Criminalizar movimentos sociais é atentado contra democracia
Os movimentos sociais são pilares da democracia e qualquer tentativa de criminalizá-los é um atentado contra a própria democracia e um retrocesso nas conquistas garantidas pela Constituição de 1988. Esse foi o cerne dos discursos na audiência pública sobre criminalização dos movimentos sociais, realizada pela Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados, na tarde desta quarta-feira (9).
A Comissão de Legislação Participativa reuniu representantes da CNBB, OAB, Via Campesina, Quilombolas, Indígenas e do Movimento Nacional de Direitos Humanos, que se revezaram em palavras de defesa dos movimentos sociais.
O secretário Especial de Direitos Humanos, ministro Paulo Vannuchi, mandou representante para acompanhar toda a audiência, mas foi ele mesmo dizer que se associa ''a todo alerta e preocupação com a implantação de onda contra os movimentos sociais'', acrescentando que a Secretaria de Direitos Humanos tem completa identidade com os episódios ocorridos no Rio Grande do Sul, ''que exigem respostas fortes e urgentes''.
O ministro se referia ao caso que provocou a audiência pública: no último dia 24 de junho, o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Passo Fundo (RS), Leandro Scalabrin – que também participou da audiência - divulgou documentos que comprovam a tentativa do Ministério Público daquele estado de ''dissolver'' o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
O documento, comprovado por uma ata da sessão ordinária do Conselho do MP/RS, ocorrida em 3 de dezembro de 2007, defende medidas para declarar a ilegalidade do MST, como proibir qualquer deslocamento de trabalhadores sem-terras, incluindo marchas e caminhadas, intervir em escolas de assentamentos, criminalizar lideranças e integrantes, cassar os títulos eleitorais de todos os membros do movimento e ''desativar'' todos os acampamentos do Rio Grande do Sul.
Crise tucana
O ministro Paulo Vannuchi ressaltou que nem todo o Ministério Público do Rio Grande do Sul é ''sectário'' e sugeriu que o caso fosse levado ao Conselho Nacional de Justiça. Ele atribui ''o desviamento democrático'' do Ministério Público do Rio Grande do Sul à crise institucional do governo estadual da tucana Yeda Crusius, acusado de fraudes.
Para a ex-ministra e senadora Marina Silva, que esteve presente à audiência, ''a sociedade tem o direito de se organizar e se manifestar para reparar as injustiças históricas que são cometidas contra segmentos sociais como os indígenas, os quilombolas e os trabalhadores sem terra''.
Ela alertou para a importância do Poder Legislativo mediar esses conflitos, ''sob o risco de validar essas injustiças'', destacou. Lembrando o exemplo do líder seringueiro Chico Mendes, que foi morto na luta contra o desmatamento da floresta amazônica, ela disse que ''não se pode inviabilizar o direito de protestar, se manifestar e reivindicar direitos''.
Desqualificação pública
O representante do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), Gilson Cardoso, denunciou que ''movimentos como um todo estão respondendo a processos judiciais e ainda são desqualificados publicamente. Pode-se dizer que houve uma agudização dos conflitos, se antes as manifestações públicas, ocupações de terra, e de moradia, a luta contra violência policial geravam repressão, hoje setores do Estado respondem com a utilização da judicialização indevida e buscam institucionalizar e dar legitimidade a esta criminalização'', afirmou.
Para ele, ''esse conjunto de situações trouxe para dentro dos poderes públicos a versão de que movimentos e suas lideranças cometem crimes, colocando a sociedade contra os movimentos sociais'', anunciando que a decisão é de ''radicalizar a luta por democracia e direitos humanos''. E, para isso, disse que contava com a unidade de todo o movimento.
Outros estados
Para o presidente da comissão, deputado Adão Pretto (PT-RS), o problema não atinge apenas os gaúchos, tendo reflexos em todo o país e na própria noção de democracia e participação popular.
Ele contou que no dia 12 de junho, o juiz da Justiça Federal de Marabá (PA), Carlos Henrique Haddad, condenou o advogado da Comissão Pastoral da Terra, José Batista Gonçalves a uma pena de dois anos e cinco meses de prisão por assessorar movimentos camponeses durante uma negociação com o Incra daquela região, logo após um protesto de agricultores sem terra organizados pela Contag, MST e Fetragri.
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