Mostrando postagens com marcador America Latina. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador America Latina. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Os USA e os novos golpes...


Esquivel, prêmio Nobel da Paz: “Protestos na Venezuela são movidos pelos EUA”



Em entrevista à imprensa argentina, o Prêmio Nobel da Paz Adolfo Pérez Esquivel garantiu que “há uma intenção de desestabilizar não apenas a economia como também a ação social e política” na Venezuela.
Ao comentar nesta segunda-feira (17/02) a série de protestos e marchas de opositores ao governo de Nicolás Maduro, o arquiteto, escritor e ativista pelos direitos humanos disse também que há uma “investida originada nos Estados Unidos”.
“Tudo isso para produzir mudanças que não se fazem por meio de eleições”, disse o argentino. Para Esquivel, quem move os “fios dos protestos são os EUA e seus aliados”.
Esquivel pediu também maior presença do Mercosul (Mercado Comum do Sul), bloco formado por Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e Venezuela — em nota divulgada hoje, o Mercosul repudiu a violência e “ameaças de ruptura da ordem democrática” no país. “O Mercosul tem que se fortalecer. Estão muito lentos”, disse Esquivel, horas antes da publicação do comunicado do bloco.
O Nobel da Paz ainda elogiou as conquistas sociais da Venezuela, ressaltando que a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) reconheceu o país latino-americano por ter erradicado o anafalbetismo da população.
“Fui até as zonas marginais. Ali, as pessoas não tinham água e nenhum médico se atrevia a entrar para prestar atendimentos. A Venezuela era um país que não produzia nada, era provida pelos EUA. Hoje, a Venezuela tem um integração”, disse Esquivel.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Medicina cubana, exemplo de humanidade...


Médico cubano fala à imprensa pela primeira vez

Em entrevista exclusiva, Maikell Rodriguez Valle diz por que escolheu Candiota para trabalhar, desmente inverdades sobre o Mais Médicos e diz como se sentiu ao ser denunciado por um colega de profissão
Profissional disse levar muito a sério o juramento de Hipócrates
Crédito: ANTÔNIO ROCHA
Ele gosta de churrasco, mas é hipertenso. Prometeu começar academia semana que vem, se o serviço permitir. Esteve na Venezuela e na Bolívia realizando o mesmo trabalho que faz no Brasil, em comunidades pobres e indígenas que, historicamente, tiveram pouco acesso à saúde pública. Foi manchete dos principais jornais brasileiros semana passada, quando um colega de profissão de Bagé o denunciou ao Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers) por ter atendido a um paciente em estado grave, fora da sua jurisdição. "Nós temos experiências em outros países. Não somos novatos", disse, como que respondendo a quem duvida de sua competência. "Quando cheguei ao Brasil, falei que não íamos mudar nada na saúde que o Brasil não queira mudar", lembrou.     
O médico mais badalado do Brasil atualmente - depois, apenas, da colega Ramona Rodríguez, que pediu asilo aos EUA para ver o namorado em Miami - concedeu entrevista exclusiva ao Jornal MINUANO. Entrevista esta pretendida desde semana passada, quando o profissional se tornou assunto na imprensa nacional, mas preferiu esperar a turbulência passar.  
Na sede da prefeitura de Candiota, bairro Dario Lassance, Maikel Rodriguez Valle, 34 anos, recebeu a equipe de reportagem e falou, em bom portunhol, por mais de uma hora. Consequência do diálogo mantido com seus pacientes no interior do município, onde prefere atuar. Atrasou-se por alguns minutos, pois estava fazendo o que manda a profissão: salvando vidas. Agora, quando o Ministério da Saúde está prestes a arquivar a denúncia do Conselho Regional de Medicina (Cremers), numa demonstração clara de bom-senso, o cubano quebra o silêncio. Fala da medicina e da saúde pública em Cuba, do programa federal Mais Médicos, por que escolheu Candiota para trabalhar e o que sentiu ao ser denunciado por um colega de profissão.
 
De Cuba para o Brasil
Valle é divorciado e pai de dois filhos. Um de seis e outro de quatro anos de idade. Não os trouxe por opção, visto que são muito novos e, segundo ele, seria traumático para as crianças esse choque de cultura e mudança de idioma. Neste ponto, Valle desmente o primeiro mito acerca do Mais Médicos, onde diziam que eram proibidos de trazer as famílias. "Conheço colegas que trouxeram a família. Eu não trouxe por que moro em Cuba, vou voltar para lá e não quero que meus filhos retornem falando português", explicou. A família que ficou em Cuba segue recebendo o salário que ele recebia no Hospital de Pinar Del Rio: "O Mais Médicos é um extra no salário", declarou.   
Formou-se em Medicina em 2007, na Faculdade Ernesto Che Guevara, em Pinar Del Rio, província que fica ao leste da ilha, há 142 quilômetros da capital Havana. Fez residência em Medicina Geral e Integrada (saúde da família), e iniciou sua segunda especialização em anatomia patológica. Trancou os estudos após se inscrever no programa federal. Pretende retomá-los após cumprir sua estada em território brasileiro, que compreende três anos de trabalho. Ao completar um ano no Brasil, vai tirar férias na ilha e rever os filhos. 
Ficou sabendo do programa Mais Médicos através de um edital publicado pelo governo cubano. Resolveu se inscrever por iniciativa própria, desmitificando o boato de que são obrigados pelo regime castrista a vir trabalhar. "Nós que quisemos participar, nada é obrigado. Da mesma forma como fomos para Venezuela e Bolívia", afirmou. Perguntado se vale a pena financeiramente, respondeu: "Desse tema nós não falamos. Mas realmente estou muito feliz. Algumas coisas as pessoas tergiversam", disse, afirmando que está muito satisfeito com o salário e que não se tornou médico para ganhar dinheiro, mas para levar saúde à população.       
 
