A luta contra o agronegócio e as transnacionais
O povo brasileiro sofre desde a década de 90 com as políticas neoliberais, que enfraqueceram o Estado, privatizaram empresas públicas, desregulamentaram os instrumentos de defesa nacional, retiraram direitos dos trabalhadores, prejudicaram a indústria nacional, ampliaram o desemprego e desvalorizaram os salários.
A sociedade brasileira gasta atualmente, por meio dos seus impostos, cerca de R$ 150 bilhões ao ano no pagamento dos títulos da dívida pública, que são repassados para 20 mil famílias, de donos de bancos e especuladores nacionais e internacionais. Sem esses recursos, o governo não consegue investir em educação, saúde, habitação.
O Brasil perdeu força diante do capital financeiro e das empresas transnacionais, que avançaram em todos os setores da economia. No século 20, os movimentos camponeses da América Latina lutaram pela chamada Reforma Agrária clássica, por meio da combinação da distribuição de terras com um projeto de desenvolvimento da indústria nacional, com fortalecimento do mercado interno e distribuição de renda.
Esse modelo tirava os camponeses da pobreza e promovia um desenvolvimento mais justo, mas a classe dominante brasileira aderiu ao neoliberalismo, no qual não existe espaço para a distribuição de terras e a consolidação de um modelo agrícola baseado em pequenas e médias propriedades.
No entanto, a questão agrária não está resolvida, há 150 mil famílias acampadas, 1 milhão de famílias perderam suas terras para a construção de barragens e mais de quatro milhões de famílias são sem-terra no País. Com isso, a realização da Reforma Agrária e a consolidação de um novo modelo agrícola depende, antes de tudo, da derrota do neoliberalismo.
Precisamos organizar a produção na sociedade para garantir melhores condições de vida para a população, um modelo agrícola que priorize a produção de alimento, um modelo energético que assegure o acesso à população e a preservação da biodiversidade.
Precisamos de um projeto popular para Brasil, que seja construído a partir das demandas reais da população, por meio da construção de um projeto popular de desenvolvimento nacional, que priorize a distribuição de renda, a indústria nacional e a prioridade absoluta na geração de postos de trabalho para garantir renda para a população.
O modelo econômico neoliberal, baseado no capital financeiro, não tem condições de promover a justiça social e a soberania nacional. Nossa luta é para construir uma sociedade justa, igualitária e democrática. As jornadas de luta realizadas no último período colocaram os movimentos do campo organizados na Via Campesina como inimigos das grandes empresas, que tentam evitar que as nossas denúncias avancem.
Por isso, as empresas usam uma série de procedimentos contra os movimentos populares, com foco na comunicação e repressão: 1- Grandes campanhas de publicidade para anular as denúncias; 2- Contratação de escritório de advogados; 3- Criação de gabinetes de crise para fazer frente às ações; 4- Cooptação de políticos com origem na esquerda para dar consultoria; 5- Articulação com governos estaduais, que controlam a Polícia Militar; 6- Contratação de empresas de seguranças (grupos armados) para repressão.
A luta dos trabalhadores do campo está em um novo patamar, porque os inimigos da Reforma Agrária são o agronegócio, as transnacionais, os bancos e o mercado financeiro. Por isso, precisamos fazer jornadas com todos setores da classe para enfrentarmos um conjunto de empresas.
Isso abre um grande desafio na área da comunicação, para garantirmos que a população compreenda os protestos e evitar que apareçam com uma massa disforme de informações. Como dar unidade para uma jornada que questiona a crise do preço dos alimentos, a transposição do Rio São Francisco, a campanha contra a Vale e o modelo energético?
Apresentamos neste documento linhas com elementos e propostas para a comunicação com a sociedade, em torno dos alvos em potencial da jornada de lutas de junho, que pretende fazer o enfrentamento com as empresas transnacionais, demonstrando as contradições causadas pela sua atuação no dia a dia do povo.
Não basta denunciar o efeito nocivo do avanço dos conglomerados internacionais no nosso país, mas é fundamental, de forma pedagógica, fazer a conexão com a vida e as dificuldades da população. Boa luta para todas as companheiras e companheiros!
PARTE 1
Crise dos alimentos e o comércio agrícola internacional
1- Nosso foco - A especulação das empresas transnacionais e do capital financeiro causam a crise do preço dos alimentos. O mercado agrícola mundial é controlado pelo oligopólio de menos de 40 empresas que controlam toda produção, insumos, processamentos até a agroindústria. Os produtos agrícolas passaram a ser commodities, que agora são vendidas nas bolsas de valores ações de mercado futuro sob o controle de especuladores. A alta do preço dos produtos agrícolas tem origem na especulação financeira.
2- Outros elementos - A produção de agrocombustíveis, com a utilização de terras agrícolas em várias partes do mundo, onde poderia se produzir alimentos, e com o uso de produtos agrícolas para etanol. Outro elemento está relacionado à alta do preço do petróleo, porque o modelo atual usa petroquímicos para fertilização e faz os alimentos circularem grandes distâncias, o que encarece os produtos. Além disso, existe um oligopólio formado por empresas transnacionais (com destaque, a Bunge) na produção desses fertilizantes, sendo que o Brasil importa cerca de 74%. Tem outros elementos secundários, como intempéries em algumas regiões.
3- Nossa situação - Os assentados, pequenos e médios agricultores e camponeses não recebem apoio do governo e também são prejudicados com a crise. O governo federal dá prioridade para o modelo do agronegócio, controlado por transnacionais e capital financeiro, que especula com o preços das commodities agrícolas. O agronegócio avança sobre territórios, produz para o mercado internacional, concentra os investimentos públicos, contamina o meio ambiente, inviabilizando a pequena agricultura, que produz 70% dos alimentos consumidos no Brasil. Os consumidores que moram nas cidades, em especial os mais pobres, são os que mais sofrem as conseqüências.
4- Diagnóstico internacional - A crise da produção de alimentos é a conseqüência da liberação geral do comércio de produtos agrícolas, possibilitando que as empresas transnacionais controlassem a produção e o comércio dos principais produtos. As políticas neoliberais dos governos tiraram a capacidade dos países produzirem os alimentos que precisam. O mercado não resolverá o problema, apenas agravará. Mais "livre comercio" não resolverá a crise.
5- Nossas propostas - Precisamos promover a consolidação de um novo modelo agrícola, baseado em pequenas e médias propriedades, com a realização da Reforma Agrária, para a produção de alimentos saudáveis e baratos para o mercado interno. Precisamos de políticas estatais para reconstruir as economias nacionais baseadas em políticas que busquem e incentivem a soberania alimentar de cada país. Precisamos de mecanismos de regulação do mercado internacional de produtos agrícolas para garantir o respeito aos direitos básicos. Defendemos a saída da agricultura e alimentação da OMC (Organização Mundial do Comercio).
PARTE 2
Desnacionalização Das Terras
1 - O preço da terra vem aumentando - A valorização da terra chegou a 17,83% ao longo de 2007, segundo pesquisa do Instituto FNP. Entre 2001 e 2007, o preço médio da terra no Brasil subiu 131% em real e 219% em dólar (consultoria Angra FP). As terras no Brasil têm preços entre 60 e 70% mais baratos que os EUA e isso gera o encarecimento. A alta do preço dos grãos, o plantio de cana para etanol e o fato de o Brasil ter alcançado o grau de investimento são motivos relacionados para valorização das terras destinadas à agropecuária, que subiu mais de 15% no segundo bimestre de 2008. O preço médio das terras entre março e abril foi de R$ 4.135 por hectare, com um aumento médio de 16,3% em relação ao ano passado. A marcha de investidores para o Brasil cria uma disputa de terras entre o capital financeiro e a Reforma Agrária e influencia o desmatamento no limite da fronteira agrícola.
2- Investidores estrangeiros compram mais terras no país - A gestora de fundos estrangeiros AIG Investments investiu R$ 65 milhões em uma empresa especializada em comprar terras a baixo preço. Além dela, a SLC, BrasilAgro e a argentina El Tejar também fizeram aquisições de terras no país. O milionário grego George Soros, as americanas Microsoft, de Bill Gates, a Google, as suecas Precius Woods e Stora Enso (esta com capital finlandês também) e até seitas religiosas, como a Igreja Unificada, do reverendo Monn Sun Myung, têm interesse em terras. Entre os brasileiros, chama a atenção os grandes investimentos em terras e gado do banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity, cujo estoque já teria alcançado mais de 510 mil hectares na região de Marabá, no Sul do Pará, em dois anos.
