sábado, 4 de agosto de 2012

As quatro crises e a teoria da grande unificação


Vaz de Carvalho
 
A compreensão profunda da realidade só é conseguida numa teoria que mostre a unidade e as contradições dos diversos fenómenos sociais do mundo atual e que estude as suas transformações. Essa teoria é o marxismo.

1 – METAFÍSICA NEOLIBERAL VERSUS MATERIALISMO DIALÉTICO
A ciência é pela sua própria natureza materialista e dialética. A ciência representa o esforço para compreender e explicar os fenómenos naturais, tanto no nosso mundo terrestre como no universo, procura as relações entre esses fenómenos, estuda as suas transformações. Uma fórmula da física é por si só um exemplo de dialética: as diversas variáveis estão unidas entre si num resultado, essa unidade exprime as contradições internas – as variações de umas opõem-se às de outras; as transformações quantitativas dão origem a transformações qualitativas. Por exemplo, conforme a escala em que se processam os fenómenos à física clássica sucede a da relatividade generalizada (escala do universo) ou a quântica (ao nível das partículas atómicas e subatómicas); conforme a pressão e temperatura um gás pode passar ao estado líquido, ao sólido ou tornar-se plasma.
Assim, as ciências sociais se pretendem ser ciência, só podem ser materialistas e dialéticas. Pelo contrário a ideologia conservadora, seja de direita, seja dita reformista da social-democracia, na defesa do sistema capitalista, adopta a metafísica. (1)
A metafísica opõe-se à dialética, no sentido em que analisa os fenómenos de forma parcial ou isolada, independentes das suas relações objetivas, considera o seu circunstancialismo invariável, remete vulgarmente a sua explicação para condicionalismos subjetivos ou imateriais, não reconhece mudanças qualitativas nem explica as contradições internas dos sistemas. É essencialmente estática. O raciocínio metafísico constitui na atualidade o instrumento da ideologia reacionária para a manipulação e alienação das populações, de que é exemplo a “austeridade”, atribuindo as causas da crise ao endividamento ao Estado, responsabilizando os desempregados pelo desemprego, atribuindo aos “custos salariais” e direitos dos trabalhadores a falta de incentivos que o capital especulador teria para proporcionar investimento.
A análise do défice e do endividamento do Estado, mesmo estando tecnicamente correcta no seu detalhe, mas não estabelecendo as relações com todas as outras componentes do sistema económico e social e as suas contradições, revela-se especulação de natureza metafísica. Em consequência verificamos o falhanço das previsões e a incapacidade de evitar o prolongamento e agravamento das crises, embora - pelo menos desde Aristóteles e da sua Lógica - se saiba que raciocínios baseados em verdades parciais conduzem a conclusões falseadas…
Um dos aspetos mais evidentes da desconexão da realidade a que a metafísica neoliberal procede é a dissociação entre o económico e o financeiro, que se manifesta nas proclamações de manter a austeridade, a ”consolidação orçamental”…para ter crescimento. É como se estas variáveis ou fossem independentes ou estivessem relacionadas por simples equações lineares.
Desligada das verdadeiras causas – como a especulação bancária e a distorção na repartição dos rendimentos - a crise é apresentada ora como um somatório de “inevitabilidades” contra as quais nada se pode fazer senão submeter-se aos “mercados” e reduzir as prestações sociais do Estado “despesista”: Chamam a isto: “rigor orçamental”, enquanto se desbarata a riqueza nacional nas PPP e concessões, nas rendas do sector energético, nas absurdas privatizações de empresas lucrativas, na livre transferência de lucros e rendimentos para paraísos fiscais.
O raciocínio metafísico em economia é evidente ao considerarem “os mercados” como entidades abstratas, absolutas, independentes da vontade humana, às quais nos teríamos de sujeitar.
“As pessoas são levadas a acreditar que a economia tem uma lógica por si própria a qual depende da livre inter-actuação de forças de mercado e que os poderosos atores financeiros não poderiam, sob quaisquer circunstâncias, ter deliberadamente influenciado o curso dos acontecimentos económicos” (2)
A análise metafísica da crise e das suas causas acentua os processos de austeridade a que se associa o presidente da República demarcando-se em público do que aprova no gabinete; ou o governador do Banco de Portugal num “estudo” em que se diz ser necessário reduzir a “rigidez laboral”; ou o ministro das finanças que vê a crise financeira como “insuficiente liquidez de capital” e “aversão ao risco” e não fruto da especulação e da corrosão económica permitida pela ausência de controlo sobre o movimento de capitais e pela proliferação dos paraísos fiscais, forma de fuga aos impostos e sabotagem das finanças públicas.
A política de direita assume a sociedade capitalista como “eterna” sem considerar as suas contradições, concluindo pelo conformismo das “inevitabilidades” antisociais e pelas consequências de uma globalização neoliberal considerada imutável e acima de quaisquer outros critérios.
O neoliberalismo é uma metafísica destinada a defender interesses inconfessáveis sob o eufemismo da “economia”. Daqui os apelos à “ética” e aos “sacrifícios para todos”, como soluções. A sua argumentação e compreensão das causas das crises assemelha-se à das querelas medievais sobre as quais se faziam extensos tratados e teses de doutoramento, como a questão dos “universais” ou de saber se “um porco conduzido para a feira é seguro pelo camponês ou pela arreata”.

2 - AS QUATRO CRISES (3)

