Mensagem de um ativista social
Prezado Juremir,
Sou um dos teus leitores assíduos e venho declarar minha satisfação em acompanhar teu trabalho jornalístico – ainda não tive oportunidade de acessar teus livros.
Bom, certamente não escrevo para babar ovo, mas sei o quanto é importante – para renovar as esperanças progressistas - que um ser qualquer venha reconhecer a qualidade do nosso trabalho.
Sou um desses ativistas de Porto Alegre – facilmente taxável de vagabundo, desocupado, baderneiro. Este estigma cabe a mim, mesmo sendo estudante e trabalhador da saúde, já que dedico meus tempos livres a fazer arruaça, quando deveria estar promovendo a paz familiar e a obediência dedicada à televisão.
Fui um dos manifestantes brutalmente espancado no 04 de outubro de 2012 pela Tropa de Choque da BM e mais brutalmente ainda pela Guarda Municipal de Porto Alegre. O motivo é claro: junto com algumas centenas de jovens (e não tão jovens) componho um grupo de desviados da moralidade e da opinião conservadora desta sociedade de discurso único.
Na última quarta-feira, após um dia de trabalho decidi novamente ir vagabundear no paço municipal e promover algazarra gratuitamente, contra o aumento da passagem de ônibus. Os meios retrataram com “assombrosa” solidariedade a violência praticada por manifestantes contra Secretário Buzato, atingido por tinta vermelha. Falou-se que os manifestantes teriam matado os servidores municipais caso tivessem conseguido entrar na Prefeitura. Falou-se muito em investigar, identificar e responsabilizar os meliantes. No entanto, os servidores da GM e da BM que usaram de violência extrema contra manifestantes completamente desarmados, deixando alguns litros de sangue derramados pelo centro da capital no outubro passado não foram identificados, e muito menos responsabilizados de nada. Tive minha cabeça aberta por uma bordoada (quando, com as mãos ao alto, pedia calma aos servidores da Guarda que me perseguiam). Fiquei 30 min sangrando com a cabeça aberta porque a SAMU foi proibida de atender pela Brigada Militar. Tudo isto foi dito inúmeras vezes em depoimentos ao Ministério Público, à Corregedoria da Guarda Municipal, à Ouvidoria de Segurança Pública do RS, à Brigada Militar. Disse mil vezes que poderia reconhecer o guarda. Nada foi feito. Como eu, dezenas de manifestantes foram violentados por este fascismo, já naturalizado, das forças repressoras do Estado Brasileiro. E que importância têm os Meios nesta maldita naturalização da violência do Estado e da criminalização do ativismo político.
Agora, deixando de lado este sarcasmo indignado, venho apelar a ti, que és uma rara voz crítica entre um mar de comunicadores fascistas da mídia. Necessitamos fazer uma grande aliança progressista para retomar a decência em Porto Alegre. Não faltam evidências para entender que nos aproximamos de um estado de brutalidade – acentuado pela proximidade da Copa 2014. Nem o patrimônio ambiental da cidade está a salvo do fascismo disfarçado de modernidade.
É preciso trazer à superfície a essência dos conceitos de democracia, participação, cidadania, justiça social e qualidade de vida. Está tudo fora de lugar, tudo subvertido pelo consumismo que faz pensar que shopping e carro são essenciais, enquanto árvores e espaços públicos de qualidade são besteiras. É preciso reconstruir a ideia de democracia, fora dessa sínica trama eleitoreira, que tira o sentido e a vida do ato político. É urgente.
Vozes fortes da hierarquia da Brigada e da Prefeitura trabalham intensamente para naturalizar a barbárie, o estado de exceção que se avizinha com a Copa. E para isto tem contado com o apoio incondicional dos Meios. Sei o quanto nadas contra essa maré. Meu apelo é para que não descanses enquanto formador de outros jornalistas, enquanto voz ativa e com espaço para tensionar. Se não fortificarmos as bases da democracia corremos o risco de voltar ao impensável. 1964 não está tão longe, tendo em conta que grande parte das novas gerações sequer sabe o que foi, e muitos dos que sabem foram induzidos ao erro e acham que foi positivo.
Como professor de Sociologia e servidor da Saúde Pública te coloco este apelo por solidariedade ao ativismo de agora, o real, o que ainda move milhares às ruas, mas que é massacrado pelos Meios para vetar qualquer identificação por parte da população a quem queremos comunicar. A pauta de hoje é justa e vem ganhando apoio da população e dos rodoviários. O último ato contra o aumento da passagem teve mais de 1500 pessoas, que corajosamente marcharam ao palácio da polícia para mostrar que não temos medo e continuaremos nas ruas. Tua voz é importante agora e sempre.
Um grande abraço.
German Alvarez
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