segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

IDEOLOGIA JIHADISTA

Juventude islâmica radical

Milhares de jovens que partiram rumo ao Iraque para, voluntariamente, enfrentar as tropas americanas, agora se dispersam pelo Oriente Médio, Europa e Ásia Central. Esses combatentes, a maioria sem qualquer engajamento político anterior, retornam a seus países alimentados por uma ideologia extremista e endurecidos pela guerra

Vicken Cheterian - LeMondeDiplomatique-BR

Vale de Bekaa, Líbano. Abu Talha mora no vilarejo de Majdel Anjar. O contato não foi fácil: alguns dias antes, as forças de segurança libanesas haviam descoberto uma célula da Al-Qaeda em Bar Elias, não longe dali, e capturaram numerosos “antigos do Iraque”. “Aceitei conceder esta entrevista para que seus leitores conheçam nossas idéias”, diz ele.

Logo após a invasão do Iraque, em 2003, Talha respondeu um chamado à resistência do dirigente islâmico Abu Musab al-Zarqawi. Ele não fazia parte do primeiro grupo de voluntários de sua cidade e passaram-se seis meses desde o contato com os recrutadores até que ele recebesse o sinal verde. “Estavam verificando minha identidade, minha determinação e, também, conduzindo com cautela os preparativos complexos de uma viagem como essa”, explica ele.

Abu Talha se juntou, então, a um grupo de quatro homens que se fizeram passar por vendedores de tâmaras. Partiram primeiro para Kamishli, na Síria, onde um atravessador cobrou US$ 300 de cada um para levá-los a Bagdá. As forças de segurança sírias, porém, cercaram o vilarejo onde eles estavam reunidos, o que os obrigou a fugir pelo deserto, onde, por sua vez, se perderam. Vagaram por dias até alcançarem Bagdá, mas já era tarde para o encontro marcado com o contato da rede. Procuraram até encontrar Abu Anas Al-Chami, assistente de al-Zarqawi – ambos assassinados posteriormente. Talha aguardou seu destino com paciência, em diversos apartamentos em Bagdá e depois em Falouja, ao lado de outros voluntários árabes que esperavam ser chamados para uma operação suicida. Porém, eram muitos os candidatos e as possibilidades logísticas pareciam limitadas. Após um mês, foi enviado de volta a casa, se engajando então na difusão da palavra divina e na arrecadação de fundos para a rede. Durante nossa conversação, ele se refere inúmeras vezes à “nobreza” e “coragem” de Zarqawi. “Desde seu martírio, ninguém conseguiu substituílo”, proclama ele. E a Al-Qaeda? “Al-Qaeda é mais uma idéia do que uma organização”. Meses antes da invasão americana de 2003, voluntários de diversos países árabes haviam se agrupado no Iraque. A rápida queda do regime os deixou desmoralizados, sem objetivo. Aqueles que conseguiram voltar às suas casas estavam, em geral, arrasados, fisicamente ou psicologicamente. Foram substituídos por uma segunda leva, recrutada não para defender o regime baasista, mas para enfrentar o exército de ocupação.

Tratava-se de islâmicos impregnados pelas ideologias jihadistas-takfiristas [1] da geração de “árabes afegãos” que os precedia. Desde 2006, muitos deles partiram para seu país natal ou para outra destinação.

Os “antigos do Iraque” estabelecem relações complexas com os governos, diferentemente da geração anterior de jihadistas combatentes durante a ocupação soviética, que se beneficiaram tanto do apoio de diversos países árabes, quanto dos Estados Unidos. Encorajados pelos primeiros e reprimidos pelos últimos, acuados por todos, os “antigos” foram, sobretudo, instrumentalizados. Estima-se que sejam milhares: mais de dois mil iemenitas, dois mil da Arábia Saudita, dois mil tunisianos e mil jordanianos [2].

Os árabes afegãos possuíam escritórios mais ou menos oficiais em países do Golfo nos anos de 1980, e chegavam até a se beneficiar de tarifas reduzidas em vôos para as bases paquistanesas. A nova geração não goza de tais privilégios. Ao contrário, milhares já foram detidos por autoridades sírias ou jordanianas e reenviados aos seus países de origem, onde foram encarcerados – 900 na Tunísia, 400 na Argélia etc.

Graças a esses combatentes, o Grupo Salafista para a Predicação e Combate (GSPC) argelino, muito enfraquecido, pôde renascer e se tornar o braço magrebiano da Al- Qaeda [3]. Esses números são elevados, se comparados aos dez ou 15 mil voluntários árabes que seriam derrotados no Afeganistão e que chegaram, em sua maior parte, quando a guerra já estava instaurada.

Até a invasão do Iraque, o movimento jihadista estava relativamente indiferente às causas e às lutas do mundo árabe. Com inspiração de seus irmãos muçulmanos, treinados no Afeganistão ao longo dos anos de 1980, esse movimento levou o jihad para a Bósnia e para o Tajiquistão no início dos anos de 1990. Em seguida, no início de 1995, uma dúzia de jihadistas também chegou à Chechênia, conduzida por Khattab (cujo verdadeiro nome é Samir Al-Suwailem), personagem conhecido por sua brutalidade. Mas, para o mundo árabe, o Afeganistão, a Bósnia e a Chechênia continuaram periféricos, geograficamente e, sobretudo, simbolicamente.

O debate sobre os movimentos jihadistas se manterem distantes do conflito entre palestinos e israelenses – a luta central do mundo árabe-muçulmano – vem desde a batalha contra a intervenção soviética no Afeganistão.

Abdullah Azzam, teólogo e líder dos árabes afegãos, mentor de Osama Bin Laden, era ele mesmo palestino. Ele foi bastante questionado sobre o assunto: “A pergunta foi feita inúmeras vezes ao doutor Azzam, em geral na minha presença”, explica desde Londres Abdullah Anas (cujo nome verdadeiro é Budjema Bunua), companheiro e genro do teólogo. “Ele respondeu que certamente a Palestina era seu país, mas que os governos árabes e as organizações de esquerda timham nos impedido de participar da luta por sua libertação.” Portanto, entre a Palestina e o Afeganistão, não tínhamos escolha. Quando os jovens tiveram a oportunidade de se juntar ao jihad na Bósnia, eles partiram para lá. Mesma coisa para a Chechênia. “Não foi fruto de uma decisão estratégica, trava-se, antes, de aproveitar as circunstâncias”, conclui ele.

A Palestina também foi motivo de divergência entre Abu Musab al-Zarqawi e seu mentor, Abu Mohamed al-Maqdisi. Assim que os dois foram libertados de uma prisão da Jordânia em 1999, por uma gentileza real, Zarqawi partiu para o Afeganistão – e em seguida para o Iraque –, enquanto al-Maqdisi, nascido em Naplouse, Palestina, considerava que o jihad deveria privilegiar seu país de origem.

A derrocada persa

Para entender a cultura jihadista, é preciso atentar para duas características. Em primeiro lugar, a ida a um país estrangeiro para participar do jihad é, em geral, designada pelo vocábulo hijra, ou “migração”. É o termo que descreve a imigração do profeta Maomé, e de seus companheiros, de Meca a Medina no ano de 622 da Era Cristã, acontecimento fundamental no islamismo e que marca o início do calendário muçulmano: para um jihadista, estar no Afeganistão ou no Iraque constitui uma experiência mística semelhante àquela do Profeta e seus companheiros. Muitos militantes usam o nome de guerra de muhajer – a saber, “o imigrante” –, como Abu Hamza al-Muhajer, o suposto sucessor de Zarqawi no Iraque.

Outro mito poderoso é o da destruição de um império por um punhado de jovens munidos apenas de armas leves – da mesma forma que os exércitos muçulmanos do século VII derrubaram o Império Persa. Muitos árabes afegãos acreditam que sua luta não só derrotou o exército soviético, como provocou a queda do próprio império soviético. Hoje, de maneira similar, existe um poderoso mito segundo o qual Zarqawi e os 30 homens que foram seus companheiros desde o começo teriam derrotado o projeto americano no Iraque.