A procura por terras tem sido mais intensa na chamada "nova fronteira agrícola". Os estados mais procurados são Maranhão, Piauí, Tocantins, Mato Grosso, Goiás e o oeste baiano. Os investidores calculam que há 100 milhões de hectares para serem "abertos" no país sem precisar entrar na Amazônia. Empresário suíço-britânico, Johan Eliasch, Eliasch, seria dono de 160 mil hectares da Amazônia, comprados em 2005, que avalia a floresta em R$ 50 bilhões.
3 - Não há registro dos estrangeiros que compram terras no Brasil - O governo federal e o Incra admitem que não tem dados nem controle sobre investidores estrangeiros e pessoas físicas que detêm terras no país. O único registro do Incra mostra que até julho de 2007, 31.194 imóveis estavam em nome de pessoas físicas estrangeiras e outros 2.039 em nome de empresas. 55% das propriedades do país registradas em nome de estrangeiros estão na Amazônia, onde 3,1 milhões dos 5,5 milhões de hectares estão em nome de pessoas e empresas de outras nacionalidades. Desde 1998, parecer assinado eliminou a necessidade de autorização para empresas de estrangeiros com sede no Brasil comprarem imóveis rurais no Brasil. Assim, empresas estrangeiras têm se associado a brasileiras para adquirir grandes áreas de terras sem restrição.
4- Nossa proposta - O Brasil precisa ter soberania sobre seu território, impedindo que empresas estrangeiras e especuladores financeiros adquiram terras no país. A Advocacia Geral da União pode revogar o parecer assinado em 1998 e fazer valer a legislação de 1971, que diz que estrangeiros não podem ter mais que 25% das terras num só município e precisam registrar a compra com certidão pública. É preciso estender o controle a empresas controladas pelo capital estrangeiro, impondo as mesmas restrições para pessoas jurídicas e físicas do exterior. É importante aprovar um projeto de lei para disciplinar os investimentos estrangeiros no país, acabando com a compra de terras por meio de "laranjas".
PARTE 3
Expansão da monocultura da cana e dos agrocombustíveis
1- Encarece o preço dos alimentos e amplia a fome no mundo. Aumenta a demanda do mercado internacional por agrocombustíveis, logo mais terras serão usadas para plantação de cana, cai a produção de alimentos, que ficam mais caros para a população. Em São Paulo, a cana substituiu lavouras de feijão, que dobrou de preço. Produtos agrícolas representaram 40% da inflação, como a soja, o milho e carne bovina em 2007. Além disso, a demanda internacional tem reflexos nos preços dos alimentos no país.
2- Impactos ambientais da monocultura são negativos e não têm condições de enfrentar o aquecimento global. A substituição de biomas nativos pela monocultura da cana, através da produção em larga escala, tem resultados piores do que o uso da gasolina como combustível. O modo de produção vigente usa muita água, provoca a poluição dos rios, utiliza fertilizantes nitrogenados em grandes quantidades e usa de queimadas, tendo impactos ambientais negativos maiores do que a gasolina.
3- Desnacionalização das nossas terras. Os investidores estrangeiros, transnacionais e o mercado financeiro estão comprando terras, o que atinge os interesses da nação e da sociedade. Não existe controle público para impedir o avanço da desnacionalização das nossas terras.
4- Não teremos benefícios no campo econômico com a produção de biocombustível: 1- Produção está nas mãos de grandes corporações estrangeiras, que lucram com o uso das nossas terras e dos nossos recursos naturais e remetem o lucro para os seus países de origem. 2- Os problemas ambientais, sociais e econômicos para a produção de cana podem servir de barreiras para a exportação de combustível para o exterior.
5- Prioridade do governo está no agronegócio em vez da Reforma Agrária. O governo está investindo, por meio de projetos do PAC e investimentos do BNDES, dinheiro que poderia ser usado na Reforma Agrária. Enquanto estão previstos investimentos de R$ 40 bilhões até 2011 para o setor de produção de álcool, o orçamento do MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário) para o período é de R$ 12 bilhões.
6 - Nossas propostas: A prioridade da nossa agricultura deve ser a produção de alimentos para o mercado interno. Concordamos que o uso de biocombustível é mais adequado para o meio ambiente do que o petróleo, desde que seja cultivado em pequenas e médias dimensões, que não desequilibrem o meio ambiente, e não prejudiquem a produção de alimentos. A nossa prioridade é a soberania energética das comunidades. A produção a nível nacional deve ser controlada por uma empresa estatal de processamento e produção do combustível. Precisamos de mecanismos legais e políticos que impeçam a dominação estrangeira sobre a terra e sobre a indústria de transformação da biomassa e biocombustível. Exigimos a criação de limites para estrangeiros comprarem terras em nosso país e a garantia de uma empresa nacional que coordene todo o processo nacional da produção de biocombustível.
PARTE 4
Avanço dos transgênicos
1- A população brasileira rejeita os transgênicos. Os brasileiros rejeitam os transgênicos. Não querem que sejam cultivados nem querem comê-los. Em 2002, 71% preferiam os alimentos não-transgênicos; em 2003, eram 74%; e em 2004, 81,9% acreditavam que o plantio de transgênicos não deveria ser liberado sem os devidos estudos de impacto. Nesse período, mais gente passou a saber o que eram os transgênicos: em 2002, só 37% já tinham ouvido falar sobre o assunto; em 2003, 63%; e em 2004, 65%. Mesmo assim, o assunto ainda é tratado de forma obscura, envolvendo interesses econômicos e políticos, cujos defensores não estão dispostos a deixar nada muito claro.
2- Não existem estudos científicos que garantam que os alimentos transgênicos não terão efeitos negativos para o consumo humano e para a natureza. Tanto que os ministérios da Saúde (via Anvisa) e do Meio Ambiente (via Ibama) se colocaram contra os transgênicos por causa das implicações para a saúde pública e para o meio ambiente que os organismos geneticamente modificados podem causar no país. Para a saúde humana, os possíveis riscos vão desde o aparecimento (ou aumento) de alergias até o aparecimento de novos vírus. Os impactos ambientais mais graves são a diminuição da biodiversidade (erosão genética), a contaminação genética (cruzamento de OGMs com plantas convencionais), o surgimento de superpragas (resistentes a herbicidas), o desaparecimento de espécies e o aumento da utilização de herbicidas.
3- O cultivo de alimentos transgênicos em nível mundial está conduzindo a um aumento massivo do consumo de pesticidas. Os agricultores que plantam transgênicos estão sendo obrigados a usar quantidades cada vez maiores do veneno para garantir sua eficácia, uma vez que várias plantas rapidamente adquirem resistência ao herbicida. Câncer, infertilidade e complicações no sistema nervoso são as principais conseqüências do consumo de agrotóxicos acima dos limites permitidos. Os agrotóxicos, quando utilizados em grande quantidade, também possuem alto impacto ambiental, contaminando o solo, a fauna e os lençóis freáticos.
4- Contaminações de lavouras convencionais e pode prejudicar a produção de alimentos orgânicos. Relatório do Greenpeace aponta 39 novos casos de contaminação e cultivo ilegal de variedades geneticamente modificadas em 23 países em 2007. A maior parte deles envolve cultivos de arroz e milho, mas também inclui soja, algodão, canola, mamão papaia e peixes. O Registro de Contaminação Transgênica existe desde 2005 e já identificou 216 eventos de contaminação em 57 países ocorridos desde 1996, quando as plantações transgênicas foram iniciadas comercialmente.
5- A questão fundamental não é a evolução da tecnologia, mas uma mudança no processo de produção de alimentos, que coloca o desenvolvimento das sementes nas mãos das empresas e atinge a autonomia dos camponeses. Os transgênicos fazem com que a agricultura deixe de se dar de modo livre na relação da sociedade com a natureza, mas a partir de laboratórios das grandes empresas, do mundo financeiro e industrial, que cobram royalties àqueles que usam suas sementes. Há um deslocamento da produção de cultivos para os experimentos de laboratório, tirando a autonomia dos camponeses e indígenas e passando para as grandes empresas.