O capitalismo mergulhou o mundo em 4 crises insuperáveis neste sistema que apenas as agrava: a crise económica e financeira, a crise social, a crise ambiental e a crise extreminista.
A crise económica e financeira atual é consequência das teses monetaristas de criar dinheiro a partir de dinheiro, sem valor acrescentado pelo trabalho. O endividamento generalizado através do apelo ao crédito, foi o entorpecente que levou largas camadas das populações a aceitarem que era possível o aumento do consumo sem passar pela produção e pelo seu rendimento salarial, entregando o seu poder de decisão – e o seu futuro - na mão de mixordeiros da política populista e dita reformista
O valor acrescentado nas empresas, passou a ser absorvido pelos accionistas, pelo sector rentista e especulador – a “engenharia financeira” - em vez de dar lugar à correspondente retribuição salarial e ao investimento produtivo. Desde o predomínio neoliberal as crises sucederam-se de forma praticamente ininterrupta através do mundo inteiro: bolsa de Nova York em 1987; falências de instituições de crédito EUA em 1989-1990; Japão 1990; México, 1994-95; crise asiática 1997-98; Rússia 1998; crise bolsista de 2000 – 2001; Argentina em 2001-02. As medidas adoptadas apenas prolongaram e agravaram estas situações até que a partir de 2007 a crise atingiu os EUA e a UE.
A crise económica e financeira que se tornou e endémica é consequência da criação de capital fictício, apenas números nas contas dos bancos, sem contrapartida de valor real criado na produção, dando origem a dívidas absolutamente impossíveis de serem pagas. Trata-se, pois, de uma crise sem fim nem solução dentro do sistema actual. A austeridade é a forma de transformar o capital fictício em valor real aumentando a taxa de exploração e apropriando-se do património público.
Sabe-se como o BCE promove e financia a especulação cujas custas recaem sobre os povos, financiando a banca a uma taxa de juro muito baixa (1%), não sendo impostos quaisquer condicionamentos à utilização desse dinheiro, para depois os bancos obterem lucros extra à custa de elevadas taxas de juro que cobram aos Estados, às famílias, às empresas.
Sem regulação, em nome de uma hipotética eficiência, o grande capital financeiro criou um caos de corrupção e especulação. A economia, a vida política e social foi colocada ao sabor de gente egoísta, corrupta, fraudulenta que se disfarça com a mistificação de “os mercados”.
Apesar dos biliões de dólares aplicados em “resgates financeiros “ e “políticas de estímulo” - mais de 13 biliões de dólares nos EUA e 4,5 biliões de euros na UE - estas economias permanecem estagnadas ou em recessão; a pobreza e o desemprego não param de aumentar.
A crise social tem origem no facto dos sectores monopolistas e financeiros drenarem em seu benefício a riqueza criada. A estagnação económica resulta assim da insuficiência dos investimentos produtivos e da desequilibrada distribuição dos rendimentos nacionais, cuja evidência são as crescentes desigualdades e o empobrecimento relativo e absoluto das camadas trabalhadoras, de pequenos empresários e profissões liberais, temporariamente camuflado pelo crédito barato.
Em termos sociais podemos dizer que existe estagnação sempre que o crescimento não pode absorver a força de trabalho disponível e que existe recessão quando o desemprego tem tendência a aumentar. Apesar dos imensos progressos tecnológicos o desemprego, a pobreza, as desigualdades aumentaram entre as pessoas e entre os países. A livre circulação de capitais é ouro sobre azul para o crime organizado e para a corrupção que vive paredes meias com as intocáveis entidades financeiras, que os povos acabam por ter de salvar em nome do “risco sistémico”. Contudo, o único risco “sistémico” para os povos é o prosseguimento das actividades especuladoras que se sobrepõem ao tecido produtivo e aos direitos sociais. O avanço dos dogmas do mercado livre traduzido na “globalização” representou mais pobreza, mais crise global: “mais comércio livre mais fome” (4)
O sistema, incapaz de assegurar o pleno emprego e direitos sociais, apresenta-os quer como miragens quer como intoleráveis “privilégios”. Em nome dos dogmas da competitividade e da “eficiência” do mercado livre afirma-se então (como o presidente da República) que não possível manter o “Estado social”. Claro que não, atendendo à crescente riqueza levada para fora do país: mais de 73 mil milhões de euros nos últimos quatro anos.
A OIT considera que mais de 200 milhões de trabalhadores estão desempregados, situação que aumenta de ano para ano. Nas presentes condições, será praticamente impossível encontrar trabalho para os 80 milhões de pessoas que nos próximos dois anos se estima aumentarem o exército de reserva da força de trabalho, designado por “mercado de trabalho”.
A crise social trazida pelo sistema é uma crise de direitos; de desemprego e de precariedade – a patologia crónica do sistema capitalista. O neoliberalismo – o capitalismo da actualidade – não é democracia: é pauperização e depredação. “Milhões de crianças morrem cada ano porque os ricos recusam-lhes alguns centavos de ajuda”, escrevia Noam Chomsky em “A globalização excludente”.
“O principal objectivo das classes dominantes não é simplesmente administrar as consequências da crise financeira. Elas têm um plano a longo prazo para esmagar totalmente a classe trabalhadora, deitar abaixo o consumo e remodelar as expectativas de como o ser humano tem direito de viver. Como mencionou um responsável do Tesouro Britânico ao Financial Times: “Isto é uma oportunidade que só ocorre uma vez numa geração de transformar o modo como o governo funciona.” (5)
“Um quarto de todo o rendimento criado nos EUA vai para a 1% da população, enquanto a classe trabalhadora tem menores rendimentos que há uma década. Os mais ricos viram os seus impostos reduzirem-se, a desigualdade social disparou e arrancou uma ofensiva antisindical. Na UE há 115 milhões de pessoas em risco de pobreza ou exclusão social, 23% da população. Contudo nos últimos 15 anos os ativos dos 3 milhões de milionários europeus cresceu mais que a soma total das dívidas dos países europeus. Estes capitais poderiam resolver de uma assentada a crise das dívidas dos países europeus, porém a atual aristocracia financeira tem tão pouca intenção de ceder seus privilégios como a aristocracia francesa antes da revolução de 1789. (6)
A crise ecológica tem origem no sistema baseado numa competição que visa exclusivamente o aumento dos lucros das empresas dominantes do comércio mundial, segundo os critérios da OMC. Em consequência, verificamos o esgotamento dos recursos naturais. Apesar da pobreza e da fome (1 200 milhões de pessoas com rendimento inferior a 1,25 dólares por dia) o consumo de recursos naturais é superior em 57% à capacidade do planeta. Apesar dos cerca de 48 milhões de pobres nos EUA se toda a população mundial tivesse os mesmos níveis e padrões de consumo médios dos EUA seriam necessários 4,5 planetas. Seguindo as mesma vias de “sucesso” e “eficiência” da “economia de mercado” o Global Footprint Network estima que em 2030 sejam necessários 2 planetas para satisfação das necessidades. Registe-se que nos relatórios GEO das Nações Unidas, todas as medidas apontadas para defesa do ambiente incluem o reforço do papel do Estado e uma sua maior independência dos poderes privados.
É neste contexto que têm de ser avaliadas as ilusões de prosperidade pela “livre iniciativa privada”.
O esgotamento dos recursos naturais imporá alterações drásticas no modo de vida e no funcionamento das sociedades. Trata-se do fim da era da energia barata (peak oil); do esgotamento dos recursos naturais como a água, as florestas, os solos férteis, a pesca, que afectará milhares de milhões de pessoas. Mil milhões de seres humanos numa centena de países estão ameaçados pela desertificação. A biodiversidade declina rapidamente; milhões de toneladas de solo fértil são perdidos. Muitos minerais fundamentais atingem o ponto de esgotamento, implicado a sua extração cada vez maior dificuldade e maiores custos.
A incompreensão do que são custos e benefícios sociais e, por consequência também ambientais, está bem expressa pela afirmação de um dos homens mais ricos de Portugal, que se congratulava por ser possível colocar – nos seus supermercados – pescado fresco do Chile em 36 horas ou frutos tropicais em 9 horas, transportados de avião. Para ele e para quem pensa como ele “eficiência”” e “criação de valor” é isto, que represente desemprego na pesca e na agricultura nacionais, endividamento do país que tão superlativamente criticam, não parece ser relevante tal como os custos ambientais de tal “eficiência”.
A WWF, organização internacional para a conservação da natureza, lista 16 prioridades que passam pela alteração dos padrões de consumo, a valorização económica do capital natural ou a criação de estruturas legais e políticas para promover a gestão ao acesso equitativo à água, alimentos e energia. “Enquanto a biodiversidade revela uma tendência decrescente, a pegada ecológica aumenta, ilustrando bem como a nossa crescente procura pelos recursos naturais se tornou insustentável”.
De salientar ainda o impacto da urbanização, pois estima-se que em 2050 duas em cada três pessoas vão viver em cidades, o que implica uma forma completamente diferente da atual na gestão dos recursos naturais, mas também dos aspetos económicos e sociais.
A globalização corresponde à necessidade que o capitalismo tem de constante alargamento dos mercados, mas é também uma guerra para extorsão de mais-valia a nível mundial por um capitalismo decadente. Um sistema totalmente absurdo, atendendo aos limitados recursos materiais de que o planeta dispõe. Porém a economia conduzida sob a égide do FMI, da OMC e do BM, promove a chantagem da maximização do lucro privado, bloqueando controlos, fiscalização, autoridade eficaz. Os organismos que o poderiam fazer acabam por ficar ao serviço dos interesses privados sem interferência nos comportamentos que deviam regular.
O Prémio Nobel, Gary Becker afirmava que “O direito ao trabalho e a proteção do ambiente tornaram-se excessivos na maior parte dos países desenvolvidos. O comércio livre vai reprimir alguns destes excessos, obrigando cada um a tornar-se competitivo.” (7)
A crise exterminista, consiste nas crescentes agressões e ameaças militares, levadas a cabo pelos “EUA e os seus fantoches da NATO” (Paul C. Roberts) “Não há preocupações com o orçamento quando se trata de guerras ilegais ou ocupações militares que o governo dos EUA leva a efeito em pelo menos 6 países ou na ocupação de 66 anos no Japão e Alemanha ou o anel de bases militares construídos à volta da Rússia. O valor total do orçamento militar e segurança dos EUA anda à volta de 1,1 a 1,2 biliões de dólares, 70 a 75% do défice federal (8)
Em vez de segurança e justiça social para os povos encontramos “pirataria, “austeridade” e “guerra perpétua”: um extremismo destinado ao derrube da democracia. Aplicado a um indivíduo, isto identificaria um psicopata. Por que aceitamos isto? (9)
Os EUA dispõem de um número indeterminado de instalações militares espalhados por todo o globo que se estima serem mais de um milhar. O fim da URSS não representou mais segurança e paz para o mundo, pelo contrário, o orçamento militar dos EUA (5% da população mundial) aumentou, representando mais de 42% do total mundial procedendo a guerras “preventivas” e à “defesa de direitos humanos” com bombardeamentos sobre indefesas populações civis.
A corrida armamentista foi acelerada com a persistente instabilidade no Médio Oriente, a intenção do “escudo antimíssil” na Europa, a proliferação de bases militares. Recentemente a Rússia testou a sua última geração de mísseis intercontinentais dotados de múltiplas ogivas nucleares hipersónicas, e de contra medidas electrónicas que se considera tornar ultrapassado o escudo antimíssil que a na NATO pretende instalar. Poderão ser lançados de submarinos atómicos de 4ª geração.
Os EUA são um Estado falido que só o poder militar e a exacção sobre o resto do mundo através da aceitação do dólar como moeda global vão escondendo e adiando e que arrasta o esfrangalhado capitalismo da UE para as suas aventuras.
Os custos das guerras no Iraque e no Afeganistão custaram já mais de 1,3 biliões de dólares, porém considerando os custos assumidos em substituição de material, tratamentos médicos, pensões aos combatentes ou famílias, juros, etc., aquele valor, dentro do calendário estipulado pelo congresso, pode atingir globalmente uns 5 biliões de dólares.
Será bom lembrar que a História nos mostra que o destino de todas as nações agressoras foi destruírem-se também a si próprias.

