sexta-feira, 25 de abril de 2008

"O cofre nunca lhe caiu nos pés"


Imaginem a seguinte situação. Final de 1998. Olívio Dutra é eleito governador do Estado. Em dezembro do mesmo ano, decide sair do pequeno apartamento onde mora na Avenida Assis Brasil, zona norte de Porto Alegre e desembolsa R$ 750 mil por uma casa de dois pisos em uma área nobre da capital. Tudo isso logo depois da campanha eleitoral.

Prossigamos nosso exercício imaginativo. Olívio assume em 1999 e, após dez meses de governo, um de seus coordenadores de campanha (que ajudou na arrecadação de fundos) é preso pela Polícia Federal, acusado de liderar um esquema de desvio de dinheiro público no Detran. Acaba indiciado pela PF sob as acusações de formação de quadrilha e prática de crime organizado. Outros importantes aliados do governo são presos e indiciados no mesmo caso.

Na Assembléia Legislativa é criada uma CPI para investigar o caso. Durante uma das sessões, um deputado pergunta a um depoente, citando o depoimento de um delegado de polícia, se ele tinha conhecimento da compra de uma casa no final da campanha eleitoral com sobras de campanha. O que estaria acontecendo com Olívio Dutra agora, se tudo isso tivesse acontecido?

Fim do exercício imaginativo. Voltemos à realidade.

Reza a sabedoria romana que à mulher de César não basta ser honesta, ela também tem que parecer honesta. Por enquanto não há provas que a governadora Yeda Crusius comprou uma casa com sobras de campanha. No entanto, os eventos que cercam o caso - e que serviram de inspiração para o exercício acima – tornam razoável exigir maiores informações sobre o caso. Agora, a governadora resolve partir para o ataque e ameaça processar o presidente da CPI do Detran, deputado Fabiano Pereira (PT), por este levantar suspeitas sobre a compra da casa.

Yeda aposta que o cordão sanitário que vem sendo construído em torno de sua figura evitará qualquer investigação sobre o caso. As declarações do delegado de polícia (aliás, ex-chefe de Polícia que teve uma participação decisiva na CPI da Segurança, em 2001) são minimizadas pela imprensa. A governadora mostra-se indignada. No seu governo, prega austeridade. Não hesita em demitir servidores, fechar escolas e corais infantis em nome dessa austeridade. E chama isso de coragem.

Na vida privada, comporta-se como qualquer novo rico que, ao ascender na vida, troca de casa, de carro, compra uma lancha, coisas do tipo. A coragem e a austeridade que cultua só se aplicam quando é o caso de fechar algum serviço público que atende à população mais pobre do Estado. A generosidade, ela guarda para as grandes empresas e para si mesma.

Em tempo: Olívio Dutra continua morando em seu pequeno apartamento na Avenida Assis Brasil, que comprou com os salários que recebeu como funcionário do Banrisul. Como disse Adão Oliveira, em um artigo publicado no Jornal do Comércio (17/08/2005), “o cofre nunca lhe caiu nos pés”.

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