Originário da periferia dos movimentos árabes afegãos, o grupo de Zarqawi tornouse a corrente dominante dos movimentos jihadistas. Diferentemente de outras organizações, como a Al-Qaeda, composta principalmente por sauditas, iemenitas ou egípcios, os fiéis de Zarqawi eram, sobretudo, jordanianos, palestinos e sírios [4].

Quando Zarqawi esteve no Afeganistão pela segunda vez, em 1999, estabeleceu seu quartel general perto de Herat, na porção oeste do país, longe das bases tradicionais dos jihadistas árabes, situadas ao redor de Jalalabad ou Kandahar.

Se o jordaniano colaborou com Osaba Bin Laden e Ayman al-Zawahiri, considerava como independente o grupo sob seu comando – Al-Tawhid wal Jihad (“Monoteísmo e Guerra Santa”): seu objetivo era preparar sua rede para o retorno à Jordânia. No início, Zarqawi estabeleceu contatos no Irã e no Curdiquistão iraquiano. Vindo das margens do Islã, Zarqawi levaria a guerra santa ao coração de terras mais prestigiadas: a Mesopotâmia, capital do califado dos abbassidas (750-1258), país das recordações mais gloriosas da civilização islâmica.

As relações entre o grupo de Zarqawi e a Al-Qaeda se revelaram complexas. O ponto de vista das duas formações diferia em várias questões. Zarqawi, que considerava seu grupo independente do de Bin Laden, criticava as posições amenas da Al-Qaeda frente a certos Estados árabes, como a Arábia Saudita, e se recusou a tomar partido na guerra civil afegã ao lado dos talibãs. No Iraque, declarou guerra aos xiitas [5]: o autor do atentado suicida que matou um religioso xiita, Sayed Mohamed Baqir al-Hakim, era ninguém menos que o sogro de Zarqawi (por sua segunda esposa). A Al-Qaeda negou qualquer responsabilidade por esse ataque. Zarqawi se impôs como chefe da resistência jihadista contra a ocupação do Iraque e, apenas em outubro de 2004, alguns meses antes de sua morte, se submeteu (baya’a) a Bin Laden. A nova geração de jihadistas busca respaldo numa escola ideológica ainda mais radical que aquela dos árabes afegãos ou da Al-Qaeda. Sua experiência militar foi muito mais brutal que a do Afeganistão, daí sua visão mais violenta do mundo. Quando Zarqawi chegou ao Iraque em 2002, ele não estava mais rodeado de combatentes leais.

Após a invasão americana, milhares de voluntários de todos os países árabe-islâmicos se deslocaram para o Iraque para combater a ocupação de uma terra muçulmana.

A geração Zarqawi são eles, e está a ponto de suscitar um novo cisma no seio do movimento jihadista. Mais radicais, mais militantes, esses jovens têm sede de operações militares, e sua visão de militância é voltada obrigatoriamente para ações violentas. Suas atividades estão criando novas fontes de instabilidade, como mostra a situação do Iêmen.

O Iêmen é conhecido há tempos pelo abrigo e proteção aos jihadistas. Os combatentes iemenitas eram numerosos entre os árabes afegãos, talvez 3 mil [6]. Depois da retirada das tropas soviéticas do Afeganistão, as autoridades acolheram não só os iemenitas “afegãos”, mas também os jihadistas de outros países. Em 1990, o sul e o norte do Iêmen se unificaram, mas as contradições entre o regime do presidente Ali Abdullah Saleh e seus “parceiros” socialistas do Sul estavam já muito explícitas. Durante a guerra civil de 1994 entre o Norte e o Sul, as brigadas de árabes afegãos tiveram um papel importante no impedimento da tentativa de separação do Sul. O Iêmen é também país de origem da família Bin Laden.

De olho no Iêmen

Após os atentados de 11 de setembro, o Iêmen se encontrou submetido a fortes pressões, pois aos olhos de Washington, “nenhuma operação da Al-Qaeda se desenrolou sem algum vínculo com o Iêmen, seja em forma de armas e dinheiro enviados daqui, seja pelo fato de que um dos executores partiu daqui ou transitou por nosso país”, explica um especialista em organizações jihadistas de Sana.

Temendo um ataque de forças militares americanas contra seu país, o presidente Saleh voou até os EUA, em novembro de 2001, e aceitou cooperar na “guerra contra o terrorismo”. No entanto, as autoridades colocaram em prática uma política de “geometria variável” em relação aos movimentos jihadistas [7]: enquanto dezenas de militantes foram detidos imediatamente, como o egípcio Sayed Imam Al-Sharif – teórico do jihad conhecido como doutor Fadl [8] –, outros foram deixados em liberdade ou conseguiram fugir.

Expulsar os estrangeiros

Sana inaugurou, igualmente, um projeto de diálogo com os prisioneiro jihadistas, conduzido pelo juiz Hamud al-Hitar, hoje ministro de assuntos religiosos (“al-Awqaf”).

“A instauração do diálogo é um dos pilares da política oficial do Iêmen e visa combater o terrorismo”, explica ele. “Descobrimos que cada movimento terrorista possui sua própria base ideológica, e uma idéia não pode ser combatida a não ser por uma idéia contrária. O emprego da força no Afeganistão e no Iraque não conseguiu pacificar ou estabilizar essas regiões.

A Al-Qaeda se funda sobre duas idéiasforças: o takfir contra os regimes árabes e a expulsão de exércitos estrangeiros. Insistimos na legitimidade do Iêmen em estabelecer esse diálogo. “Mostramos também que a diferença de religião ou práticas religiosas não pode justificar a guerra.”

Essa tentativa de diálogo tinha como objetivo corrigir as visões errôneas fundadas sobre referências religiosas. Al-Hitar explicou que esse projeto foi interrompido em 2005 em razão de pressões internas do governo iemenita, que queria combater o “terrorismo” por outros meios. Ele acrescentou que o diálogo concernia os árabes afegãos, mas não os “antigos do Iraque”.

Muitas críticas foram feitas recentemente com relação à política do Iêmen de “luta contra o terrorismo”.

Washington protestou violentamente contra a libertação, em outubro de 2007, de Jamal Badawi, considerado um dos cérebros do atentado contra a embarcação americana US Cole, em 12 de outubro de 2000. Desde então, ele retornou à prisão, mas os EUA tentam sua extradição.

Outra semente de discórdia é a fuga de 23 detentos suspeitos de serem membros da Al-Qaeda de uma prisão de segurança máxima em fevereiro de 2006, sem dúvida com a cumplicidade de alguns guardas. Entre eles, está Naser al-Wahayshi, o novo emir (chefe) da Al-Qaeda no Iêmen.

Um dos principais temas de conflito com Washington é o sheik Abdel Majid al- Zindani. Esse teólogo, conhecido por ter exercido influência sobre Bin Laden durante o jihad afegão, é presidente da universidade islâmica Al-Iman, na capital do Iêmen, e um dos chefes influentes do partido de oposição Al-Islah... que mantém relações estreitas com autoridades governamentais. Ele é procurado pelas autoridades americanas e figura na lista do Comitê de Sanções contra a Al- Qaeda e Talibãs do Conselho de Segurança da ONU. No entanto, Zindani goza de grande apoio entre as confederações tribais do Norte, entre os salafistas e até mesmo entre oficiais iemenitas.

Em reação a um atentado perpetrado em julho de 2007, que matou sete turistas espanhóis, Nasser al-Bahri (cujo nome de guerra é Abou Jandal), ex-guarda-costas de Bin Laden, acusou uma “nova geração” desconectada da organização-mãe: “Esta não é a estratégia de Osama Bin Laden (...).

A nova geração não é essa de Bin Laden, mas a de Abu Musab al-Zarqawi, diferente da Al-Qaeda, mesmo se certos grupos se apropriam desse nome. É a geração do Iraque, dos jovens sem experiência, mal dirigidos e mobilizados a ‘torto e a direito’. Eles pensam que a velha geração não foi capaz de enfrentar o adversário, que são frouxos e os espionam [9]”. Saïd al-Jamhi, pesquisador em ciência política e autor de um livro sobre a Al-Qaeda [10], concorda com essa visão: “O governo do Iêmen se concentra sobre grupos da Al-Qaeda e não presta suficiente atenção à nova geração”.

