Breno Altman, em Opera Mundi
Os jornais de hoje (17) estampam declaração do presidente da
Sociedade Interamericana de Imprensa, Alejandro Aguirre, afirmando que o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva “não pode ser chamado de
democrático”. O ataque se estende aos demais países da região que são
administrados por partidos de esquerda. Esses governos, de acordo com o
dirigente da SIP, “se beneficiam de eleições livres para destruir as
instituições democráticas”.
Certamente é importante, para os leitores, conhecer a história dessa
entidade antes de julgar a credibilidade das declarações de seu
principal dirigente. Fundada nos Estados Unidos em 1946, a SIP teve
papel fundamental durante a Guerra Fria. Empenhou-se com afinco a
etiquetar como “antidemocráticos” os governos latino-americanos que não
se alinhavam com a Casa Branca. Constituiu-se em peça decisiva da guerra
psicológica que antecedeu os levantes militares no continente entre os
anos 60 e 80.
Orgulha-se de reunir 1,3 mil publicações das Américas, com 40 milhões
de leitores. Entre seus membros mais destacados, por exemplo, está o
diário chileno El Mercurio, comprometido até a medula com a
derrubada do presidente constitucional Salvador Allende, em 1973, e a
ditadura do general Augusto Pinochet
Outros jornais filiados são os argentinos La Nación e El
Clarín, apoiadores de primeira hora do golpe sanguinário de 1976,
liderado por Jorge Videla. Aliás, suspeita-se que a dona desse último
periódico recebeu como recompensa um casal de bebês roubado de seus pais
desaparecidos.
A lista é interminável. O vetusto diário da família Mesquita,
Estado de S.Paulo, também foi militante estridente das fileiras
anticonstitucionais, clamando e aplaudindo, em 1964, complô contra o
presidente João Goulart. Mas não foi atitude solitária: outros grupos
brasileiros de comunicação, quase todos também inscritos na SIP,
seguiram a mesma trilha golpista.
Os feitos dessa organização, entretanto, não são registros de um
passado longínquo. Ou é possível esquecer a histeria da imprensa
venezuelana, em abril de 2002, no apoio ao golpe contra o presidente
Hugo Chávez? Naquela oportunidade, a SIP não deixou por menos: a maioria
de seus filiados foi cúmplice da subversão oligárquica em Caracas.
Uma trajetória dessas é para deixar até o mais crédulo com as barbas
de molho. Qual a autoridade dos dirigentes dessa agremiação para falar
em democracia, com sua biografia banhada na lama e no sangue? O que
fazem é se aproveitar dos espaços públicos sobre os quais exercem
propriedade privada para conspirar, agredir e manipular.
Ainda mais quando apelam à calúnia. A imensa maioria dos veículos de
imprensa no Brasil dedica-se à desabusada oposição contra o presidente
Lula e seu partido. Nenhuma publicação dessas foi fechada ou censurada
por iniciativa de governo. Circulam livremente, apesar de muitos terem
atravessado o Rubicão que separa o jornalismo da propaganda política,
violando as mais comezinhas regras de equilíbrio editorial.
As palavras do presidente da Sociedade Interamericana de Imprensa,
dessa forma, devem ser compreendidas através do código genético de
Aguirre e seus pares. Hoje, como antes, atacam os governos progressistas
porque desejam sua desestabilização e derrocada. Insatisfeitos com os
resultados e as perspectivas eleitorais de aliados políticos, tratam de
vitaminá-los com factóides de seu velho arsenal.
A história do presidente Lula, afinal, é de absoluto respeito à
Constituição e à democracia. O mesmo não pode ser dito da SIP, cujas
impressões digitais estão gravadas na história dos golpes e ditaduras
que infelicitaram a América Latina.
(*) Breno Altman é jornalista e diretor
editorial do site Opera Mundi.
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