José
Paulo Gascão denuncia neste texto uma das campanhas de desinformação em
curso, a de que a única saída da crise é dentro do sistema capitalista.
E depois de contactar que o capitalismo não é reformável, afirma:
“Desenganem-se os que pensam que nos parlamentos se pode ir criando
condições para reverter a situação. Particularmente com a ditadura
mediática dos media apelidados de referência, os parlamentos são um
instrumento do capital monopolista.”
«Hoje,
Sócrates é já um cadáver político e muitos dos que estão calados apenas
esperam que o desenvolvimento dos acontecimentos lhes diga o momento
oportuno de reconhecer o óbito.
O cadáver político está aí, a família que o enterre.»
O cadáver político está aí, a família que o enterre.»
A frase em epígrafe, escrita em Fevereiro do ano passado, vinha ao arrepio das notícias e comentários dos media de
referência. Então, os meios de comunicação ainda promoviam José
Sócrates que, dando sequência ao trabalho iniciado por Mário Soares,
completara já o processo de fusão ideológica do PS com a direita e
consolidara a sua rendição incondicional ao capitalismo e ao
neoliberalismo.
A profunda crise sistémica do capitalismo há muita prevista, uma
crise económica, financeira, social, cultural e moral que varre o mundo,
foi em Portugal agravada pelas consequências da adesão à União
Europeia: destruição da agricultura e desmantelamento das pescas e da
indústria transformadora…
A eleição em Março passado de Passos Coelho, tal como Sócrates um
impreparado político, pouco culto, sem passado nem futuro políticos, não
permitiu aos media começar de imediato a reflectir a retirada
do apoio do grande capital a Sócrates. Era preciso que as medidas
impostas pelos monopólios recaíssem sobre Sócrates, o chefe do turno
cessante.
Ao reunir primeiro com Passos Coelho na sede do PSD, em 13 de
Outubro último, seis meses e três PECs passados, e só no dia seguinte
com Teixeira dos Santos (nestes casos nunca há dificuldades de agenda…),
o grande capital quis dizer, inequivocamente, quem concitava agora seu
apoio. A substituição de Sócrates pelo seu ministro das Finanças na
reunião do dia seguinte foi o recurso diplomático para disfarçar o
vexame.
Depois sim, a imprensa já podia dar continuidade à manobra. E deu: a maioria dos sábios económicos do costume
que enxameavam a comunicação social foram substituídos, Sócrates deixou
de ter os favores da imprensa que dele passou a fazer o retrato óbvio: o
de um político impreparado, sem ideias nem convicções, que foi
publicitariamente promovido como se de uma pasta dos dentes se tratasse.
E muitos dos que ao longo dos últimos o incensaram passaram, sem pudor,
a ser os seus mais cáusticos críticos.
A POLÍTICA EUROPEIA
PARA A RECUPERAÇÃO DO CAPITAL
PARA A RECUPERAÇÃO DO CAPITAL
O rebentar da crise e o seu desenvolvimento não destruiu apenas os
mitos do desenvolvimento contínuo do capitalismo e o do seu benefício
comum para o trabalho e o capital. Pôs também a nu que ela é uma
consequência inevitável do próprio sistema capitalista, evidenciou as
tensões entre os imperialismos norte-americano e europeu e evidenciou
ainda a conflitualidade de interesses no seio da União Europeia.
No entanto, ainda não é claro para a uma parcela significativa da
classe trabalhadora e do povo que a União Europeia, um instrumento do
capital monopolista europeu, aproveita a crise do capitalismo para
exigir aos governos uma redução drástica dos salários e dos direitos
sociais conquistados ao longo de décadas. Como não está claro que o
objectivo é a recuperação do capital fictício perdido com o rebentar da
crise pela banca e por outros grupos monopolistas, à custa de um corte
dos salários e pensões e uma diminuição crescente dos direitos sociais.
Para os grupos monopolistas e a União Europeia as medidas tomadas
são ainda pouco. Se antes da aprovação do Orçamento de Estado (OE) na
generalidade este era um «documento fundamental para acalmar os
mercados», logo no dia seguinte á sua aprovação a Comissão Europeia,
congratulou-se com a sua aprovação, mas não deixou de acrescentar que
«era necessário uma redução do deficit mais rápida» e os juros da dívida
pública começaram uma vez mais a subir.
Eram previsíveis estes comportamentos. Já no 1º dia de debate sobre o
OE, na SIC notícias, Morais Sarmento (PSD) e Francisco Assis (PS)
lamentavam o tom em que decorrera o debate, o que dificultava futuros
acordos para novas medidas gravosas para a classe trabalhadora, tendo
este último deixado escapar: «… até porque lá para Maio vamos ter que
negociar outro PEC».
Antes mesmo do início da discussão do OE na Assembleia da República,
à saída da reunião da Comissão Política onde Sócrates explicou o acordo
PS/PSD Almeida Santos, presidente do PS, comentou: «Os sacrifícios que
estão a ser exigidos ao povo não são sacrifícios incomportáveis. Oxalá
que o país nunca tenha de enfrentar sacrifícios maiores. As crises não
são só do governo, são do povo, e o povo tem que sofrer as crises como o
governo as sofre»!
Michael Hudson, um insuspeito Professor da Universidade de Missouri,
em 30 de Setembro resumia em New Economic Perspectives objectivo da UE
nesta citação: «O objectivo é baixar os salários cerca de 30% ou mais,
até níveis de depressão, pretendendo que isso “deixará mais excedentes”
disponíveis para pagar o serviço da dívida. (…) Trata-se de um projecto
de reversão da era das reformas democrático-sociais que a Europa
conheceu no século passado».
—///—
Na sua queda, Sócrates arrasta o PS para uma derrota profunda e
muitos do que estiveram anos calados acham que é este «… o momento
oportuno de reconhecer o óbito» político do chefe até agora
incontestado.
O governo dá crescentes provas de desagregação e até de
desorientação: ministros e secretários de Estado desdobram-se em
contradições, confrontos e disparates.
À classe trabalhadora e às restantes classes e camadas exploradas
resta um caminho: lutar e aprender com a vida que o capitalismo não é
reformável e nesta sua fase senil pode mesmo conduzir a Humanidade a uma
nova barbárie.
Desenganem-se os que pensam que nos parlamentos se pode ir criando
condições para reverter a situação. Particularmente com a ditadura
mediática dos media apelidados de referência, os parlamentos são um
instrumento do capital monopolista.
Como sem rebuço reconheceu o bilionário norte-americano Warren Buffet, numa frase que deve causar arrepios nos media portugueses,
«Existe uma guerra de classes, é verdade, mas é a minha classe, a
classe dos ricos, que está a fazer a guerra, e nós estamos a ganhá-la».
O caminho será provavelmente longo até que a classe trabalhadora
inverta a situação e passe á ofensiva. No entanto, essa importantíssima
alteração da correlação de forças só será possível quando, e enquanto, a
luta e classes for conduzida nas suas três formas, teórica, política e
económica, de forma coordenada e interligadas entre si.
Só assim poderá transformar-se a justa revolta de hoje contra a injustiça na luta pela transformação do país e do mundo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário