quinta-feira, 10 de maio de 2012

Yvonne Maggie: falsificação de citações, adulteração de arquivos e desonestidade intelectual

Idelber Avelar na REVISTA FÓRUM

Este não será um texto sobre racismo nem sobre cotas. Escrevo sobre o tema há alguns anos mas, nos últimos tempos, tenho me limitado a divulgar, admirar e comentar os textos em que, com prosa cintilante, pesquisa histórica exaustiva e sensibilidade incomum, Ana Maria Gonçalves se dedica a esmiuçar os caminhos do racismo brasileiro. Não se tratará, aqui, portanto, do já conhecido rosário do negacionismo brasileiro. Distorções e omissões várias são sua matéria cotidiana, mas o tema aqui será algo bem mais grave, a falsificação de citações e a posterior adulteração de um arquivo para tentar encobrir dita falsificação, depois que a mentira foi denunciada, aqui mesmo na Revista Fórum. O caso é sério, especialmente porque sua autora é professora numa das instituições universitárias mais respeitadas do país, a UFRJ. Não se trata de um erro ou de um engano, como se verá adiante.
Em seu texto “A constitucionalidade das cotas raciais no Brasil”, publicado no portal d’O Globo no dia 23/04, Yvonne Maggie escreveu:

Em Thirteen ways of looking at a black man, de Henry Louis Gates Junior, professor de Harvard, há uma história reveladora do que se passou depois da lei dos direitos. Neste livro, Harry Belafonte conta que alguns anos depois de 1964 fora convidado para fazer um filme. O produtor, muito animado, lhe dissera: “Harry, será maravilhoso, vamos fazer um filme dirigido e estrelado por negros, produzido por negros, com música feita por negros e vai ser belíssimo”. Ao que o ator, nervoso, respondeu: “Não quero fazer parte disso, passei tantos anos lutando para sair do gueto, não serei eu a me enfiar de novo nele”. Gates conta que durante a entrevista, após esta declaração de Harry, seguiu-se um silêncio constrangedor, só quebrado com uma sonora gargalhada do entrevistado e a seguinte frase: “Eu não aceitei a armadilha, mas é claro que Sidney Poitier aceitou e ficou rico estrelando todos aqueles filmes”.
"Esse negócio de cota não é legal!", diz o Henry Louis Gates inventado por Maggie
Pois bem, tudo o que está nesse parágrafo é falso. Nada disso se encontra no livro Thirteen ways of looking at a black man, de Henry Louis Gates. Como está longamente explicado no texto de Ana, Yvonne Maggie simplesmente atribuiu a Henry Louis Gates Jr. algo que ele jamais escreveu. Colocou entre aspas, atribuída a “um produtor”, uma frase que jamais foi dita ao ator Harry Belafonte. Atribuiu ao próprio Belafonte, ativista dos direitos civis, uma frase que ele não pronunciou, e por cuja atribuição ele com certeza poderia processar criminalmente Yvonne Maggie. A suposta paráfrase que começa com “Gates conta que …” também é falsa, e tem como predicado algo que Gates nunca contou. A frase seguinte, entre aspas e atribuída a Harry Belafonte, também é uma fabricação de Yvonne Maggie.
As falsificações têm como objetivo manipular a voz de dois negros respeitados – ambos ativistas da luta pelos direitos civis e pela cidadania afro-americana – de forma a fazer parecer que eles tivessem corroborado a fantasia de Yvonne Maggie, de que a luta pelas políticas de ação afirmativa é uma forma de “se enfiar de novo no gueto” (expressão jamais atribuída a Harry Belafonte no livro de Henry Louis Gates). Daí a falsificação das datas: as duas histórias a partir das quais Yvonne Maggie constrói sua mentira (e que tem com esta pouquíssima relação) aconteceram por volta de 1959-60. Ela adultera a data para “depois de 1964” de forma que as declarações possam parecer uma recusa da “volta ao gueto” posterior à publicação da legislação dos direitos civis nos EUA. Caso você queira saber o que realmente está escrito no livro de Henry Louis Gates, basta ler o artigo de Ana. Como se verá lá, trata-se de dois episódios, nenhum dos quais tem o conteúdo sugerido por Yvonne Maggie ou contém as frases colocadas por ela entre aspas.
O parágrafo com as falsificações, que se encontra no texto de Yvonne Maggie … Opa! Peraí. O parágrafo já não está lá! Citado por Ana no texto publicado aqui na Fórum, o trecho foi posteriormente retirado, sem qualquer aviso, justificativa ou crédito a quem havia apontado o seu “engano”. A professora da UFRJ se esqueceu de que havia escrito na Internet, onde blogueiro véio não é bobo. Já acostumados com a desonestidade intelectual do negacionismo brasileiro, fotografamos a página antes da adulteração. Eis aqui o printscreen do texto de Yvonne Maggie com a falsificação agora ocultada. É só clicar e ampliar:
 