O episódio 2 de janeiro
Sobre o que aconteceu no dia 2 de janeiro de 2014, no Hospital Beneficente de Candiota, Valle foi reticente. Disse apenas que foi aquilo mesmo que está nos jornais e não quis discorrer sobre o assunto. Não se sentiu chateado ou magoado pela denúncia do colega de profissão. Pelo contrário. Mostrou amadurecimento e uma grande espiritualidade em não recriminar a atitude, respeitando a opinião dos brasileiros e se dando o direito de apenas discordar. "Para mim o importante é a opinião do povo", disse, fazendo alusão ao massivo apoio que obteve nas redes sociais e, inclusive, da presidente Dilma Rousseff. 
Sobre as críticas que o programa Mais Médicos e os cubanos vêm recebendo da categoria brasileira, Valle deu uma lição de humanidade e respeito: "Nós levamos muito a sério o juramento de Hipócrates, que diz que devemos tratar nossos colegas médicos como irmãos. Isso é uma lei do juramento hipocrático, que nós cubanos temos muito presente. Para nós eles são irmãos. O programa tem sido atacado por que toda a mudança traz um pouco de repercussão. É algo normal", considerou. "Da nossa parte nunca vai haver uma resposta negativa contra os colegas. Sempre vamos tratá-los como irmãos. Podemos dizer que em Cuba eles são bem-vindos. Eles e todos os colegas do mundo".
A maioria dos médicos cubanos, segundo Valle, tem duas especializações. Os que não possuem, estão cursando, assim como ele. Ou seja, ninguém é marinheiro de primeira viagem, como reza o corporativismo médico brasileiro que duvida das qualificações cubanas.   
Trabalham 32 horas por semana, com oito horas reservadas para os estudos. Mas como atende no interior, Valle trabalha bem mais tempo. "Estamos tratando de fazer realmente como está concebido na medicina familiar, que é a prevenção, mudanças de modos e estilo de vida, partindo da célula da sociedade, que é a família: tem que conversar, tem que ver as condições de vida, o ambiente onde mora, a alimentação, as condições da água", explicou, confessando que não gosta do tumulto da cidade e que prefere a calma dos campos. 
 
A rotina em Candiota 
De acordo com o médico cubano, quase não existe diferença entre trabalhar em Cuba ou no Brasil. A diferença maior, segundo ele, está nas doenças, visto que regiões tropicais apresentam enfermidades específicas. A outra diferença é a de que todo e qualquer exame, cirurgia, tratamento ou atendimento é gratuito na "ditadura castrista".  
Em Candiota, o maior problema são os hipertensos, em virtude da alimentação fronteiriça. Principalmente as carnes nos churrascos, o que ele sabe que faz parte da cultura, mas que pretende orientar os consumidores mais pré-dispostos à hipertensão. Ele mesmo é um adepto aos assados gaúchos, mas tem de pegar leve porque faz parte da lista dos que sofrem de pressão alta.    
Atua com uma equipe composta por três pessoas: um médico, um enfermeiro e um agente de saúde. De casa em casa percorrem quilômetros por dia, nos lugares mais isolados do município, alguns de difícil acesso. Comentou que, em Cuba, quando as localidades não permitem chegar de carro, alguns profissionais não se incomodam de atender a cavalo quando as situações exigem. 
Agora estão no aguardo de uma unidade móvel equipada para qualificar ainda mais o atendimento. E existe a previsão da chegada de mais dois profissionais cubanos para auxiliarem nos trabalhos.  
Mantém um bom relacionamento com os médicos brasileiros que atuam em Candiota. "O Mais Médicos trata-se de um trabalho em conjunto. Entre todos vamos tratar de ajudar a população. Nossa ideia é poder trabalhar juntos, mas não pensando cada um por si. Não tenho problemas pessoais com ninguém. Há médicos que falam bem do programa, que são a favor e que querem ajudar", relatou.    
Valle é situado historicamente. Explicou que pesquisou sobre Candiota e que escolheu a cidade não pela usina, mas por abrigar a região onde se travou a Batalha do Seival, por causa de Antônio de Souza Netto, destacado líder da Revolução Farroupilha, e também por Bento Gonçalves e os Lanceiros Negros. 
 
Os candiotenses agradecem 
Os pacientes até estranham em receber médicos em casa para atendê-los. "Eles são muito agradecidos", comentou. O cubano quer apenas trabalhar e levar saúde e informação aos candiotenses. Quando imprevistos ocorrem, como no caso da denúncia do Simers, apenas acompanha de longe, não se envolve, pois sabe que, no íntimo, agiu corretamente. "Estamos acostumados às dificuldades, mas isso nos dá mais forças. Cuba tem um povo lutador. Estamos bloqueados pelos EUA há décadas e Cuba segue firme sem esmorecer", alegou. "Nossa concepção de vida é mais espiritual do que material".    
Com a decisão extraoficial de que o Ministério da Saúde irá arquivar a denúncia feita pelo Cremers, sepultando a hipótese de deportação de alguém que quis salvar uma vida, quem ganha é a população de Candiota. Porque, parafraseando Che Guevara, "hay que endurecerse pero sin perder la ternura jamás".        
 