3 - A TEORIA DA GRANDE UNIFICAÇÃO NO CAMPO POLÍTICO E SOCIAL É O MARXISMO

A ciência atual mais avançada procura na física unir na mesma teoria, num mesmo sistema de equações, as quatro forças fundamentais da natureza. (10) O mesmo se deveria passar com a análise social ao tratar das atuais crises.
Análises, medidas, comentários normalmente apresentados na comunicação social sobre a crise ou as crises esforçam-se por não pôr em causa o sistema capitalista. Admite-se uma crise económica e financeira, uma crise social, uma crise ambiental, uma crescente insegurança bélica a nível mundial, como se pudessem ser resolvidas de forma independente.
É neste contexto que o esquema financeiro, defendido contra a ineficiência e despesismo do Estado – nas prestações sociais, mas não na corrupção e na fiscalidade distorcida – se tornou responsável pelas graves crises que atingem os diversos países como uma forma de espoliação da mais-valia produzida, com uma redistribuição do rendimento em desfavor dos trabalhadores e pequenos e médios empresários, em nome da do dogmatismo da ortodoxia financeira.
O “despesismo” do Estado está bem documentado com a entrega de biliões de euros ao “racional e eficiente” sector bancário, às grandes transnacionais e na entrega de serviços públicos a oligopólios.
A questão é na sua essência simples. Não há solução para estas crises no sistema capitalista. As propostas apresentadas – imposições de troikas – são confessadamente apenas para resolver os problemas que a especulação provocou, aliás com as medidas que lhes deram origem. Fazer as mesmas coisas à espera de resultados diferentes configura um quadro de insanidade mental (um mundo dirigido por loucos…) caso não se tratasse de puro dogmatismo para uns, de oportunismo para outros, de ganância sobretudo para os que controlam estes.
Vemos títeres criticarem aquilo que efectivamente defenderam e praticam, enunciarem promessas de reformas e fazerem apelos à ética, fraseologia oca de conteúdos concretos, inconsequente e irrelevante, como o “ganhar credibilidade” – o que quer que isto queira dizer – obviamente perante “os mercados”, que o ministro espanhol das finanças considerou agora agirem de forma “irracional”.
O sistema capitalista não tem quaisquer soluções para resolver os problemas das 4 crises, pelo contrário é a sua própria natureza, as suas leis fundamentais que as provocam, ignorando custos e benefícios sociais, funcionando em função do lucro privado, precisamente em sentido contrário do que seria desejável e necessário.
O sistema capitalista nas nossas sociedades, já não tem condições de criar emprego senão em precariedade e sem direitos – a “flexibilidade” - nem garantir serviços sociais, nem proporcionar mais democracia, uma significativa redução do desemprego está confessadamente fora de causa.
Este sistema é imune à ética e ao reformismo, porque a questão não reside em razões práticas, ou de competência dos seus medíocres dirigentes, que são aqueles que o grande capital define e apoia, colocou-se, na sua deriva metafísica, à margem da realidade.
A evidência dos factos mostra que a questão de reforma ou revolução está ultrapassada. O que se designa por “reformas” são tão-somente retrocessos civilizacionais de décadas, largas décadas em muitos casos, cuja tendência é a generalização do trabalho sem ou com um mínimo de direitos: trabalho semiescravo. O mito social-democrata de criar mais riqueza para melhor a distribuir, sem ter em conta as relações de produção, cai pela base com a livre circulação de capitais, o domínio dos paraísos fiscais e dos critérios de especulação financeira.
As crises exprimem a incapacidade do capitalismo para criar valor real, estando a acumulação capitalista atulhada de capital fictício e de ativos tóxicos. “Além disto, sendo os recursos naturais limitados, a necessidade de crescimento constante do capitalismo é estritamente impossível. Manter o capitalismo indefinidamente é matematicamente impossível. O seu desaparecimento é imperativo” (11)
A análise não dogmática, materialista e dialética da realidade, permitiu prever com exactidão o ocorrer da crise e sua evolução, quando a propaganda ao serviço da oligarquia a negava, afirmando o seu fim sempre adiado de ano para ano. Agora se evidencia que mais austeridade só traz mais austeridade, o governo e os seus propagandistas, continuam a propagar uma metafísica de equilibrar as contas públicas – custe o que custar. A única entidade que reconhecem é uma abstração a que chamam “mercados” - a especulação financeira de indivíduos corruptos, mais uma vez comprovada no caso do Barclays Bank - a ditadura à qual os povos são submetidos.
A compreensão profunda – materialista e dialética – da realidade só é conseguida numa teoria que mostre a unidade e as contradições dos diversos fenómenos sociais do mundo atual e que estude as suas transformações. Essa teoria é o marxismo.

1 – A metafísica constitui uma forma de pensamento ultrapassada, no entanto necessária à sua evolução no passado, permitindo a análise e classificação de fenómenos da natureza. Esta designação tem origem em Aristóteles, dado na sua obra filosófica seguir-se à física, significando depois (meta) da física, tratando das questões que ultrapassavam os limites da experiência.
2 A crise económica global A Grande Depressão do século XXI - Michel Chossudovsky e Andrew Gavin Marshall* - www.odiario.info - 20.mai.2010
3 – Não temos a pretensão nem poderíamos desenvolver neste texto o muito que há a dizer sobre as crises do capitalismo. O odiario.info, bem como o resistir.info, têm relevantes textos sobre este tema. Desejaríamos destacar pela abordagem global – e pelo seu nível – como bibliografia, “Crise e Transição Política – Metabolismo social e material”, de Rui Namorado Rosa, Edições Avante.
4 - Más libre comercio, más hambre - Esther Vivas - www.rebelion.org – maio.2008
5 – “Unidos contra nós, divididos entre si” por Ben Hiller - Colaborador de Socialist Alternative O original encontra-se em http://mrzine.monthlyreview.org
6 – “Alemania en la Gran Desigualdad” - Rafael Pochla – Vanguardia – www.rebelion.org – 24-maio.2012
7 - A Ilusão Neoliberal – René Passet – Ed. Terramar – 2002 - p.109
8 – “An Economy Destroyed” Paul Craig Roberts –July 22 / 24, 2011 – www.couterpunch.org - Paul Craig Roberts was Assistant Secretary of the US Treasury, Associate Editor of the Wall Street Journal, and professor of economics in six universities.
9 – “A história é o inimigo quando as psy-ops se tornam notícia”, John Pilger, www.resistir.info – 23.junho.2012 - O original encontra-se em www.johnpilger.com/…
10 – Trata-se da designada GUT (Great Unification Theory). As 4 forças fundamentais da natureza são: a força electromagnética, a força nuclear fraca, a força nuclear forte e a força gravitacional. Em 1850 James Maxwell estabeleceu no mesmo sistema de equações a força eléctrica e a força magnética, levando ao posterior desenvolvimento teórico e tecnológico da electricidade, electrónica, emissão de ondas electromagnéticas. A força nuclear fraca - responsável por certos tipos de radiação quando algumas partículas atómicas se transformam noutras mais leves (diz-se que “decaem”). Está atualmente unida ao electromagnetismo constituindo a força electrofraca. A força nuclear forte é responsável pela constituição de protões e neutrões e a estabilidade dos núcleos atómicos. As tentativas a associar à força electrofraca não têm sido conclusivas. Quanto á gravitação considera-se um passo final da unificação de que se tem ocupado a física quântica.
11 - Jean Mathieu - http://www.papamarx.wordpress.com - Crise Economique : Un changement d’époque.- Le fruit de la misère ne tombe jamais loin de l’arbre de l’exploitation.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

O empobrecimento do debate político



Vladimir Safatle no CARTA CAPITAL

Há várias maneiras de despolitizar uma sociedade. A principal delas é impedir a circulação de informações e perspectivas distintas a respeito do modelo de funcionamento da vida social. Há, no entanto, uma forma mais insidiosa. Ela consiste em construir uma espécie de causa genérica capaz de responder por todos os males da sociedade. Qualquer problema que aparecer será sempre remetido à mesma causa, a ser repetida infinitamente como um mantra.
Isto é o que ocorre com o problema da corrupção no Brasil. Todos os males da vida nacional, da educação ao modelo de intervenção estatal, da saúde à escolha sobre a matriz energética, são creditados à corrupção. Dessa forma, não há mais debate político possível, pois o combate à corrupção é a senha para resolver tudo. Em consequência, a política brasileira ficou pobre.
Não se trata aqui de negar que a corrupção seja um problema grave na vida nacional. É, porém, impressionante como dessa discussão nunca se segue nada, nem sequer uma reflexão mais ampla sobre as disfuncionalidades estruturais do sistema político brasileiro, sobre as relações promíscuas entre os grandes conglomerados econômicos e o Estado ou sobre a inexistência da participação popular nas decisões sobre a configuração do poder Judiciário.
Por exemplo, se há algo próprio do Brasil é este espetáculo macabro onde os escândalos de corrupção conseguem, sempre, envolver oposição e governo.
O que nos deixa como espectadores desse jogo ridículo no qual um lado tenta jogar o escândalo nas costas do outro, isso quando certos setores da mídia nacional tomam partido e divulgam apenas os males de um dos lados. O chamado mensalão demonstra claramente tal lógica. O esquema de financiamento de campanha que quase derrubou o governo havia sido gestado pelo presidente do principal partido de oposição. Situação e oposição se aproveitaram dos mesmos caminhos escusos, com os mesmos operadores. Não consigo lembrar de nenhum país onde algo parecido tenha ocorrido.
Uma verdadeira indignação teria nos levado a uma profunda reforma política, com financiamento público de campanha, mecanismos para o barateamento dos embates eleitorais, criação de um cadastro de empresas corruptoras que nunca poderão voltar a prestar serviços para o Estado, fim do sigilo fiscal de todos os integrantes de primeiro e segundo escalão das administrações públicas e proibição do governo contratar agências de publicidade (principalmente para fazer campanhas de autopromoção). Nada disso sequer entrou na pauta da opinião pública. Não é de se admirar que todo ano um novo escândalo apareça.
Nas condições atuais, o sistema político brasileiro só funciona sob corrupção. Um deputado não se elege com menos de 5 milhões de reais, o que lhe deixa completamente vulnerável -para lutar pelos interesses escusos de financiadores potenciais de campanha. Isso também ajuda a explicar porque 39% dos parlamentares da atual legislatura declaram-se milionários. Juntos eles têm um patrimônio declarado de 1,454 bilhão de reais. Ou seja, acabamos por ser governados por uma plutocracia, pois só mesmo uma plutocracia poderia financiar campanhas.
Mas como sabemos de antemão que nenhum escândalo de corrupção chegará a colocar em questão as distorções do sistema político brasileiro, ficamos sem a possibilidade de discutir política no sentido forte do termo. Não há mais dis-cussões sobre aprofundamento da participação popular nos processos decisórios, constituição de uma democracia direta, o papel do Estado no desenvolvimento, sobre um modelo econômico realmente competitivo, não entregue aos oligopólios, ou sobre como queremos financiar um sistema de educação pública de qualidade e para todos. Em um momento no qual o Brasil ganha importância no cenário internacional, nossa contribuição para a reinvenção da política em uma era nebulosa no continente europeu e nos Estados Unidos é próxima de zero.
Tem-se a impressão de que a contribuição que poderíamos dar já foi dada (programas amplos de transferência de renda e reconstituição do mercado interno). Mesmo a luta contra a desigualdade nunca entrou realmente na pauta e, nesse sentido, nada temos a dizer, já que o Brasil continua a ser o paraíso das grandes fortunas e do consumo conspícuo. Sequer temos imposto sobre herança. Mas os próximos meses da política brasileira serão dominados pelo duodécimo escândalo no qual alguns políticos cairão para a imperfeição da nossa democracia continuar funcionando perfeitamente.