6- Nossas propostas: A Soberania Alimentar proporciona meios de subsistência a milhões de pessoas e protege a vida na terra. Acreditamos que, para proteger a sobrevivência, o emprego, a saúde e o meio ambiente, o alimento tem de continuar nas mãos de agricultores, que durante séculos e milênios têm desenvolvido a biodiversidade agrícola a partir da conservação das sementes crioulas e nativas. Dentro desta perspectiva, a Via Campesina desenvolve iniciativas sustentáveis para os agricultores do campo brasileiro, baseadas na agroecologia.
PARTE 5
Monocultura do eucalipto e indústria de papel e celulose
1- Destruição do meio ambiente e biodiversidade - A expansão das empresas de celulose significa a destruição de milhares de hectares de vegetação nativa para ceder lugar para o eucalipto no Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Minais Gerais e sul da Bahia. No município capixaba de Conceição da Barra, 68% da área está coberta pela monocultura. O eucalipto e a produção de celulose em larga escala também consomem muita água. A Aracruz Celulose, no ES, consome cerca de 250 mil m³ de água por dia, o equivalente ao consumo de uma cidade de 2,5 milhões de habitantes. A exploração exagerada do eucalipto já secou poços artesianos com até 30 metros de profundidade. Outro problema é a contaminação do ambiente por substâncias químicas, uma vez que as espécies adquirem resistência às pragas fora do seu habitat nativo, necessitando de grandes doses de agroquímicos. Mais um efeito colateral é a destruição da biodiversidade e perda da fertilidade do ambiente.
2- Concentração de terra - De acordo com o dados de uma das maiores empresas de celulose do Brasil, a Votorantim, a área plantada das empresas do setor, em nosso país, soma 5,5 milhões de hectares. Sem contar os 304 mil hectares de áreas pertencentes à terceiros, mas utilizadas pelas empresas para o plantio de eucalipto. As empresas Suzano, Aracruz, Votorantim e a transnacional Stora Enzo controle praticamente 100% destas áreas. No Rio Grande do Sul, estas três últimas empresas adquiriram 500 mil hectares de terras entre 2005 e 2007, compradas de 2400 proprietários, o que demonstra a concentração de terras. Enquanto isso, em 25 anos de lutas no estado, 130 mil hectares foram desapropriados para a Reforma Agrária, onde foram assentadas 12 mil famílias.
3- Desnacionalização das terras - A empresa sueco finlandesa Stora Enso adquire propriedades rurais gaúchas em faixas de fronteira. Ela admitiu que utiliza uma empresa como laranja, a Azenglever, cuja totalidade do capital social é de pessoa física brasileira, para adquirir essas áreas sem passar pelo Conselho de Segurança Nacional. Mas a Azenglever estaria associada com a Derflin, empresa de capital estrangeiro e pertencente à Stora Enzo.
4- Expulsão de quilombolas e indígenas - No período de instalação da Aracruz Celulose no ES, havia cerca de 40 aldeias indígenas Tupinikim e Guarani, ocupando mais de 30 mil hectares. Logo após a chegada da empresa restaram apenas três aldeias e 40 hectares. A planta industrial que reúne as 3 fábricas foi construída justamente sobre a principal aldeia Tupinikim - Aldeia dos Macacos. Antes da chegada da Aracruz, em meados dos 70, ainda eram cerca de 12 mil famílias afrodescendentes, habitando um território de 256 mil hectares. Hoje resistem apenas 1300 famílias, em 32 comunidades quilombolas, ilhadas em meio ao eucaliptal, sem terra, sem água, sem mata, sem trabalho.