A série de ataques com explosivos contra alvos ocidentais, em Sana, desde meados de 2007, seria obra de um grupo de jovens jihadistas chamado Kataeb Al-Jound Al-Yama [11]. O objetivo da organização seria obrigar as autoridades a libertar os militantes presos, para acabar com a cooperação com os EUA e seus aliados e, também, dar liberdade de movimento a todos que quiserem levar o jihad para o Iraque, Afeganistão ou Somália. A emergência e as atividades dessa nova geração poderiam colocar em risco o pacto entre autoridades iemenitas e os militantes da Al-Qaeda: um compromisso de não cometer atentados no Iêmen em troca de apoio logístico ao jihad em outras localidades.

As autoridades precisam do apoio do movimento jihadista em duas frentes. Primeiro, face ao crescente descontentamento no Sul do país, onde uma parcela da população se arrepende da unificação em 1990. Segundo, face à contestação tribal zaidita (um dos braços do xiismo), no Norte, desde 2004.

Se o vazio político e a insegurança persistirem no Iêmen, Líbano e outros países, esses jovens poderão encontrar novos dirigentes, novas predicações e novas formas de organização.



[1] O takfirismo denuncia como traidor todos os muçulmanos que não seguem sua orientação. Ver Syed Saleem Shahzad ,“Takfirismo, ideologia messiânica”, Le Monde Diplomatique, agosto de 2007.

[2] Ver Nabil al-Sofi, “Aljihad alyamani fi ali’raq: salafiyun waqabael yandamoun ‘aljihadiyin’” (“O jihad iemenita no Iraque: os salafistas e as tribos se juntam aos ‘jihadistas’”). Al-Hayat, Londres, 11 de abril de 2007; e Rashid Khashana, “Alf shab tunisi mutahamun bilmusharaqa wabiltakhteet lidawr fi ‘almuqawama al’irakiya’” (“Mil jovens tunisianos acusados de querer tomar parte na ‘resistência iraquiana’”), Al-Hayat, 12 abril de 2007.

[3] Muhammad Muqadam, “Al-Qaeda fi bilad almaghreb alarabi’ tujaned lilqital fi al’irak… laken liahdaf fi aljazaer” (Al- Qaeda no Magrebe árabe recruta para combate no Iraque… mas com objetivos na Argélia), Al-Hayat, 9 de setembro de 2007.

[4] Fouad Husein, “Al-Zarqawi, al-Jeel al-Thani lil-Qae’da” (“Zarqawi, a segunda geração da Al-Qaeda”), Beirute, Dar al-Khalil, 2005.

[5] Mas não atacou os parceiros de Mouqtada al-Sadr.

[6] Bruce James, “Arab Veterans of the Afghan War”, Londres, Jane’s Intelligence Review, abril de 1995.

[7] Ver Laurent Bonnefoy, “Entre pressions extérieures et tensions internes, un équilibre instable au Yémen”, Le Monde Diplomatique, outubro de 2006.

[8] Mais de 113 militantes de primeiro escalão são presos, em sua maior parte egípcios. Ver Asharq al-Awsat, Londres, 5 de março de 2004.

[9] Nasser Arrabyee, “Al Qaida not behind tourist attack in Yemen”, Dubai, Gulf News, 10 de julho de 2007.

[10] “Al-Qae’da fi al-Yaman: al-nash’a… al-khalfiya al-fikriya… al-imtidad” (“Al-Qaeda no Iêmen: seu desenvolvimento, raízes e desdobramentos ideológicos”), Sana, 2008.

[11] Gregory D. Johnsen e Brian O’Neill, “Yemen attack reveals struggle among Al-Qaeda’s ranks”, Washington, Jamestown Foundation, 10 de julho de 2007. Em setembro de 2008, um ataque contra a embaixada americana em Saana resultou em 17 mortos.

domingo, 4 de janeiro de 2009

Filmaço de Werner Herzog

WOYZECK - 1979

Sinopse:Franz Woyzeck (Kinski) é um infeliz, inútil soldado, sozinho e sem o reconhecimento da sociedade, atacado de todos os lados por forças que ele não consegue controlar.

Crítica:O cineasta alemão Werner Herzog é conhecido pelos métodos inusitados com que aborda todas as suas produções, seja no gênero documentário ou em filmes ficcionais. Baseado numa das peças teatrais mais conhecidas e importantes do romantismo alemão, “Woyzeck” (Alemanha, 1979) surgiu em um surto criativo quase impossível de ser igualado: foi filmado em apenas dezoito dias e editado em quatro. É um longa-metragem duro, difícil, cuja narrativa – composta por apenas 27 takes repletos de silêncio – reproduz com exatidão os sentimentos de opressão e desorientação experimentados pelo protagonista.

O caso da produção do filme bate perfeitamente com a história confusa da peça. O texto original, de Geörg Buchner, foi escrito no século XIX, e demorou décadas a ser decifrado por especialistas na obra do autor, porque não era um texto coeso, e sim um bando de segmentos escritos com tinta fraca. Ou seja, a história nunca passou de um amontoado de notas soltas, quase desconexas, que o dramaturgo pretendia utilizar numa peça, mas nunca levou a cabo a tarefa. Ainda assim, as primeiras montagens foram um sucesso tão grande que o texto acabou por se tornar primordial para entender a nostalgia e a desilusão com o mundo dos homens, características importantes do movimento romântico na Europa.

Na época da produção do longa, em 1976, Herzog vivia uma fase de acerto de contas com a cultura alemã que o antecedeu. Foi durante as filmagens de “Nosferatu”, remake do importante filme da fase expressionista alemã, que o diretor resolveu transformar a peça em filme. Convencido de que a melhor forma de capturar a urgência e a angústia do protagonista era eliminando o processo detalhista que costuma acompanhar a pré-produção de um filme, Herzog simplesmente decidiu improvisar tudo. Usou o mesmo elenco, a mesma equipe técnica, os cenários e figurinos de “Nosferatu”, e começou a registrar o texto da peça, em película, apenas cinco dias depois de completar as filmagens do filme de horror, numa vila medieval da República Tcheca.

O resultado é uma obra idiossincrática, irregular, de mise-en-scéne fundamentalmente teatral. A história é focalizada sobre o soldado Franz Woyzeck (Klaus Kinski), homem do povo que é humilhado pelo chefe no quartel, traído pela esposa e submetido a uma experiência científica bizarra pelo médico da aldeia: comer apenas ervilhas durante meses a fio. Exausto pelas filmagens duras de “Nosferatu”, Kinski utiliza este cansaço para compor com perfeição o quadro de esgotamento nervoso vivido pelo personagem. O método de Herzog, constituído de longas tomadas sem cortes e interpretações infladas, quase teatrais, faz o resto. O resultado é uma demonstração cabal do tumulto interior que é marca registrada deste cineasta genial.
http://www.cinereporter.com.br/dvd/woyzeck/

Informações sobre o filme:
Gênero: Drama
Diretor: Werner Herzog
Duração: 77 minutos
Ano de Lançamento: 1979
País de Origem: Alemanha
Idioma do Áudio: Alemão
IMDB: http://www.imdb.com/title/tt0080149/

Elenco:
Klaus Kinski ( Friedrich Johann Franz Woyzeck)
Eva Mattes (Marie)
Wolfgang Reichmann (Capitão)
Willy Semmelrogge (Doutor)
Josef Bierbichler (Tamboreiro-mor)
Paul Burian (Andres)

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Exclamation OUTROS FILMES DO MESMO DIRETOR:
Arrow [Documentário] FATA MORGANA - 1970
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Arrow [Drama/Biografia] AGUIRRE: A CÓLERA DOS DEUSES - 1972
http://www.forum.clickgratis.com.br/farra/t-13106.html

Arrow [Drama] CORAÇÃO DE CRISTAL - 1976
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Arrow [Documentário] LA SOUFRIERE - 1977
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Arrow [Horror] NOSFERATU: O VAMPIRO DA NOITE - 1979
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Arrow [Drama/Aventura] FITZCARRALDO - 1982
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sábado, 3 de janeiro de 2009

A matança continua.....

A SUÁSTICA VIROU ESTRELA DE DAVI


Laerte Braga

Os bombardeios do nazi/sionismo contra Gaza e o povo palestino são assassinatos frios, premeditados e sem a menor preocupação com a dor, o sofrimento e os direitos de um povo, o palestino. Sionistas acham-se superiores, ungidos por Deus e detêm o controle de boa parte da economia mundial, logo, subjugam nações, governos e silenciam pessoas.
O que acontece em Gaza é um exercício de barbárie e não fica nada a dever às práticas hitleristas, pelo contrário, parece que o aprendizado nos campos de concentração aperfeiçoou o caráter boçal do sionismo. Estão usadas armas com tungstênio e fósforo que se acertam uma pessoa acima do abdômen não tem qualquer chance de sobrevivência.
São armas proibidas por convenções internacionais. A organização terrorista Casa Branca usou esse pretexto para invadir o Iraque. Na verdade a inteligência norte-americana “errou”. As armas não estavam em Bagdá, mas em Tel Aviv. E são usadas contra homens, mulheres, crianças indefesos da forma mais desumana e covarde possível, típica do nazi/sionismo.
O governo terrorista de Israel recusa-se a discutir o que quer que seja em termos de paz e insiste, com apoio da mídia podre, que não mostra as imagens da barbárie, em “justiçar” o Hamas. O partido palestino que governa Gaza eleito pelo voto direto num dos muitos acordos de paz com participação dos EUA não tem feito outra coisa ao longo da história que não se defender das constantes agressões nazi/sionistas. A GLOBO não diz isso e nem vai dizer. Sionistas são grandes credores da rede.
Os Marinhos vendem mães se for preciso for para sustentar o poder de mentir. Como qualquer Frias da vida em sua FOLHA DE SÃO PAULO, ou qualquer Civita em sua VEJA quantas mentiras.
Os feriados de fim de ano trocaram o horror do holocausto dos palestinos pelos congestionamentos nas estradas que dão acesso ao litoral brasileiro. Pessoas felizes da vida em longas extensões de automóveis, muitos da General Motors/Mortos, se dizendo dispostas a enfrentar o que fosse necessário para assistir a uma queima de fogos.
Há um filme simples chamado DOMINIUM cuja história se passa num país governado por um similar nazi/sionista, em que a emoção é doença. Amar é doença. Ser solidário é doença. Por onde quer que se vá lá está um aparelho de televisão mostrando as virtudes da frieza, da omissão. E uma droga que faz com que as pessoas deixem de sentir. Sentir emoções.
Esse papel é cumprido hoje pela mídia e os nazi/sionistas sabem disso. São grandes banqueiros, grandes empresários, sustentam-se do dinheiro das pessoas dominadas por tênis de marca, sanduíches dessa ou daquela rede e provavelmente já estão comprando em massa os perfumes com cheiro de hambúrgueres lançado por uma dessas redes do terrorismo capitalista.
No filme, o fator de controle e comando do estado nazi/sionista é o clero. Não difere do fundamentalista judeu que assassinou o primeiro ministro Rabin por ter aceito a paz. Nem de qualquer Edir, o Macedo, não importa que esse Edir, o Macedo, seja um grande pilantra, escroque. Começou com pão de nozes.
As religiões historicamente têm servido de pretexto para guerras e defesa de interesses econômicos. Pio XII, mais recentemente era aliado de Hitler e João Paulo II e Benedito XVI instrumentos do capitalismo neoliberal.
Os sionistas avocam a si a condição de perseguidos ao longo da história da humanidade e cobram juros de sangue e barbárie por isso. Como se fossem os únicos.
Assassinam, estupram, torturam em nome do direito de existirem, eliminando o outro. São bestas sanguinárias escoradas no poder da maior potência militar do mundo, os EUA.
Norte-americanos e ingleses (colônia européia dos EUA) recusaram-se a votar a proposta dos países árabes para o cessar fogo exigindo que o Hamas parasse de lançar foguetes caseiros sobre Israel. Legítima defesa só para os sionistas donos dos bancos e das grandes empresas que financiam campanhas políticas, inclusive a de Barak Obama.
Chamam isso de civilização. Sentem-se e procedem como “povo superior”. Tem os que se deixam encaçapar em trocas inocentes de bombons na sociedade foto montada e onde os banheiros têm sabonetes que eliminam "bactérias palestinas", "bactérias latinas", "bactérias africanas", etc.
São só assassinos, genocidas. Transformam humanos em massas inertes nos congestionamentos do ano novo e se estarrecem com os cachorrinhos perdidos nas estradas e o desespero dos donos. O dono desse pé na foto acima está longe, não importa. Não percebem que agem em todos os cantos do mundo e estendem suas garras e sua suástica em forma de estrela de davi para “curar” os inferiores do mal do “sentir emoções”.
O endereço para se ter idéia da extensão do horror suástica/davi é
http://www.ccun.org/Documents/The%20Gaza%20Holocaust%20Israeli%20Attacks%20on%20Jabalia%20February%2027-March%203,%202008.htm

Créditos: Patria Latina

Do LeMondeDiplomatique...

O que o Império Britânico poderia ensinar aos EUA

No momento em que a influência dos Estados Unidos sobre o resto do mundo parece ameaçada, vale a pena ensair uma comparação entre a o império norte-americano e o que o precedeu. Ela revelará, entre outros pontos, que a Grã-Bretanha teve, em meados do século 20, a sabedoria de perceber que seu poder tinha limites. Os EUA serão capazes do mesmo?

Eric Hobsbawm

Na história recente, apenas duas potências tornaram-se impérios globais: a Grã-Bretanha, do século 18 até a metade do século 20, e os Estados Unidos, desde então. Espanha e Holanda formaram também impérios poderosos, mas sem alcançarem essa dimensão global. Os britânicos, e posteriormente os norte-americanos, distribuíram recursos pelo mundo todo e ostentaram ambições internacionais sustentadas por uma vasta rede de bases militares.

O poder bélico da Grã-Bretanha veio de sua supremacia naval. O dos Estados Unidos, de sua capacidade de destruição por meio de bombardeios. Mas garantir a permanência de um império global requer mais que vitórias militares: exige a capacidade de ordenar e controlar o ambiente ao redor.

A Grã-Bretanha e os Estados Unidos beneficiaram-se de um trunfo suplementar que só podia existir no quadro de uma economia globalizada: ambos dominaram a indústria mundial. Pela importância do seu aparato de produção, essas nações tornaram-se as “oficinas do mundo”. Tanto que, durante os anos 1920 e depois da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos representavam cerca de 40% da produção industrial mundial. Ainda hoje, essa cifra oscila entre 22% e 25%.

Os dois impérios tornaram-se modelos que os outros países buscavam copiar. Exerceram uma influência cultural desproporcional, especialmente por meio da formidável propagação da língua inglesa. Situados no cruzamento das trocas internacionais, suas decisões orçamentárias, financeiras e comerciais condicionaram o conteúdo, o volume e a destinação desses fluxos.

Para além desses pontos comuns, existem inúmeras diferenças entre as duas nações. A mais evidente diz respeito ao tamanho de cada uma. A Grã-Bretanha é uma ilha, não um continente, e nunca teve fronteiras no sentido norte-americano do termo. Ela fez parte de diversos impérios europeus – na época romana, depois da conquista normanda e, durante um curto período, quando Maria Tudor casou-se com Filipe II da Espanha, em 1554 –, mas nunca foi o centro de um deles. Além disso, toda vez que a Grã-Bretanha produzia um excedente populacional, este emigrava ou fundava colônias, fazendo das ilhas uma fonte importante de emigração.

Os europeus que colonizaram os EUA viam seu território como presente de Deus. É por isso que a Constituição exclui explicitamente os índios do corpo político formado por aqueles que se beneficiariam do “direito natural aos bens da liberdade”

Ao contrário disso, os Estados Unidos são essencialmente uma terra de acolhimento, que preencheu seus imensos espaços graças ao aumento populacional e a importantes ondas de imigração, principalmente vindas da Europa Ocidental, até 1880. Junto com a Rússia, foi o único império a não experimentar uma diáspora.

