terça-feira, 28 de setembro de 2010

Gilmar Mauro: ‘MST não será refém do próximo governo’

  Gabriel Brito e Valéria Nader, da Redação do Correio da Cidadania  
 
Às vésperas do pleito presidencial mais vazio de idéias desde tempos imemoriais, os movimentos sociais e a esquerda do país vão se deparar com um novo período de suas lutas. Necessitam fazer uma ampla reflexão sobre as derrotas acumuladas, que, ao contrário do que se esperava, foram aprofundadas no período Lula. Esse é o pensamento de Gilmar Mauro, dirigente do MST, em entrevista ao Correio da Cidadania, na qual também explicou a postura do movimento na eleição e a polêmica em torno de um possível apoio velado de suas lideranças à candidatura petista.

 
Gilmar argumenta que o MST não declarou apoio a candidato algum no primeiro turno por conta do enfraquecimento político e social da esquerda. De modo que o movimento não é capaz de impedir que grande parte de suas bases opte por Dilma, ainda que o governo Lula, como também aponta, não tenha chegado sequer perto de promover a reforma agrária. Para ele, a única diferença de Lula com Serra é a menor intolerância ao diálogo com o movimento social (o que crer se aplicar também em São Paulo, na disputa entre Alckmin e Mercadante).
 
Para Gilmar, é justamente essa retração da esquerda, imposta por falhas próprias e também pela vitória do lulismo, que deixou o movimento numa posição "complicada" para tomar partido de candidatos mais alinhados ao projeto de reforma agrária defendido pelo MST, como Plínio Arruda Sampaio (responsável pelo plano de reforma agrária de Lula em 2003, posteriormente engavetado) e outros da esquerda socialista. Além disso, lembra que os sem terra e a reforma agrária possuem apoios em diversos outros partidos.
 
Até pela difícil posição em que se encontra o movimento nas eleições deste ano, Gilmar ressalta que o principal debate a ser feito na esquerda diz respeito à sua própria reconstrução, de forma mais unitária, antes de qualquer novo projeto ou programa a ser anunciado. Só após extensa autocrítica e a conjunção de todos esses fatores, conclui, as forças não privilegiadas pela ordem poderão voltar a encarar o capital em todas as suas variadas vertentes, inclusive para um dia alcançarem a reforma agrária.
 
Correio da Cidadania: No atual momento histórico de completa supremacia do agronegócio no campo, com seus laços com grandes e poderosos setores das finanças, indústrias e política, que reforma agrária você considera possível e necessária?
 
Gilmar Mauro: Eu acho que é preciso repensar a reforma agrária e hoje ela depende de um amplo debate na sociedade brasileira. E a sociedade terá de discutir que tipo de uso quer dar ao solo, aos recursos naturais, água, biodiversidade e todo o subsolo.
 
Em segundo lugar, teremos de decidir que tipo de comida vamos querer daqui por diante. Se optarmos por manter o atual uso do solo brasileiro para produzir commodities e exportá-las, utilizando agroquímicos em grande escala, realmente não precisamos de reforma agrária.
 
E o terceiro aspecto é o paradigma tecnológico que queremos para o futuro. Ninguém está falando em volta ao passado, movimento budista de acabar com as máquinas, mas a tecnologia precisa estar a serviço humanidade. É evidente que deve haver produção para atender às demandas, sejam de alimentação ou de matéria-prima, mas com tecnologias de impacto ambiental não tão grande quanto as que estão sendo usadas, ajudando a diminuir a penosidade do trabalho, do que ninguém discorda também.
 
Evidentemente, vamos continuar ocupando terras, porque tem gente querendo ser assentada e trabalhar. No entanto, mais além do MST, tal debate precisa ser jogado à sociedade, pois, se ela não discutir e colocar sua opinião, não há reforma agrária viável dentro do modelo que está sendo aplicado no momento.
 
Correio da Cidadania: Lula chegou perto de alcançar algum desses objetivos nos moldes defendidos pelos movimentos camponeses?
 
Gilmar Mauro: Não, na verdade, o que temos hoje são políticas agrárias e de assentamentos. Não podemos falar de reforma agrária no país. Existem assentamentos, fruto de pressão, regularizações fundiárias, mas do ponto de vista da concentração fundiária está tudo intacto, ou seja, 1% dos proprietários detém 46% das terras. E do ponto de vista do modelo e da produção agrícola, exportação de commodities, ampliou-se o modelo historicamente construído no país.
 
Temos pequenas melhorias na agricultura familiar, alguma coisinha em crédito, merenda escolar, que possibilitam à pequena agricultura algum tipo de renda, mas não podemos falar de reforma agrária. Embora tenham sido assentadas algumas centenas de milhares de famílias, não se alterou em nada a estrutura fundiária brasileira. Se quisermos falar de reforma agrária de fato, é preciso mudar o modelo e a estrutura fundiária brasileira, o que não ocorreu até hoje na história do país.
 
Correio da Cidadania: Dirigentes do movimento passaram os últimos anos fazendo duras críticas ao abandono a que o governo Lula relegou as políticas agrárias defendidas pelo PT ao longo dos anos. No entanto, recentemente, alguns líderes mostraram alguma inclinação pela candidatura de Dilma em relação à de Serra. Como você avalia estes posicionamentos?
 
Gilmar Mauro: O MST, e prefiro falar daquilo que foi decidido pela direção, adotou uma postura de não apoio a nenhum candidato, tanto a presidente como a governador e outros cargos. Isso entendendo uma série de questões que relacionamos do ponto de vista da reforma agrária e um leque bastante amplo de partidos, que vão desde a esquerda socialista, revolucionária, até setores, digamos, democratas, republicanos. Temos apoio na causa em setores do PMDB, do PDT e assim por diante.
 
Assim, o MST optou por não tomar posição em favor de algum candidato neste primeiro turno das eleições. Até para preservar as alianças que construímos historicamente e a perspectiva, inclusive, de reconstrução de uma esquerda progressista no próximo período. Acho que, neste momento histórico, as condições não foram propícias em termos de unificação das candidaturas de esquerda. Mas é este o nosso tempo histórico e não podemos mais ficar chorando o leite derramado. Temos de aprender as lições desse processo todo na esquerda brasileira e pensar o próximo período. Os desafios estão postos para que se pense na reconstituição política de uma esquerda de fato em nosso país.
 
Correio da Cidadania: Essa postura de não declarar apoio a nenhum candidato iria de encontro à idéia sempre frisada de manter a autonomia do movimento, mesmo com essas novas demonstrações de simpatia relativamente à vitória petista?
 
Gilmar Mauro: Exatamente. Porque, independentemente de qualquer coisa, uma reforma agrária de fato, que altere toda a estrutura fundiária brasileira, pensando em novos paradigmas, de produção, tecnologia e modelo, só se realizará na medida em que as forças populares tiverem um protagonismo muito maior.
 
E estamos vivendo um momento de crise, com enfraquecimento dos setores sociais, perda de força política. Posso falar até pelo MST: creio que houve uma perda de força política e social no último período. E o mesmo tem ocorrido nos movimentos urbanos, sindicais, estudantis, o que não é particularidade brasileira, mas uma realidade mundial.
 
Esse é o contexto que coloca os setores reformistas, não apenas os revolucionários, numa situação defensiva em escala internacional hoje em dia.
 
Correio da Cidadania: Em entrevista que você nos concedeu em maio, houve uma declaração de que a tendência do movimento seria ficar ao lado de quem apoiasse uma reforma agrária "profunda e radical". Como interpretar essa intenção à luz do que está agora ocorrendo de fato no que se refere ao posicionamento de dirigentes e militantes? Dilma caminharia para esta reforma profunda e radical, a seu ver?
 
Gilmar Mauro: Acho que não. Acho que nenhum governo levaria a esse caminho. Poderíamos eleger o mais radical, o Rui Costa Pimenta (PCO), que não haveria condições de fazê-la. Isso porque, sem força social e política organizada, não se consegue, a correlação de forças não permite.
 
O indicativo do MST, inclusive de acordo com o que discutiu a direção do movimento, é votar em candidatos que defendam a reforma agrária, tanto para o parlamento quanto para a principal eleição. E acho que a militância tem feito isso, apoiando candidaturas que defendam a reforma agrária e tenham um compromisso histórico com ela.
 
Inclusive, muitos militantes vão votar no Plínio. Outra parte vota no Ivan Pinheiro, também no Zé Maria, e ainda há outra parte que vota na Dilma. Acho até que, do ponto de vista das bases do movimento, a maioria vota na Dilma, embora o governo Lula tenha estado longe de fazer a reforma agrária. Houve pequenos avanços, alguns assentamentos, e uma parte de nossas bases entende que votar na Dilma é uma opção.
 