E se o golpe de 2005 tivesse dado certo?


Por Emir Sader

Um historiador inglês (Neill Ferguson, História virtual) se dedicou a pensar vias alternativas daquelas que triunfaram efetivamente na história realmente existente, como exercícios de pensamento sobre o que teria sido se não fosse. Por exemplo: e se a Alemanha de Hitler tivesse triunfado na Segunda Guerra? E se a URSS não tivesse desaparecido? E outras circunstâncias como essas.
No Brasil podemos pensar o que teria acontecido se várias tentativas de golpe militar – antes e depois da de 1964 – tivessem triunfado, o que teria acontecido com o Brasil. Um bom exercício também para entender o presente, quando as mesmas forças que protagonizaram essas tentativas no passado – as fracassadas e a vencedora de 1964 – se excitam de novo e, como toda força decadente, tratam de dar aos estertores da sua última tentativa, uma dimensão épica, que somente uma classe que não pode olhar para sua vergonhosa historia golpista, pode fazer. Juizes, jornalistas, políticos derrotados, usam os superlativos que suas pobres formas de expressão permitem, para falar “do julgamento do século”, do “maior caso de…”.
Pudessem assumir a história do Brasil como ela realmente ocorreu e ocorre, se dariam conta que o maior julgamento da nossa história teria sido o da ditadura militar – aventura da qual essas mesmas forças participaram ativamente -, que destruiu a democracia no país, violou todos os direitos humanos, em todos os planos – políticos, jurídicos, sociais, culturais, econômicos -, abriu as portas para o assalto do Estado e do pais às grandes corporações nacionais e internacionais, impôs a ditadura também no plano da liberdade de expressão, prendeu, torturou, assassinou, fez desaparecer, alguns dos melhores brasileiros.
Em suma, passar a limpo essa página odiosa da nossa história – que tem as impressões digitais dos mesmos órgãos de comunicação que lideraram a ofensiva golpista de 2005 – teria sido o maior julgamento da nossa história, onde seriam réus eles mesmos, junto à alta oficialidade das FFAA, grande parte dos empresários nacionais e internacionais, entre outros.
Podemos, por exemplo, especular o que teria sido o país se tivesse triunfado o golpe contra Getúlio, em 1954. Era um movimento similar ao que triunfou uma década depois, com origem na Doutrina de Segurança Nacional, típica ideologia da guerra fria. Na Argentina, por exemplo, a queda de Peron, um ano depois do suicídio do Getúlio, introduziu o tipo de militar “gorila” (a expressão nasceu na Argentina, com o golpe de 1955), que se generalizaria a partir do golpe brasileiro.
Na Argentina, com a proscrição do peronismo, Arturo Frondizi conseguiu se eleger presidente, mas nem ele, nem os presidentes ou ditadores que o sucederam – houve novo golpe em 1966, que também fracassou, como o de 1955 – conseguiram estabilizar-se, frente à oposiçao do peronismo, principalmente do seu ramo sindical, que tornou impossível a vida a todos os governos, até o retorno de Peron, em 1973.
No Brasil, um objetivo central do golpismo era evitar a continuidade do getulismo, expressada no JK, mas também no Jango. A famosa frase – suprassumo do golpismo – de Carlos Lacerda, de que “Juscelino não deveria ser candidato; se fosse, não deveria ganhar; se ganhasse, não deveria tomar posse; se tomasse posse, não deveria poder governar”, espelhava aquele objetivo.
Se Getulio nao tivesse apelado para o gesto radical do suicídio, para brecar a ofensiva golpista, o movimento de 1964 teria surgido uma década antes. Ao invés das eleições relativamente democrática de 1955, teríamos tido uma ditadura militar mais ou menos similar à de 1964. As consequências teriam sido ainda mais catastróficas, porque o sacrifício do Getúlio conquistou dez anos, que o movimento popular aproveitou para se fortalecer amplamente. Nessa década avançou não apenas a industrialização, mas também o movimento sindical e outros movimentos populares, assim como a consciência social na massa da população. Uma ditadura – ou algum regime duro, mesmo se recoberto de formas institucionais, mas que impedisse a continuidade do regime getulista – teria atuado sobre um movimento popular com muito menor capacidade de organização e de consciência social.
Na Argentina os militares tiveram que, em prazos mais ou menos curtos, convocar novas eleições, o fizeram depois de prescrever o peronismo, a grande força politica e ideológica, do campo popular argentino. No Brasil, teriam feito algo similar, castrando a democracia brasileira da vitalidade que os movimentos populares possuíam e imprimiam ao país.
De qualquer forma, grande parte dos retrocessos que a ditadura
impôs ao Brasil, teriam sido antecipados por um movimento de direita que tivesse se apropriado do Estado brasileiro em 1964. Nossa história seria ainda pior do que ela foi, a partir do golpe triunfante de 1964.
Outras tentativas golpistas existiram durante o governo do Juscelino, pelo menos duas de caráter militar – por membros da Aeronáutica -, de menor monta, mas as articulações golpistas nunca deixaram de existir, de tal maneira que os antecedentes do golpe de 1964 vem da fundação da Escola Superior de Guerra, por Golbery do Couto e Silva e Humberto Castelo Branco, vindos da guerra na Itália, sob influência e patrocínio diretos dos EUA, que desembocou finalmente no golpe vitorioso de 1964, que não por acaso teve nesses dois militares seus protagonistas fundamentais.
E se nos perguntarmos o que teria sido do Brasil se o movimento de um golpe branco contra o Lula – que poderia ter sido um impeachment ou uma derrota eleitoral em 2006 – tivesse triunfado?
Se nos recordamos que o candidato da direita era o neoliberal acabado que é Alckmin, podemos imaginar os descalabros a que teria sido submetido o país. (O que torna ainda mais absurda a posição da ultra esquerda, que se absteve ou pregou o voto nulo diante da alternativa Lula ou Alckmin.) Só para recordar uma circunstância concreta, quando Calderon triunfou no México, de forma evidentemente fraudulenta, nas eleições presidenciais de julho de 2006, Alckimin saudou-a como o caminho que o Brasil deveria seguir. (Ver artigo aqui na Carta Maior, comentando essa similitude assumida por Alckmin.)
Significaria, antes de tudo, a retomada de um Tratado de Livre Comércio com os EUA, ja que a ALCA (Área de Livre Comércio das Américas) tinha sido substituída por tratados bilaterais com países do continente, como o Chile, entre outros, pelos EUA, depois que o Brasil contribuiu decisivamente para enterrar a ideia de uma America Latina totalmente aderida ao livre comercio, subordinada completamente aos EUA.
Os processos de privatização que FHC não tinha conseguido completar, pela resistência do movimento popular brasileiro, seriam retomados, atingindo a Petrobras, o Banco do Brasil, a Caixa Economica, a Eletrobras, entre outras empresas sobreviventes do vendaval privatizando do governo dos tucanos.
Mas sem ir mais longe, bastaria imaginar o que teria sido o Brasil – e também a América Latina – se a crise internacional do capitalismo, iniciada em 2007 e ainda vigente, tivesse encontrado o Brasil tendo ao neoliberal duro e puro do Alckmin como presidente. Estaríamos ainda pior do que um país como a Espanha ou a Grécia ou Portugal. Estaríamos devastados pela recessão, pelo desemprego, pelos compromissos escorchantes do FMI.
Basta esse quadro realista do que estaríamos vivendo se o golpe de 2005 tivesse dado certo. O seu objetivo inicial era tentar impor uma derrota de longo prazo à esquerda, que teria fracassado, com Lula, seu principal dirigente, por um prazo longo, permitindo que as forças tradicionais da direita retomassem o controle do Estado brasileiro.
O julgamento que começa esta semana é, sobretudo, o julgamento de uma tentativa frustrada de golpe branco contra um governo popular e democrático, eleito pelo voto popular e legitimado pela reeleição do Lula e pela eleição da Dilma. O povo já disse sua palavra.