Fonte: JORNAL MINUANO
Por: Felipe Severo

sábado, 8 de fevereiro de 2014

Washington desestabiliza a Ucrânia - da Rede CastorPhoto


Paul Craig Roberts: EUA desejam derrubar governos do Brasil, Venezuela, Bolívia e Equador!


 [*] Paul Craig Roberts – Institute for Political Economy


Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Barack Obama, um maníaco?
 maníacos por controlar o mundo, em Washington, pensam que só é democrático o que Washington decida e imponha contra outros países soberanos. Nenhum outro país da Terra será jamais capaz de tomar uma, sequer uma, decisão democrática.

O mundo assiste há eras a essa arrogância dos EUA, com Washington derrubando um governo democrático após outro e impondo em cada país um fantoche norte-americano. É o que Washington fez no Irã em 1953, quando a CIA, como a própria agência já admite e Ervand Abrahamian demonstra em seu livro The Coup [O Golpe] (The New Press, 2013) derrubou o governo eleito de Mossadeq; e como Washington fez também mais recentemente, quando derrubou o governo eleito de Honduras, e como fez inúmeras outras vezes em todos esses golpes.

Atualmente, Washington trabalha em tempo integral e faz horas extras para derrubar o governo da Síria, do Irã (outra vez!) e da Ucrânia. 

Washington também já pôs em sua alça de mira a democracia da Venezuela, da Bolívia, do Equador e do Brasil; e, nos seus sonhos mais enlouquecidos, Washington sonha com derrubar também governos de Rússia e China.

Dia 22/1/2014, Bouthaina Shaaban conselheira de Comunicações do governo sírio, perguntou a Wolf Blitzer, propagandista alugado a Washington e ao lobbyisraelense, em plena televisão norte-americana, por que o governo dos EUA, falando pela boca do secretário de Estado John Kerry, imagina que teria o direito de decidir quem deve governar a Síria, em lugar do povo sírio. [Pesquisas mostram que os índices de aprovação do presidente al-Assad são superiores aos de todos os governantes ocidentais]. Nem o viscoso-escorregadio Blitzer foi suficientemente viscoso-escorradio para responder “porque nós somos o povo excepcional, indispensável”. Mas é o que Washington pensa. Entrevista a seguir (em inglês):

Não demorará, e Washington retomará o trabalho de desestabilizar o governo do Irã, um hábito, suponho. Mas, no presente momento, Washington está dedicada a desestabilizar a UcrâniaA Ucrânia tem um governo democraticamente eleito, mas Washington não gosta dele, porque não foi escolhido por Washington. A Ucrânia ou a parte ocidental do país está cheia de ONGs mantidas por Washington cujo objetivo é entregar a Ucrânia às garras da União Europeia, para que os bancos da União Europeia e dos EUA possam saquear o país como saquearam, por exemplo, a Letônia; e para simultaneamente enfraquecer a Rússia, roubando parte da Rússia tradicional e convertendo-a em área reservada para bases militares de EUA-OTAN contra a Rússia.
Vladimir Putin , atleta
Talvez Putin, atleta, esteja distraído pelos Jogos Olímpicos na Rússia. É isso, ou é uma espécie de charada que ainda não deciframos, mas... Por que a Rússia não pôs em alerta máximo os seus mísseis nucleares e ocupou com soldados o oeste da Ucrânia, para impedir que todo o dinheiro da Ucrânia seja roubado por Washington? Em todos os países há cidadãos que trocariam por dinheiro o próprio país; e o oeste da Ucrânia pulula de traidores desse tipo. [No Brasil temos os MILICANALHAS e os demotucanos! redecastorphoto]

Como temos visto há décadas, árabes e muçulmanos são capazes de vender o próprio povo em troca do dinheiro ocidental. Os ucranianos ocidentais também estão interessados no mesmo negócio. As ONGs financiadas por Washington existem para entregar a Ucrânia às garras de Washington; ali os ucranianos converter-se-ão em servos dos EUA, e essa parte essencial da Rússia será transformada em palco para exibição da violência militar dos EUA.

De todos os “protestos” violentos aos quais o mundo tem assistido, os “protestos” na Ucrânia são os mais completamente orquestrados.

Dia 6/2, o blog Zero Hedge, um dos sites inteligentes e bem informados da Internet, postou uma gravação “vazada” em que fala a desprezível Victoria Nuland, uma das secretárias-assistentes de Estado do governo Obama. Nuland e Geoffrey Pyatt, enviado dos EUA à Ucrânia, discutem sobre quem Washington coroará próximo chefe de governo da Ucrânia. 

Victoria Nuland: F*da-se a União Europeia
Nuland está furiosa, porque a União Europeia não se uniu a Washington no plano para impor sanções ao governo ucraniano para completar a tomada da Ucrânia por Washington. Nuland fala como se fosse Deus, como se tivesse direito divino para escolher quem governa a Ucrânia – que ela já está escolhendo.

A União Europeia, por corrompida que já esteja pelo dinheiro de Washington, mesmo assim ainda consegue entender que ter enriquecido com o dinheiro de Washington não lhe garante qualquer proteção contra os mísseis nucleares russos. A resposta de Nuland à União Europeia que hesita em arriscar a própria existência em benefício da hegemonia dos EUA é:

“Foda-se a União Europeia”.

São os votos de Washington aos seus aliados mais cativos e a todos os povos do mundo.



[*] Paul Craig Roberts (nascido em 03 de abril de 1939) é um economista norte-americano, colunista do Creators Syndicate. Serviu como secretário-assistente do Tesouro na administração Reagan e foi destacado como um co-fundador da Reaganomics.Ex-editor e colunista do Wall Street Journal, Business Week eScripps Howard News ServiceTestemunhou perante comissões do Congresso em 30 ocasiões em questões de política econômica.

Durante o século XXI, Roberts tem frequentemente publicado em Counterpunch, escrevendo extensamente sobre os efeitos das administrações Bush (e mais tarde Obama) relacionadas com a guerra contra o terror, que ele diz ter destruído a proteção das liberdades civis dos americanos da Constituição dos EUA, tais como habeas corpus e o devido processo legal. Tem tomado posições diferentes de ex-aliados republicanos, opondo-se à guerra contra as drogas e a guerra contra o terror, e criticando as políticas e ações de Israel contra os palestinos. Roberts é um graduado do Instituto de Tecnologia da Geórgia e tem Ph.D. da Universidade de Virginia, pós-graduação na Universidade da Califórnia, Berkeley e na Faculdade de Merton, Oxford University.

sábado, 1 de fevereiro de 2014

Não nos esqueçamos da Taxa Tobin!






Um tema recorrente no debate sobre mudanças estratégicas em nosso País refere-se à necessidade de uma reforma tributária. Assim como a reforma política ou a reforma previdenciária, trata-se apenas de um mote para promoção de alterações em algum sistema jurídico-institucional existente. Podem ser encontradas diferentes alternativas e modelos para atender a todos os gostos. O “xis” da questão reside no verdadeiro sentido da transformação que se pretende operar, uma vez que não existe neutralidade na adoção de determinado tipo de política pública. Haverá sempre algum tipo de interesse por trás das diferentes propostas colocadas sobre a mesa, sempre que assuntos desse tipo venham à baila.

No caso da reforma tributária, o quadro de conflitos existentes é bastante explícito.
 
Os representantes do capital normalmente se escondem por trás dessa reivindicação genérica para pleitear a redução de impostos. E ponto final. Sob o discurso da carga tributária excessiva ou da cantilena do elevado custo Brasil, os representantes do empresariado pretendem diminuir o volume de tributos incidentes sobre suas atividades. Pouco importa se tal “reforma” vai implicar uma carência de receitas do Estado para dar conta das despesas envolvidas com a manutenção das políticas públicas tão sabidamente emergenciais e necessárias.
 
Afinal, o que importa mesmo é a busca tresloucada pela rentabilidade do empreendimento privado.

Sistema tributário regressivo e a necessidade de mudança

Outro enfoque bem distinto para dar conta da questão tributária implica em reavaliar a natureza do nosso sistema de impostos. E qualquer análise minimamente isenta vai confirmar que se trata de um modelo bastante regressivo.
 
Isso significa que ele foi concebido de forma a penalizar os setores de renda mais baixa da população. São várias as razões para a sobrevivência de tal quadro. Ainda não foi implementada a regulamentação do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF), tal como previsto no art. 153, inciso VII, da Constituição Federal. A sistemática de alíquotas do Imposto de Renda suaviza os segmentos de renda muito elevada. Os impostos sobre consumo de bens e serviços não são capazes de diferenciar o comprador de acordo com sua remuneração. Assim, o milionário paga o mesmo tributo incidente sobre o litro de leite ou sobre o kwh da conta de eletricidade do que um assalariado que ganha um salário mínimo.

Portanto, quando se fala em reforma tributária, a estratégia dos trabalhadores e demais setores populares deve ser a de implementação de um modelo progressivo, de maneira a que passem a contribuir com mais impostos as camadas sociais que sejam mais bem aquinhoadas na repartição do bolo do patrimônio e da renda. Paga mais tributo quem possui mais riqueza ou quem recebe mais dinheiro.
 
Simples assim, uma mera questão de equidade e de restabelecimento de padrões mínimos de justiça social. E as possibilidades de utilização de instrumentos de tributação com esse fim são bastante amplas, podendo ser também de incidência internacional.

Taxa Tobin: inovação tributária global

Um exemplo bem característico dessa modalidade é a chamada Taxa Tobin. Trata-se de uma proposta que foi apresentada pelo economista norte-americano James Tobin (prêmio Nobel de economia em 1981), ainda na década de 1970. Há quase meio século atrás, ele propôs a criação de um imposto a ser aplicado sobre as operações envolvendo transações financeiras internacionais. Apesar de sua formação conservadora, Tobin compreendia a necessidade de impor algum grau de regulação na desordem perversa dos negócios internacionais. Ocorre que a idéia sofreu ataques pesados por mais de trinta anos, em particular pelas forças ligadas ao sistema financeiro, em especial a partir do momento em ela se transformou em bandeira dos movimentos progressistas pelo mundo afora. A criação de uma taxa sobre as transações financeiras internacionais cumpriria com duas funções. Por um lado, o papel de regular esse tipo de operação, até hoje fora de qualquer tipo de supervisão ou controle. De outro lado, a possibilidade de constituir um fundo internacional, a partir do recolhimento da taxa, com objetivo de redução das desigualdades sociais e econômicas existentes entre as nações.

Ainda que o autor da proposta tenha tentado voltar atrás em sua proposição inicial, ela adquiriu vida própria e se converteu em uma das bases da constituição de movimentos e organizações que pleiteiam uma nova ordem econômica mundial. É o caso da ATTAC, sigla da “Associação para a Taxação das Transações Financeiras para Ajuda aos Cidadãos”, criada na França em 1998. Em pouco tempo a iniciativa ganhou escala internacional, aproveitando a toada do movimento altermundista e das articulações do Fórum Social Mundial. Durante a época de hegemonia absoluta do pensamento neoliberal, havia muito pouco ou quase nenhum espaço para esse tipo de proposição nos foros institucionais oficiais. Afinal, a criação de um tributo sobre qualquer tipo de transação econômica era vista como uma ingerência indevida no reino intocável das livres forças de mercado. Heresia pura!

Tanto mais se a intervenção que se imaginava viesse para o espaço do financismo e das relações econômicas internacionais. Vale lembrar que um dos pressupostos essenciais do Consenso de Washington era a livre circulação de capitais entre os países, sem nenhuma interferência nas entradas e saídas dos fluxos financeiros. A instituição de uma taxa impositiva nessa seara era vista como algo inconcebível.
 
No entanto, nada como um dia após o outro - e uma crise financeira internacional no meio - para colocar alguns dogmas do liberalismo em questionamento. Após a catástrofe provocada pela quebradeira generalizada dos bancos norte-americanos em 2008, o próprio “establishment” da economia mundial começou a flexibilizar seus graus de ortodoxia. Nada que cheirasse a alguma transformação mais profunda, de natureza político-ideológica. Apenas uma acomodação racional e oportunista, com o intuito de chamar o Estado de volta à cena e ajudar o capital a reduzir as suas perdas. “Business as usual”. A velha estória de promover a apropriação privada de lucros e a socialização de prejuízos.

A crise internacional e oportunidade de mudança

Assim, dentre as diversas propostas de inspiração keynesiana que passaram a frequentar a agenda dos organismos multilaterais desde então, voltou a ser mencionada a taxação das transações financeiras internacionais. O Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial (BM) e a própria União Européia (UE) resolveram incorporar o debate a respeito do assunto. Afinal, algumas projeções levavam a resultados bem interessantes, do ponto de vista das finanças internacionais. Um exercício com a alíquota irrisória de 0,01%, por exemplo, a incidir sobre alguns tipos de operações financeiras no mercado globalizado levariam a uma arrecadação superior a US$ 400 bilhões anuais. Uma quantia razoável para se iniciar um programa global contra a fome e a miséria, por exemplo. Ou seja, uma taxa praticamente invisível propiciaria a arrecadação de somas e fundos expressivos. Nesse caso, fica evidente que o discurso de que a ação do Estado sempre distorce a dinâmica do mercado não se sustenta. Uma alíquota como essa passa praticamente desapercebida pelos preços transacionados, mas resulta em volume de recursos nada desprezível, em razão da escala das operações.

Os momentos mais adequados para a introdução desse tipo de inovação são, em geral, aqueles marcados por algum tipo de crise. No entanto, é fundamental assegurar que os recursos sejam destinados a mecanismos de redução das desigualdades entre os países no mundo e não simplesmente a socorrer os caixas das instituições financeiras em dificuldades. Aliás, caso o governo brasileiro esteja mesmo interessado em manter seu protagonismo na esfera da diplomacia internacional, nada mais interessante do que patrocinar esse tipo de sugestão. Os países do Terceiro Mundo só terão a agradecer a iniciativas como essa, bem como a maioria da população do planeta.

Se o espaço de aceitação da Taxa Tobin continuar se ampliando, como indicam as pressões recentes de países europeus e da própria China, faz-se necessário avançar também na definição do arcabouço institucional. No plano das uniões econômicas ou da soberania de cada país, é mais fácil criar e gerir um tributo dessa característica. Porém, inexiste até o momento, um espaço internacional com legitimidade diplomática e capacidade tributária global. O caminho passa pela construção de um amplo consenso transcontinental em torno da medida e a constituição de um fundo mundial comunitário a partir da coleta dos recursos oriundos das transações tributadas.

Esta seria uma importante demonstração - concreta e objetiva - de que um outro mundo é mesmo possível.

- Jaciara Itaim é economista e militante por um mundo mais justo em termos sociais e econômicos.
 
23/01/2014


http://www.alainet.org/active/70741

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

O quase milagroso fortalecimento da Celac e o sonho da "Pátria Grande




 ATILIO BORÓN
  no CORREIO DA CIDADANIA





Contra todos os prognósticos, a comunidade de países vai se consolidando como instituição “nuestroamericana”. Não é um milagre, mas quase. Contra todos os prognósticos, a Celac (Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos) vai se consolidando como instituição “nuestroamericana” e está a ponto de celebrar em Havana sua segunda cúpula de presidentes.

Dizemos “milagre” porque quem poderia ter imaginado, há apenas cinco anos, que o sonho bolivariano de Hugo Chávez – sonho fundando em um impecável diagnóstico da geopolítica mundial – de construir um organismo regional, sem a presença dos Estados Unidos e do Canadá, daria frutos?

Ele, Chávez, e aqueles que o acompanharam nessa empreitada patriótica, tiveram que vencer toda a classe de obstáculos: a resignação de alguns governos, a claudicação de outros, o ceticismo dos mais distantes e a sistemática oposição de Washington, dado menor na política de outros países. Eppur si muove, diria Galileu, ao contemplar a co-criação desse projeto bolivariano, pela primeira vez na história comum a todas as nações da América Latina e do Caribe, com a única exceção – até o momento! – de Porto Rico. Sem dúvidas, o fortalecimiento da Celac – como o da Unasul (União de Nações Sul-Americanas) no plano sul-americano – é muito boa notícia para a causa da emancipação da Pátria Grande.


A Casa Branca tentou, primeiro, impedir o lançamento da Celac, em dezembro de 2011 em Caracas, com a presença de seu incansável promotor e mentor, já atacado por um câncer que lhe custaria a vida. Ao fracassar em sua tentativa, o império mobilizou seus aliados regionais para abortar – ou pelos menos, adiar para um futuro indefinido – a iniciativa. Tampouco funcionou. A próxima estratégia consistiu na utilização de alguns de seus incondicionais peões na região como cavalos de Tróia, para estragar o projeto desde dentro.

Não avançou muito, mas conseguiu que o primeiro governo que exerceu a presidência pro-tempore da Celac, em 2012, o Chile de Sebastián Piñera, declarasse por meio da boca de Alfredo Moreno, seu chanceler, que “a Celac será um fórum, não uma organização, que não terá sede, secretariado, burocracia nem nada disso”. Um fórum! Quer dizer, um âmbito de amáveis e intranscedentes práticas de governantes, diplomatas e especialistas, que nem de longe colocariam em questão a dominação imperialista na América Latina e o Caribe.


E a Casa Branca também conseguiu, através do militante ativismo de seus principais amigos da Aliança do Pacífico, México, Colômbia e Chile, que todas as decisões da Celac deveriam ser adotadas por unanimidade. Parece que a “regra da maioria” – tão cara para a tradição política estadunidense – somente funciona quando lhes convém; quando não, impõe-se um critério que, de fato, dá poder de veto a qualquer dos 33 membros da organização. Mas essa é uma faca de dois gumes: Panamá e Honduras poderiam vetar uma resolução que exija colocar um fim ao status colonial de Porto Rico, mas Bolívia, Equador e Venezuela poderiam fazer o mesmo frente a outra que proponha requerer a colaboração do Comando do Sul dos EUA para combater o narcotráfico.

O segundo turno presidencial da Celac, em 2013, foi de Cuba, e o presidente Raúl Castro Ruz deu passos importantes para desbaratar as manobras do chanceler chileno: a institucionalização da Celac avançou e foi criado um embrião de uma organização que, para essa cúpula, conseguiu elaborar 26 documentos de trabalho, algo que nenhum fórum faz. Algumas propostas, como a declaração da América Latina e o Caribe como uma “Zona de Paz”, serão objeto de um debate surdo, porque não se trata só de evitar a presença de armas nucleares na região – como saber se elas não existem na base de Mount Pleasant, nas nossas Ilhas Malvinas? –, mas também de utilizar o recurso da força para resolver conflitos internos.


Esse tema faz alusão subliminar à tradição intervencionista de Washington na América Latina e à presença de 77 bases militares na região, cujo propósito é exatamente esse: intervir, quando as condições lhes convenham, com sua força militar na política interna dos países da região, complementando a aberta intervenção que Washington já realiza em todos eles.


Lembrem-se, para citar um exemplo bem didático, o papel decisivo da “embaixada” para determinar o ganhador da recente eleição presidencial em Honduras. O tema, como se pode ver, será um dos mais urticantes e divisórios, porque há governos, e não são poucos, que não somente toleram a presença dessas bases militares norte-americanas, mas que, como Colômbia, Peru e Panamá, as reivindicam.


Porto Rico

Outro tema potencialmente disruptivo é a aprovação da proposta venezuelana de integrar Porto Rico à Celac – que é absolutamente lógico, levando em conta a história e o presente desse país, assim como sua cultura, sua língua e suas tradições –, mas que provavelmente suscitará reservas entre os governos mais próximos a Washington, para quem Porto Rico é um inegociável espólio de guerra. Uma guerra cuja vitória foi apreendida dos patriotas cubanos e, graças à apropriação de Cuba, Porto Rico e Filipinas, a Roma americana iniciaria a transição de república a império.


Desconta-se, em troca, um apoio unânime para o pedido argentino com relação às Ilhas Malvinas, ao levantamento do bloqueio a Cuba e para outras propostas direcionadas a reforçar os vínculos comerciais, políticos e culturais. Sabe-se que o Equador apresentará uma proposta de repúdio à espionagem realizada pelos EUA e de desenvolvimento de uma nova rede de comunicação na Internet a salvo da interdição de Washington; e é provável que se aprovem propostas concretas em relação ao combate à pobreza e que se examinem alternativas para consolidar o Banco do Sul e, eventualmente, para criar uma grande empresa petroleira latino-americana, tema sobre o qual o presidente Chávez havia insistido uma e outra vez.


A transição geopolítica internacional em curso, e que se manifesta no deslocamento do centro de gravidade da economia mundial até a Ásia-Pacífico; o declínio do poderio global dos EUA; a irreparável queda do projeto europeu; a persistência da crise econômica iniciada no fim de 2007, e que parece somente se acentuar com o passar do tempo; e a permanência de uma “ordem” econômica mundial que concentra riqueza, marginaliza nações e aprofunda a depredação do meio ambiente têm atuado como poderosos incentivos para remover a inicial desconfiança que muitos governos tinham em relação à Celac.


Costa Rica

O acordo fechado em Caracas em 2011 estabelecia que uma troika tomaria sucessivamente conta da presidência durante os primeiros três anos: começou com o Chile, depois Cuba (ratificando o repúdio continental ao bloqueio estadunidense e seu propósito de isolar a Revolução Cubana) e, ao fim dessa cúpula, a presidência será passada à Costa Rica. O país, incondicional aliado de Washington, deverá enfrentar decisivas eleições em 2 de fevereiro, quando pela primeira vez em décadas a hegemonia política  da direita neocolonial costarriquenha estará ameaçada pela ascensão de um novo e surpreendente ator político: a Frente Ampla.


A atual presidenta, Laura Chinchilla, por muitos anos funcionária da USAID, é garantia, com o triunfo do oficialismo, da “domesticação” da Celac e do retorno ao projeto cunhado por Sebastián Piñera e expressado com total descaro por seu chanceler. Mas todas as pesquisas dão por certo que haverá segundo turno e, então, o discurso e as propostas bolivarianas do candidato da Frente Ampla, José M. Villata, poderiam catapultá-lo à presidência Costa Rica.


Com certeza, assim como aconteceu há poucos meses com as eleições presidenciais na vizinha Honduras, todo o aparato de inteligência, manipulação midiática e o financiamento dos partidos amigos já foi colocado em ação por Washington, para quem uma derrota  da direita neocolonial costarriquenha seria um revés de amplas repercussões regionais. Se isso acontecesse, a Celac poderia dar um novo passo em direção a sua definitiva institucionalização, algo que a América Latina e o Caribe precisam impreterivelmente.


Atilio Borón é diretor do Programa Latino-americano de Educação à Distância em Ciências Sociais (PLED), Buenos Aires, Argentina. Prêmio Libertador al Pensamiento Crítico 2013. www.atilioboron.com.ar - Twitter: http://twitter.com/atilioboronFacebook: http://www.facebook.com/profile.php?id=596730002

Tradução: Opera Mundi.

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Classes e luta de classes: retornando à classe média


ESCRITO POR WLADIMIR POMAR   no CORREIO DA CIDADANIA




Tomar a propriedade privada dos meios de produção e as relações de produção assalariadas como fatores básicos da divisão social e da caracterização das classes sociais parece algo superado para grande parte dos estudiosos do assunto, mesmo para aqueles que criticam o critério de renda com mais ou menos vigor.

Waldir José de Quadros, Denis Maracci Gimenez e Davi José Nardy Antunes, por exemplo, afirmam que a busca de pleno emprego num estado de bem-estar democrático teria gerado um cidadão de classe média com renda disponível pouco superior à da base do mercado de trabalho, com reduzida capacidade de diferenciação do consumo e cercado de ampla proteção social.

A camada inferior ou baixa dessa classe média seriam os auxiliares de escritório, vendedores, garçons, professores primários, policiais, auxiliares de enfermagem etc., com carências de todo tipo. Ou seja, na linha de Pochmann, eles incluem na classe média diferentes tipos de assalariados, ao invés de incluí-los na classe dos trabalhadores assalariados. Isto, segundo eles, porque essa camada se apropria de uma renda, embora pouco superior à da base do mercado de trabalho.

Por outro lado, em certo sentido, comungam da mesma opinião de Marcelo Neri, para o qual a renda, e a capacidade de consumo e acesso a bens duráveis, representaria o comportamento típico da classe média. Contra o que se insurge Eliana Vicente, já que consumir e desejar coisas não são particularidades da nossa sociedade, mas algo percebido em todas as sociedades, desde as pré-letradas. Os homens sempre consumiram, através de um metabolismo constante com a natureza, o que não é particularidade de qualquer classe social.

Em sua argumentação, Quadros et al mostram que, no Brasil, os 31,5 milhões de domicílios localizados no intervalo de renda da chamada nova classe média (entre R$ 1.315,00 e R$ 5.672,00, atualizados para 2013) abrigam uma forte desigualdade em seu interior, com predomínio de domicílios nas faixas de renda inferiores. É a partir dos mesmos critérios que Celia Kerstenetzky e Christiane Uchôa consideraram o perfil socioeconômico desses domicílios.

Como somente 23,6% deles possuem dois banheiros; 35,1% de seus chefes possuem cartão de crédito; 17,1% possuem cheque especial; 28,7% possuem plano de saúde; 7,8% possuem educação superior; e 8% de seus filhos estudam na rede pública, isto singularizaria a classe média no Brasil. Isto é, frente à insuficiência e condição insatisfatória dos serviços públicos universais, a classe média tenderia a consumir serviços sociais no setor privado, especialmente educação privada e plano de saúde.

Segundo elas, essa situação comprovaria a intuição de Bourdieu de que a classe média significaria não exatamente um padrão de consumo, mas um estilo de vida, que envolveria diferenciação/distinção de morar “bem”, ter uma educação “distinta”, consumir serviços de “qualidade”, ter acesso a capitais, entre outros. Nessas condições, as evidências indicariam que o perfil da assim chamada “nova classe média” de Neri não exibiria a maior parte dos critérios considerados distintivos de uma classe média, o que certamente é verdadeiro.

Vicente também parece concordar com isso. Afirma que lugares, comidas e vestimentas são elementos que marcam a distinção entre a classe média mais tradicional do segmento emergente da classe média e dos mais pobres. Assim, além do investimento em educação ser uma característica das classes médias modernas, seria este tipo de investimento que garantiria a reprodução e a perpetuação do status social desse grupo, conforme Guerra et al. Nesse ponto, Vicente se aproxima de Jessé Souza quanto ao papel do que este chama capital cultural.

O problema consiste em que caminhamos da renda para o estilo de vida, embora seja difícil falar de estilo de vida e de cultura sem falar em renda, da mesma forma que é difícil falar de renda sem falar de onde ela vem. Isso é, se vem da venda da força de trabalho, ou do trabalho assalariado, ou da apropriação de mais-valia através da utilização do capital, por menor que seja tal capital e a apropriação correspondente.