Por conta de tudo isso, o MST ficou nessa situação. Não tomamos partido, como instituição, de nenhuma candidatura, mas estimulamos o voto em quem apóia a reforma agrária.
 
Correio da Cidadania: Haveria, de fato, diferenças substanciais entre os governos Serra e Dilma na consecução da reforma agrária e no relacionamento com os movimentos sociais?
 
Gilmar Mauro: Acho que nesse caso sim. Com o Serra, nós nunca conseguimos fazer uma reunião. A única reunião que fizemos aqui foi com o chefe da Casa Civil, o Aloysio Nunes, e à boca pequena se dizia que ele não queria mesmo falar conosco. Por outro lado, tivemos vários despejos violentos (na Cutrale, por exemplo), com articulação entre o governo estadual, Rede Globo e os fazendeiros da região, buscando criminalizar o nosso movimento.
 
As investidas do Serra contra os professores, a Polícia Civil, os moradores do Jardim Pantanal, nós, sem terra, são mostras de um processo de dificuldade de diálogo do governo Serra com o movimento social. Aliás, até alguns prefeitos do PSDB com quem temos contato estão apoiando a Dilma, pois dizem que têm muita dificuldade de se reunir com o Serra. Dessa forma, parece ser da índole dele tamanha dificuldade em se relacionar, não só com o movimento social, como também com outras pessoas.
 
Não acho que, do ponto de vista do projeto político, exista tanta diferença entre os dois. Mas, pelo lado dos movimentos sociais, há sim diferença entre Serra e Dilma, principalmente no sentido de criminalizar os movimentos e pela dificuldade de ver o movimento social como parte do processo de construção e de lutas.
 
Correio da Cidadania: Ainda que existam estas diferenças entre eventuais governos Dilma ou Serra, o posicionamento mais favorável do movimento com relação à vitória petista não seria, de todo modo, um salvo-conduto à permanência de um certo imobilismo e perda de autonomia dos movimentos sociais, tão destacados pelo próprio MST ao longo dos últimos anos, nos quais Lula presidiu o Brasil?
 
Gilmar Mauro: Não, muito pelo contrário. E outra, o Movimento Sem Terra tem por princípio manter sua autonomia política. Não acredito nisso e não tenho nenhuma dúvida de que o movimento não será refém do próximo governo. Aposto todas as minhas fichas nisso, porque o movimento terá de continuar lutando pela reforma agrária. Embora a conjuntura seja adversa, a esquerda tenha pouca força, o movimento social idem, é tempo de remar contra a maré. E o MST vai continuar organizando sua base.
 
Acho que duas coisas são fundamentais: primeiramente, uma organização que não coloca como defesa principal as necessidades de sua base social é uma organização que não tem sentido, por isso muitas deixaram de existir. As pessoas se organizam a partir de suas necessidades. Portanto, o MST tem de continuar dando respostas às suas bases, com lutas, marchas, que são as necessidades corporativas da base real do MST.
 
O segundo aspecto, e quem não o entende terá dificuldade de compreender a própria luta de classes: as pessoas se organizam a partir de suas necessidades, sejam econômicas ou físicas, sejam ideológicas ou espirituais. O sujeito vai à igreja porque sente alguma necessidade. Se a organização perde isso de vista, perde o sentido, vira uma casta. E creio que o MST nunca será assim.
 
Outra coisa, a marca do MST: o movimento nunca foi conhecido internacionalmente por um bom programa, por um bom discurso, belas elaborações. Ficou conhecido internacionalmente por uma coisa: planejava e fazia. Às vezes com erros, e como movimento social cometemos muitos, mas foi isso que deu moral ao movimento diante das pessoas. O que projetou nosso movimento foi planejar e executar.
 
Evidentemente, queremos avançar também do ponto de vista teórico, de elaboração de programas, porque não basta só uma prática política relevante. É preciso ter uma teoria condizente com o processo e anseio das lutas que planejamos continuar levando adiante.
 
