Motivos para não aprovar a proposta do novo Código Florestal
por Fernando Marroni, deputado federal (PT-RS) no Viomundo
As imagens e os efeitos devastadores dos deslizamentos na região
serrana do Rio de Janeiro no início deste ano permanecem vivos na
memória dos brasileiros dois meses depois da catástrofe. E tão
importante quanto jamais esquecer a perda de 900 vidas é lembrar que
grande parte dessa tragédia poderia ter sido evitada com uma simples
atitude: obediência às regras do Código Florestal Brasileiro.
Estudo liberado essa semana pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA)
comparou imagens de satélite antes e depois da enchente e constatou a
ocupação irregular das encostas e margens de rios. E o resultado dessa
pesquisa é taxativo: os efeitos da chuva teriam sido significativamente
menores se a Área de Preservação Permanente (APP) de 30 metros ao longo
dos cursos d’água tivesse sido respeitada.
A morte de centenas de cidadãos brasileiros serve como trágico
lembrete de que o Congresso Nacional não pode votar às pressas a
proposta do novo Código Florestal Brasileiro.
Como primeira justificativa para isso basta lembrar que a atual
proposta reduz de 30 metros para 15 metros a faixa que pode ser ocupada
por habitações ou lavouras nas APPs, ou seja, permite de norte ao sul do
Brasil ocupações de alto risco capazes de reproduzir resultados
trágicos como os observados no interior do Rio, em janeiro último.
Diante de recentes calamidades como essa, a inexistência de um
regramento específico para as zonas urbanas por si só já inviabiliza
qualquer tentativa de aprovação da atual proposta. Mas os danos
cometidos pela atual proposta conseguem ir além de colocar milhões de
brasileiros sob risco iminente.
A anistia proposta àqueles que desmataram áreas protegidas até
22/07/2008, por exemplo, reforça a nódoa de “país da impunidade” que o
Brasil carrega e, criminosamente, sugere passar uma borracha em 43 anos
de crimes ambientais. A injustiça nesse caso tem dois gumes: um fere
quem sempre respeitou a lei e outro atinge quem luta para recuperar o
meio ambiente degradado.
Ao ignorar qualquer referência sócio-econômica dos beneficiados pela
isenção da reserva legal o relatório elaborado pelo deputado Aldo Rebelo
(PCdoB/SP) se transforma na crônica de uma morte anunciada de
aproximadamente 30 milhões de hectares de florestas (dos quais 20
milhões de hectares estão localizados na Amazônia). Tal proposta
configura não apenas um crime ambiental sem proporções, mas um crime
contra a humanidade em tempos de luta para controlar a emissão de gases e
o aumento dos danos causados pelo efeito estufa.
Em 1962, o então ministro da Agricultura Armando Monteiro Filho
propôs a criação do Código Florestal em vigor ao observar que o avanço
do desmatamento se configurava em grave ameaça à produção agrícola
nacional. Hoje, os grandes produtores agrícolas defendem a aprovação
urgente da nova lei sem qualquer alteração, mas não percebem que a
flexibilização das regras de contenção ao desmatamento fará deles
próprios vítimas, quando a água destinada à agricultura começar a
rarear.
A elaboração do atual Código consumiu três anos durante os quais
centenas de cientistas foram ouvidos até a publicação da Lei 4.771/65.
Hoje, 46 anos depois, se pretende votar uma proposta calcada em
interesses econômicos imediatos e que contraria grande parte da
comunidade científica brasileira, que sequer foi ouvida para a
elaboração da proposta a ser votada.
Tomar tal atitude é ser irresponsável com o futuro do Brasil e de
seus habitantes. É legar às futuras gerações florestas e rios mortos,
cidades reféns das intempéries e solos estéreis. Como representantes do
povo temos a responsabilidade de preservar o futuro deste país e
protegê-lo. E votar o novo Código Florestal sem submetê-lo a sérias
alterações é um passo na direção contrária.
Fernando Marroni é vice-líder da bancada do PT na Câmara dos
Deputados e membro do grupo de trabalho petista que estuda o novo Código
Florestal Brasileiro.
Leia aqui para saber por que a Via Campesina rechaça a proposta do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) para o Código Florestal.
Ouça aqui a opinião de João Pedro Stedile, líder do MST, sobre a revisão do Código Florestal.
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