Emir  Sader é escritor, sociólogo, mestre em filosofia política e doutor em ciência política pela USP

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Cuba, a ilha da saúde

 
Doutor em Estudos Ibéricos e Latino-americanos da Universidad Paris Sorbonne-Paris IV. Professor nas Universidades Paris-Sorbonne-Paris IV e Paris-Est Marne-la-Vallée. Jornalista, especialista sobre relaciones entre Cuba e Estados Unidos


Após a Revolução, a medicina virou prioridade e transformou a ilha em referência; hoje, Cuba concentra o maior número de médicos por habitante

Desde o triunfo da Revolução de 1959, o desenvolvimento da medicina tem sido a grande prioridade do governo cubano, o que transformou a ilha do Caribe em uma referência mundial neste campo. Atualmente, Cuba é o país que concentra o maior número de médicos por habitante.
Em 2012, Cuba formou mais 11 mil novos médicos, os quais completaram sua formação de seis anos em faculdades de medicina reconhecidas pela excelência no ensino. Trata-se da maior promoção médica da história do país, que tornou o desenvolvimento da medicina e o bem-estar social as prioridades nacionais. Entre esses médicos recém graduados, 5.315 são cubanos e 5.694 vêm de 59 países da América Latina, África, Ásia e até mesmo dos Estados Unidos, com maioria de bolivianos (2.400), nicaraguenses (429), peruanos (453), equatorianos (308), colombianos (175) e guatemaltecos (170). Em um ano, Cuba formou quase o dobro de médicos do total que dispunha em 1959. [1]
Após o triunfo da Revolução, Cuba contava somente com 6.286 médicos. Dentre eles, três mil decidiram deixar o país para ir para os Estados Unidos, atraídos pelas oportunidades profissionais que Washington oferecia. Em nome da guerra política e ideológica que se opunha ao novo governo de Fidel Castro, o governo Eisenhower decidiu esvaziar a nação de seu capital humano, até o ponto de criar uma grave crise sanitária. [2]
Como resposta, Cuba se comprometeu a investir de forma maciça na medicina. Universalizou o acesso ao ensino superior e estabeleceu a educação gratuita para todas as especialidades. Assim, existem hoje 24 faculdades de medicina (contra apenas uma em 1959) em treze das quinze províncias cubanas, e o país dispõe de mais de 43 mil professores de medicina. Desde 1959, se formaram cerca de 109 mil médicos em Cuba. [3] Com uma relação de um médico para 148 habitantes (67,2 médicos para 10 mil habitantes ou 78.622, no total), segundo a Organização Mundial da Saúde, Cuba é a nação mais bem dotada neste setor. O país dispõe de 161 hospitais e 452 clínicas. [4]
No ano universitário 2011-2012, o número total de graduados em Ciências Médicas, que inclui 21 perfis profissionais (médicos, dentistas, enfermeiros, psicólogos, tecnologia da saúde etc.), sobe para 32.171, entre cubanos e estrangeiros. [5]

Sede da Escola Latino-Americana de Medicina em Havana. Wikimedia Commons

A ELAM

Além dos cursos disponíveis nas 24 faculdades de medicina do país, Cuba forma estudantes estrangeiros na Elam (Escola Latino-Americana de Medicina de Havana). Em 1998, depois que o furacão Mitch atingiu a América Central e o Caribe, Fidel Castro decidiu criar a Elam – inaugurada em 15 de novembro de 1999 – com o intuito de formar em Cuba os futuros médicos do mundo subdesenvolvido.
"Formar médicos prontos para ir onde eles são mais necessários e permanecer quanto tempo for necessário, esta é a razão de ser da nossa escola desde a sua fundação”, explica a doutora Miladys Castilla, vice-reitora da Elam. [6] Atualmente, 24 mil estudantes de 116 países da América Latina, África, Ásia, Oceania e Estados Unidos (500 por turma) cursam uma faculdade de medicina gratuita em Cuba. Entre a primeira turma de 2005 e 2010, 8.594 jovens doutores saíram da Elam. [7] As formaturas de 2011 e 2012 foram excepcionais com cerca de oito mil graduados. No total, cerca de 15 mil médicos se formaram na Elam em 25 especialidades distintas. [8]
A Organização Mundial da Saúde prestou uma homenagem ao trabalho da Elam: "A Escola Latino-Americana de Medicina acolhe jovens entusiasmados dos países em desenvolvimento, que retornam para casa como médicos formados. É uma questão de promover a equidade sanitária (…). A Elam (…) assumiu a premissa da "responsabilidade social”. A Organização Mundial da Saúde define a responsabilidade social das faculdades de medicina como o dever de conduzir suas atividades de formação, investigação e serviços para suprir as necessidades prioritárias de saúde da comunidade, região ou país ao qual devem servir.
A finalidade da Elam é formar médicos principalmente para fornecer serviço público em comunidades urbanas e rurais desfavorecidas, por meio da aquisição de competências em atendimento primário integral, que vão desde a promoção da saúde até o tratamento e a reabilitação. Em troca do compromisso não obrigatório de atender regiões carentes, os estudantes recebem bolsa integral e uma pequena remuneração, e assim, ao se formar, não têm dívidas com a instituição.
[No que diz respeito ao processo seletivo], é dada preferência aos candidatos de baixa renda, que de outra forma não poderiam pagar os estudos médicos. "Como resultado, 75% dos estudantes provêm de comunidades que precisam de médicos, incluindo uma ampla variedade de minorias étnicas e povos indígenas”.
Os novos médicos trabalham na maioria dos países americanos, incluindo os Estados Unidos, vários países africanos e grande parte do Caribe de língua inglesa.
Faculdades como a Elam propõem um desafio no setor da educação médica do mundo todo para que adote um maior compromisso social. Como afirmou Charles Boelen, ex-coordenador do programa de Recursos Humanos para a Saúde da OMS: "A ideia da responsabilidade social merece atenção no mundo todo, inclusive nos círculos médicos tradicionais... O mundo precisa urgentemente de pessoas comprometidas que criem os novos paradigmas da educação médica”. [9]

A solidariedade internacional

No âmbito dos programas de colaboração internacional, Cuba também forma, por ano, cerca de 29 mil estudantes estrangeiros em ciências médicas, em três especialidades: medicina, enfermagem e tecnologia da saúde, em oito países (Venezuela, Bolívia, Angola, Tanzânia, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Timor Leste). [10]
Desde 1963 e o envio da primeira missão médica humanitária a Argélia, Cuba se comprometeu a curar as populações pobres do planeta, em nome da solidariedade internacional e dos sete princípios da medicina cubana (equidade, generosidade, solidariedade, acessibilidade, universalidade, responsabilidade e justiça). [11] As missões humanitárias cubanas abrangem quatro continentes e têm um caráter único. De fato, nenhuma outra nação do mundo, nem mesmo as mais desenvolvidas, teceram semelhante rede de cooperação humanitária ao redor do planeta. Desde o seu lançamento, cerca de 132 mil médicos e outros profissionais da saúde trabalharam voluntariamente em 102 países. [12] No total, os médicos cubanos curaram 85 milhões de pessoas e salvaram 615 mil vidas. [13] Atualmente, 31 mil colaboradores médicos oferecem seus serviços em 69 nações do Terceiro Mundo. [14]
Segundo o Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), "um dos exemplos mais bem sucedidos da cooperação cubana com o Terceiro Mundo é o Programa Integral de Saúde para América Central, Caribe e África”. [15]
Nos termos da Alba (Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América), Cuba e Venezuela decidiram lançar em julho de 2004 uma ampla campanha humanitária continental com o nome de Operação Milagre. Consiste em operar gratuitamente latino-americanos pobres, vítimas de cataratas e outras doenças oftalmológicas, que não tenham possibilidade de pagar por uma operação que custa entre cinco e dez mil dólares. Esta missão humanitária se disseminou por outras regiões (África e Ásia). A Operação Milagre possui 49 centros oftalmológicos em 15 países da América Central e do Caribe. [16] Em 2011, mais de dois milhões de pessoas de 35 países recuperaram a visão. [17]