Correio da Cidadania: Mesmo sendo bastante compreensível todo este espectro de dificuldades na esquerda e no movimento, não poderia ter havido uma colocação mais explícita, ainda que somente no primeiro turno, em favor, por exemplo, da candidatura do PSOL, Plínio Arruda Sampaio, que sabidamente sempre se posicionou francamente a favor da reforma agrária nos moldes defendidos pelo MST, além de, ao longo das décadas, ter feito parte das entidades que lutam por esse objetivo?
 
Gilmar Mauro: Acho que o Plínio é uma grande figura nesses aspectos, a melhor entre todos os candidatos. Sempre esteve ao lado dos trabalhadores, da reforma agrária, é um grande lutador e um exemplo para a nossa militância. E apesar da idade, continua em pé, lutando, fazendo aquilo que acredita. Nem sempre o que acreditamos é o mais correto ou dá liga no momento, como é o caso da candidatura.
 
Acho que é um tempo histórico de muitas dificuldades. Tivemos dificuldades nas esferas partidárias para se chegar à unificação de uma candidatura. O PSTU, PSOL, PCO, PCB não conseguiram se unificar. É um tempo de fragmentação, isso é real, objetivo. E tempo de dificuldade inclusive de articulação dos setores de esquerda, do movimento social, para se juntar numa candidatura que catalisasse todo o descontentamento social. Eu diria que esse tempo histórico explica muito mais do que qualquer coisa.
 
Se fôssemos olhar pela base do MST, teríamos caído de cabeça na candidatura Dilma, porque a base do MST hoje é lulista. Aliás, este é um fenômeno que precisamos entender. Exagerando, Lula parece gerar mais consenso que Jesus, 94% das pessoas aprovam ou dizem que é regular o governo dele. É algo que não se imaginava.
 
Portanto, se efetivamente fizéssemos uma discussão com nossas bases, teríamos apoiado a Dilma. Porém, a militância refletiu e se questionou como iria apoiar a Dilma nas eleições abertamente, tendo o governo Lula apoiado o agronegócio, com o grande capital ganhando muito dinheiro e a reforma agrária avançando tão pouco. Não dava para sair em defesa do governo Dilma.
 
Dessa forma, optamos por não declarar apoio a ninguém no primeiro turno. Apoiar o Plínio seria uma postura mais militante. A direção tomar uma posição de apoio o Plínio ao mesmo tempo em que a base ficasse do lado da Dilma criaria uma situação difícil. É complicado. Estou sendo muito honesto aqui.
 
Sendo assim, o melhor, e acho isso mesmo, foi ter a postura de não declarar apoio oficial a nenhum candidato.
 
Correio da Cidadania: Em entrevista ao Correio este ano, o sociólogo Ricardo Antunes criticou a falta de "organicidade" em nossa esquerda, que, além de não conseguir se unificar num período eleitoral, tampouco tem conseguido incorporar os movimentos sociais em suas mais diversas lutas. Você vislumbra alguma forma de reorganização na esquerda em período próximo?
 
Gilmar Mauro: É difícil falarmos em tempos, mas alguns ingredientes são premissas fundamentais se quisermos construir um processo sustentado, já que o verbo anda na moda.
 
Primeiramente, precisamos fazer um balanço político profundo, honesto e sério das experiências de esquerda partidária, do movimento social e sindical. É preciso dizer "nossos instrumentos são importantes, foram construídos por nós, é o que temos, mas hoje não dão conta de organizar a classe trabalhadora". Há muitos setores da classe trabalhadora que não estão nem aí pra nenhum tipo de organização.
 
Em segundo lugar, foi completamente perdida a referência, até o sentido de classe, os laços de solidariedade. As pessoas não se enxergam como classe trabalhadora. A Nike, por exemplo, não tem nenhuma fábrica, é um processo todo terceirizado, fragmentado, atomizando a classe. No Brasil, mais concretamente, são mais de 600 mil vendedoras de Avon! Se somarmos com Natura, Herbalife, são mais de 1 milhão de pessoas. E se as chamamos de ‘classe trabalhadora da Avon’, elas vão se dizer ‘consultoras de venda’. Porque os instrumentos até aqui construídos não dão conta dessa nova dinâmica e da nova realidade da classe trabalhadora. Se não fizermos tal autocrítica, dificilmente vamos conseguir pensar em formas organizativas e projetos para um novo período.
 
Outro aspecto é que devemos parar com esse negócio de ver quem é dono da verdade. Cada um tem uma parte da verdade, e possíveis razões em sua análise, mas é apenas mais uma verdade entre todas as demais, de outros agrupamentos e setores. Necessitamos baixar a crista, a petulância, até o pedantismo intelectual, e olharmos nossa fragmentação, nossa baixa força social e política... E organização sem isso vale zero, mesmo com o melhor debate e o melhor programa do mundo.
 
Se nos olharmos entre todos, veremos que cada um tem sua parcela de contribuição; e juntando tudo ainda somos um agrupamento muito pequeno para enfrentar toda a lógica do capital, imposta a todo o país. Portanto, para mim, essas são as condições analíticas fundamentais.
 
É preciso reorganizar a esquerda? É preciso pensar um novo programa, uma nova estratégia? Não tenho a menor dúvida. Mas não adianta juntar mais meia dúzia, dizer "a nova estratégia é essa" e sair angariando gente para a minha corrente. Não vai ter. Dessa forma, é preciso fazer o debate, autocrítica, análise, de modo que se envolva a militância e se pense a respeito, o que necessita tempo.
 
Portanto, mais do que sair com uma nova proposta, de um novo partido, para o ano que vem, é preciso criar uma metodologia para o debate político, que nos permita, no momento de criar novos instrumentos, ter suficiente acúmulo de forças, evitando que seja só mais um agrupamento para disputar com os outros.
 
Infelizmente, a esquerda vê essa disputa pela hegemonia como uma concorrência entre instrumentos, e não uma possibilidade de fortalecimento, uma vez que, para fazer uma revolução social, serão necessárias milhões de pessoas conscientes. Está na ordem do dia, mas, se não fizermos o balanço, os grupos vão se achar certos por terem tentado impor sua hegemonia sobre os demais.
 
Olha, se não fizermos um balanço crítico desses tempos, somos uns babacas. Aí poderemos falar de qualquer coisa, menos de revolução.
 
É um momento de extrair todas as lições, com muita humildade, e a partir daí pensar no novo período. Casada a isso, uma análise muito profunda da nova realidade sócio-econômica mundial. O que é a classe trabalhadora do mundo de hoje? Porque, se não tivermos tal clareza, como vamos saber que instrumentos e programas são necessários a essa nova classe?
 
As eleições vão passar, de modo que para mim esse é o debate central. É no que acredito e, no que depender de mim, entraremos com todas as forças nesse debate político do próximo período.
 
Correio da Cidadania: Retornando finalmente à realidade mais imediata, no estado de São Paulo, como enxerga uma eventual vitória de Alckmin? Seria mais fácil negociar com Mercadante?
 
Gilmar Mauro: Não sei, é uma pergunta difícil. Mas o tucanato em São Paulo... Com Alckmin também tivemos experiência anterior; com ele ao menos conseguimos nos reunir. Mas, depois da morte do Covas, tudo que diz respeito à agricultura, reforma agrária, foi completamente abandonado. O próprio Itesp (Instituto de Terras do Estado de São Paulo) foi sucateado, a Polícia Civil, os professores; o trato deles com o movimento social sempre foi de criminalização.
 
Acredito que, pelo seu histórico dentro do PT, o Mercadante não seja como o Alckmin, creio que seja um pouco melhor. E, sendo honesto, precisamos definir quem preferimos enfrentar, pois acho que teremos de enfrentar quem ganhar, seja quem for, no âmbito federal ou estadual. Assim, a pergunta é: para nós, é melhor enfrentar quem? No meu modo de ver, é melhor enfrentar o Mercadante. Não sei se vai dar segundo turno, até torço para que dê, pois, para o movimento social, é melhor encarar o Mercadante. Essa é minha impressão.
 
No entanto, infelizmente, acredito que aqui em São Paulo nós temos uma situação pior ainda, pois enfrentamos o que há de pior na mídia, Veja, Folha, Estadão, Globo, enfim, o que há de pior das oligarquias e meios de comunicação está em São Paulo, em maior número. E do ponto de vista da esquerda idem, tem muita coisa boa, mas também existem vícios nas mesmas proporções. É uma realidade bastante complexa. Os desafios nos fazem crescer, é o espaço onde atuamos e temos o grande desafio de repensar esse período, inclusive aqui em São Paulo.
 
Valéria Nader, economista, é editora do Correio da Cidadania; Gabriel Brito é jornalista.
 

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