O império americano é o produto lógico de sua expansão, baseada numa identificação quase total entre país e continente. Para os imigrantes europeus, habituados a densidades populacionais relativamente elevadas, os espaços norte-americanos devem ter parecido ao mesmo tempo infinitos e desertos. Impressão reforçada pela destruição quase total das populações locais por doenças que os colonos espalhavam, voluntariamente ou não. A certeza que o europeu tinha sobre o fato de essa terra ser uma dádiva de Deus o fazia eliminar os nômades para impor seu sistema econômico e sua agricultura intensiva. É por isso que a Constituição norte-americana exclui explicitamente os índios do corpo político formado por aqueles que se beneficiariam do “direito natural aos bens da liberdade”.

Os Estados Unidos nunca se viram como parte de um sistema internacional formado por nações de poderes comparáveis, o que configura outra diferença com relação à Grã-Bretanha e à Europa em geral. A noção de colônia era igualmente incompatível com essa visão, já que a totalidade do continente norte-americano, aí incluso o Canadá, deveria acabar transformando-se em um único país.

É por isso que a hegemonia norte-americana, para além do seu território-continente, não poderia tomar a forma do império colonial britânico nem da Commonwealth. Com exceção do Havaí, os Estados Unidos nunca procuraram realmente incorporar regiões que já estivessem povoadas ou que não houvessem sido colonizadas por anglo-saxões, como Porto Rico, Cuba e as ilhas do Pacífico.

Não tendo jamais enviado colonos ao redor do mundo, os EUA não poderiam fazer surgir os dominions, essas “colônias brancas” com ou sem populações nativas que conquistaram progressivamente sua autonomia, como o Canadá, a Austrália, a Nova Zelândia ou a África do Sul. Além disso, desde a guerra civil e a vitória do norte, toda secessão da União se tornou impensável no plano legal, político e até mesmo ideológico. Assim, o poder norte-americano só poderia exprimir-se para além das suas fronteiras na forma de um sistema de Estados satélites ou vassalos.

Os EUA nasceram de uma revolução muito duradoura. Alexis de Tocqueville já havia compreendido que a orientação política de um empreendimento desse tipo seria forçosamente populista e antielitista

Outra diferença fundamental entre os dois países é que os Estados Unidos nasceram de uma revolução que talvez tenha durado mais do que todas aquelas animadas pelas esperanças do Século das Luzes, como afirma Hannah Arendt. É a partir da convicção messiânica de que a sua sociedade “livre” seria superior a todas as outras que os EUA fundam sua justificativa para a constituição do império. Uma sociedade destinada a transformar-se em um modelo para o mundo inteiro. Alexis de Tocqueville já havia compreendido que a orientação política de um empreendimento desse tipo seria forçosamente populista e antielitista.

Já a Inglaterra e a Escócia fizeram suas revoluções nos séculos 16 e 17, mas elas não perduraram. Foram recicladas em um regime capitalista voltado para a modernidade, mas muito hierarquizado e desigual, dirigido até o século 20 por grandes famílias de proprietários de terras. A Irlanda provou que um império colonial pode existir no interior de uma estrutura desse tipo, como a Grã-Bretanha.

Os britânicos estavam convencidos da sua superioridade com relação às outras sociedades, mas não tinham nem a convicção messiânica, nem a vontade de converter os povos estrangeiros ao seu modo de governo ou ao protestantismo. O império britânico não foi construído para ou por missionários. Pelo contrário: em sua principal província, a Índia, as atividades destes últimos eram ativamente desencorajadas.

Mais uma diferença: desde o Domesday [1], no século 11, o reino da Inglaterra e, depois de 1707, a Grã-Bretanha, constituíram-se ao redor de um sistema judiciário e de um governo muito centralizados, que formaram a mais antiga nação da Europa. Nos Estados Unidos, a liberdade é adversária do governo central, e até mesmo de toda autoridade estatal, deliberadamente paralisada pela separação dos poderes.

Não nos esqueçamos de outra diferença fundamental: suas respectivas idades. Além de uma bandeira e de um hino, os estados-nações têm necessidade de mitos fundadores, que devem ser procurados em sua história. Mas os Estados Unidos não contavam ainda com uma história de onde pudessem extrair tais alegorias, diferentemente da Inglaterra, da França revolucionária ou mesmo da União Soviética, onde Stálin não hesitou em reavivar a memória de Alexandre Nevski para mobilizar o povo contra o invasor alemão, em 1941.

Os Estados Unidos acabaram se definindo contra os ingleses. Por isso, sua identidade nacional só podia construir-se a partir da ideologia revolucionária e das novas instituições republicanas. A ligação aceitável com a antiga pátria reduzia-se à língua

A América não tinha ancestrais mais antigos que os primeiros colonos ingleses, já que os próprios puritanos se definiram como não-índios, e os índios, assim como os escravos, estavam, por definição, excluídos do “povo”. Ao contrário dos criollos hispano-americanos, em sua luta pela independência eles tampouco podiam se inspirar em impérios desaparecidos, como os dos incas ou dos astecas.

Por fim, os Estados Unidos, no curso da revolução, acabaram se definindo contra os ingleses. Portanto, a identidade nacional norte-americana não podia constituir-se a partir de um passado comum com a Grã-Bretanha, mesmo antes do afluxo de imigrantes anglo-saxões. Ela só podia construir-se a partir da sua ideologia revolucionária e das suas novas instituições republicanas. A ligação aceitável com a antiga pátria reduzia-se à língua.

A maioria das nações européias tem vizinhos e inimigos contra os quais se definem e nos quais se referenciam. Os Estados Unidos, cuja existência nunca esteve ameaçada, salvo pela Guerra da Secessão, não podem definir seus inimigos no plano histórico, o que lhes deixa apenas a opção do plano ideológico: aqueles que rejeitam o modo de vida norte-americano.

O que vale para os impérios vale para os Estados. Nesse caso também, a Grã-Bretanha e os Estados Unidos são profundamente diferentes. O império, no sentido estrito ou formal, foi um elemento constitutivo do desenvolvimento econômico britânico e de seu poderio internacional. Esse nunca foi o caso para os Estados Unidos, cuja decisão mais importante foi a de não se tornar um Estado entre outros, mas um gigante de dimensões continentais. É a terra, e não os mares, que desempenhou um papel central no seu desenvolvimento. Eles sempre foram expansionistas, mas nunca à maneira dos impérios marítimos espanhol ou português no século 16, holandês no século 17, ou britânico, cujas metrópoles foram sempre Estados de dimensões modestas.

Os Estados Unidos assemelham-se mais à Rússia, que também estendeu sua influência por vastas planícies, “de um mar a outro” – neste caso, do Báltico ou mar do norte ao Pacífico. Mesmo se não possuíssem um império, os Estados Unidos seriam a nação mais populosa do hemisfério ocidental e a terceira em escala global. Do lado oposto, desprovida de seu império, a Grã-Bretanha era apenas uma economia entre outras, realidade da qual tinha perfeita consciência, mesmo quando governava um quarto da população mundial.

No ápice de sua potência industrial, as exportações norte-americanas representavam apenas 5% de seu PIB. Essa proporção era de 12,8% na Alemanha, 13,3% no Reino Unido, 17,2% nos Países Baixos e 15,8% no Canadá

Mais importante ainda: como a economia britânica estava implicada na maioria das trocas internacionais, o império foi um elemento central do desenvolvimento da economia mundial no século 19. Até os anos 1950, ao menos três quartos dos enormes investimentos britânicos tinham como destino os países em desenvolvimento. E mesmo durante o período entre as duas guerras mundiais, mais da metade das exportações que saíam da Grã-Bretanha partiam em direção a regiões da sua zona de influência. Com a industrialização da Europa e dos Estados Unidos, a Grã-Bretanha deixou de ser a oficina do mundo, mas permaneceu como o mestre-de-obras da rede de transporte internacional. Ela se mantém igualmente como negociante e banqueira do restante do mundo, assim como a primeira exportadora de capital.

A economia norte-americana nunca manteve uma ligação tão simbiótica com a economia mundial. Mas seu peso significativo se deve ao fato de ser a maior produtora industrial do globo e pela imensidão de seu mercado interno.

A partir de 1870, e sobretudo no século 20, as proezas dos Estados Unidos em matéria de tecnologia e de organização do trabalho levaram o país a se tornar a primeira sociedade de consumo de massa. Durante o intervalo das duas guerras mundiais, essa economia, bastante protegida, desenvolveu-se graças aos seus recursos próprios e ao seu mercado interno.

Diferentemente da Inglaterra, até o final do século 20 os Estados Unidos importavam poucas matérias-primas e exportavam uma quantidade de mercadorias e capitais bastante modesta para o seu tamanho. No ápice de sua potência industrial, em 1929, as exportações norte-americanas representavam apenas 5% de seu Produto Interno Bruto (PIB, em dados corrigidos de 1990), enquanto essa proporção era de 12,8% na Alemanha, 13,3% no Reino Unido, 17,2% nos Países Baixos e 15,8% no Canadá. Do mesmo modo, apesar de uma supremacia incontestável no plano industrial a partir de 1880, com 29% da produção mundial, as exportações norte-americanas só alcançaram as da Grã-Bretanha às vésperas do crash da bolsa, em 1929. A dominação econômica do Novo Mundo sobre o Velho instaurou-se durante a Guerra Fria. Nada permitia afirmar que ela, mais uma vez, duraria tanto tempo.

A Grã-Bretanha possuiu o mais império da História. Mas sabia que não podia dominar o mundo inteiro e nunca tentou fazê-lo. Procurou tornar o restante do mundo suficientemente estável para poder prosperar, sem procurar impor sua vontade por toda parte

Como reação à industrialização da Europa e dos Estados Unidos, a Grã-Bretanha vitoriana, já maciçamente industrializada e sempre a primeira exportadora de capitais, fez pender a balança dos seus investimentos em direção a sua zona de influência imperial. Para os Estados Unidos do século 21, essa possibilidade não existe mais. Aliás, com exceção do período que vai do fim da Primeira Guerra Mundial a 1998, a economia norte-americana sempre foi deficitária.

Em um mundo globalizado, a dominação cultural dos EUA é cada vez menos sinônimo de dominação econômica. Sim, eles inventaram o supermercado, mas foi o grupo francês Carrefour que conquistou a América Latina e a China, por exemplo. Como conseqüência dessa diferença crucial com a Grã-Bretanha, o império norte-americano teve sempre de exibir força para sustentar sua economia. Sem a submissão do “mundo livre” às exigências da Guerra Fria, o tamanho da economia norte-americana teria sido suficiente para servir de modelo ao restante do mundo? Ou para estabelecer a dominação das agências de classificação de risco financeiro, as normas contábeis e o direito dos negócios norte-americanos? Ou para definir o “consenso de Washington” como a Bíblia do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial? É possível duvidar de que teria sido assim.

Por todas essas razões e divergências, o império britânico não pode ser considerado como um modelo que permite compreender o projeto hegemônico norte-americano. A Grã-Bretanha conhecia os seus limites, especialmente aqueles que se referiam ao seu poderio militar. Peso-médio que sabia que não poderia manter eternamente o título de campeã dos pesos-pesados, ela fugiu da crise de megalomania que ameaça todos os aprendizes de senhores do mundo. Ela possuiu um império mais vasto do que nenhum outro país jamais teve ou terá. Mas sabia que não podia dominar o mundo inteiro e nunca tentou fazê-lo. Ao contrário disso, ela tentou tornar o restante do mundo suficientemente estável para poder prosperar, mas sem procurar impor sua vontade por toda parte.

Quando a era dos impérios marítimos chegava ao fim, na metade do século 20, a Grã-Bretanha sentiu o vento virar antes das outras potências coloniais. Como seu poder econômico não dependia de seu poderio militar, mas do comércio, ela se adaptou mais facilmente à perda de seu império, assim como havia enfrentado o mais grave dos reveses da sua história: o fim das suas colônias americanas.

Os Estados Unidos compreenderão essa lição? Ou procurarão manter uma dominação global apenas por meio do poderio político e militar, engendrando assim cada vez mais desordem, conflitos e barbárie?



[1] Referência ao censo realizado por ordem de Guilherme I da Inglaterra, em 1086, destinado a levantar informações sobre os proprietários de terra e gado, a fim de determinar o que cada um efetivamente possuía e, assim, poder cobrar-lhes impostos. Todas as informações foram reunidas no Domesday Book, ou Livro da Cntabilidade. Em agosto de 2006, uma versão online foi disponibilizada pelo arquivo Nacional britânico: www.nationalarchives.gov.uk/domesday.

Boa música cubana....

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Ernesto Lecuona - La Música De Ernesto Lecuona I @ 320

01. La Comparsa
02. Malagueña
03. Maria La O
04. Rosa La China
05. En 3 X 4
06. Por Qué Te Vas
07. Andalucía
08. Aragon
09. A La Antigua
10. Ahí Viene El Chino
11. Siboney
12. Noche Azul
13. Danza Negra
14. Al Fin Te VI
15. Estás En Mi Corazón
16. Romántico
17. Danza Lucumi
18. Córdoba
19. Polichinela
20. Damisela Encantadora

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Ernesto Lecuona - La Música De Ernesto Lecuona II @ 320

01. Damisela Encantadora
02. Estás En Mi Corazón
03. Noche Azul
04. El Dulcero
05. Aquella Tarde
06. Mariposa
07. Mariposa
08. Siboney
09. Malagueña
10. Andalucía
11. Para Vigo Me Voy
12. Romanza De Maria La O
13. Muñeca De Cristal
14. Te Vas Juventud
15. Karabali - Esclavo Libre
16. La Chancletera
17. Danza Ñañiga

Total arquivo: 129,71MB

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Do blog do Azenha...


Gaza resiste. Gaza sobrevive.



Ramzi Kysia é escritor e ativista árabe-norte-americano, um dos organizadores do Movimento "Gaza Livre". Para saber mais, visite www.FreeGaza.org.

FAIXA DE GAZA, Palestina — Num pequeno café na cidade de Gaza, Amjad Shawa, coordenador da Rede Palestinense de ONGs (PNGO), toma café e rumina sobre o bloqueio com que os israelenses castigam Gaza. “Esse bloqueio nada tem a ver com segurança, nem com o Hamás,” diz ele. "Israel só pensa em separar Gaza da Cisjordânia, para enterrar o projeto nacional palestino.”

Na Faixa de Gaza, estreita planície litorânea de 30 km de comprimento, apertada entre Israel e o Egito, vivem 1,5 milhão de palestinenses. Apesar da pequena extensão territorial, concentra-se ali, em vários sentidos, o núcleo duro de dois gigantescos conflitos: o crescimento político do islamismo e a idéia, ocidental, de que o islamismo político possa ser derrotado mediante algum castigo coletivo e um brutal bloqueio econômico.

Desde que o Hamás venceu eleições parlamentares, em janeiro de 2006, Israel vem submetendo Gaza a bloqueio cada vez mais severo. Em junho de 2007, depois de militantes do Hamás terem-se aliado ao presidente Máhmude Abbas e assumiram o controle de Gaza, Israel cerrou ainda mais o bloqueio, que passou a incluir praticamente tudo, apenas mitigado com a chegada, esporádica, de alguns produtos, todos de ajuda humanitária. A economia local foi destruída, o que fez subir todos os indicadores de desemprego, de miséria, de desnutrição infantil.

Enquanto Abbas e o partido Fatah ainda governam a Cisjordânia, com apoio de Israel, o futuro do Hamás é incerto. Apesar de o Hamás ainda ter massivo apoio popular, a população em Gaza começa a dar sinais de frustração, ante a economia moribunda.

Para Rawya Shawa, membro independente do Conselho Legislativo Palestino de Gaza, a Palestina está num limbo político. “Quando se chega ao poder, as coisas mudam", diz Shawa. “70% dos habitantes de Gaza são refugiados. A Fatah liderou os palestinos por 45, 50 anos, e fracassou. Nada fizeram do que prometeram. Agora, o Hamás está no poder. Estão tentando. A população está à espera de resultados.”

CRESCIMENTO DO HAMÁS

Em situação de declínio do nacionalismo pan-arabista, que esteve no auge nos anos 60 e 70 e que entrou em colapso a partir de 1993, depois dos acordos de Oslo, o Hamás encontrou terreno fértil na Palestina, combinando projetos bem-sucedidos de bem-estar e melhoria de condições de vida para a população, tradicionalismo religioso, anti-elitismo (o primeiro-ministro Ismail Haniyeh ainda vive na casa em que nasceu, em Beach Camp, uma das áreas mais pobres de Gaza) e oposição dura à presença de Israel na Região. Embora atualmente o Hamás esteja respeitando um cessar-fogo unilateral, os seus grupos armados são responsáveis pelos rojões Qassam lançados contra Israel e por ataques de homens-bomba, motivo pelo qual o grupo está classificado como "organização terrorista" por EUA e Israel.

Praticamente ninguém, em Gaza, aceita essa classificação. Para o grupo B’Tselem, de israelenses ativistas dos direitos humanos, 955 crianças palestinenses foram mortas pelo exército de Israel; e 123, nos ataques palestino, desde o início da II intifada em setembro de 2000. Por causa do bloqueio, cerraram as portas 3.500 das 3.900 fábricas que havia em Gaza, o que levou à demissão de mais de 100 mil empregados do setor privado. A renda per capita em Gaza é inferior a 2 dólares/dia; 80% das famílias dependem integralmente de auxílio internacional para comer.

O bloqueio levou a racionamentos cada vez mais terríveis, que abalaram todas as estruturas da economia e da sociedade. A falta de combustível, elevou os preços da gasolina para mais de $50/galão no início do verão e levou, em seguida, à falta de energia elétrica. Hospitais, que dependem de geradores a diesel para funcionar, ficam paralisados regularmente por até 12 horas por dia. Sem combustível para as bombas de irrigação, as colheitas, já minguadas, desaparecem. Nas casas, só há água corrente durante menos de 6 horas por dia, e um terço das casas não tem água encanada.

Sem diesel, as bombas de escoamentos dos esgotos não funcionam, e os detritos já começam a ser lançados diretamente no Mediterrâneo, o que faz das praias latrina a céu aberto. Em 2008, foram lançados no Mediterrâneo mais de 15 bilhões de litros de esgotos não tratados, o que já dizima a flora e a fauna marinha nas regiões costeiras.

Em comparação a dezembro de 2005, menos de 20% dos produtos que Israel normalmente exporta para Gaza ainda são entregues, mas os números encolhem diariamente. Tanto o Banco Mundial quanto várias organizações israelenses de direitos humanos já exigiram o fim do bloqueio, sem sucesso.

“Não é um desastre natural", diz John Ging, diretor da Agência da ONU para Auxílio Humanitário em Gaza. “É desastre construído e planejado pelas políticas desumanas de Israel."

AÇÃO DIRETA

As pessoas, em Gaza não esperam que o fim do bloqueio porá fim à crise. Em janeiro, centenas de milhares de pessoas passaram pela fronteira, em direção ao Egito, quando o Hamás demoliu parte do muro de fronteira que Israel construiu em 2003. Em fevereiro, o Comitê Popular contra o Bloqueio organizou uma "corrente humana", de milhares de palestinenses, ao longo de toda a fronteira da Faixa de Gaza.

“Meu telefone não parou de tocar, porque eles [os israelenses] pensam que vamos demolir a fronteira", diz Sameh Habeeb, um dos organizadores do evento. "Israel não acredita que milhares de árabes sejam capazes de organizar um protesto pacífico. Quando há resistência armada, Israel manda seus mísseis e F-16s, mas eles ficam sem saber o que fazer nos movimentos de resistência civil. A não-violência enlouquece os israelenses.”

O mais impressionante ato de resistência não-violenta em Gaza é sobreviver.

Várias famílias aprenderam a caçar e criar coelhos e pássaros selvagens, para suplementar a dieta. Há uma precária mas eficiente rede de túneis que atravessam a fronteira do Egito, cuja construção custou muitas vidas, mas que é importante via pela qual chegam suprimentos e remédios. Nas últimas semanas, começou a operar uma rede de tubulações, subterrânea, que aliviou consideravelmente a falta de combustível. Alguns carros rodam movidos a gás de cozinha, vendido a 300 dólares o botijão. A falta de gás para cozinhar fez muitas famílias reverter aos fogões à lenha. Não havendo concreto, começam a reaparecer em Gaza construções feitas de tijolos de barro queimado.

O colapso da economia em Gaza é mostra do imperialismo de guerra em estágios extremos: economia obrigada a operar sem matérias-primas, esfacelamento de todas as indústrias locais mediante a violência militar e o bloqueio, acesso permitido só a produtos manufaturados importados exclusivamente da potência ocupante, pressão para forçar os habitantes a consumir todas e quaisquer reservas ou poupanças que tenham armazenado. Quando o bloqueio terminar, algum dia, a população ainda demorará muito para recuperar-se, mesmo com extensa ajuda humanitária.

Amjad Shawa, diretor da Rede Palestinense de ONGs, lembra que o bloqueio é instrumento da ocupação israelense. "O estatuto legal de Gaza é "território ocupado". O bloqueio é um instrumento da mesma agressão. Por isso os ataques a Gaza, por Israel, configuram crime de guerra. De fato, por mais que precisemos de ajuda humanitária, a solução não virá daí. Precisamos pôr fim à ocupação".

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

TV Globo quer confundir espectador


Do blog Diario Gauche


Repórter amestrado simula situações de perigo

Ontem à noite no Jornal Nacional da tevê Globo, o seu correspondente baseado em Israel se superou.

O repórter e tordilho amestrado chegou a simular estar sofrendo – ele próprio – um bombardeio de foguete palestino Kassan, sabidamente um artefato caseiro. Mostrou imagens instáveis arremedando uma câmera em movimento e abrigando-se junto a um muro, enquanto ruídos davam o tom de perigo à cena visivelmente montada em estúdio.

Anotem o nome do bufão: Alberto Gaspar. O tipo cumpre (em absoluta segurança e circulando somente no lado israelense) a linha editorial da Globo que opta por deliberadamente confundir o espectador de senso comum, fazendo crer que há uma equivalência perfeita na violência entre o Hamas e Israel. Uma fórmula tácita - disfarçada - de apoiar o genocídio do Estado de Israel contra o povo palestino da Faixa de Gaza.

Fim da era Bush e eleição em Israel:

uma das faces obscenas do massacre


O ataque a Gaza é uma tentativa de última hora de mudar as relações de forças no Médio Oriente, antes do fim da era Bush, nos EUA. E tem uma dimensão obscena: as centenas de vítimas dos bombardeios são vítimas colaterais da campanha eleitoral em Israel.Para aumentar o seu apoio popular antes das eleições, todos os líderes israelenses estão competindo para ver quem é o mais duro e quem está disposto a matar mais. A análise é de Michael Warschawski.