5- Não gera emprego nem paga impostos - A indústria do papel e celulose não paga todos os impostos previstos na legislação e com pressão econômica consegue isenção fiscal. Os estados onde atuam perdem recursos para investimentos sociais com a Lei Kandir, que isentou de ICMS produtos primários destinados a exportação. A Aracruz alegava que para cada hectare de eucalipto seriam gerados quatro empregos diretos, em 1989. Portanto, se a Aracruz tem hoje 329 hectares de plantação própria, deveria empregar ao menos 1,3 milhão de trabalhadores. Porém, em 2007, a empresa empregava apenas 12 mil trabalhadores, sendo 9 mil terceirizados. A Votorantim, portanto, deveria empregar 1,25 milhão, porém emprega pouco menos de 8 mil. Levando em consideração que o lucro da Aracruz em 2007 foi de R$ 1 bilhão e da Votorantim de R$ 838 milhões, percebemos que, pelo baixo número de trabalhadores que emprega, este modelo de negócio também concentra renda.
6- Nossas propostas - Somos contra a expansão das florestas industriais de eucalipto, sem qualquer limite para a monocultura. A produção de eucalipto deve se restringir a pequenas e médias propriedades. Defendemos um zoneamento ambiental capaz de planejar o uso do solo baseado nos interesses populares e em consonância com a preservação ambiental. Somos contra o Projeto de Emenda Constitucional nº 49/06, que propõe diminuir a extensão da faixa de fronteiras para beneficiar empresas transnacionais, especialmente a Stora Enso, de autoria do senador Sérgio Zambiasi (PTB-RS).
PARTE 6
Transposição do Rio São Francisco
1 - O mito de acabar com a sede - O projeto do Rio São Francisco mostra que a destinação da água é de 4% para a população rural, 26% para o meio urbano e 70% para atividades agrícolas, principalmente para grandes empresas do hidro/agronegócio. O problema do semi-árido não é a falta de água, mas a péssima distribuição que não deixa chegar a quem realmente precisa. Com a transposição, a água será levada, para reservatórios que atendem às áreas urbanas ou às grandes produções irrigadas, e não até as cidades mais remotas do sertão.
2 - Utilização de dinheiro público - O governo tem dito claramente que a transposição tem finalidade econômica. A Agência Nacional de Águas (ANA) concedeu o direito de outorga por 20 anos ao Ministério da Integração Nacional para executar o projeto de transposição, que tem o custo estimado pelo governo federal de R$ 4,5 bilhões. Estima-se que o gasto pode chegar a R$ 20 bilhões. A operação do sistema de transposição terá um custo anual para os estados de R$ 80 a R$ 100 milhões, divididos entre Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco.
3 - Cobrança de água e energia - O governo federal apenas participará da construção da obra e à definição da Companhia Hidrelétrica do São Francisco (CHESF) como gestora do projeto. Os critérios e formas de como a água será distribuída e cobrada dos usuários ficará a cargo das companhias estaduais de abastecimento, o que pode gerar cobrança de preços abusivos. Até essa água chegar ao consumidor, ela passará por vários acréscimos em seu valor.
4 - Jogo de interesses - A população nordestina não tem acesso a 70% dos açudes públicos. A influência político-econômica na distribuição da água certamente exercerá grande força. As águas da transposição vão passar por muitas terras, de muitos proprietários. Em Juazeiro e Petrolina (PE), os pequenos proprietários perderam suas terras para os empresários estrangeiros, do sul e do sudeste. Para começar um projeto desse nível é necessário fazer a regularização fundiária na região. No início do projeto, não foram ouvidas as opiniões das 153 comunidades quilombolas e das 34 indígenas que estão na área de abrangência do projeto.
5 - É preciso revitalizar antes de distribuir - O São Francisco está poluído e assoreado. Dos 504 municípios que fazem parte da bacia do rio, apenas 132 possuem obras de abastecimento de água e somente 78 municípios dispõem de serviço de saneamento básico. Aproximadamente 18 milhões de toneladas de terra por ano são despejadas no leito do rio o que contribui para o seu assoreamento. Com a transposição, haverá uma perda na água - tendo em vista que de cada 4 litros armazenados, 3 evaporam.
6 - Nossas propostas - É preciso implementar as obras propostas pela ANA (Agência Nacional de Águas) em seu Atlas do Nordeste. São cerca de 530 obras, que alcançam 1112 municípios acima de 5 mil habitantes, beneficiam 9 estados do Nordeste mais o norte de Minas, solucionando o problema de 34 milhões de pessoas. Defendemos a revitalização do rio, o uso racional da água e a construção de cisternas e açudes. É necessário, primeiro, recuperar os mananciais, os olhos d’água e as nascentes; fazer o reflorestamento e resolver a questão fundiária, principalmente nas áreas de preservação permanente. Antes de se pensar em transposição, os investimentos deveriam ir para a construção de poços, de adutoras para interligar açudes e de barragens subterrâneas.