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A professora Yvonne Maggie, portanto, não apenas adulterou citações, falsamente atribuindo a líderes negros norte-americanos frases que eles jamais disseram. Quando pega na mentira, adulterou o arquivo que ela mesma havia escrito, sem qualquer reconhecimento da falsificação. Não deixa de ser uma estratégia comum do negacionismo brasileiro: apagar, “branquear” as marcas da barbárie.

Depois do pós-neoliberalismo: um socialismo com características latino-americanas?


  Fernando Marcelino no CORREIO DA CIDADANIA   

O ciclo hegemônico neoliberal do capitalismo, que começou nos anos 1970, agora está em todo o mundo, no mínimo, capengando.

Podemos dizer que o “neoliberalismo realmente existente” começou a tomar maiores desdobramentos com o fim do sistema de Bretton Woods, na crise dos anos 1970, com a liberalização e desregulamentação dos mercados financeiros, os ataques ao papel intervencionista do Estado na formação de preços e políticas de privatização e flexibilização das relações de trabalho.

Além disso, as políticas neoliberais compreendiam a financeirização das corporações e a especulação financeira como elementos importantes na maximização dos lucros, e a segmentação dos elos das cadeias produtivas das corporações e sua re-localização em países e regiões que oferecessem melhores condições de mão-de-obra barata, infra-estrutura menos onerosa e estabilidade política e social. Nesse período a ortodoxia neoliberal passou a dominar as instituições financeiras internacionais, como o FMI e o Banco Mundial, tornando-se os principais agentes na promoção das políticas de “ajustes estruturais”.

Já no final da década de 1980 a “onda neoliberal” parecia perder o ímpeto, em razão de sua incapacidade de transformar as conquistas iniciais na consecução de seu principal objetivo programático: promover uma reanimação do capitalismo avançado mundial. Com o fim da URSS e o colapso do socialismo real o neoliberalismo ganhou um novo respiro, com uma possibilidade de expansão única num período de “fim da história” em que “não há alternativa”. Sua ideologia se disseminou: a vitória do Ocidente na guerra fria, com o fim da URSS, não foi o triunfo de qualquer capitalismo, mas do “capitalismo neoliberal”.

Neste momento o neoliberalismo encontrou uma conjuntura social tão favorável que lhe foi permitido espalhar-se rapidamente por todas as regiões (e quase todos os países) do mundo: além de reafirmar sua hegemonia nos países capitalistas avançados, tomou de assalto o Leste Europeu, a América Latina, África e parte da Ásia. Foi precisamente neste período que ocorreu a consolidação do neoliberalismo, a vitória do pensamento neoliberal no plano político-ideológico.

Na década de 1990, os países latino-americanos, em sua grande maioria, adotaram práticas de cunho neoliberal em seus sistemas sócio-econômicos, políticos e ideológicos. Além do Chile, Bolívia, México, Argentina e Venezuela, países pioneiros na implantação do regime, o neoliberalismo surgiu no Brasil em momento crítico à política nacional-desenvolvimentista. Após a crise da dívida, diversas tentativas de estabilização inflacionária, fracassos dos planos econômicos, o projeto neoliberal foi ganhando espaço político no país. No Brasil, o neoliberalismo nasceu associado à abertura econômica e à democratização, culminando com a derrota do protecionismo e com a diminuição dos direitos trabalhistas provenientes do populismo. As orientações neoliberais foram acolhidas por amplos setores da sociedade brasileira, de governantes e empresários a lideranças do movimento popular e sindical, além de intelectuais. Embora desde a década de 1980 as medidas neoliberais tenham sido aplicadas no Brasil, a ofensiva maior ocorreu durante o governo de Fernando Henrique Cardoso.

