Uma questão de interpretação, um entrave ou um erro político e
conceitual. Estas foram algumas opiniões das entidades que representam
os servidores públicos gaúchos convidadas a integrar o Comitê de Diálogo
Permanente (Codipe), sobre a metodologia de participação proposta pelo
executivo estadual. A primeira reunião do comitê ocorreu nesta
terça-feira (29) e provocou um intenso debate sobre a oferta do governo
de que as entidades assinem um “Termo de Adesão” ao Codipe, a fim de que
efetivem participação no espaço criado para discutir as necessidades
dos servidores públicos.
Das 22 entidades presentes na reunião, 15 já aderiram ao termo
proposto pelo governo estadual. O documento conceitua o Comitê de
Diálogo Permanente como um espaço de negociação com os servidores
públicos e o governo estadual. As entidades contrárias ao termo, como a
presidente do Cpers, Rejane de Oliveira, defendem que o termo está
equivocado e fere a autonomia dos sindicatos. “Estamos (Cpers) dispostos
a participar deste espaço, mas não assinaremos termo de adesão. Isto é
um gesto que fere a constituição e a história do sindicalismo”, disse.
O Cpers foi a primeira entidade a fazer uso da palavra e também a
reiterar sua posição ao final da reunião, contestando a posição final da
secretária Stela sobre considerar a discussão sobre o termo “adesão”
um entrave ao processo de construção do comitê. Rejane apresentou um
parecer jurídico à secretária e aos demais colegas de sindicato,
argumentando a necessidade de as entidades rejeitarem a adesão.
Segundo o parecer do Cpers, o Decreto nº 47.897 – que instalou o
Codip em 16 de março de 2011 -, é inaceitável do ponto de vista
político e democrático. “Não podem os sindicatos aderir organicamente a
uma estrutura de governo e muito menos, dela participando, se submeter
a um programa de conteúdo, sob pena de estarem, neste ato, renunciando
a sua independência e autonomia. Além de um erro conceitual e
político, o Decreto, com seu programa associado ao ‘Termo de Adesão’,
concretizam uma forma de intervenção do estado na organização
sindical”, diz o texto apresentado pelo Cpers. Entidades como o
Sindicaixa-RS e o Centro de Auditores do Tribunal de Contas do Estado
também se manifestaram contra a assinatura do termo.
Por outro lado, entidades como a Associação dos Oficiais de Nível
Superior da Brigada Militar (ASOFBM) e o Sindicato dos Empregados em
Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas e de
Fundações Estaduais (Semapi), afirmaram acreditar na proposta do Codipe e
consideraram uma contradição não participar de espaços de diálogo
promovidos pelo Governo do Estado. “Aderir é aceitar o convite. Não
significa que vamos concordar com tudo que será dito. Eu não poderia me
furtar desta possibilidade de aceitar esta oportunidade que está sendo
oferecida pelo governo. A minha impressão é que cada um tem uma
leitura diferente sobre o que está sendo propondo pelo Codipe”, afirmou
o tenente-coronel José Carlos Ricardi Guimarães, presidente da ASOFBM.
“Não queremos instrumentalizar sindicatos”
Na linha de frente com os ex-colegas de Cpers, a secretária da
Administração e dos Recursos Humanos, Stela Farias, coordenou os
trabalhos por parte do Executivo. A reunião que deveria definir as
câmaras temáticas para encaminhar as reivindicações prioritárias dos
servidores acabou sendo um momento de o governo ouvir as posições das
entidades convidadas para aderir ao Codipe. “A proposta do governo é a
explicitada e construída em campanha. Nós não queremos enganar ninguém
nem utilizar este espaço para instrumentalizar os sindicatos”, disse,
ressaltando sua intimidade com as causas dos sindicalistas. E reforçou:
“As questões levantadas por representantes de algumas categorias, como
o Cpers, podem ser perfeitamente ajustadas. O Codipe não será um
espaço para represar demandas das categorias, pelo contrário, nós
queremos produzir acordos, a partir de diálogos”, disse.
