista. Agora está claro, para o governo brasileiro, que a Lei de Anistia não é empecilho para a investigação de crimes ocorridos durante o regime militar”, explica.
Em comunicado divulgado pelo Centro pela Justiça e Direito Internacional (CEJIL), a presidente da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos de São Paulo, Criméia Schmidt de Almeida, também comemora a decisão da OEA. “Essa sentença pode significar um passo importante na verdadeira redemocratização do país, eliminando os entraves ditatoriais que ainda persistem nas práticas dos agentes públicos. Como familiar, espero que possa significar um ponto final a tantas incertezas que há quase 40 anos marcam com angústia a nossa vida”, diz Criméia.
“O Brasil tem o dever de investigar o destino de todo cidadão morto em luta política”, concorda Adalberto Frasson, presidente gaúcho do PCdoB, partido envolvido em várias ações de investigação e reparação de crimes cometidos durante a ditadura. Para ele, o esclarecimento dos fatos trata-se até mesmo de uma “questão humanitária”, já que os familiares dos desaparecidos têm o direito de enterrar seus mortos.
O advogado Roberto de Figueiredo Caldas, juiz  da Corte Interamericana da OEA, diz que os desdobramentos da sentença virão a partir de manifestações do Ministério das Relações Exteriores e da Presidência da República. “É preciso reforçar o que considero um dos pontos chave da decisão, que é o fato de que crimes de lesa-humanidade não são anistiáveis”, afirma. “Os sequestros, por exemplo, não são passíveis de anistia. E trata-se de um crime menos grave do que a tortura ou a morte. Por que um crime menos grave não pode receber anistia, e um mais grave pode?”, indaga.

“Lei internacional é superior”

De qualquer modo, a decisão da OEA ainda deve motivar muitas discussões e incertezas. O ministro da Defesa, Nélson Jobim, já manifestou sua oposição a qualquer revisão do julgamento do STF sobre a Lei da Anistia. Para o ministro, a decisão tem caráter meramente jurídico, sem efeitos práticos em nosso país. “O assunto não pode voltar ao Supremo, pois o STF está sujeito a suas próprias decisões. As decisões de constitucionalidade têm efeito contra todos, inclusive os próprios ministros (do STF)”, disse Jobim, durante palestra na quarta-feira (15). Reforçando que seu lema é “memória tudo, retroação zero”, Jobim afirma ainda que a transição foi “negociada” entre civis e militares, em um processo “pacífico”.
Roberto de Figueiredo Caldas evita criticar as declarações de Nélson Jobim. Para ele, não há necessidade de um debate direto com tribunais ou com o Supremo Federal. “Sabemos que, depois do anúncio da decisão, os debates internos serão intensos. Temos convicção de que a questão está bem embasada no que há de mais atual em direito internacional. É a opinião do ministro, e assim deve ser recebida”, diz.
Victória Grabois, do Tortura Nunca Mais, é um pouco mais incisiva. “A Corte Interamericana é uma instância jurídica que está acima do Supremo do Brasil. O governo precisa acatar a decisão”. Ela explica que a decisão anterior do STF está em desacordo com o Pacto de São José da Costa Rica, de 1969, que estabelece a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. O pacto foi ratificado pelo Brasil em 1992. “A lei internacional é superior. Queremos que os militares que participaram de crimes durante a ditadura sejam chamados, de acordo com os tratados continentais, e responsabilizados pelos seus crimes”.
“Não queremos revanchismo. O que precisa ficar claro sempre é que, pelas determinações internacionais, torturadores não têm anistia”, insiste Adalberto Frasson, presidente gaúcho do PCdoB, frisando que o governo brasileiro “tem se esforçado” para resgatar o débito com os perseguidos pela ditadura militar. O advogado Roberto de Figueiredo Caldas, da Corte Interamericana de Direitos Humanos, reforça essa visão. Para ele, é necessário dar tempo para que o estado brasileiro possa discutir e ir se adaptar a todos os aspectos da decisão. “Sabemos que é uma decisão inovadora para a jurisprudência nacional, que deve implicar até mesmo em algumas adequações da Constituição. Vai precisar de uma análise atenta e um período de maturação. De qualquer modo, trata-se de uma sentença autoexecutável”, ressalva.

“Certos crimes jamais se apagam”

O juiz Roberto de Figueiredo Caldas lembra que a sociedade brasileira tem um compromisso com as famílias que perderam entes queridos durante a luta contra a ditadura, que vai além de eventuais indenizações. Lembra que o trabalho com as famílias de desaparecidos não envolve apenas profissionais da área jurídica, mas também profissionais de outras áreas, como psicólogos. “Certos crimes jamais se apagam”, argumenta. “Além da ação exemplificativa, que busca que crimes assim nunca mais se repitam, temos que procurar modos de sanar ao máximo a dor das famílias. Deixar esses casos sem uma resposta seria uma injustiça para essas pessoas”.
Segundo Victória Grabois, a luta agora passa a ser no sentido de pressionar o estado para que se adeque o mais rápido possível à determinação da OEA. “Teremos que esperar a posse de Dilma Rousseff, já que Lula não fará mais nada nesses últimos dias de mandato”, afirma. A pressão do Tortura Nunca Mais será direcionada também a questões específicas, como o Grupo de Trabalho Tocantins, que busca restos mortais na região do Araguaia. “As buscas se tornarão mais eficazes com a abertura dos arquivos da ditadura. Muitas informações desses documentos podem ser decisivas para localizar esses corpos. Conversando apenas com camponeses não dá, vamos passar a vida vendo escavações sendo feitas em vão”, revolta-se.
“Os setores que dominam as informações (sobre a Guerrilha do Araguaia) precisam apresentar esses documentos”, reforça Adalberto Frasson, do PCdoB. Segundo ele, isso é algo que pode acontecer, se os órgãos ligados aos familiares de desaparecidos mantiverem a pressão sobre os órgãos militares e governamentais. “As Forças Armadas resistem à abertura dos arquivos, mas a sociedade brasileira não pode deixar de lado essa batalha. Essa história precisa ser fixada na mente de todos, para que nunca mais exista sequer a possibilidade de que aconteça algo do tipo novamente. Quem torturou não pode ficar impune”, defende.