Na América Latina, o século XXI começou com um período de prolongada instabilidade frente ao esgotamento do neoliberalismo e as dificuldades de construção de projetos alternativos. O ciclo de crises regionais, da crise mexicana de 1994, brasileira em 1999 e argentina em 2000, configuraram a ampla crise ideológica do neoliberalismo – diferentemente do que está ocorrendo agora na Europa.

A expansão descontrolada do neoliberalismo na América Latina precipitou rapidamente sua crise de legitimação pela desregulamentação dos mercados de trabalho, entreguismo e privatização generalizada de setores estratégicos da economia nacional, ataques aos movimentos sociais combativos e sucateamento estatal.

Da crise de legitimidade prematura do neoliberalismo periférico latino-americano abriram-se diversos espaços de disputa política para a construção de alternativas “pós-neoliberais”.

Para Emir Sader, existem duas vertentes do campo pós-neoliberal na América Latina: Brasil, Argentina, Uruguai por um lado, e Venezuela, Bolívia e Equador por outro. Na primeira existiriam governos anti-neoliberais, cujas políticas buscam a superação desse modelo; na segunda existiriam governos também com a pretensão de ser anticapitalista. Para ambas vertentes, o principal eixo político da América Latina seria o enfrentamento entre o neoliberalismo e o pós-neoliberalismo. Comentando este processo a partir do Brasil, Sader escreve:

“Sem uma estratégia pré-definida, Lula buscou avançar pelas linhas de menor resistência. Centrou seu governo em dois eixos fundamentais, que o diferenciou dos governos neoliberais e o aproximou dos novos governos latino-americanos. Eixos que representam os elos mais frágeis do neoliberalismo: a prioridade das políticas sociais ao invés da do ajuste fiscal e a prioridade dos processos de integração regional em lugar dos Tratados de Livre Comércio com os Estados Unidos. São essas as duas características comuns aos governos latino-americanos que podemos caracterizar como pós-neoliberais. É o caso da Venezuela, do Brasil, da Argentina, do Uruguai, da Bolívia e do Equador, que em seu conjunto mudaram a fisionomia do continente e se constituem no único núcleo regional atual de resistência ao neoliberalismo”.

Atualmente existem governos pós-neoliberais na maioria dos países sul-americanos e nos países centro-americanos. Portanto, por mais que o neoliberalismo permaneça hegemônico em grandes partes do mundo, o pós-neoliberalismo já apresenta amostras em alguns países latino-americanos, seja pelo viés do pós-neoliberalismo lulista ou pelo viés (ainda incipiente) anticapitalista.

No caso de Venezuela, Bolívia e Equador, esses governos, em maior ou menor grau, optaram por políticas de confronto explícito com o ideário e os agentes neoliberais, colocando em marcha políticas de caráter anti-neoliberal e politizando setores que eram excluídos da cena política, incentivando amplos processos de transformação social. Essa experiência, assim como todas da humanidade, não está livre de contradições. O “pós-neoliberalismo bolivariano” executado na Venezuela, por exemplo, depende do lucro do
comércio do petróleo para o financiamento do Estado, conferindo à economia do país um elevado grau de volatilidade, devido às flutuações do mercado internacional. Por não haver diversificação do aparelho produtivo nacional, o país continua refém das oscilações do preço do petróleo para a efetivação dos programas sociais. Entretanto, o “pós-neoliberalismo bolivariano” é marcado pela intervenção estatal na politização e mobilização das favelas, organizando unidades militares, incentivando a organização política nas bases da sociedade, diferentemente do “pós-neoliberalismo lulista” que amplia o descrédito do espaço político e cultural, considerando o desenvolvimento do capitalismo como foco principal no desenvolvimento da América Latina.