Sobre a retirada do “Termo de Adesão”, Stela disse que irá analisar o
termo jurídico apresentado pelo Cpers e a comissão técnica que criou o
comitê poderá refazer a metodologia de participação das entidades.
“Nós entendemos que é perfeitamente possível descompatibilizar o termo
de adesão e fazer uma carta convite”, falou.
As sugestões, críticas e apontamentos feitos pelas entidades de
classe dos servidores deverão ser analisadas em reunião com as
secretarias que compõem o Comitê no início da próxima semana e as
conclusões apresentadas na segunda quinzena de abril em nova reunião do
Codipe.
O Codipe
As discussões do Codipe serão mensais e ocorrerão em dois espaços: um
mais amplo, que vai tratar de temas como concepção do Estado e dos
serviços públicos, a relação dos servidores com o Estado, o programa do
Governo eleito e sua relação com os servidores; o outro espaço,
funcional e de gestão de pessoas, que terá câmaras temáticas e
setoriais. As câmaras temáticas vão discutir temas como Saúde do
Trabalhador, Previdência, Capacitação continuada, Convenção 151 – OIT,
Modernização e tecnologia e diretrizes para planos de cargos, carreiras e
salários. Já as setoriais vão tratar de assuntos específicos dos
quadros de pessoal da Segurança, Educação, Saúde, Quadro Geral e
técnicos-científicos.
O Codipe abrange os servidores e empregados públicos da administração
direta e indireta, incluídas as fundações, autarquias, empresas
públicas e sociedades de economia Mista. Do governo estadual, integram o
Codipe as secretarias da Fazenda, Educação, Saúde, Segurança Pública,
Casa Civil, Planejamento, Secretaria-Geral de Governo e Procuradoria
Geral do Estado.
Antes das inscrições dos interessados em falar, a secretária Stela
explicou por uma hora as intenções do comitê. Segundo ela, o órgão tem
poder deliberativo, mas não decidirá nada por voto e sim por consenso.
Os encaminhamentos tirados dos encontros mensais do Codipe deverão
ocorrer por consenso entre as partes e serão registrados em ata para
encaminhamento ao gabinete do governador. “A ideia é que a reunião
aconteça em uma segunda-feira, na tarde de expediente dos servidores.
Precisamos montar os temas e definir as câmaras. Serão seis
representantes de categorias por câmara temática”, sugeriu a
secretária.
Recuperar a confiança
O discurso coletivo da maioria das entidades presentes na primeira
reunião do Codipe foi de que é preciso construir uma relação de
confiança entre o novo governo e os servidores públicos. Todos
reclamaram da falta de valorização e espaço de participação no governo
de Yeda Crusius (PSDB) e depositam elevadas expectativas com o governo
de Tarso Genro (PT). Porém, defenderam a legitimidade de suas entidades e
os pleitos de suas categorias.
O grupo de servidores recordou o que considerou como “uma experiência
traumática”: o Grupo de Assessoramento Estadual para Política de
Pessoal (GAE) criado no governo Yeda. Segundo o representante do Centro
de Auditores do Tribunal de Contas do Estado, Amauri Peruso, o órgão era
um instrumento do gabinete da ex-governadora e pouco contribuía com as
necessidades dos servidores. “Era um inibidor dos anseios dos
servidores. Não produzia resultados, mas contenções. A própria
Secretaria de Administração nunca teve peso”, disse.
Ciente do desafio para com a gestão e o funcionalismo, a secretária
de Administração e Recursos Humanos, Stela Farias, propôs ao governador a
participação dos servidores na definição do Plano Plurianual
Participativo (PPA). E salientou que, apesar de não definir as câmaras
temáticas do Codipe no encontro, já tem em vista alguns encaminhamentos
com setores do funcionalismo. “Os empregados dos serviços públicos
estaduais em fundações, autarquias e empresas de economia mista estão em
plena database. Então não temos saída. Mesmo sem tempo para fechar
acordo com as entidades, nós vamos ter que chamar individualmente as
setoriais destes servidores e debater suas demandas salariais”,
explicou.
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