PARTE 7
Campanha contra a mineradora Vale
1- Prejuízos a comunidades rurais e assentamentos - Atuação da Vale gera pobreza no Pará, problemas respiratórios no Maranhão, expulsa famílias e afeta sistema de saneamento básico em Minas. A atividade dos 71 fornos do empreendimento da siderúrgica FGC (Ferro Gusa Carajás), da mineradora Vale, causa problemas de saúde a assentados em função da fumaça. As 200 famílias do Assentamento Califórnia, em Açailândia (MA), ao lado da fazenda da siderúrgica, sofrem com problemas respiratórios, fortes dores de cabeças, irritação nos olhos, cansaços físicos e sinusites. Em Minas Gerais, a Barragem de Aimorés, construída pela Vale e Cemig, desalojou 1000 famílias, que ainda não receberam indenização nem foram re-assentadas. A barragem inviabiliza o sistema de esgoto da região.
2- Impacto ambiental - A Vale é a mineradora campeã em multas do Ibama. Desde a privatização, levou 56 autos de infração, no valor de 37 milhões de reais. Em 2006, foram 14 multas, que chegaram até 2,9 milhões de reais. Apenas 217 mil foram pagos. As acusações são: consumo de carvão proveniente de floresta nativa, incêndios em áreas de preservação ambiental, destruição de florestas permanentes e manter em funcionamento serviços potencialmente poluidores, lançamentos de rejeitos que deveriam ter sido confinados a lagos artificiais.
3- Desrespeito a direitos trabalhistas - A Vale foi multada em R$ 109 milhões por danos morais aos operários das mais de 100 empresas terceirizadas no Pará pela Justiça Federal de Parauapebas. No Rio de Janeiro, o Ministério Público do Trabalho tenta interditar obras da Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA), da Vale, na Baía de Sepetiba, por irregularidades e falta de segurança no trabalho. Trabalhadores precarizados (contrato temporário de trabalho) sofrem acidentes rotineiros e morreram mais de 60 trabalhadores.
4- Isenção fiscal - A mineradora não paga todos os impostos previstos na legislação e com pressão econômica consegue isenção fiscal. Os estados onde a mineradora atua perdem recursos para investimentos sociais com a Lei Kandir, que isentou de ICMS produtos primários destinados a exportação. A Vale tem isenção fiscal até 2015 para operações referentes à extração, circulação, comercialização e transporte da bauxita, alumina e alumínio, ferro e manganês. O Pará, que vive praticamente da exportação de minérios, perde R$ 850 milhões anuais com a lei, dos quais R$ 595 milhões (70%) viriam com a Vale. Hoje, o orçamento paraense total é de R$ 7,8 bilhões. A Vale tem receita de R$ 4,2 bilhões, apenas no Pará, mas paga em impostos menos de 7% de sua receita. Seu lucro em 2007 foi de cerca de R$ 20 bilhões, grande parte advindo do subsolo paraense.
4- Ressarcimento por exploração de recursos brasileiros - Grupos de prefeitos de municípios mineradores e entidades da sociedade civil defendem a revogação desses benefícios fiscais para garantir que a exploração dos recursos naturais garanta melhores condições de vida para as comunidades. Existe também uma demanda pelo aumento do valor da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM), os chamados royalties. A Vale deve R$ 2,2 bilhões à prefeitura de Parauapebas por royalties que não foram recolhidos devidamente entre 1991 e 2004.
5- Defendemos a reestatização da Vale - Os problemas causados pela atuação da Vale nas comunidades são conseqüências da sua privatização. A empresa pública passou para o controle privado em benefício do lucro de especuladores estrangeiros em 1997. Fomos e somos contra a venda da Vale, ocorrida num processo cheio de irregularidades, que consideramos crime de lesa pátria e traição ao povo brasileiro. Por isso, defendemos a anulação da sua privatização a partir das ações que estão na Justiça. Em 2007, mais de 40 organizações promoveram um plebiscito popular sobre a retomada da Vale por conta das irregularidades da privatização. O resultado demonstra que 3,7 milhões de brasileiros defendem que a mineradora volte a ser uma empresa pública. O artigo 176 da Constituição determina que as jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União e devem seguir o princípio da soberania nacional.