No caso do Brasil, o governo pós-neoliberal seria capaz de dar o salto estratégico para aumentar o controle dos capitalistas e do mercado impulsionando novas polarizações políticas, sociais e culturais rumo ao encontro com um novo horizonte latino-americano? Afinal, é compatível articular estas transformações sem fazer mudanças que limitem o poder dos capitalistas e da “canalha ilustre” do Estado, mantendo a dívida da “governabilidade de coalizão”? Haveria disposição política de fazer isso e colocar em jogo a conciliação de classes existente para impulsionar tal tipo de reformas pós-neoliberais? Teriam os governos de centro-esquerda na região capacidade de enfrentar os monopólios e oligopólios capitalistas e dar um salto estratégico do pós-neoliberalismo ao socialismo?

Se for correto utilizar o termo “pós-neoliberalismo” para as experiências dos novos governos progressistas que subiram ao poder principalmente pelo vazio político constituído pelo esgotamento social da hegemonia neoliberal, é decisivo encontrar os limites e contradições destas experiências. Minimizar tais contradições é um profundo erro político, um verdadeiro desvio na articulação de um projeto de emancipação popular.

Estes complexos processos pós-neoliberais, que ainda necessitam demonstrar porque podem ser alternativas reais considerando as possíveis formas de regresso do neoliberalismo, não devem ser confundidos com uma transição pós-capitalista.

Nossa pergunta é: quando vamos conseguir tocar na questão de fundo de qualquer transformação pós-capitalista, no caso, os meios de produção?

Em nosso momento, é urgente colocar na ordem do dia um caminho de desenvolvimento que não seja exclusivamente capitalista para o pós-neoliberalismo, uma transição que afete as estruturas oligárquicas e que avance na criação de formas de propriedade que possam se transformar em formas socialistas.

Um projeto do pós-neoliberalismo ao socialismo depende de potencializar a descentralização e a autonomia das empresas e unidades produtivas e, ao mesmo tempo, que faça possível a efetiva coordenação das grandes orientações da política econômica. Um socialismo que promova diversas formas de propriedade social, desde empresas cooperativas até empresas estatais e associações destas com capitais privados, passando por um amplo leque de formas intermediárias nas quais trabalhadores, consumidores e técnicos estatais se combinem de diversas formas para engendrar novas relações de propriedade sujeitas ao controle popular, sem confundir propriedade pública com propriedade estatal.

A dinâmica das diversas formas de propriedade num processo de transição socialista deve deixar claro que a propriedade privada não seria o fator determinante numa economia de mercado predominantemente socializada.

Para lidar com o mercado se impõe um nível de planejamento mais flexível, mas que delimita progressivamente o comportamento do setor privado na economia pela modernização da propriedade estatal e cooperativa. O Socialismo de Mercado, assim, não é para o mercado manter suas relações caóticas e anárquicas, mas para utilizar os mecanismos dos mercados numa melhor alocação dos recursos e estimular a competição entre os capitais, visando alcançar os limites do capitalismo junto com uma transição socialista que prevê o controle da reprodução social pelos produtores associados de diversas formas que se sustentem reciprocamente. O objetivo é uma transição em que o capital se oponha a este processo com uma posição historicamente retrógrada e insustentável devido ao dinamismo das propriedades públicas, estatais e não estatais, com um sistema orgânico entre produção e distribuição, descentralização do poder político e radical transgressão da divisão social hierárquica do trabalho.

Esse “socialismo de mercado com características latino-americanas” seria uma forma de superar o neoliberalismo aprofundando a coexistência de formas de propriedade estatal, pública não-estatal, cooperativas, empreendimentos de economia solidária e de propriedade privada com diversos mecanismos de controle dos trabalhadores, consumidores e técnicos, descentralizando os poderes de decisão e a produção/circulação de conhecimentos de forma material e imaterial. Superar a antinomia falsa entre planificação socialista e o mercado faz parte deste processo de transição, ainda mais quando os objetos veiculados pelo mercado são materiais e imateriais. Qualquer socialismo de mercado depende de ampla e complexa planificação. Um socialismo de mercado não é uma convivência pacífica com o mercado dominado pelo capitalismo. Não devemos confundir mais capitalismo ou “livre iniciativa” com mercado.

