Rachel Duarte no SUL21
O encontro altermundista para debater pela primeira vez em 60 anos a
ocupação da Palestina por Israel está sendo considerado ‘agressivo’ e
uma ‘demonização do estado de Israel’ por entidades que representam a
comunidade judaica no Rio Grande do Sul. Marcado para acontecer no dia
28 de novembro, em Porto Alegre, o Fórum Social Mundial Palestina Livre
surgiu de uma articulação entre movimentos sociais brasileiros e a
Federação Palestina e conta com apoio do governo federal. O governo
estadual também apoia a realização do fórum, pactuado durante o Fórum
Social Temático 2012. Porém, a Prefeitura de Porto Alegre se recusou a
apoiá-lo e apenas irá ceder os espaços públicos da capital solicitados
pela organização do evento. Seguindo o parecer do prefeito José
Fortunati (PDT), o presidente da Assembleia Legislativa, Alexandre
Postal (PMDB) colocou em dúvida a utilização da casa do povo para as
atividades em prol dos direitos do povo palestino.
“O grande problema que vemos é que o site vai contra o que
acreditamos enquanto cidade e mesmo como pessoas. Achamos que é
necessário que se resolva a questão da Palestina, mas através da
conciliação. Não queremos conflito dentro da cidade”, afirma a
coordenadora de Relações Políticas da Prefeitura de Porto Alegre,
Daniele Votto, acrescentando que, na sua visão, o material promocional
do Fórum pede a extinção de Israel.
Ela se refere ao conteúdo do Documento de Referência escrito pelo
Comitê Nacional Palestino para o Fórum Social Mundial. No texto, apoiado
por um conjunto de movimentos sociais brasileiros (MST, CUT, Marcha
Mundial das Mulheres), é defendido a condenação das políticas de
ocupação israelense do território palestino, que ignoram as resoluções
da Organização das Nações Unidas (ONU), ferindo as normas internacionais
de direitos humanos. Mas foi o pedido de boicote econômico a Israel que
fez a Prefeitura dizer ‘não’ aos sucessivos pedidos para um apoio
formal ao Fórum.
“Foram muitas entidades e vários ofícios, isto também dificultou o
processo. Não existiu uma posição única. Optamos em conversar com quem
tínhamos mais contato, que é Federação Palestina do RS, e que tem a
intenção de construir uma conciliação na pacificação e não em posições
agressivas. Se fosse só a Federação, estaríamos apoiando. O problema são
as entidades mais aguerridas”, diferencia Daniele.
“Está havendo pressão da comunidade israelita gaúcha”, diz CUT
Segundo ela, a Prefeitura não está agindo por pressão da Federação
Israelita do Rio Grande do Sul. Porém, a representante da CUT, Mara
Felts, uma das organizadoras do evento, diz que a Prefeitura irá ceder
os locais para o Fórum, mas “está sofrendo forte pressão da comunidade
israelita que vive no RS”.
O presidente da Federal Israelita do RS, Jarbas Milititsky, confirma
que foram feitas sucessivas reuniões com o prefeito. “Tivemos vários
contatos com a Prefeitura e também com a Assembleia Legislativa. Também
estivemos reunidos com o governador (Tarso Genro) na presença do embaixador de Israel no Brasil (Rafael Eldad)”, conta.
O encontro com o governador foi para alertar sobre episódios
ocorridos em outros países que realizaram o Fórum Palestina Livre.
“Nossa preocupação é muito séria sobre este documento (de referência)
agressivo e raivoso. Se o documento básico é assim, estamos preocupados
que estes indivíduos não respeitem as comunidades judaicas em Porto
Alegre. Em outros lugares do mundo isso se transformou em atos contra
prédios e indivíduos”, afirmou.
Para o governador Tarso Genro, “não podemos fazer um tipo de
policiamento preventivo e dizer para não ser dito alguma coisa”. Ele
afirmou que, por parte do governo, não há uma posição de agressividade
para com o estado de Israel. “O que as pessoas que estiverem no Fórum
falarão será de inteira responsabilidade delas”, eximiu-se. Segundo o
governador, há uma determinação da Secretaria Geral da República para o
governo estadual apoiar o evento. “Nós vamos permanecer apoiando”,
salientou.
Entre outras autoridades, foram confirmadas para o Fórum Palestina
Livre as participações do presidente da Autoridade Nacional Palestina
(ANP), Mahmoud Abbas, da presidenta Dilma Rousseff e do ex-presidente
Lula, que tem reafirmado a defesa do direito do povo palestino ao seu
próprio território, livre da opressão.