A medicina de catástrofe

No que se refere à medicina de catástrofe, o Centro para a Política Internacional de Washington, dirigido por Wayne S. Smith, ex-embaixador dos Estados Unidos em Cuba, afirma em um relatório que "não há dúvida quanto à eficiência do sistema cubano. Apenas alguns cubanos perderam a vida nos 16 maiores furacões que atingiram a ilha na última década e a probabilidade de perder a vida em um furacão nos Estados Unidos é 15 vezes maior do que em Cuba”. [18]
O relatório acrescenta que: "ao contrário dos Estados Unidos, a medicina de catástrofe em Cuba é parte integrante do currículo médico e a educação da população sobre como agir começa na escola primária […]. Até mesmo as crianças menores participam dos exercícios e aprendem os primeiros socorros e técnicas de sobrevivência, muitas vezes através de desenhos animados e, ainda, como plantar ervas medicinais e encontrar alimento em caso de desastre natural. O resultado é a assimilação de uma forte cultura de prevenção e de uma preparação sem igual”. [19]

Alto IDH

Esse investimento no campo da saúde (10% do orçamento nacional) permitiu que Cuba alcançasse resultados excepcionais. Graças à sua medicina preventiva, a ilha do Caribe tem a taxa de mortalidade infantil mais baixa da América e do Terceiro Mundo – 4,9 por mil (contra 60 por mil em 1959) – inferior a do Canadá e dos Estados Unidos. Da mesma forma, a expectativa de vida dos cubanos – 78,8 anos (contra 60 anos em 1959) – é comparável a das nações mais desenvolvidas. [20]
As principais instituições internacionais elogiam esse desenvolvimento humano e social. O Fundo de População das Nações Unidas observa que Cuba, "há mais de meio século, adotou programas sociais muito avançados, que possibilitaram ao país alcançar indicadores sociais e demográficos comparáveis aos dos países desenvolvidos”. O Fundo acrescenta que "Cuba é uma prova de que as restrições das economias em desenvolvimento não são necessariamente um obstáculo intransponível ao progresso da saúde, à mudança demográfica e ao bem-estar”. [21]
Cuba continua sendo uma referência mundial no campo da saúde, especialmente para as nações do Terceiro Mundo. Mostra que é possível atingir um alto nível de desenvolvimento social, apesar dos recursos limitados e de um estado de sítio econômico extremamente grave, imposto pelos Estados Unidos desde 1960, que situe o ser humano no centro do projeto de sociedade.

Referências bibliográficas:

[1] José A. de la Osa, "Egresa 11 mil médicos de Universidades cubanas”, Granma, 11 de julho de 2012.
[2] Elizabeth Newhouse, "Disaster Medicine: U.S. Doctors Examine Cuba’s Approach”, Center for International Policy, 9 de julho de 2012. http://www.ciponline.org/research/html/disaster-medicine-us-doctors-examine-cubas-approach (site consultado em 18 de julho de 2012).
[3] José A. de la Osa, "Egresa 11 mil médicos de Universidades cubanas”, op. cit.; Ministério das Relações Exteriores, "Graduados por la Revolución más de 100.000 médicos”, 16 de julho de 2009. http://www.cubaminrex.cu/MirarCuba/Articulos/Sociedad/2009/Graduados.html (site consultado em 18 de julho de 2012).
[4] Organização Mundial da Saúde, "Cuba: Health Profile”, 2010. http://www.who.int/gho/countries/cub.pdf (site consultado em 18 de julho de 2012); Elizabeth Newhouse, "Disaster Medicine: U.S. Doctors Examine Cuba’s Approach”, op. cit.
[5] José A. de la Osa, « Egresa 11 mil médicos de Universidades cubanas », op.cit.
[6] Organização Mundial da Saúde, "Cuba ayuda a formar más médicos”, 1º de maio de 2010. http://www.who.int/bulletin/volumes/88/5/10-010510/es/ (site consultado em 18 de julho de 2012).
[7] Escola Latino-Americana de Medicina de Cuba, "Historia de la ELAM”.
http://www.sld.cu/sitios/elam/verpost.php?blog=http://articulos.sld.cu/elam&post_id=22&c=4426&tipo=2&idblog=156&p=1&n=ddn (site consultado em 18 de julho de 2012).
[8] Agência Cubana de Notícias, "Over 15,000 Foreign Physicians Gratuated in Cuba in Seven Years”, 14 de julho de 2012.
[9] OMS, "Cuba ayuda a formar más médicos”, op. cit.
[10] José A. de la Osa, "Egresa 11 mil médicos de Universidades cubanas”, op. cit.
[11] Ladys Marlene León Corrales, "Valor social de la Misión Milagro en el contexto venezolano”, Biblioteca Virtual en Salud de Cuba, março de 2009.
http://bvs.sld.cu/revistas/spu/vol35_4_09/spu06409.htm (site consultado em 18 de julho de 2012).
[12] Felipe Pérez Roque, "Discurso del canciller de Cuba en la ONU”, Bohemia Digital, 9 de novembro de 2006.
[13] CSC News, "Medical Brigades Have Treated 85 million”, 4 de abril de 2008.
http://www.cuba-solidarity.org.uk/news.asp?ItemID=1288 (site consultado em 18 de julho de 2012).
[14] Felipe Pérez Roque, "Discurso del canciller de Cuba en la ONU”, op. cit.
[15] PNUD, Investigación sobre ciencia, tecnología y desarrollo humano en Cuba, 2003, p.117-119. http://www.undp.org.cu/idh%20cuba/cap6.pdf (site consultado em 18 de julho de 2012).
[16] Ministério das Relações Exteriores, "Celebra Operación Milagro cubana en Guatemala”, República de Cuba, 15 de novembro de 2010.
http://www.cubaminrex.cu/Cooperacion/2010/celebra1.html (site consultado em 18 de julho de 2012) Operación Milagro, "¿Qué es la Operación Milagro?”. http://www.operacionmilagro.org.ar/ (site consultado em 18 de julho de 2012).
[17] Operación Milagro, «¿Qué es la Operación Milagro?», op. cit.
[18] Elizabeth Newhouse, "Disaster Medicine: U.S. Doctors Examine Cuba’s Approach”, op. cit.
[19] Ibid.
[20] Ibid.
[21] Raquel Marrero Yanes, "Cuba muestra indicadores sociales y demográficos de países desarrollados”, Granma, 12 de julho de 2012.
[Doutor em Estudos Ibéricos e Latino-americanos pela Universidade Paris Sorbonne-Paris IV, Salim Lamrani é professor encarregado de cursos na Universidade Paris-Sorbonne-Paris IV e na Universidade Paris-Est Marne-la-Vallée e jornalista, especialista nas relações entre Cuba e Estados Unidos. Seu libro mais recente é "Etat de siège. Les sanctions économiques des Etats-Unis contre Cuba” ("Estado de sítio. As sanções econômicas dos Estados Unidos contra Cuba”, em tradução livre), Paris, Edições Estrella, 2011, com prólogo de Wayne S. Smith e prefácio de Paul Estrade. Contato: Salim.Lamrani@univ-mlv.fr /Página no Facebook: https://www.facebook.com/SalimLamraniOfficiel
Fonte: Opera Mundi]

terça-feira, 31 de julho de 2012

Django Reinhardt - Djangology - 1936-1948


Djangology
1936 - 1948
(10 CDs)

http://img26.imageshack.us/img26/2179/zzs29186804295.jpg

CD 01 - Georgia on my mind - 1936-1937

CD 02 - Sweet Georgia Brown - 1937

CD 03 - Minor Swing - 1937

CD 04 - Tea for Two - 1937-1938

CD 05 - Body and Soul - 1938-1940




CD 06 - Daphne - 1940

CD 07 - Nuages - 1940


CD 08 - Swing 42 - 1940-1942

CD 09 - Manoir de Mes Reves - 1943-1945

CD 10 - Echoes Of France - 1946-1948


http://img710.imageshack.us/img710/4181/1zol28h6819997.jpg



Créditos: LOOOLOBLOOG

Romney revolta palestinos ao falar de “superioridade cultural” de Israel

Candidato republicano voltou a polemizar em seu giro pelo exterior; Polônia é o próximo destino



O giro internacional de Mitt Romney, candidato republicano à Presidência dos Estados Unidos voltou a provocar polêmica. Após dizer no último domingo (29/07) que Jerusalém é a capital de Israel, o ex-governador de Massachusetts voltou a irritar os palestinos na manhã desta segunda-feira (30) ao afirmar que a prosperidade econômica de Israel, em comparação à crise econômica vivida nos territórios reivindicados pelos palestinos, se deve a aspectos culturais. Líderes palestinos disseram-se ofendidos e classificaram as frases do candidato como “racistas. As informações são do jornal britânico The Guardian e da agência Reuters.

Romney fez as declarações no início do dia, durante um café da manhã que angariou 1 milhão de dólares para sua campanha (cada convidado pagou 25 mil dólares de entrada) no hotel King David, em Jerusalém.

Aos seus doadores, o candidato afirmou que “leu muitos livros” e contava com sua “experiência empresarial” para entender porque a diferença econômica entre os dois povos era tão grande. “Quando chego aqui e vejo essa cidade e os feitos desse povo e dessa nação, eu reconheço o poder ao menos da cultura e de algumas outras coisas”, afirmou.