Qualquer socialismo demanda formas de controle dos elementos que produzem o mercado. Devemos mostrar que é possível um mercado sem a dominação da propriedade privada. Claro que um dos objetivos do socialismo é suprimir o mercado, mas isso não se dará de maneira imediata por decreto, estatização total ou isolamento num só país, mas pelas próprias contradições do mercado mundial. É a partir daí que podemos buscar elementos mínimos para elaborar o projeto de um socialismo com características latino-americanas que, felizmente, ainda está trilhando apenas seus primeiros passos. Obviamente, não se trata de um experimento simples.

Fernando Marcelino é economista.

Dr. Rosinha: “Alguns segmentos da imprensa terão de ser investigados, sim”



por Conceição Lemes no VIOMUNDO

Deu no Painel, da Folha de S. Paulo, dessa quarta-feira, 9 de maio.

O deputado federal Dr. Rosinha (PT-PR), um dos “soldados” citados,  estranhou a nota.
“Eu não sei de nenhuma reunião secreta na liderança do PT do Senado. E se houve, não participei”, diz. “E não tendo participado, fui escalado, segundo a Folha. Só que até agora eu não fui avisado, a não ser pelo Painel.”

“O foco da CPI não será a mídia. O PT tem defendido que o foco seja a organização criminosa comandada pelo Carlos Cachoeira”, afirma. “E se a investigação revelar que essa organização tem tentáculos, braços, nós vamos investigá-los. Portanto, se tiver algum órgão de imprensa envolvido, esse tentáculo também será investigado.”

“Se alguém disse a frase ‘se a mídia quer guerra, ela vai ter guerra’, não saiu de ninguém do PT de reunião em que eu tenha participado. Até porque o nosso objetivo não é a imprensa, mas a organização criminosa do Cachoeira”, reitera. “Agora, se algum jornalista ou empresa de comunicação tiver algum problema identificado, será investigado como qualquer suspeito de crime.”
Nós entrevistamos o Dr. Rosinha no final da noite dessa quarta-feira 9. Ele é suplente da CPI do Cachoeira. O suplente, ao contrário dos muitos imaginam, pode fazer tudo — ter acesso aos documentos sigilosos, questionar os depoentes, se manifestar — , exceto votar, se o titular estiver presente. E quando o titular se ausenta, o suplente vota também.
Na terça-feira, o Dr. Rosinha participou da sessão secreta da CPI que ouviu o depoimento do delegado da Polícia Federal (PF) Raul Alexandre Marques Souza, que comandou a Operação Vegas.

Viomundo – Os documentos já vazados da Operação Monte Carlo indicam que o esquema do bicheiro Carlinhos Cachoeira teria um braço na mídia. O que achou das revelações nesse setor até agora?

Dr. Rosinha – Oficialmente, dentro da CPI, ainda há muito pouca coisa nessa área . Nós tivemos o primeiro depoimento – o do delegado da Vegas — na terça-feira. E os documentos que chegaram à Câmara, ainda não deu tempo para analisarmos.
De modo que tudo o que saiu sobre a imprensa e a organização criminosa do Cachoeira foi publicado por outros veículos da imprensa. Mas o pouco que ouvi na terça-feira do delegado da Polícia Federal, alguns segmentos da imprensa terão de ser investigados, sim

Viomundo — O que o senhor ouviu?

Dr. Rosinha – Eu não posso revelar, porque a reunião foi secreta. Mas o delegado disse que há mais de um jornalista citado nas escutas telefônicas do Cachoeira. Lembre-se de que ele falou apenas sobre a Operação Vegas.

Viomundo – É só a Veja ou há mais veículos citados nos grampos da Operação Vegas?

