Samir Oliveira no SUL21
Com a iminência do vencimento dos atuais contratos de concessão de
pedágios, o governo do Estado se desdobra em debates internos para
definir, em reta final, como será o novo modelo de administração das
rodovias no Rio Grande do Sul. Atualmente, a tese que encontra mais
respaldo no Palácio Piratini é a da criação de uma empresa pública que
gerenciaria as três praças comunitárias já existentes e assumiria o
comando dos sete polos hoje administrados pela iniciativa privada.
Essa solução resolveria dois problemas: daria tempo para que o
governo elaborasse com calma uma nova licitação para o setor e não
deixaria as praças de pedágio abandonadas a partir de julho de 2013,
quando começam a vencer os contratos firmados no final da década de
1990.
A nova estatal também melhoraria o funcionamento do Daer, já que o
departamento ficaria com uma atuação focada na fiscalização das
estradas, sem ter que se preocupar em gerir contratos com rodoviárias,
pedágios e empresas de ônibus – funções que a empresa a ser criada
assumiria. Com a instalação da nova estrutura, seriam extintas as
diretorias de Operação Rodoviária e de Transportes Rodoviários do Daer.
O formato jurídico que mais ganha força nos debates internos do
governo é da companhia mista de direito privado, que permitia que o
quadro funcional fosse contratado pelo regime de CLT e tornaria os
processos mais céleres. A intenção do Palácio Piratini é criar a estatal
o mais rápido possível, por isso o governador Tarso Genro (PT) irá
enviar o projeto de lei em regime de urgência à Assembleia Legislativa
até o final deste mês, junto com outras matérias num pacote que envolve
outros temas polêmicos, como reforma previdenciária e liberação de
bebidas alcoólicas nos estádios durante os jogos da Copa do Mundo de
2014.
Beto Albuquerque admite ampliação de pedágios comunitários no Estado
O secretário estadual de Infraestrutura e Logística, Beto Albuquerque
(PSB), é o principal defensor da criação de uma companhia pública para
cuidar dos pedágios no Rio Grande do Sul. A ideia chegou a ser proposta
no ano passado, mas só começou a ser debatida mais intensamente pelo
núcleo do governo neste ano.
Confrontado com a burocracia e os vícios históricos do Daer, Beto
acredita que a melhor forma de resolver os problemas é com a criação de
uma nova estrutura. “Na época do Collares, o Daer tinha quase 3 mil
funcionários a mais do que hoje. A resposta às necessidades dos pedágios
comunitários é muito lenta”, queixa-se o secretário.
O secretário entende que, com a criação da estatal, será possível
ampliar o número de praças comunitárias no Estado, mas reconhece que
esse modelo não serve para todos os casos. “Alguns pedágios poderão ser
transformados em comunitários. Mas onde se exige muito investimento será
impossível”, admite, citando o polo de Gramado com caso que demanda
muitos recursos.
Além da ampliação das praças administradas pelo governo, a nova
empresa pública possibilitará um controle mais efetivo sobre as verbas
geradas por esses empreendimentos. Atualmente, os recursos que vêm das
taxas cobradas pelos pedágios comunitários vai para o caixa único do
Estado.
“O dinheiro do pedágio não vai mais passear pelo caixa único”,
explica Beto. O secretário também defende que a nova estrutura passe a
comandar a concessão de estações rodoviárias e de operadoras de ônibus,
desafogando ainda mais o Daer e deixando seus engenheiros livres para
fiscalizar as estradas.
“Empresa é fundamental para evitar o colapso no encerramento das concessões”, explica João Victor
O secretário da Assessoria Superior do Governador, João Victor
Domingues (PT), explica que o fator fundamental que motiva o governo do
Estado a criar uma nova empresa pública é o encerramento dos atuais
contratos de pedágios no ano que vem. Conforme prometeu na campanha
eleitoral, o governador Tarso Genro não irá renovar as atuais parcerias,
mas a elaboração de uma nova licitação poderia ser derrubada na Justiça
pelas concessionárias, que alegam a existência de um passivo de R$ 1,7
bilhão a ser quitado. Nesse contexto, a estruturação de uma estatal
seria uma saída que daria tempo para que o Palácio Piratini resolva o
imbróglio com a iniciativa privada e não deixe as praças de pedágio
abandonadas.
“Essa empresa é fundamental para evitar o colapso no encerramento das
concessões”, reconhece o petista. A nova companhia ficará no comando
das praças hoje controladas pela iniciativa privada até que o governo
encontre uma solução definitiva para o problema.
Uma consultoria contratada pelo Palácio Piratini irá definir um novo
modelo a ser adotado. De posse desse estudo, o governador Tarso Genro
irá decidir se abre uma nova licitação para que a iniciativa privada
reassuma a administração dos polos ou se determinará que a nova empresa
pública ficará com o comando das praças. Em qualquer uma das
possibilidades, o desafio do governo está em oferecer um serviço melhor
que o atual com a diminuição das tarifas, o aumento dos investimentos e a
extinção de alguns pedágios, como o de Farroupilha – promessa de
campanha do governador.
Outro impasse a ser resolvido por Tarso é o das estradas federais.
Atualmente, os sete polos de pedágios do Estado contam com 1,2 mil
quilômetros de rodovias federais. O governo já conseguiu uma garantia de
que até junho o Ministério dos Transportes diga o que irá fazer em
relação a essa malha.