Agência Efe

O candidato republicano Mitt Romney realiza um giro de campanha internacional por três países (Reino Unido, Israel e Polônia) 

O republicano também citou como razões do sucesso o clima de inovação, a cultura judaica para superar adversidades e a “mão da providência”, afirmou.

Assimetrias

“Vejam o PIB per capita de Israel, por exemplo, que gira em torno de 21 mil dólares e compare-o com as áreas administradas pela ANP (Autoridade Nacional Palestina), que é pouco mais de dez mil dólares per capita. Vocês perceberão uma diferença dramática e gritante de vitalidade econômica”. No entanto, o republicano errou feio nos números, mesmo que a diferença seja ainda mais dramática: segundo o Banco Mundial, o PIB per capita em 2011 de Israel foi pouco mais de 31 mil dólares, enquanto Gaza e Cisjordânia (sem contar Jerusalém Oriental) é de cerca 1,5 mil.

Romney realizou seu discurso em uma mesa em forma de “U” sentado ao lado de Sheldon Adelson, magnata de dupla nacionalidade norte-americana-israelense, dono de uma rede de cassinos e do Israel Hayom, jornal de maior circulação no país – que apóia incondicionalmente as ações do governo do premiê Benjamin Netanyahu.

“Estou incrivelmente impressionado com a mão da providência, sempre que ela decide agir. E também com a grandeza do espírito humano, e como indivíduos que alcançam a grandeza e tm um propósito para eles mesmos são capazes de construir e realizar coisas que só poderiam ser feitas por uma espécie criada à imagem de Deus”, completou o candidato.

Resposta

Pouco após as declarações do republicano, Saeb Erekat, membro do Conselho Parlamentar Palestino, criticou duramente o norte-americano. “É um comentário racista. Esse homem é incapaz de perceber que a economia palestina está impossibilitada de atingir seu potencial em razão da ocupação israelense”, afirmou.

“Me parece que faltam informação, conhecimento, visão e entendimento a esse homem. Falta-lhe conhecimento até mesmo sobre os israelenses. Nunca ouvi qualquer governante de Israel falar em superioridade cultural”, afirmou.
 

Outro dirigente palestino, Nabil Abu Rudeineh, assessor do presidente da ANP, Mahmoud Abbas,  afirmou que as declarações de Romney não contribuíram em nada para as negociações de paz, além de contradizer as posições prévias defendidas pela administração norte-americana.

O secretário-geral da OLP (Organização de Libertação da Palestina), Yasser Abed Rabbo, disse que "os formuladores de política norte-americanos devem abandonar a hipocrisia e parar de tentar ganhar votos à custa dos direitos do povo palestino".

"Lapso"

Em nenhum momento o republicano se referiu à história de ocupação israelense dos territórios reivindicados pelos palestinos, que já dura 45 anos, nem do bloqueio econômico e marítimo imposto à Faixa de Gaza, tampouco as restrições impostas sobre a movimentação de pessoas e produtos, sem mencionar o acesso a fontes de água na região da Cisjordânia. Todos esses fatores causaram forte impacto na economia palestina.

É consenso entre economistas até mesmo de órgãos como o Banco Mundial e o FMI (Fundo Monetário Internacional) que, enquanto Israel continuar a restringir importações e exportações, assim como a movimentação de seus produtos, a economia palestina continuará a fracassar em desenvolver suas fundações.

Romney não visitou nenhum território da Faixa de Gaza ou da Cisjordânia, e cancelou e última hora um encontro com membros do Partido Trabalhista, de oposição ao governo do premiê Benjamin Netanyahu, amigo pessoal e ex-colega de faculdade do republicano.

No domingo, Romney chegu a dizer que Jerusalém era a capital israelense, frase que Erekat classificou como “inaceitável”. “O que este homem está fazendo aqui é apenas promover o extremismo, a violência e o ódio, e isso é absolutamente inaceitável”.

Os palestinos pleiteiam a região oriental de Jerusalém como a capital de seu futuro Estado. No entanto, através de uma emenda constitucional, Israel declarou unilateralmente em 1981, a cidade como sua capital “eterna e indivisível”. Ela já estava sob ocupação desde 1967.

“Condenamos as suas declarações. Aqueles que falam sobre a solução de dois Estados devem saber que não pode haver Estado palestino sem Jerusalém Oriental”, disse Erekat. A maioria dos países, incluindo Estados Unidos, não reconhece a ação de Israel e mantêm suas embaixadas na cidade de Tel Aviv.

Turbulência

Além de Israel, Romney também causou mal-estar no aliado Reino Unido, quando questionou o sucesso do país para organizar os Jogos Olímpicos. Já em território polonês, última etapa de sua viagem, o republicano prestará homenagens aos movimentos anti-comunistas no país. A imprensa local e norte-americana afirmam que o candidato prepara uma série de críticas à Rússia, especialmente na terça-feira, em visita à Universidade de Varsóvia. Nesta segunda já se encontrou com o ex-presidente Lech Walesa.

Romney, que deverá ser o principal concorrente do democrata Barack Obama na eleição presidencial do dia 6 de novembro, já se encontra na Polônia , local de encerramento de sua agenda internacional, onde deverá fazer críticas à Rússia. As candidaturas dos dois ainda precisam de algumas formalidades para serem oficializadas.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Preconceito racial e racismo institucional no Brasil


No Brasil, os negros sofrem não só a discriminação racial devida ao preconceito racial e operada no plano privado, mas também e sobretudo o racismo institucional, que inspira as políticas estatais que lhes são dirigidas e se materializa nelas
por Márcia Pereira Leite
“Na primeira vez em que estive aqui, em 1987, fiquei chocado ao ver que na TV, em revistas, não havia negros. Melhorou um pouco. Mas há muito a fazer. Quem nunca veio ao Brasil e vê a TV brasileira via satélite vai pensar que todos os brasileiros são loiros de olhos azuis.” (Spike Lee)1
 O comentário do cineasta norte-americano Spike Lee, em recente visita ao Brasil para filmagem do documentário Go Brazil Go, no mesmo período em que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgava a constitucionalidade das cotas raciais em universidades públicas, despertou várias discussões na imprensa e nas redes sociais sobre o racismo na sociedade brasileira. Desses debates, é possível depreender quanto ainda persiste do mito de que o Brasil seria uma “democracia racial” em que, a despeito do preconceito, não haveria nem o ódio nem a segregação que caracterizaram o regime do apartheid. Nosso racismo combinaria o preconceito de cor e o preconceito de classe, diluindo-se no caso de negros educados e bem-sucedidos e implodindo no samba, no carnaval, enfim, na cultura popular brasileira.
Queremos chamar a atenção para o que ficou ausente nesse (e em outros) debate sobre o racismo no Brasil: os mecanismos de discriminação produzidos e operados pelas estruturas e instituições públicas e privadas que os reproduzem e os fortalecem. Nesta reflexão, propomos seguir o giro da ciência social, nos anos 1960, em sua análise das relações raciais: “Abandonar os esquemas interpretativos que tomam as desigualdades raciais como produtos de ações (discriminações) inspiradas por atitudes (preconceitos) individuais, para fixar-se no esquema interpretativo que ficou conhecido como racismo institucional, ou seja, na proposição de que há mecanismos de discriminação inscritos na operação do sistema social e que funcionam, até certo ponto, à revelia dos indivíduos”.2
O racismo constitui, como se sabe, um mecanismo fundamental de poder utilizado historicamente para separar e dominar classes, raças, povos e etnias. Seu desenvolvimento moderno se deu com a colonização, com o genocídio colonizador. O racismo é, como disse Foucault, “o meio de introduzir [...] um corte entre o que deve viver e o que deve morrer”. “No contínuo biológico da espécie humana, o aparecimento das raças, a distinção das raças, a hierarquia das raças, a qualificação das raças como boas e de outras, ao contrário, como inferiores, tudo isso vai ser uma maneira de fragmentar esse campo do biológico de que o poder se incumbiu; uma maneira de defasar, no interior da população, uns grupos em relação aos outros. [...] o racismo faz justamente funcionar, faz atuar essa relação de tipo guerreiro − ‘se você quer viver, é preciso que o outro morra’ − de uma maneira que é inteiramente nova e que, precisamente, é compatível com o exercício do biopoder.”3
Para o autor, “a especificidade do racismo moderno, o que faz sua especificidade, não está ligada a mentalidades, a ideologias, a mentiras do poder. Está ligada à técnica do poder, à tecnologia do poder”,4 isto é, ao biopoder enquanto um poder (estatal) de regulamentação que se exerce sobre populações e consiste em “fazer viver e deixar morrer”.
 