 Dr. Rosinha – Tem mais veículos envolvidos.

Viomundo – Quer dizer que o delegado abordou, mesmo, a participação da mídia no esquema do Cachoeira?

Dr. Rosinha — A sessão de terça foi sobre a investigação e as escutas telefônicas da Operação Vegas. Nas gravações com o Cachoeira, segundo o delegado, foram feitas referências a três jornalistas de veículos diferentes.

Viomundo – Quantos veículos?

Dr. Rosinha – Foram citados três jornalistas de três veículos diferentes. Nós, agora, vamos continuar a apuração. Se forem mantidas as informações que ouvimos, cabe investigação.

Viomundo – Tanto o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, quanto a mídia estão batendo na mesma tecla: a convocação dele para depor na CPI seria uma manobra para desviar a atenção do chamado mensalão. O que acha dessa teoria?

Dr. Rosinha – O chamado mensalão está no STF e não mais na Procuradoria Geral da República. O STF vai fazer o julgamento no momento em que julgar que está tudo preparado para fazê-lo.
Eu não entrei nessa CPI para vingar absolutamente nada. Nem ninguém. Eu assim como todos os demais petistas integrantes da CPI – e nós conversamos sobre isso — entramos nela, porque existe uma organização criminosa que tem de ser investigada.
Se o procurador for convocado, não tem nada a ver com o chamado mensalão. Tem a ver com o fato de ele ter ficado mais de dois anos sem dar encaminhamento ao relatório da Operação Vegas, da Polícia Federal. Ele não mandou arquivar nem tocou adiante. Por que ele fez isso? Essa explicação ele deve não para a CPI, ele deve para toda a sociedade. Afinal, enquanto ele ficou sem dar continuidade ao relatório da Vegas, o crime organizado foi mantido. Na verdade, essa atitude dele contribuiu para que demorasse ainda mais a investigação.

Viomundo – Caso a CPI do Cachoeira convoque algum jornalista para depor, a mídia dirá que é um atentado à liberdade de imprensa e à liberdade de expressão. O que acha disso?

Dr. Rosinha — Quer dizer que jornalista não pode ser investigado? Cada vez que um jornalista é investigado é censura, é atentado à liberdade de imprensa? Aí, eu estaria dizendo que jornalistas, de uma maneira geral, poderiam cometer crimes. Isso é um desvio de atenção. É querer se resguardar de qualquer tipo de investigação.
O Murdoch que o diga na Inglaterra. É algo muito semelhante. A empresa do Murdoch grampeou telefones. O que se tem até agora é que o jornalista da Veja, o Policarpo Jr., usou material de telefones grampeados ilegalmente, como fez o pessoal do Murdoch, na Inglaterra.
O jornalista da Veja sabia ou não que o material era proveniente de grampo ilegal? Bem, a suspeita de que ele sabia é muito forte. Isso tem que ser investigado, porque se confirmada essa prática, ficará caracterizado crime   muito semelhante ao que tinha na Inglaterra.
Agora isso não é censura. Vão dizer que na Inglaterra estava tendo censura? Não estava, estava tendo investigação. Então, no Brasil, eu acho que a CPI tem de ter a liberdade de investigar todos os cidadãos e cidadãs sobre os quais forem levantadas suspeitas.

Viomundo – Então todo suspeito será investigado?

Dr. Rosinha – Todas as conversas que estamos tendo são no sentido de focar no crime organizado. Toda vez que houve CPI, dois ou três deputados eram a festa da mídia. E o corruptor, você se lembra de quantos foram punidos? NENHUM!
Agora, há um corruptor, que é do crime organizado, com empresas legais. Afinal, ele tem de lavar o dinheiro. Acho que é um grande momento na República para se investigar tudo isso.
Não se trata de tirar o foco de políticos. Mas ver que tem um segmento importante que manda no Estado brasileiro. Ele tem poder no Parlamento – já está aí o caso do senador. Tem poder na polícia – já tem o policial federal preso. Tem poder no Executivo. E tem poder na mídia. É como a máfia italiana que está em tudo.