“Fórum de parlamentares pela Palestina Livre está garantido na AL-RS”, afirma deputado
Dentro da programação do Fórum Social Mundial Palestina Livre
ocorrerá o ‘Fórum Parlamentar Mundial – Palestina Livre”, que reunirá
exclusivamente parlamentares brasileiros e palestinos. Este evento está
agendado para a tarde do dia 30 de novembro, no Plenarinho da Assembleia
Legislativa gaúcha. “Envolve dez deputados e dez bancadas. Reunirá
senadores, deputados federais e estaduais, vereadores. Está assegurado a
realização deste evento”, afirma o deputado estadual Raul Carrion
(PCdoB).
Porém, o presidente da casa legislativa gaúcha, Alexandre Postal
(PMDB), disse que cedência de espaços para as atividades organizadas
pelos movimentos sociais ainda será discutida pela Mesa Diretora, na
próxima terça-feira (20). “Havíamos sinalizado positivamente, mas um
documento chegou aos deputados e a mim, com posições contrárias ao que
pensamos em relação aos povos do mundo inteiro, com considerações
agressivas que não de paz. Portanto, vamos debater isso na Mesa
Diretora”, falou.
Sobre a negação da casa do povo às manifestações culturais da
comunidade palestina, ele salientou que é natural a realização de fóruns
e a utilização do espaço. Mas insistiu no questionamento do documento
de referência do Fórum Palestina Livre. “Como vamos aprovar um texto que
fala de boicote a Israel se temos aviões tripulados que partem de Santa
Maria para lá? Não queremos fechar as portas para eles”, alegou.
O trecho mais polêmico e que está acirrando os ânimos sobre a
realização do Fórum Palestina Livre é o que trata do “fortalecimento e
expansão da participação na campanha global, liderada pelos palestinos,
de boicote, desinvestimento e sanções (BDS) contra Israel, uma das mais
importantes formas de solidariedades com nosso povo e seus direitos. As
campanhas BDS englobam boicotes a Israel e empresas internacionais
cúmplices das violações israelenses das leis internacionais, e boicotes
acadêmicos e culturais de instituições israelenses, parceiras coniventes
na ocupação e no apartheid”.
De acordo com o deputado estadual Raul Carrion, este tema foi
levantado pelo relator especial da ONU para Direitos Humanos na
Palestina Ocupada. “Existe um documento da ONU que pondera em cima da
legislação nacional que as empresas que atuam nas áreas ocupadas sofram o
boicote. Isto foi ampliado para um boicote mais geral por parte dos
movimentos sociais”, explica o deputado.
Para a Federação Israelita, não é apenas a sugestão do boicote
econômico à Israel. “Somos contra a realização deste evento. A
organização do fórum é unilateral. Este documento, que é o pilar do
evento, é uma demonização do estado de Israel. Não visa a dar
contribuições para resolver o problema do conflito”, afirma o presidente
Jarbas Miltitsky. Ele ressalta que o texto utiliza a expressão
“higienização” feita pelo estado de Israel sobre a Palestina, o que
considera um argumento ‘fora da realidade’ do que lá acontece. “Isto é
contrário à política externa brasileira. Não somos contra a discussão
sobre a construção de uma solução para o conflito entre os povos, mas
por meio da paz e do diálogo”, disse.
Na opinião do deputado estadual Valdeci Oliveira , que é contrário ao
veto do espaço da Assembleia para realização do Fórum, o debate
proposto pela primeira vez sobre a realidade do povo palestino é ponto
central do evento e deve ser respeitado. “É legitimo, importante. Não
são verdadeiras as afirmações de que possa ser algo agressivo ou para
gerar conflitos. Ao contrário, é um evento pela paz e diálogo. Não serão
os espaços da Assembleia que diminuirão a importância do Fórum
Palestina Livre. Eu apoio totalmente este evento”, salientou.
Já estão inscritas no evento 200 organizações e mais de 160
atividades, que incluem debates com a presença de autoridades,
dirigentes partidários e militantes dos movimentos sociais palestinos,
lançamento de livros, apresentação de filmes e documentários. O Fórum
acontecerá de 28 de novembro a 1º de dezembro, em Porto Alegre, e tem
como objetivo reunir pessoas e organizações no apoio à causa palestina,
através de conferências e atividades culturais que ocorrerão no centro
de Porto Alegre e ao longo da orla do Guaíba.
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