sábado, 12 de março de 2011

Para o Jornal da Globo a culpa é do oprimido



Alexandre Haubrich

“As mulheres reclamam muito dos salários baixos, mas pesquisa revela: muitas delas têm medo de pedir aumento”. Essa foi a chamada para uma matéria do Jornal da Globo desta quinta-feira. Na escalada do jornal, o texto perguntou: “Medo de quê? Por que as mulheres tem mais dificuldade em pedir aumento?”.
Essa é a explicação encontrada pela Globo para os salários mais baixos recebidos por mulheres em cargos iguais aos dos homens. A mesma matéria já aproveita para explicar as maiores dificuldades das mulheres em ascender na carreira: apenas 28% delas pensam em promoção, contra 39% dos homens.
Após algumas entrevistas nas ruas, nas quais todas as falas que foram ao ar são de mulheres dizendo que nunca pediram aumento – referendando a tal pesquisa –, o repórter, em off, acusa: “Quase metade delas diz que ganha mal, mas também não faz nada para mudar essa situação”. No fim da matéria, a entrevistada é uma alta executiva. A partir de sua posição privilegiada, ela faz uma análise sociológica: “Não vejo limitações. Quem coloca limitações é a própria pessoa, o mercado está aberto”, afirma.
Entre tantas aspas destacando frases absurdas, um comentário do Mirgon Kayser, no Twitter, resumiu a situação com precisão: “Padrão Globo sim… Em geral a Globo valoriza as explicações mercadológicas que diluam e mascarem machismo / racismo / homofobia, etc”.  É isso. No caso específico das mulheres, é a reprodução e o fortalecimento do pensamento segundo o qual a mulher estuprada é a responsável pelo estupro.
A culpa por ser pobre é do próprio pobre, a culpa do desemprego é do desempregado que não gosta de trabalhar, a culpa de todas as formas de exploração e/ou opressão é sempre do explorado e oprimido. É assim que a Rede Globo quer fazer as pessoas pensarem, alimentando, dessa forma, a segregação, o preconceito e a exclusão por parte das elites, ao mesmo tempo em que tira dos oprimidos a percepção da necessidade de luta coletiva para se alcançar uma verdadeira mudança social. Individualiza a percepção e a luta, colaborando, através da construção desse discurso, com a manutenção das mais diversas formas de opressão.

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