“Não há escola sem bullying”, disse o especialista gaúcho em Direitos
Humanos Marcos Rolim durante palestra nesta quarta-feira (04), no
Galpão Crioulo do Palácio Piratini. Ele foi um dos convidados pela
Secretaria Estadual de Educação para auxiliar o governo gaúcho a
trabalhar na prevenção da violência nas escolas. A iniciativa, que faz
parte do projeto Governo Escuta, reuniu acadêmicos e ativistas ligados
ao tema, os quais apresentaram dados e caminhos para o enfrentamento da
violência na rede escolar gaúcha. A intenção é definir açõesque serão
aplicadas paralelamente ao lançamento da campanha publicitária do
governo sobre prevenção à violência escolar.
Rolim apresentou a definição sobre o bullying como um conjunto de
atitudes agressivas e repetitivas entre pares, ou seja, um fenômeno que
não segue uma hierarquia. “Pode acontecer entre professores também”,
exemplificou. Segundo o especialista gaúcho, todas as escolas tem este
tipo de violência, mas, como normalmente as vítimas ficam caladas, é
difícil perceber e interferir. Ainda há despreparo ou desconhecimento
das escolas no enfrentamento do bullying. “A característica é a agressão
verbal repetitiva, normalmente por criação de apelidos ou piadas
homofóbicas. Isso faz com que a vítima perca sua identidade. Ela fica
conhecida pelo apelido, que normalmente é uma ridicularização de alguma
característica física”, explicou.
As humilhações sofridas na escola causam consequências severas às
vítimas, como sofrimento moral, aumento do risco de suicídio e das
chances de uma vida adulta criminosa. Além dos sofrimentos físicos e
psíquicos, há o baixo desempenho e a evasão escolar.
Como acontece?
Segundo pesquisas internacionais, a maioria dos casos de bullying
ocorre com alunos da 5ª a 8ª série. Tanto as vítimas como os autores
tendem a ter um desempenho escolar abaixo da média. A violência
doméstica também contribui para a prática, já que, ao bater no filho, o
pai ou a mãe passam a ideia de que a violência é uma forma legítima de
solução de conflitos, explicou Rolim. Ele lamentou o fato de no Brasil
haver poucas pesquisas sobre o fenômeno e apresentou os resultados do
estudo que realizou, durante sete meses, com alunos da Escola Odila Gay
da Fonseca, em Porto Alegre. O trabalho, retratado no livro Bullying: o pesadelo da escola, apontou que agressores e vítimas têm um perfil muito semelhante.
Para o professor titular do Departamento de Sociologia e do Programa
de Pós-graduação em Sociologia do Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas da UFRGS, José Vicente Tavares, a sociedade apresenta sintomas
de uma crise social que se manifesta de diversas formas. “A violência na
escola é a expressão da insegurança estrutural da sociedade
contemporânea, das crises nas instituições, na família e nos grupos de
referência”, comparou. Defensor de uma campanha de combate à violência,
Tavares destaca o papel das instituições. “A escola é o centro do
problema e também é a solução”.
Além de apontar saídas para o conflito, o professor lembra que a
maioria dos problemas ocorrem nas escolas. “É preciso reconhecer que
existe violência no espaço escolar, diferenciar os tipos de violência e
apontar várias estratégias de prevenção para cada tipo. Por ser uma
instituição de socialização, a escola é o limite, pois é o ponto de
condensação dos conflitos sociais”, acrescentou.
Considerado um dos exemplos de combate ao bullying na Capital, a
Escola Padre Reus foi um exemplo citado no debate. O diretor da
instituição Ruy Rosário Guimarães explicou o trabalho de resgate desde a
estrutura física até ações de aproximação com a comunidade feita pela
escola para coibir a violência. Em 2004, quando assumiu a direção do
estabelecimento, Guimarães deparou-se com um cenário desolador, com o
prédio da instituição depredado e elevado índice de agressividade entre
os alunos. A solução foi desenvolver um projeto de conscientização
através da música, do esporte e do teatro. “Há dois anos não precisamos
pintar a escola. Também não registramos mais casos de vandalismo”,
reconhece, lembrando que o dinheiro economizado é revertido na aquisição
de equipamentos de informática.
Desde 2006, alunos, professores e funcionários participam das
oficinas do projeto Escola sem Violência, idealizadas pelo professor
Aloizio Pedersen. Em cinco anos, a instituição reduziu os índices de
evasão e de violência no ambiente escolar.
Por onde começar?
O especialista em Direitos Humanos, Marcos Rolim, propõe a adoção de
regras de comportamento claras, que sejam conhecidas pelos professores,
alunos, funcionários e pais, como forma de evitar a ocorrência de atos
violentos no ambiente escolar. Para casos em que a violência, física ou
psicológica, já ocorreu, o professor Rolim sugere a adoção dos Círculos
de Justiça Restaurativa, em que agressores e vítimas ficam frente a
frente, acompanhados por um mediador.
Já que a prática do bullying costuma ocorrer na presença de outras
pessoas, servindo como forma de auto-afirmação do agressor, entre as
medidas sugeridas pelo palestrante estão a chegada dos professores, na
sala de aula, antes dos alunos, o monitoramento do recreio e da entrada e
saída dos estudantes. A colocação de caixas para que os alunos possam
denunciar agressões sofridas, por eles ou por colegas, é outra proposta.
A aplicação de questionários para serem respondidos de forma anônima
pelos estudantes, contribui para evitar a violência, pois permite a
direção conhecer a realidade da escola e identificar os conflitos
existentes.
O jornalista e ativista da Cufa (Central Única das Favelas) no Rio
Grande do Sul, Manoel Soares, fez uma exposição sobre a realidade que
acompanha diretamente no trabalho que realiza nas periferias. Ele fez
referência ao município de Canoas, que desenvolve políticas públicas
para enfrentar a violência nas escolas que reúnem tecnologia e
convivência comunitária dos agentes do estado. O jornalista apresentou
uma reportagem que realizou na cidade, ressaltando a importância do
poder público para ações além de campanhas publicitárias.
Em Canoas, foram criadas Comissões Internas de Prevenção à violência
escolar (CIPAVES), formada por representantes da rede escolar e da
comunidade. Também foi instituída a ronda escolar com guardas municipais
foram capacitados para ter uma relação de proximidade com os
estudantes, pais e professores para conseguir mediar os conflitos e para
encaminhar casos a Brigada Militar, caso necessário. E, nas escolas
municipais, foram implantadas câmeras de circuito fechado interno de TV e
sistema de alarmes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário