sábado, 25 de junho de 2011

Papel dos festivais na recepção e divulgação dos cinemas africanos



Do blog CINE-AFRICA
 
Há cinquenta anos atrás, o cinema africano nascia e se afirmava como um cinema engajado, comprometido social e ideologicamente com as lutas de emancipação que agitavam toda a África nos períodos da descolonização. Mas depois das independências, novas prioridades afastaram os governos africanos do seu cinema. A partir dos anos 70, os cinemas africanos se tornaram de vez filhos da cooperação cultural que sobretudo a França vem mantendo com as suas ex-colônias. Muitas vozes denunciam os efeitos perversos da política de ajuda francesa nas cinematografias africanas. Paradoxalmente, as críticas mais virulentas partem dos próprios cineastas que vêem nesta forma de apoio um freio e um empecilho à emergência de políticas cinematográficas endógenas. Toda a ambiguidade da ajuda ocidental às cinematografias africanas decorre do fato de que ela carrega boa parte das contradições que cercam as relações do ocidente com o Outro e com essas culturas. Olivier Barlet resume assim o paradoxo da relação da ajuda internacional com os cinemas africanos:
“Os sucessos dos filmes africanos fragilizaram esta cinematografia: há muita pressão sobre os conteúdos e a política de ajuda, ao corresponder a uma necessidade ocidental de imagens do sul, tende para uma adaptação às normas de qualidade internacional.” (BARLET, 1996)


Se a ajuda a uma cinematografia estrangeira é ambígua, precisa o autor, não é porque a transforma numa cinematografia assistida - todo o cinema é, aliás, assistido, inclusive Hollywood. O problema é que esta ajuda é baseada no princípio de um gesto bondoso de um centro em relação ao Outro, à sua cultura e ao seu cinema, isto é, um cinema diferente. Isso não deixa de acarretar consequências no plano temático e ideológico nos trabalhos dos cineastas africanos que se sentem cada vez mais impelidos a conformar os conteúdos de seus filmes às expectativas ligadas a esta “solidariedade” interessada, proveniente de uma grande nação de cultura. Para muitos autores, a cooperação cultural da França com as suas ex-colônias é ainda opaca, ela oscila entre a boa consciência, dever moral, vergonha com o passado colonial e interesse geopolítico.


Há mais de quatro décadas que os recursos da cooperação mantêm viva a produção fílmica na África. Por um lado, isso cria um comodismo nos governos africanos que tendem a considerar o cinema como um setor secundário, e não prioritário, nos esforços de desenvolvimento. Por outro, a ajuda que vem de fora retarda o envolvimento do setor privado local na produção cultural e a emergência e consolidação de uma indústria cultural que seria uma alternativa ao desenvolvimento econômico. Enquanto isso não acontecer, os cineastas lidam como podem com a ambiguidade da política cinematográfica francesa. E na falta de uma política de acompanhamento dos filmes no plano da distribuição, todo o cinema africano se tornou um cinema de evento, um cinema para festivais. À necessidade de ajuda à produção de imagens nos países africanos corresponde uma outra demanda por filmes africanos nos festivais consagrados a esta cinematografia do sul: a distribuição.


Todavia, nesta situação de marasmo e de total entrega das cinematografias africanas às políticas pensadas sob medida para elas e de dependência aos festivais organizados para elas, o Burkina Faso figura como exceção. Não somente pela histórica implicação dos sucessivos governos deste pequeno país da África ocidental na atividade cinematográfica, mas também pela organização do maior evento dedicado, de forma bienal, às produções fílmicas de toda a África e de sua diáspora. Neste texto, nosso objetivo não é denunciar nem fazer uma crítica injusta às diversas formas de ingerência da atividade cinematográfica na África. Ao contrário, pegamos nas contradições da dependência do cinema africano da ajuda, dos festivais e da crítica ocidentais como ponto de partida para um esforço de compreensão do valor de outras experiências endógenas que pontuam a história do cinema africano e que buscam quebrar esta dependência. Nesta perspectiva, o Festival Pan-africano de Cinema e Televisão (FESPACO), a Federação Panafricana dos Cineastas (FEPACI) e os esforços do Burkina Faso por um pan-africanismo no cinema africano devem ser percebidos como alternativas à carência de uma política cinematográfica na África.

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Para onde vai o Fórum Social Mundial?


Reunidos em Paris no fim de maio, os representantes das organizações membros do Conselho Internacional (CI)do Fórum Social Mundial refletiram sobre o futuro do FSM num novo contexto, marcado pela emergência dos movimentos populares nos países árabes. Em função de tudo isso, é permitido esperar que um FSM na Tunísia ou no Cairo em 2013 venha a ter um efeito realmente mobilizador, um pouco como teve no caso das primeiras edições do FSM na América Latina.

 
Agir no epicentro da crise
Há vários anos no Magreb e no Mashrek [1] os movimentos populares estão em marcha para elaborar novas estratégias. Sob a ameaça constante de regimes de ditaduras corrompidas ou pseudo-democracias (as “democraturas”, como as nomeou justamente o saudoso Abraham Serfati), esses movimentos também sofrem ataques das correntes reacionárias, que agem sob o manto da religião. Como nos lembraram os camaradas marroquinos, tunisianos, egípcios, cada situação é singular, caracterizada por configurações políticas, sociais, culturais, específicas. As contribuições de Kamal Labhib, de Gustave Massiah e de Samir Amin, notadamente, tem nos permitido compreender melhor a complexidade e os desafios que isso comporta para os movimentos populares num processo de longa duração.

É necessária uma intervenção

Enquanto isso, para as organizações sociais do mundo inteiro, a prioridade é resistir às diversas ofensivas imperialistas que visam reassegurar essa parte do mundo com vistas aos objetivos geopolíticos e geoeconômicos dos dominantes. O desmembramento em curso na Líbia, que se junta ao da Palestina, do Iraque, do Afeganistão, do Sudão e de outros países do “arco das crises” se inscreve numa estratégia de “gestão de crise” cujo fim é impedir toda mudança real. Para os partidos que compõem o FSM, tudo isso quer dizer dar atenção a essa situação e se solidarizar, bem como confrontar as classes dominantes nos países em que esses movimentos estão localizados, e enfim apoiar o duro trabalho de construção das redes estabelecidas pelo Fórum Magreb-Mashrek e uma miríade de organizações na região, há alguns anos.

Em função de tudo isso, é permitido esperar que um FSM na Tunísia ou no Cairo em 2013 venha a ter um efeito realmente mobilizador, um pouco como teve no caso das primeiras edições do FSM na América Latina.

Repensar o Processo do Fórum

Há pelo menos três anos que se sabe que há uma discussão em curso para reforçar o processo do FSM. Ao longo de todos os seus dez anos o FSM marcou os avanços do movimento popular, sobretudo na América Latina. Os “avanços” do FSM na Ásia, na África e na Europa também tiveram vários aspectos positivos. No entanto, está claro que a fórmula dos grandes encontros, que permitiram ao movimento popular “visualizar-se” deve ser retomada. Além disso, o último Fórum em Dakar demonstrou a vitalidade de um certo número de inovações. Pensa-se notadamente nos espaços de elaboração estratégica para os movimentos e das redes, que vão além dos diagnósticos da crise e que lançam luz sobre hipóteses estratégicas. Esses passos requerem muita preparação, por meio de pesquisas, de consultas, de diálogos cruzados entre vários movimentos. O processo implica também, além da organização de uma ou de conferências durante o Fórum, um trabalho de longa duração. As organizações e redes que participarão desse processo no próximo período serão as que agregarão valor ao FSM.

Retorno ao local

Por definição, a importância do FSM foi justamente a de tornar visível uma mundialização dos movimentos, via elaboração de uma plataforma de discussões e portanto de problemas comuns. Hoje, se esse objetivo permanece válido em várias partes do mundo, em que o processo do FSM está ainda embrionário, é menos prioritário para vários movimentos, especialmente na América Latina e na Europa, embora seja preciso distinguir as diferenças reais que separam a experiência nos diversos países. Contudo, desenvolve-se uma certa tendência a querer enraizar o Fórum em escalas locais, regionais e até municipais, onde a convergência dos movimentos pode ter um impacto imediato. Esses fóruns locais tem igualmente a vantagem de se focalizarem num certo número de temáticas que correspondem justamente às prioridades locais, o que facilita a tarefa dos movimentos que pretendem ir além no sentido da elaboração de estratégias.

Uma reorganização necessária

O FSM não foi concebido no início como uma “conferência” ou um “acontecimento”, mas como um processo facilitador de acumulação das experiências úteis aos movimentos populares na sua resistência ao neoliberalismo e na elaboração de alternativas. Certo, a importância de organizar grandes encontros era evidente nesse primeiro período, mas não é preciso fazer disso um princípio absoluto. É preciso também considerar os interesses divergentes que se expressam a esse respeito no fórum e que envolvem os movimentos altermundistas, os sindicatos, as ONGS, as redes feministas, os campesinos, os ecologistas, etc. O princípio da pluralidade e dos diálogos cruzados deve permanecer em primeiro plano. Igualmente central é a ideia de que esses diálogos cruzados devam “desembocar”, quer dizer, permitir uma melhor articulação das práticas, à luz de elaborações teóricas e isso, ao se integrar às culturas políticas diversas e às estratégias distintas postas desde o começo pelos movimentos populares.

Repensar os recursos

Ligado a esse debate está o dos recursos. O FSM é a emanação dos movimentos sociais e não um “projeto” proposto a fundações liberais, e menos ainda a estados talvez “acolhedores”, mas cujos objetivos são antinômicos aos dos movimentos. Um FSM que respire e que avance, por exemplo, deve integrar a dimensão ecológica alinhada à gigantesca batalha mundial por Pachamama, o que é contraditório com uma dependência financeira dos que preconizam o “desenvolvimento” por meio das fontes de energia fóssil. Dito isso, é preciso que as organizações sociais tomem as rédeas da organização e do financiamento do Fórum. É em todo caso possível, como demonstraram os camaradas dos Estados Unidos com a organização do Forum dos EUA no último verão em Detroit. Nesse sentido, as proposições do comitê internacional sobre os recursos permitiram identificar várias pistas promissoras para autonomizar o FSM nesse plano.

O FSM dos dez próximos anos

É muito provável que o processo do FSM seja relançado e reforçado em função das pistas oferecidas acima. De uma certa maneira, a liderança deve se renovar e passar a mão a uma nova “geração”. Os brasileiros e outros movimentos latino-americanos, que muito contribuíram sabem que essa “passagem” é necessária, mesmo que suas redes continuem ativas no Fórum, mas sem o mesmo peso e sem desempenharem o papel central que ocuparam nos últimos anos. Essa transição deve ser feita por etapas e ir de par com o desenvolvimento das redes nas diversas regiões. Enquanto isso, as novas iniciativas estão se desenvolvendo um pouco em toda parte para construir, no seio dos movimentos populares novos “intelectuais coletivos”, na tradição de Gramsci e de Bourdieu, de “intelectuais coletivos” enraizados nos movimentos, capazes de desenvolver os saberes inscritos nos movimentos e de produzir elaborações estratégicas que lhes permitam construir verdadeiras ferramentas contra hegemônicas.

Tradução: Katarina Peixoto

Brizola Neto: O entreguismo da direita não tem limites



por Brizola Neto, no Tijolaço

É impressionante como a oposição brasileira é incapaz de qualquer ato que não seja o da mais absoluta  vassalagem ao capital internacional.
É completamente incabível, sob qualquer aspecto, a reação ao fato de se estar promovendo, através de lei específica, a regulação – e não a proibição – da  propriedade estrangeira de solo brasileiro, como publica hoje o Estadão.
Ninguém quer se meter com a vida de alguém que, cansado do frio europeu, queira ter um sitiozinho ou uma chácara no Brasil. Seja bem-vindo, esteja em casa.
Não se pode descartar, mesmo, que o limite mínimo para ter de haver registro – que é de cinco hectares, (50 mil metros quadrados) possa ser um pouco maior, em áreas não-urbanas. Negociação é assim mesmo, você oferece o mínimo e cede um pouco, dentro do razoável.
Daí em diante, a transação teria de ter a aprovação e o registro em um órgão público. Nada demais. Apenas queremo saber o que o “mister” quer fazer com a terra, qual é o seu projeto.
E para as propriedades de mais de 500 mil hectares – cinco milhões de metros quadrados – a União seria detentora de uma espécie de “golden share”, uma participação garantida na definição do uso da terra.
Portanto, longe de ser uma medida radical, é o mínimo que o país precisa para controlar um bem que não é “fabricável”: o seu território.
O Tijolaço já tratou deste tema com mais detalhes – o que você pode ler aqui – e a gente reproduz o mapa que publicou naquela ocasião.
Nele, repare uma coisa: todo mundo pensa que estrangeiro comprando terra é coisa lá nos cafundós, não é? Nada, é só você olhar no mapa e ver que é o agronegócio a cereja do bolo: Mato Grosso, São Paulo e Mato Grosso do Sul não os estados onde a terra mais foi abocanhada.