"A morte de uma única vítima israelense justifica o assassinato de centenas de palestinos. Uma vida israelense vale uma centena de vidas palestinas. É isto que o Estado de Israel e os meios de comunicãção mundiais mais ou menos descuidadamente repetem, com questionamentos marginais. E esta alegação, que acompanhou e justificou a mais longa ocupação de territórios estrangeiros da história do século XX, é visceralmente racista. Que o povo judeu aceite isto, que o mundo concorde, que os palestinnos se submetam - esta é uma história de piadas irônicas. Ninguém acha graça..."
John Berger

Enquanto o mundo inteiro está em choque diante das terríveis imagens emitidas de Gaza, a opinião pública israelense apóia maciçamente a sangrenta ofensiva de Barak-Olmert. Isto inclui o Meretz, a oposição de esquerda parlamentar. Apesar de ter manifestado preocupação pelas mortes de civis, o líder do Meretz, Haim Oron, numa entrevista à televisão israelense, aderiu aos argumentos da propaganda oficial, responsabilizando o Hamas pelo banho de sangue. Um discurso mistificador como este está sendo copiado pela maioria dos líderes do mundo ocidental, com o Ministro dos Negócios Estrangeiros de França superando até a Secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice. Vamos colocar os fatos em sua devida ordem:

Gaza está sendo alvejada pelo exército israelense desde a vitória do Hamas, e o cerco imposto sobre mais de 1,5 milhão de civis - por Israel, mas também pela chamada comunidade internacional - é em si um aco de violência e um crime de guerra;

O ataque israelense é uma agressão planeada: de acordo com as notícias vindas de Israel, Ehud Barak planeou o ataque a Gaza já em agosto;

Os foguetes lançados sobre cidades de Israel foram uma retaliação a agressões militares israelitas anteriores, e não foram lançados pelo Hamas, mas sim pela pequena organização Jihad Islâmica;

O ataque a Gaza é parte integral da guerra santa neo-conservadora contra o mundo islâmico, e a administração neo-conservadora cessante dos EUA, assim como o Egipto e outros regimes reaccionários árabes, instaram as autoridades israelenses a desencadear a ofensiva antes de Obama entrar na Casa Branca;

A intenção declarada de Barack Obama de abrir conversações com a República Islâmica do Irã é uma das principais preocupações das administrações cessantes em Tel Aviv e Washington, e a ofensiva contra Gaza é uma tentativa de provocar uma reação iraniana que permita a retaliação israelense e dos EUA. Nos últimos dias, o vice-ministro da Defesa israelense, Ephraim Sneh, bem conhecido pela sua obsessão anti-iraniana, vinculou sistematicamente os foguetes do Hamas (sic) ao Irã, sem, evidentemente, apresentar quaisquer provas.

Esta estratégia geral, baseada na mistificação do "choque de civilizações" e na guerra global contra o Islã, é partilhada por todos os partidos políticos sionistas de Israel e explica o apoio do Meretz à actual agressão.

Apesar de não ser de esperar uma mudança rápida da política norte-americana no Ocidente asiático, os líderes israelitas e os seus patrocinadores neo-cons em Washington estão preocupados pela mudança na administração norte-americana, e temem que uma nova estratégia possa quebrar a guerra global "preventiva". O ataque a Gaza é uma tentativa de última hora de mudar as relações de forças no Médio Oriente, antes do fim da era neo-conservadora.

E, antes de concluir, não esqueçamos a dimensão obscena: as centenas de vítimas dos bombardeios sobre Gaza são vítimas colaterais da campanha eleitoral israelense. Para aumentar o seu apoio popular antes das eleições, todos os líderes israelenses estão competindo para ver quem é o mais duro e quem está disposto a matar mais. Ehud Barak, contudo, tem uma memória muito curta, e Shimon Peres pode recordar-lhe que este cálculo cínico não é necessariamente o melhor: o massacre de Qana, que, supostamente, deu a vitória a Shimon Peres, teve como consequência que centenas de milhares de cidadãos palestinos virassem as costas ao Partido Trabalhista.

Apesar da sua brutalidade, contudo, Ehud Barak permanece um dos mais populares líderes na arena israelense, e os milhares de manifestantes que saíram às ruas ontem, quase sem convocação, protestando contra o massacre, podem indicar que todos os que estão por trás dele, incluindo o Meretz, não vão receber os seus votos. É previsível que o repúdio internacional e o relativamente amplo sentimento anti-guerra entre os eleitores force o Meretz, uma vez mais, a mudar de posição. Deviam, porém, lembrar-se da antiga verdade que os eleitores preferem sempre o original: quando o Meretz sanciona a estratégia de guerra e as mentiras de Netanyahu, os eleitores vão preferir votar em Netanyahu em vez de na sua pálida e sensaborona cópia.

(*) Ativista de esquerda israelense, diretor do Centro de Informação Alternativa de Jerusalém.




Tradução de Luís Leiria - Esquerda.Net

quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Um exemplo de soberania....

Cuba, Revolução, 50

Emir Sader

De repente chegaram fotos de uns barbudos, posando como time de futebol, que tinham derrubado uma ditadura na América Central (sic – naquela época ainda não existia para nós o Caribe. Era uma região de “repúblicas bananeiras”, como depreciativamente nos referíamos a uma área de ditaduras – Somoza, Trujillo, Batista – como se fosse um fenômeno exótico na América Latina).

Aquela ilha tropical começava a surpreender-nos, a falar de revolução em um continente em que essa palavra era reservada para um fenômeno longínquo – a revolução mexicana – e de que desconhecíamos a revolução boliviana de 1952. Revolução, na verdade, para nós, eram a soviética e a chinesa. De repente, começa a se esboçar uma no nosso próprio continente, no nosso tempo político de vida.

Primeiro, a revolução nos chegava como luta contra o analfabetismo – que passou a representar um elemento essencial da luta emancipatória, a que a Venezuela e a Bolivia viriam a se somar recentemente, como se fossem carimbos de que se trata de processos revolucionários. Depois, as reformas urbana e agrária, as nacionalizações de empresas estrangeiras, mas sobretudo o discurso antimperialista.

Diante das reações da maior potência imperial da historia da humanidade, Cuba passou logo a identificar-se para nós com revolução – nascia a expressão Revolução Cubana, que nos acompanha a 50 anos. Tudo começado em um primeiro de janeiro, o que passou a dar a essa data uma conotação nova – de tempos novos, de que a pomba no ombro do Fidel quando discursava, era um prenuncio seguro.

Desde então, revolução, emancipação, dignidade, justiça, exemplo, solidariedade, internacionalismo – e tantas outras palavras, gestos, comportamentos, passaram a se incorporar a nosso mundo, a servir de norte, de referência e a identificar-se com Cuba. Nada foi igual desde que Cuba passou a expressar diante de nós a todos esses valores. Já não podíamos dizer que não eram possíveis, remetê-los para a utopia, como se não fosse possível a um pais ser pobre e ainda assim justo, ainda assim solidário, ainda assim internacionalista.

Cuba nos trouxe a revolução e o socialismo. O fato de que uma sociedade possa viver não em função do lucro, da ganância, do valor de troca, do mercado, mas das necessidades das pessoas, possa colocar em primeiro lugar a educação, a saúde, a habitação, a cultura – nos aponta o que contrapõe o socialismo ao capitalismo.

50 anos em que Cuba enfrentou as mais difíceis condições – do bloqueio dos EUA às duas tentativas de invasão do país por parte do governo estadunidense, pelo fim do campo socialista, pelas agressões reiteradas do imperialismo, pelo bloqueio e pelas mentiras – do que diz e do que cala – da imprensa monopolista mundial, pelo período especial e pelas catástrofes naturais. Cuba chega a seus 50 anos de Revolução desmentindo os que diziam que não sobreviveria sem o apoio da URSS, aos que se deslocaram para a Ilha para cobrir a suposta queda do regime cubano depois do fim dos regimes do leste europeu, aos que creiam que o país seria afetado pelas maiores convulsões se Fidel deixasse de estar à cabeça do governo.

Cuba chega aos 50 anos soberana, decidindo seu futuro a partir de suas próprias experiências, sem nunca ter deixado de ser solidária e internacionalista, nem nos seus momentos de maiores dificuldades. Ao contrário, a Escola Latinoamericana de Medicina expande a quantidade de alunos que formam as primeiras gerações de médicos pobres da América Latina. Mantêm e reforça a Operação Milagre, que já devolveu a visão a mais de um milhão de pessoas. Estende seu trabalho CE combate ao analfabetismo, que possibilitou que a Venezuela e a Bolívia fossem o segundo e o terceiro territórios livres de analfabetismo, como apoio direto e sistemático de Cuba.

São 50 anos de luta, de dignidade, de busca incessante da construção de uma sociedade justa, de apoio aos que precisam de apoio, de solidariedade com todos os povos do mundo. São 50 anos em que Cuba aponta o caminho da sociedade desmercantilizada, humanista, internacionalista – da sociedade socialista, de José Martí, de Fidel e do Che.

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