Certamente por isso, Sonia Fleury critica os intelectuais orgânicos que tomam como base o critério do crescimento da renda como indicador privilegiado da mobilidade social. Eles teriam adotado o termo classe C para indicar aquela parcela da população que, com o crescimento de sua renda, maior do que o crescimento da renda dos grupos mais ricos, teria ultrapassado a linha da pobreza e justificado sua inclusão no vago conceito de classe média.

No entanto, se continuarmos amarrados apenas ao conceito de mobilidade social, em que elementos de uma classe social podem trafegar dentro de sua classe ou de uma classe para outra, continuaremos com dificuldade para definir os critérios para a análise real das classes sociais. Mesmo Claudio Salm e Lígia Bahia, ao frisarem que o conceito de classe média foi construído pela sociologia clássica enfatizando a propriedade, se veem obrigados a colocar no mesmo plano da propriedade a educação diferenciada. O que, no final de contas, volta a diluir os fatores fundamentais para a conceituação de uma classe. Isto é, a propriedade e as relações de produção.

Amélia Cohn é mais direta. Segundo ela, a classe média tradicional vem, há muito, sofrendo um processo de crescente proletarização, seja vinculada aos serviços públicos, seja ao setor privado. Proletarização esta vinculada não ao valor do salário mínimo, mas à precarização das condições e dos contratos de trabalho. Para ela, há que se ir à luta e conquistar, custe o que custar, espaço no mercado de trabalho.

Marilene de Paula, ao contrário, considera que a classe média tradicional possui uma rede de relações e contatos que podem realocá-la em novos empregos de igual nível ou oferecer facilidades na obtenção de serviços públicos ou privados. Estaria preparada e formada para o exercício profissional. O que, a rigor, também vale para a classe trabalhadora assalariada com qualificação profissional. Assim, podemos deduzir que, em termos gerais, Eliana Vicente tem certa razão em supor que a denominação de “nova classe média” pode confundir e obscurecer o entendimento das questões relativas às desigualdades e ao consumo, este compreendido como forma de reconhecimento social.

Na verdade, o conceito de classe média, que pode ser usado genericamente para situar a classe social intermediária entre a burguesia e a classe trabalhadora assalariada, se torna um imbróglio quando se procura colocar à mostra suas características econômicas, sociais, culturais, ideológicas e políticas. Para clarificar tais características, talvez seja mais conveniente apelar para o tradicional conceito de pequena-burguesia, que oferece um maior rigor na classificação, ao mesmo tempo em que permite certa flexibilidade, tendo em conta as profundas tendências contraditórias dessa classe social.

Historicamente surgida no feudalismo, com base no capital comercial, ela deu surgimento ao capitalismo moderno, ao mesmo tempo em que se reproduzia e se transformava, tanto em burguesia, quanto em proletariado e ralé, ou lumpem-proletariado, em virtude da feroz luta contra os feudais, e também da não menos feroz competição ou concorrência capitalista.

Sua característica básica sempre foi a propriedade de pequeno capital, apenas transformável em meios de produção, ou capital constante, mas nem sempre com a capacidade de também transformá-lo em capital variável. O sapateiro, o chaveiro, o marceneiro, o ourives e outros indivíduos de categorias idênticas, que possuem as ferramentas e máquinas necessárias à produção e/ou ao conserto, mas não têm capital para contratar ajudantes, fazem parte da pequena-burguesia baixa, ou inferior. Na prática, eles arrancam a mais-valia absoluta e, portanto, o lucro, de sua própria força de trabalho.

Se seu negócio se torna promissor e lhe permite arrancar uma taxa maior de mais-valia e de lucro de seu trabalho-extra, isso lhe dá condições de contratar ajudantes ou outros profissionais, passando a arrancar mais valia não só de seu trabalho direto, mas também dos assalariados que contratou. A mobilidade social se evidencia com sua elevação a um nível mais elevado na própria pequena-burguesia. Mas ele continua, ambiguamente, sendo capitalista e trabalhador. Ele só se eleva a um nível superior da classe quando a acumulação de capital, permitida pela exploração de sua própria força de trabalho e da força de trabalho alheia, lhe permite abandonar a ambiguidade de trabalhador produtivo e se tornar apenas administrador de seu capital, tanto constante quanto variável.

Nesse processo de mergulho mais profundo no sistema de funcionamento do capital, sob a pressão da concorrência e da luta de classes, sua necessidade inescapável, que aparentemente não passa de um sonho, é se tornar burguês. Mesmo porque, se não conseguir superar os obstáculos que se antepõem a isso, seu destino pode ser o retorno ao nível mais baixo da classe ou, como diz Amélia Cohn, sua proletarização. É essa necessidade que muitas vezes torna a maior parte da pequena-burguesia aparentemente mais exploradora do que os capitalistas plenos, arrancando o couro de seus trabalhadores.

Processo reverso pode ocorrer com trabalhadores assalariados qualificados, seja do chão de fábrica, seja de colarinho branco, que percebem altos salários e conseguem acumular parte deles como capital, numa das diversas formas através das quais se apresenta na sociedade. Com isso, sai da classe trabalhadora assalariada, ou do proletariado, e ingressa na pequena-burguesia, passando a sofrer todas as vicissitudes dessa classe.

No entanto, isso nada tem a ver com os assalariados, em especial os de colarinho branco, que não têm condições de acumular capital, mas sonham viver como se fossem pequeno-burgueses ou mesmo burgueses. A sua ideologia pode ser pequeno-burguesa, mas a sua realidade não é, criando as crises existenciais típicas desses sonhadores.

Leia também:



Wladimir Pomar é escritor e analista político.