Barragens e violação dos direitos humanos





Silvia Alvarez de Campo Grande (MS) no Correio do Brasil

Avatar não foi a primeira produção dos Estados Unidos a tratar dos impactos da ganância do lucro em comunidades. Floresta das Esmeraldas, filme de John Boorman, de 1985, conta a história de um engenheiro estadunidense que veio construir um megaempreendimento na Amazônia, mas é confrontado pela tribo “povo invisível”, tendo inclusive seu filho sido sequestrado pelos índios e se tornado, posteriormente, um deles. A obra em questão é a Usina Hidrelétrica (UHE) de Tucuruí, construída entre 1976 e 1984 em plena ditadura civil-militar, no rio Tocantins, no Pará.
A história não ficcional das comunidades atingidas por Tucuruí – até então povos invisíveis aos olhos do Estado – está agora registrada no relatório final da Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), órgão ligado ao Ministério da Justiça. O documento foi aprovado no dia 22 de novembro, em Campo Grande (MS), na 202ª reunião extraordinária do Conselho. Além da hidrelétrica do Pará, outros seis projetos foram visitados e analisados pela Comissão – casos escolhidos seguindo os critérios de diversidade regional, tipos de projeto (de geração de energia e de retenção de água), tamanho e fase (em processo de licitação, implantação e já concluído). São eles: UHE Canabrava (GO), UHE Aimorés (MG), UHE Foz do Chapecó (RS e SC), Pequena Central Hidrelétrica (PCH) Fumaça (MG), PCH Emboque (MG) e Barragem de Acauã (PB).
“Ao final de seus trabalhos, a Comissão Especial considera verídica e verificável a denúncia encaminhada pelo Movimento dos Atingidos por Barragens ao Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana”. Essa é a conclusão do relatório. O MAB havia encaminhado, em 2006, denúncias de violações de direitos humanos ao CDDPH, que deram origem à criação da Comissão Especial. O objetivo era verificar as denúncias e apresentar propostas para prevenir novas violações e minimizar os impactos sofridos pelas populações atingidas por barragens no Brasil. Entre 2007 e 2010, a Comissão realizou visitas às regiões dos sete casos escolhidos, participando de audiências públicas, colhendo depoimentos e requisitando documentos aos atingidos, órgãos públicos e empresas.
O presidente do CDDPH e Secretário Especial de Direitos Humanos, ministro Paulo Vanucchi, na abertura da reunião, parabenizou o trabalho da Comissão Especial considerando-o muito eficiente e competente. “Foi um trabalho histórico, que levou cerca de quatro anos. Li atentamente o relatório e sugeri que seja feito um sumário executivo para facilitar a leitura e a divulgação”, declarou o ministro. De acordo com o representante do Ministério Público Federal (MPF) na Comissão, João Aquira Omoto, a aprovação do relatório é de extrema importância, “pois é o reconhecimento do Estado de uma situação que estava se perpetuando sem que houvesse, de fato, medidas e propostas para resolvê-la”.
Segundo o relatório, “os estudos de caso permitiram concluir que o padrão vigente de implantação de barragens tem propiciado, de maneira recorrente, graves violações de direitos humanos, cujas conseqüências acabam por acentuar as já graves desigualdades sociais, traduzindo-se em situações de miséria e desestruturação social, familiar e individual”. A Comissão identificou, nos casos analisados, um conjunto de 16 direitos humanos sistematicamente violados, dentre os quais merecem destaque o direito à informação e participação; direito ao trabalho e a um padrão digno de vida; direito à moradia adequada; direito à melhoria contínua das condições de vida; e direito à plena reparação das perdas.
Para Carlos Vainer, relator e representante do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da UFRJ na Comissão, o principal direito violado é o da informação. “As populações não são informadas dos grandes projetos que se abaterão sobre suas regiões. No máximo, são confrontadas com processos de comunicação social, que na verdade constituem um marketing desses projetos, cuja mensagem é a de que eles promoverão o progresso e a felicidade geral daquela população. Essa violação se verifica em todos os casos estudados”, afirmou Vainer durante a reunião do CDDPH.
A falta de uma definição ampla do conceito de atingido é apontada no relatório como uma das principais causas de ocorrência de violações de direitos humanos em implantações de barragens. Um dos frutos desse estudo é o Decreto nº 7.342 da Presidência da República, de 26 de outubro de 2010, que institui o cadastro socioeconômico para identificação, qualificação e registro público da população atingida por barragens. A instituição do cadastro é uma antiga reivindicação do MAB e uma das recomendações do relatório da Comissão Especial.
Para Ricardo Montagner, representante do MAB na Comissão, o relatório será mais um instrumento de luta para os atingidos por barragens e, por isso, vai ser amplamente divulgado pelo movimento. “A aprovação do relatório legitimou as denúncias e a luta histórica feita pelo MAB. Vamos pressionar os órgãos públicos e as empresas para que apliquem as medidas de reparação recomendadas pela Comissão”, declara.

Parece ficção…
 
Para Montagner, um dos piores casos analisados pela Comissão é o de Acauã. O relatório definiu os reassentamentos em que vivem os atingidos como verdadeiros campos de concentração. “Ali, tiraram o direito à vida. As terras do reassentamento não são próprias para o cultivo e as comunidades estão isoladas, sem possibilidades de trabalho próximo”, denuncia.
Tucuruí também é considerado um caso desolador. Vinte e seis anos depois de construída a usina, centenas de atingidos ainda não foram reconhecidos e indenizados. Ocorreram graves impactos sociais e ambientais ainda não mitigados com repercussão negativa sobre a existência material e imaterial das populações e dos povos indígenas Parakanã, Asuriní e Gavião da Montanha. Ao contrário, esses impactos só tendem a aumentar com a conclusão das eclusas da barragem, inauguradas no dia 30 de novembro.
Em Aimorés, o que chamou mais a atenção da Comissão foi a paisagem deixada pela hidrelétrica: onde antes corria um rio, há somente poças que constituem, segundo o relatório, verdadeiros criadouros de vetores. A multiplicação de focos de aedes não traz riscos apenas de epidemias de dengue, uma vez que o mosquito é também o vetor urbano da febre amarela.

Recomendações

 
“Sejam quais forem as opções de desenvolvimento econômico e as escolhas que vier a fazer a nação nas áreas de geração e transmissão de energia elétrica e de gestão de recursos hídricos, nada pode justificar violações de direitos humanos”, constata o relatório. A comissão recomendou a adoção de mais de 100 medidas para garantir e preservar os direitos humanos dos atingidos por barragens e evitar novas violações.
O advogado Leandro Scalabrim, que também acompanhou a elaboração do relatório, destaca a recomendação de que se constitua uma Comissão Nacional de Reparação dos atingidos por barragens no âmbito da Secretaria Especial dos Direitos Humanos e com a participação de outros órgãos públicos. “O único caso histórico parecido com este é o da comissão de anistia”, diz.
Além disso, o relatório apontou a necessidade de conceber, formular e implementar políticas de reparação específicas para grupos, famílias e indivíduos mais vulneráveis como idosos, crianças, doentes crônicos e portadores de deficiências físicas.

