Galiza - Diário Liberdade - [Rodrigo Moura] Na primeira metade do século XIX, nota-se a permanência de um silêncio na literatura galega. É certo que ainda persistem gêneros tradicionais, de caráter oral, assim como uma literatura de circunstâncias centradas nos acontecimentos políticos e sociais destes anos: a guerra contra os franceses, a defesa da Constituição, a luta contra a Inquisição e contra os absolutistas e liberais.
Grande parte dos escritores desta época são versos e prosas propagandísticos que adotam com frequência a forma de diálogos. Distante de qualquer pretensão estética, esses autores e obras ficam à margem da literatura culta, sendo estimáveis apenas pelo seu valor documental.
Da mesma forma, como acontecera durante os Séculos Obscuros, háouve algumas pequenas mostras de um caráter literário específico: uma delas diz respeito à uma pequena peça dramática intitulada A casamenteira (1812), de Antonio Benito Fandiño em que inside numa pintura costumista, anunciando uma das temáticas preferidas da literatura galega deste século; as outras mostras pertencem a Nicomedes Pastor Díaz, poeta ilustre do Romantismo espanhol. Trata-se de uma Égloga e de uma Alborada (datadas em torno de 1828), caracterizadas com elementos neoclássicos e pré-românticos, que apresentam motivos recorrentes no posterior Rexurdimento: a temática amorosa, a percepção animada e simbólica da paisagem ou a abundância do diminutivo com valor afetivo.
Por último, na segunda metade do século XIX ganha destaque o chamado Rexurdimento na literatura galega. Nesse contexto, concorrem várias circunstâncias: a retomada do pensamento Iluminista une-se ao pensamento romântico europeu, que valorizava as singularidades de cada país e a variedade cultural. O levantamento de 1846 deu lugar ao nascimento do galeguismo como fonte ideológica. Aparece, assim, uma literatura culta em galego, com tons costumistas, elegíacos e, em todo caso, reveidicativos. Para entendermos melhor a importância destes acontecimentos, temos que valorar todo o esforço humanista de alguns autores que, desconhecendo a existência da rica tradição literária medieval, se esforçaram por dignificar esteticamente um idioma desprezado e relegado ao âmbito rural e familiar.
Neste caminho tiveram um destacado papel alguns editores, como Andrés Martínez Salazar, que publicou inúmeros títulos fundamentais do Rexurdimento, assim como textos literários - A crónica Troiana, por exemplo, e documentos inéditos até então, favorecendo os trabalhos dos historiadores. Entre eles, dever-se-ia destacar a figura de Manuel Murguía, que na sua Historia de Galicia dá inúmeras explicações acerca da cultura galega. Além disso, pode-se considerar Murguía como um autêntico promotor do Rexurdimento literário, devido ao seu prestígio e influência sobre Rosalía de Castro, Eduardo Pondal e Curros Henriques, os três grandes mestres do século XIX.
Em 1861 celebraram-se os primeiros Xogos Florais de Galiza, acontecimento que propiciou o aparecimento de uma antologia poética do nascimento do Rexurdimento. Nela figuram muitos autores que adiantam toda uma nova estética da literatura galega: a temática de costumes, rural e paisagista, entendida como reveindicação e procura dos sinais de identidade do povo galego, e a consciência do abandono e marginalização que Galiza sofre.
Xosé Manuel Pintos (1811-1876) publicou em 1853 o primeiro livro da literatura galega moderna: A gaita gallega. Trata-se de uma miscelânea de prosa, verso, vocabulário e anotações linguísticas, que tem como fio condutor a iniciação do rapaz castelhano Pedro Luces no cargo de gaiteiro - representante da consciência galega. Em todo caso, a obra supõe uma defesa de Galiza, denunciando ora os desmandos dos setores alienados em processo de aculturação, ora os efeitos negativos do êxodo migratório. Para tanto, utiliza-se de uma voz reveindicativa em prol da restauração do uso do idioma galego.
Rodrigo Barreto da Silva Moura - Mestrado (Conceito 5/CAPES) em Literatura Portuguesa e Galega Contemporânea pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Tem diversos trabalhos publicados em periódicos brasileiros e apresentações em Congressos Internacionais em que defende uma aproximação entre os estudos literários galegos e a lusofonia. Participa da organização das Jornadas das Letras Galegas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
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