PARTE 8
Modelo energético
1- Preço da energia é caro - O Brasil possui 10% do potencial hídrico energético do mundo, ficando apenas atrás da Rússia (13%) e da China (12%). A hidroeletricidade tem uma grande vantagem do ponto de vista do preço de custo. Mesmo assim, o brasileiro paga a 5ª maior tarifa de energia elétrica do mundo. Isso acontece porque o preço da energia elétrica deixou de ser cobrado pelo seu custo de produção real (baseado na hidroeletricidade) para ser determinado no mercado internacional, com referência na média do custo de produção, predominante nos demais países (energia térmica, principalmente o petróleo). Com a privatização, iniciada no governo Collor, a energia foi transformada numa grande mercadoria (commodity). A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) reajustou as tarifas residenciais em 386,2%, quase o dobro da inflação.
2- Grandes empresas pagam menos pela energia - No atual modelo do setor elétrico, os consumidores são divididos em dois grupos: de um lado, os grandes consumidores de energia elétrica, chamados "consumidores livres", e de outro os pequenos e médios consumidores, chamados "consumidores cativos" (pequenas indústrias e residenciais). Aos consumidores livres é fornecido energia ao preço de custo real. Eles obtêm o direito de negociar livremente com as geradoras o preço da energia através de contratos que podem ser de longo prazo, o que contempla as multinacionais, através da grande indústria (principalmente eletrointensiva) e grandes supermercados (shoppings). Atualmente, existem no Brasil 665 consumidores livres que consomem quase 30% da eletricidade a um preço bem menor do que pagam as famílias. Por exemplo, enquanto a Alcoa e a Vale (consumidores livres) pagam menos de R$ 5,00 por 100Kwh de energia, os consumidores residenciais, as empresas e o comércio de pequeno e médio porte pagam mais de R$ 45,00 pela mesma quantidade de energia consumida, ou seja, nove vezes mais.
3- Impactos sociais e ambientais - No mundo, existem mais de 45 mil barragens construídas que já expulsaram mais de 80 milhões de pessoas de suas terras, a maioria sem receber nenhum tipo de indenização. No Brasil, são 1 milhão de pessoas expulsas de suas terras. Além disso, milhares de hectares de terras cultiváveis, e de vegetação em extinção foram inundados.
4- Campanha de energia - A Tarifa Social é uma reivindicação imediata, com o cumprimento de liminar que garante que todas as famílias que consomem até 220kw/h por mês têm direito a tarifa social de energia elétrica, sem ter que estar cadastrada em algum programa social do governo. O desconto pode chegar a até 65% da conta de luz. Vários estados como Rondônia, Rio Grande do Sul, Pará, São Paulo fizeram entregas coletivas das autodeclarações que garantem a Tarifa Social e já conseguiram o desconto.
5- Contexto internacional - A energia tem sido o "ponto fraco" dos países ricos, que cada vez mais aumentam suas demandas de consumo. As multinacionais, além de quererem tomar conta das últimas reservas de petróleo no mundo, querem controlar as demais fontes de energia. O Brasil, em especial a Amazônia, passa a ser o principal foco de interesse dessas empresas. Nessa região está localizado 50% do potencial nacional de geração de energia hidrelétrica, algo em torno de 304 usinas (46 já construídas e 258 inventariadas).
6- Nossa proposta - Queremos que a organização do sistema energético brasileiro não atenda o lucro das empresas multinacionais e sim para o bem-estar da população brasileira. A energia se tornou um insumo básico na sociedade, mas que é negado à população que não tem acesso ou não pode pagar pelo serviço. Exigimos: 100 Kw/h grátis de energia para a população (isso já acontece no Paraná); igualdade de preço entre as tarifas pagas pela população e pelas grandes empresas; redução das tarifas de energia.