Moçambique utiliza crianças na agricultura e exploração sexual


Canalmoz - 171210_criana Em Moçambique, o trabalho infantil é utilizado com grande frequência na agricultura e nas ruas, além da exploração sexual e no trabalho doméstico, além do tráfico de menores, segundo um estudo do Departamento do Trabalho norte-americano divulgado na quarta-feira, intitulado "2009 Finding on the Worst Forms of Child Labor", que inclui 125 países e mais 19 territórios.
Segundo o Departamento do Trabalho dos Estados Unidos, as crianças moçambicanas são submetidas a trabalho doméstico por longas horas e com risco de abuso sexual dos seus empregadores, além de serem utilizadas no trabalho informal nas ruas, como na colecta de sucata de metal, onde correm vários riscos.

Muitas trabalham em restaurantes e também em bares nas barracas e algumas destas crianças são exploradas sexualmente.
Crianças são traficadas internamente e para a África do Sul e Swazilândia para fins de exploração sexual, trabalho forçado na agricultura, trabalho manual e doméstico.
Raparigas do Zimbabwe e Malawi também são traficadas para Moçambique para exploração sexual e serviço doméstico. Os meninos são traficados dentro do país e para a África do Sul para trabalharem em quintas e em minas.
Em Moçambique, as crianças órfãs são particularmente vulneráveis ao envolvimento nas piores formas de trabalho infantil.
Em 2009, havia 1,2 milhões de órfãos em Moçambique, muitos perderam os pais devido ao
HIV/SIDA.
O Governo de Moçambique tem participado em projectos financiados pelos doadores para retirar ou prevenir que as crianças exerçam as piores formas de trabalho infantil. No entanto, ainda existem lacunas no seu quadro legal. As crianças podem deixar a escola aos 12 anos e a Lei não define o que é trabalho perigoso, refere o estudo, acrescentando que queixas de tráfico de crianças são investigadas com frequência.
Crescem os programas de protecção social, mas não tratam dos sectores em que o trabalho pesado é também realizado por crianças, como na
agricultura.
O Departamento do Trabalho norte-americano sugere que o Governo de Moçambique deve aumentar a idade obrigatória de escolaridade para os 15 anos, alterar o código do trabalho para proibir as crianças de trabalharem à noite e definir o que é trabalho pesado.
Sugere ainda o reforço dos programas sociais principalmente voltados para as crianças que trabalham na agricultura e trabalho doméstico, além da investigação de tráfico de crianças, entre outras medidas.
De acordo com o estudo do Departamento do Trabalho, estima-se que 215 milhões de crianças trabalham em vez de ir à escola e mais de metade (115 milhões) destes dedicam-se a trabalhos perigosos no mundo.

Wikileaks: Para EUA, esquerda do Uruguai usa direitos humanos como arma contra Washington


Daniella Cambaúva no OperaMundi

Em documento diplomático revelado pelo Wikileaks, autoridades diplomáticas dos Estados Unidos avaliam que grupos de esquerda do Uruguai usam a defesa dos direitos humanos como arma contra Washington, e que é preciso dar uma resposta às acusações. Em mensagem enviada pelo então embaixador norte-americano em Montevidéu em 2006, Frank Baxter, o tema predominante são o crescente sentimento anti-americano no país e o vínculo entre a última ditadura militar uruguaia (1973-1985) e os EUA.

No despacho, Baxter reclama que a “TeleSur da Venezuela” – no canal estatal de televisão com participação uruguaia – continua transmitindo acusações de que os EUA patrocinaram o Plano Condor, aliança entre os regimes militares da América do Sul – Brasil, Argentina, Chile, Bolívia, Paraguai e Uruguai – criada com o objetivo de coordenar a repressão a oposicionistas das ditaduras instaladas no Cone Sul. A TeleSur é uma rede de televisão multi-estatal latino-americana, isto é, tem participação de vários governos da região – Venezuela, Cuba, Argentina e Uruguai. A sede fica na Venezuela.

Baxter escreveu também que as violações de direitos humanos cometidos entre 1973 e 1984 não são um assunto novo no Uruguai, e ressaltou que, no período imediatamente após o fim da ditadura, muitos escritores e jornalistas acusaram os EUA de patrocinar o Plano Condor e falam em cumplicidade norte-americana nos abusos cometidos no regime militar.


“Os documentos que vimos não vinculam explicitamente os EUA em qualquer conspiração regional contra esquerdistas, o caso chama atenção porque se presume sempre que os EUA são cúmplices da campanha de cumplicidade [entre os regimes do Cone Sul] no Plano Condor, de destruição de movimentos de guerrilheiros na década de 1970 e a aprovação de métodos brutais", escreveu o diplomata.

O anti-americanismo “é um barulho que soa cada vez mais forte”, afirmou Baxter, “e o tempo para algum tipo de resposta pode estar se aproximando”, completou. Segundo Baxter, "o dia dos Direitos Humanos é uma data que serve para reforçar a afirmação de que a esquerda é a única que possui verdadeiros defensores desse direito”.

De acordo com ele, a abertura de documentos sobre a ditadura militar no país sul-americano “alimentaram o fogo das acusações da esquerda de que os EUA são um inimigo dos direitos humanos”. O diplomata acrescentou que a promotoria estava utilizando documentos dos EUA para reforçar acusações contra o ex-presidente uruguaio, Juan Bordaberry, e o ex-chanceler Juan Carlos Blanco.

Juan Bordaberry foi eleito presidente em 1972, participando do golpe em 1973 , permanecendo no cargo até 1976. Juan Carlos Branco foi ministro de Relações Exteriores entre 1972 e 1973. Ambos estão presos, acusados de desaparecimentos forçados durante o período ditatorial.

No Uruguai, Bordaberry e Carlos Branco são um dos únicos agentes da repressão que foram julgados, já que, em 1986, a Lei de Caducidade Punitiva do Estado anistiou os militares. O assunto, porém, é constantemente foco de debate no país. Dois referendos, em 1989 e 2009, ratificaram a lei do perdão. Em agosto, o governo formulou um projeto de lei que, se aprovado, invalidaria a anistia.

Atualmente, o Uruguai está sendo processado na CIDH (Corte Interamericana de Direitos Humanos), ligada à OEA (Organização dos Estados Americanos) por um único crime cometido durante a ditadura. Trata-se da denúncia feita por Macarena Gelman, cujos pais foram sequestrados em Buenos Aires, em agosto de 1976, e depois enviados a Montevidéu, onde foram assassinados. Estima-se que a sentença seja emitida até o final do ano.

Além disso, o país já foi condenado duas vezes pelo Comitê de Direitos Humanos do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos pelos casos de impunidade. De acordo com dados de entidades de defesa de direitos humanos do Uruguai, pelo menos 200 pessoas desapareceram durante a ditadura militar (1973-1985)
Governo uruguaio

Na mesma mensagem, o ex-embaixador tratou também do governo uruguaio. Na época, o presidente era Tabaré Vázquez (2005-2010), cumprindo o segundo ano de mandato. Líder da principal coalizão de esquerda do país, a Frente Ampla, Vázquez quebrou um ciclo de 170 anos de governos conservadores, alternados pelos partidos Nacional e Colorado.

Para Baxter, a grande novidade era que a Frente Ampla estava no poder, com controle na política e na imprensa suficiente para incomodar os EUA. Disse duvidar, entretanto, que Vázquez sancionasse este tipo de condutas e que estava em dúvida sobre o que poderia fazer para mudar a situação.

Em 2009, José “Pepe” Mujica, também da Frente Ampla e ex-integrante da guerrilha esquerdista Tupamaros, tornou-se presidente.


Pinochet

Em outra mensagem, o ex-embaixador menciona a morte do ex-ditador chileno Augusto Pinochet (1973-1990), em dezembro de 2006. A cobertura feita pela imprensa uruguaia “reforça a afirmação de que os esquerdistas locais são os únicos verdadeiros defensores dos direitos humanos”, criticou Baxter.

Ele escreveu também que havia uma grande nostalgia em torno da presidência de Salvador Allende e desprezo por aquele que “choram por Pinochet”, “demonizado” por políticos “socialistas e comunistas”, que acreditam que o ex-ditador chileno foi a inspiração para as demais ditaduras da região, inclusive no Uruguai. “Há uma sensação de alegria por sua morte”, descreveu.

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