Editorial do SUL21
Tudo no Brasil é caro. A ladainha de sempre é de que a culpa é
dos impostos e do “custo Brasil”, formado basicamente por encargos
sociais. Paga-se muito imposto no Brasil e, por este motivo, os produtos
são caros, afirmam. Bela balela, pura mentira. Que se pagam altos
impostos no Brasil é verdade, mas não é apenas este o motivo de o
consumidor brasileiro pagar tudo muito mais caro do que os dos demais
países. O “custo França”, com certeza, é equivalente ao brasileiro.
A matéria do final de semana do Sul21 sobre o preço dos livros no Brasil
é um exemplo do que se afirma aqui. Os livros são caros não pelo motivo
dos impostos, já que os livros são isentos de tributação desde os anos
50 do século passado. Tanto os livros quanto os automóveis, as ligações
telefônicas (de aparelhos celulares e de fixos), as roupas, os
dentifrícios etc. etc. etc. são caros basicamente porque, além dos
impostos, o mercado consumidor brasileiro é relativamente pequeno, mas principalmente porque as margens de lucro praticadas no país são excessivamente altas.
Nada contra os lucros, quando eles são razoáveis. O produtor, o
distribuir e o comerciante precisam ser remunerados. Não fosse assim,
não existiria a economia de mercado e não há nada a vista que nos
autorize acreditar que ela esteja prestes a se extinguir e/ou a ser
substituída por outra forma de organização econômica.
Tudo contra a ganância desvairada, imperante no Brasil. Durante
muitos anos, desde que se instalou a ciclo de industrialização
dependente e associado (aos capitais internacionais) no país, o consumo
restringiu-se a uma pequena fatia da população, nunca maior do que 25%
do total populacional. Como se produzia para poucos, vendia-se (muito)
caro para que se pudesse gerar o ganho necessário para manter e
reproduzir o sistema.
Foi assim desde os anos 50, na era JK, com a introdução da indústria automobilística e sociedade de massas no país. Foi assim desde os anos 70, no período do “milagre econômico brasileiro”
durante a ditadura militar, com a reserva de mercado e a dificuldade de
importação de produtos de fora. Foi assim nos anos 90, na com a “abertura dos portos” e a invasão de produtos importados da era Collor de Melo.
Tudo começou a mudar nas eras Itamar Franco, FHC e Lula, com o
aumento do mercado consumidor desde o Plano Real. As sucessivas (foram
três) quebras econômicas do país e as privatizações não alteraram o
ritmo da expansão do mercado interno brasileiro iniciado com Itamar e
aprofundado com Lula.
A entrega de setores estratégicos da economia à iniciativa privada
(internacional e nacional), ocorrida no período FHC sem a devida
implantação de mecanismos de controle eficientes, gerou distorções que
ainda hoje se mantém. Os serviços telefônicos no Brasil são os segundos
mais caros do mundo (e de péssima qualidade)! Os automóveis brasileiros
são tão caros que se paga aqui o preço de um carro de luxo (tipo um SUV
de última geração) por um réles 1.4 parcamente equipado! As roupas de
grife, vendidas aqui a preço de ouro (tipo Tommy, Lacoste, Zara), são
compradas no exterior por cerca de 1/3 dos que se paga no Brasil! Hoje,
muitos dos que possuem renda, viajam ao exterior para fazer compras. O
que economizam por lá, paga a passagem, a estadia e sobra ainda para a
poupança.
Há um problema de escala, sem dúvida. Como se vende menos, se
compensa aumentando a margem de lucro para se manter o ganho final.
Acontece que se os preços são altos em demasia, mesmo que os ganhos dos
consumidores aumentem (como está ocorrendo atualmente), nunca se
conseguirá atingir um volume de consumo que possibilite a diminuição dos
preços finais, em virtude do aumento da escala de vendas.
Hoje, na verdade, nem mesmo a justificativa do tamanho do mercado
consumidor interno brasileiro se sustenta. Os carros produzidos no
Brasil, por exemplo, são vendidos no mundo todo, já que o mercado é
global. Além disso, a ascensão social de mais de 32 milhões de pessoas e
a queda de 43% da população miserável ocorridas no Brasil nos últimos
oito anos fez com que fosse incorporado ao mercado interno do país um
contingente de consumidores superior à população total da Espanha ou
mais do que uma vez e meia a população do Canadá. O crescimento da
classe média brasileira, neste mesmo período, foi equivalente ao número
total de moradores de duas Bélgicas.
Segundo projeções do economista Marcelo Neri, da Fundação Getúlio
Vargas (RJ), se for mantido o ritmo atual de crescimento, o Brasil terá
incorporado até o ano de 2014 mais do que uma França de cidadãos às
classes A, B e C ou um total de 68 milhões de pessoas. Está mais do que
na hora, portanto, de o consumidor se impor e exigir redução de preços e
melhoria de serviços. Que tal começar campanhas na internet, nas redes
sociais e também por meios dos movimentos populares e partidos políticos
pela redução das margens de lucro excessivas e pelo respeito ao
consumidor?
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