Oposição e base aliada se dividem em opiniões sobre a medida
Os debates internos do governo gaúcho para a criação de uma empresa
pública que cuide dos pedágios no Estado ainda não ecoaram de forma
clara na Assembleia Legislativa, que analisará o assunto a partir do
final de abril, quando o Palácio Piratini enviará um pacote de projetos
em regime de urgência. Deputados da base aliada e da oposição dão
diferentes versões para o fato e se dividem entre o apoio e a crítica à
medida.
Para Raul Pont, líder partidário e presidente do PT no Rio Grande do
Sul, a iniciativa de criar uma estatal para gerenciar contratos de
pedágio é positiva. “A decisão de organizar uma empresa que assuma isso e
garanta que os recursos sejam aplicados em obras de manutenção e
expansão de rodovias é correta”, elogia, acrescentando que “essa posição
já deveria ter sido assumida há mais tempo”, deixando claro o
desconforto com o diálogo que o governo vinha mantendo com as
concessionárias – que gerou diversos rumores de que o governador Tarso
Genro estaria disposto a renovar os atuais contratos.
Pont reconhece que o governo ainda não tem posição formada sobre qual
será o modelo utilizado para a administração dos pedágios, mas sugere
que o controle pelo Estado pode ser o mais efetivo. “Até hoje não se
conseguiu saber exatamente quanto esses pedágios arrecadam. Controlá-los
e saber qual é a receita vai ajudar a tomar uma decisão melhor”,
entende.
O líder do PMDB, deputado Márcio Biolchi, vê com restrições a ideia
de se criar uma nova empresa pública no Estado. Ele critica a forma como
esse debate está sendo conduzido no governo – sem extrapolar os muros
do Palácio Piratini – e condena a utilização do regime de urgência para
um tema que considera relevante demais para ser apreciado em apenas 30
dias.
“O governo não diz às claras que modelo irá adotar e não discute isso
com a Assembleia Legislativa, apenas com a base aliada. Esse assunto
não é tratado de forma pública”, denuncia. Para o peemedebista, é
temerário centralizar a gestão dos pedágios nas mãos do Estado. “O poder
público não tem mostrado eficiência na gestão de contratos”, opina.
Márcio Biolchi observa que outros estados têm ampliado as concessões à
iniciativa privada que, segundo ele, seriam menos onerosas aos cofres
públicos. “Onde está a garantia de que essa estatal terá eficiência e as
tarifas de pedágio irão diminuir? O Brasil inteiro vem fazendo
concessões porque é mais barato, vamos aqui criar o desafio de provar o
contrário?”, questiona.
O deputado Jorge Pozzobom (PSDB), contumaz crítico de Tarso, se
mostra mais favorável à criação de uma estatal para gerir os pedágios.
“Vejo com bons olhos, no momento em que o Estado volta a ter poder nas
mãos. Hoje o poder está com as concessionárias”, compara.
Entretanto, o tucano ressalva que o governo está “muito confuso”
nesse assunto e que “há um ponto de interrogação” em tudo que o Palácio
Piratini propõe.
“Por uma questão política, o governo segue refém do passado”, crítica advogado da Univias
Atualmente, há 12 polos pedagiados no Rio Grande do Sul e dois
modelos de administração. A concessão do trecho à iniciativa privada –
que vigora em sete polos, sendo que dois são de responsabilidade da
União, o de Pelotas e a Freeway -, e os chamados pedágios comunitários,
administrados diretamente pelo Estado (caso das praças de Passo Fundo,
Campo Bom e Portão).
O que se encerra em 2013 são os contratos dos sete polos de pedágio
que o governo gaúcho concedeu à iniciativa privada em 1998. Trata-se de
1,8 mil quilômetros de rodovias pedagiadas, dos quais a Univias –
através das empresas Metrovias, Sulvias e Convias – administra 1 mil
quilômetros.
O advogado da Univias, Ricardo Breier, alerta que a concessionária
irá entrar na Justiça para buscar o pagamento de um desequilíbrio
contratual. Vários órgãos públicos apresentam diferentes números para
essa dívida, mas a Univias adota o maior valor, calculado pela Agência
Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que estima o desequilíbrio em
R$ 1,7 bilhão.
“O Estado só pode cancelar esse contrato sem pensar em outras
alternativas quando pagar o desequilíbrio”, garante Breier. Ele diz que,
por questões políticas, o governo gaúcho se nega a renovar a parceria.
“Por uma questão política, o governo segue refém do passado. Quando foi
oposição (o PT) sempre barrou qualquer forma de prorrogação dos
contratos”, lembra. O advogado assegura que a Univias “continua querendo
negociar”, mas que não abrirá mão de cobrar judicialmente os valores
que acredita lhe serem devidos.
O secretário de Infraestrutura e Logística, Beto Albuquerque (PSB),
minimiza a polêmica. “Cada um tem o direito de espernear sobre o que
acha que tem direito. Concessão se encerra na data marcada, qualquer
discussão sobre um eventual desequilíbrio pode ser feita na Justiça, que
é o lugar certo para arbitrar esse tipo de dívida”, comenta.
O socialista informa, ainda, que o governo está fazendo um
levantamento patrimonial para apurar a gestão das estradas pela
iniciativa privada e cobrar possíveis medidas contratuais que não teriam
sido efetuadas. “Há rodovias que deveriam ter recebido uma terceira
faixa, por exemplo. Vamos avaliar quais são os desequilíbrios em favor
da sociedade”, avisa.