Samir Oliveira, Igor Natusch, Ramiro Furquim e Felipe Prestes no SUL21
Uma manifestação que reuniu centenas de pessoas em frente à
prefeitura de Porto Alegre na noite desta quinta-feira (4) começou de
forma pacífica e acabou terminando em uma verdadeira guerra campal.
Centenas de jovens e artistas de rua protestavam por uma cidade “mais
alegre”, mas terminaram a noite sob forte repressão da Brigada Militar.
A reportagem do Sul21 esteve no ato durante quase
toda a noite e pôde observar que a manifestação transcorria de forma
pacífica e animada. Os manifestantes estavam dançando, cantanto e
gritando palavras de ordem contra o prefeito José Fortunati (PDT) –
acusado de ter privatizado diversos espaços públicos de Porto Alegre,
como o Largo Glênio Peres e o auditório Araújo Vianna, ambos
patrocinados pela Coca-Cola.
Quando a reportagem deixou o local por volta das 23h30min, a
manifestação ainda ocorria de forma pacífica e bastante festiva, sem
nenhum tipo de confronto. Mais de 20 guardas municipais faziam a defesa
da entrada da prefeitura e exatos 19 policiais militares – agrupados em
quatro viaturas e três motocicletas – faziam a defesa do mascote da copa
do mundo, um boneco gigante de um tatu patrocinado pela Coca-Cola que
estava colocado no Largo Glênio Peres.
Pouco depois que a reportagem deixou o local, os ativistas resolveram
se dirigir ao Largo Glênio Peres para protestar em frente ao boneco da
Coca-Cola. De acordo com diversos relatos de pessoas que estavam no
local, os brigadianos permaneceram imóveis diante da aproximação da
multidão.
Segundo os manifestantes, os brigadianos permitiram que as pessoas
pulassem a grade de contenção do mascote para, então, começarem a
reprimi-las. A partir daí, os relatos são de que houve uma verdadeira
batalha campal.
Roberta Santiago e Tamires Marchetti esperavam por notícias de uma
amiga que estava presa. Elas contam que o ato ocorria pacificamente,
quando manifestantes decidiam dançar em volta do tatu, local onde se
concentrava o contingente de policiais. Segundo as jovens, apenas cerca
de cinco pessoas furaram o bloqueio para tentar vandalizar o mascote,
mas isto desencadeou um conflito generalizado. Policiais agrediram não
só as que invadiram a área onde fica o mascote, mas também as pessoas
que dançavam em volta. Outros que não haviam apanhado, tomaram as dores
de agredidos e jogaram latas ou tentaram defender amigos. Houve correria
e quebra-quebra em prédios próximos. Testemunhas dizem ter ouvido
barulhos de bomba de efeito moral e tiros de borracha.
Tamires conta que a amiga presa foi agredida por estar registrando o
confronto. “Ela estava filmando com o celular, foi jogada no chão.
Policiais bateram nela e a prenderam. Torceram o braço dela até quase
quebrar. Depois, disseram que nós só poderemos falar com ela amanhã e
não deixaram nem o advogado entrar no posto”. Roberta diz que também foi
agredida. “Um policial me deu um chute, me pegou pelo braço e me chamou
de vadia”.
Para defender o boneco representando o mascote da Copa 2014 – que
chegou a ser derrubado -, foram deslocados cerca de 60 policiais
militares do Pelotão de Operações Especiais (POE) do 9º Batalhão de
Polícia Militar, além de tropas da Guarda Municipal. Os policiais
jogaram bombas de gás lacrimogêneo, dispararam tiros com munição
não-letal e partiram para cima dos manifestantes com seus cassetetes. Os
relatos informam que sequer os jornalistas presentes foram poupados.
Pelo menos três, que estavam devidamente identificados com seus crachás,
foram agredidos: um fotógrafo do jornal Zero Hora, um repórter do Correio do Povo e um repórter da Rádio Guaíba.
De acordo com alguns manifestantes ouvidos pela reportagem, as
mulheres foram agredidas com puxões pelos cabelos, além de xingamentos
de policiais que as chamavam de “vagabundas”. Após o tumulto, já com
reforços no local, a polícia ordenou que todos de ajoelhassem no chão.
O repórter fotográfico do Sul21, Ramiro Furquim,
chegou ao local após o confronto e presenciou o momento em que a SAMU
chegou para atender os feridos. “A SAMU buscou um cara que estava com um
machucado aberto na cabeça”, relatou.
Por volta da meia-noite, seis pessoas estavam detidas dentro do posto
da Brigada Militar, contíguo ao Largo Glênio Peres, e duas em uma
viatura, segundo o Coronel Freitas. Do lado de fora, parentes e amigos
tentavam falar com os detidos, mas eram impedidos de entrar no posto.
Era possível ver que lá dentro havia um jovem com a cara toda
ensanguentada. Depois de momentos de pressão, o coronel informou que os
detidos que estivessem reclamando de dores seriam levados ao Hospital de
Pronto-Socorro (HPS) e, em seguida, ao Palácio da Polícia. Os que não
precisassem de cuidados médicos iriam direto para o este último local. O
coronel afirmou que poderia elencar muitos motivos para as detenções:
“Desordem, dano, agressão, lesão corporal. Teria uma lista”, disse.
Até o momento, as informações mais precisas dão conta de que a
Brigada Militar prendeu seis pessoas e de que cerca de 20 manifestantes
estão feridos e recebendo cuidados médicos no Hospital de
Pronto-Socorro.
Os manifestantes já colocaram no YouTube um vídeo com o momento em que o boneco foi derrubado.
Atualização (10h55): Aqui, um vídeo com imagens extremamente claras:
ATUALIZAÇÃO (3h24): No momento, alguns manifestantes já foram
encaminhados ao Palácio de Polícia. Segundo a vereadora Fernanda
Melchionna (PSOL), que está no Hospital de Pronto Socorro, são 14
feridos que se encontram no local, embora a polícia não saiba informar
quantos deles estão sob custódia. Os números ainda não foram confirmados
pelo HPS.
Relatos recebidos pela reportagem dão conta de que pessoas foram
perseguidas além do Largo Glênio Peres pelas forças policiais, sendo
vítimas de agressões. Guiga Narciso foi alvejado por balas de borracha
na Andradas, quase Borges de Medeiros, e garante que estava indo para
casa quando ele e seu grupo foram cercados por policiais. Ao tentar
proteger uma amiga, foi alvo dos disparos. Ele está no HPS para remover
estilhaços da bala alojados em seu pescoço. “Eu fico pensando: quem é a
policia da polícia? Vou fazer uma ocorrência para quem, para eles mesmos
(policiais)?”, lamenta.
ATUALIZAÇÃO (05h01): Alguns manifestantes encontram-se neste momento
no Palácio da Polícia, sob acusações de dano ao patrimônio e agressão.
Mais informações no decorrer da madrugada. Se você tem relatos
sobre o acontecido e deseja contar o que viu, entre em contato com a
reportagem via igornatusch@sul21.com.br
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