(Afrodescendentes protestam contra o baixo número de negros na Fashion Rio Verão 2012/2013)
 
Racismo institucional no Brasil

O argumento central deste artigo consiste em que, no Brasil, negros sofrem não só a discriminação racial devida ao preconceito racial e operada no plano privado, mas também e sobretudo o racismo institucional, que inspira as políticas estatais que lhes são dirigidas e se materializa nelas. Trata-se de discriminação racial praticada pelo Estado ao atuar de forma diferenciada em relação a esses segmentos populacionais, introduzindo em nossas cidades e em nossa sociedade, pela via das políticas públicas, “um corte entre o que deve viver e o que deve morrer”, a faxina étnica.
A expressão, utilizada para evidenciar as relações entre o racismo e as políticas estatais para territórios e populações negras no Brasil, não é mera retórica. Antes, sustenta que as elevadas taxas de homicídio e de “autos de resistência”5 nos territórios de maioria negra, as políticas de remoção e de despejo de sua população, os altos índices de encarceramento de negros pobres, a precariedade das políticas públicas de habitação, saúde e educação para o conjunto da população negra e o desrespeito a suas tradições culturais e religiosas não são sucessivos produtos do acaso ou do mau funcionamento do Estado,6 mas traduzem o racismo institucional que opera no Brasil bem ao largo de qualquer perspectiva de integração social e urbana desses segmentos populacionais pela via da cidadania.
Esse modo específico de gestão estatal das populações negras e de seus territórios de moradia − que “faz viver e deixa morrer”, como diz Foucault − pode ser identificado no âmbito das políticas públicas praticadas pelo Estado brasileiro. Examinemos alguns dados empíricos que expressam o sentido e o escopo de sua formulação e de sua realização.
Os negros são as maiores vítimas de homicídio. No período de 2002 a 2008, segundo dados do Mapa da violência 2011,7 o número de vítimas brancas na população brasileira diminuiu 22,3%; já entre os negros, o número de vítimas de homicídio aumentou 20,2%. Os dados são mais dramáticos quando se consideram os jovens: o número de homicídios de jovens brancos caiu, no período, 30%, enquanto o de jovens negros cresceu 13%, o que significa que a brecha de mortalidade entre brancos e negros cresceu 43%. Se considerarmos os homicídios praticados pelas forças policiais e registrados/encobertos pelos “autos de resistência”, vemos que eles também vitimam mais intensamente os negros: de 2001 a 2007, incidiram sobre esse segmento 61,7% dos homicídios praticados por agentes do Estado.8 Não se trata simplesmente de abuso policial ou de despreparo de policiais em situações de confronto. A consistência dos dados e sua persistência no período, em que pese a redução desses homicídios nos últimos anos em algumas grandes cidades brasileiras, como Rio de Janeiro e São Paulo,9 indicam uma política de extermínio de negros (jovens, sobretudo) − o “fazer morrer” − praticada pelo Estado, por meio de seus agentes, ou por ele tolerada.10
Mas, como vimos, a tecnologia do poder também “faz viver”, ainda que em distintas condições para esses diferentes segmentos populacionais, brancos e negros. É o que demonstra uma pesquisa realizada em 2003 pelo Ministério da Saúde,11 que revelou indicadores de saúde diferenciados da população brasileira segundo o critério raça/cor. Analisando seus resultados, Meireles12 destaca que 62% das mulheres brancas ouvidas realizaram sete ou mais consultas de pré-natal, enquanto somente 37% das mulheres negras passaram pelo mesmo número de consultas. Talvez por isso a hipertensão arterial durante a gravidez, uma das principais causas de morte materna, tenha sido mais frequente entre as mulheres negras. Além disso, o risco de uma criança negra morrer antes de completar 5 anos por causas infecciosas e parasitárias é 60% maior do que o risco de uma criança branca falecer pela mesma razão, enquanto o risco de morte por desnutrição é 90% maior entre crianças negras do que entre as brancas.
Já os dados do Relatório anual das desigualdades raciais no Brasil; 2009-2010demonstram que os negros representam cerca de 60% daqueles que, por motivos diversos, não conseguem atendimento no SUS, sendo os maiores percentuais os relativos às mulheres negras − o que, sem dúvida, argumenta o autor, evidencia a precariedade do dispositivo constitucional que assegura a universalidade do direito à saúde no país.
No plano da educação, todas as pesquisas apontam que, ainda que o acesso tenha crescido no país nos últimos anos, a presença dos negros no ensino médio, universitário e na pós-graduação permanece significativamente menor do que a dos brancos – diferença que se torna exponencial nos níveis superiores de formação. A razão, ressaltam, é clara: enquanto os brancos recorrem a escolas particulares (sabidamente, no Brasil, de melhor qualidade) no ensino fundamental e médio e, assim, obtêm melhor formação intelectual para ingresso nas universidades públicas, aos negros restam as escolas públicas (crescentemente sucateadas) nos níveis fundamental e médio e o caminho das universidades privadas. Mesmo com essa estratégia, também no campo da educação as desigualdades raciais são gritantes: em 2008, a probabilidade de um jovem branco, de 18 a 24 anos, frequentar uma instituição de ensino superior era 97,8% maior do que a de uma jovem negra da mesma faixa etária.13
No plano da moradia, os indicadores sociais revelam a mesma diferenciação no interior das políticas públicas, ou como o Estado “faz viver” esses contingentes populacionais. Os territórios de maioria negra nas cidades (favelas, loteamentos, bairros pobres e periferias) são carentes de equipamentos urbanos e serviços públicos de boa qualidade. O déficit habitacional brasileiro (cerca de 5,5 milhões de unidades) é fruto da ausência de uma política estatal de habitação popular, o que resultou na precariedade que caracteriza as atuais condições de moradia e vida nessas localidades.14
Além disso, em várias de nossas grandes cidades que vêm sendo reestruturadas para favorecer a especulação imobiliária e/ou sediar “grandes eventos” e assim se inserir nos fluxos internacionais de acumulação urbana, essas populações têm sido compulsoriamente removidas das localidades em que sempre viveram, criaram seus laços de vizinhança e parentesco, suas alternativas de sobrevivência (em trabalhos formais, pequenos comércios ou “virações”).15 São, então, reassentadas em locais distantes, ambientalmente precários,16 com infraestrutura urbana de má qualidade, sem redes de sociabilidade nem alternativas de trabalho; enfim, sem lugar na sociedade, sem direito à cidade.

Muito além do preconceito

Os dados analisados e as situações descritas revelam quanto as desigualdades sociais têm cor e estão profundamente enraizadas no racismo institucional que estrutura a sociedade brasileira e se materializa por meio das políticas praticadas pelo Estado, em todos os seus níveis. O que queremos sublinhar ao discuti-los é que, no Brasil, as desigualdades sociais se somam e são elevadas pelas desigualdades raciais. Mais do que isso: as desigualdades raciais estão no cerne do modo de gestão estatal dos territórios de maioria negra e desta população.
Trata-se de um novo modo de gestão estatal de territórios e de populações, que dispensa os tradicionais discursos e práticas de integração à sociedade nacional pela via da cidadania (da educação, do trabalho e dos direitos) por entender que essas populações são desnecessárias ao atual desenvolvimento do capitalismo.
Vivemos, hoje, uma mudança no eixo da atuação do Estado, cujo sentido passou a ser – simplesmente – evitar que essas populações negras, pobres e moradoras em territórios de favelas, loteamentos, bairros pobres e periferias produzam problemas para a ordem social. Suas estratégias combinam, desde então, diferentes políticas e mecanismos de controle social repressivo (até o “deixar morrer”) com políticas de mera inserção17/mínima sobrevivência (o “fazer viver”), travestidas, no plano discursivo, de integração à cidadania e à sociedade.
No primeiro caso, especialmente nas situações em que a criminalização da pobreza tem sido mais eficiente, o Estado atua promovendo ou acobertando a segregação socioespacial e as políticas de extermínio e de encarceramento, sobretudo de jovens negros. No segundo, atuando nos territórios de maioria negra, o Estado oferece a essas populações uma ilusão de integração por meio de políticas públicas que há muito abandonaram os princípios da universalidade e da justiça (são pontuais, descontinuadas; os serviços e equipamentos que criam são de má qualidade) ou patrocinando projetos sociais realizados por organizações não governamentais que seguem a mesma lógica, além de criminalizar sua clientela, entendida como “população vulnerável ao crime”. Em ambos os casos, o racismo institucional soma-se às desigualdades sociais, raciais e urbanas que historicamente estruturaram nosso país, aprofundando-as e revelando que estamos muito longe da “diluição” dessas desigualdades e da possibilidade de uma efetiva integração social e urbana dos negros pobres na sociedade brasileira.

Márcia Pereira Leite
Professora associada da Uerj, pesquisadora do CNPq, membro do Círculo Palmarino/Rio de Janeiro e do Conselho Deliberativo da Fase


Ilustração: Ricardo Moraes / Reuters
1 Fonte: .
2 Valter Silvério, “O multiculturalismo e o reconhecimento: mito e metáfora”, Revista USP, n.42, jun./ago. 1999, p.156.
3 Michel Foucault, Em defesa da sociedade, Martins Fontes, São Paulo, 2002, p.304-5.
4 Idem, p.309.
5 Registro de ocorrência policial, em atividade de policiamento ou mesmo na folga do agente policial, como resistência armada à prisão seguida de morte. Trata-se de um homicídio que não é registrado como tal, por exclusão de ilicitude por parte de seu autor. Nesse registro, a vítima é qualificada como criminosa (usualmente, como traficante de drogas); a morte, como decorrente de atividade legal da polícia; e seu autor, o policial, como vítima de tentativa de homicídio.
6 Cf. “Manifesto contra a faxina étnica”, divulgado no Fórum Social Urbano, no Rio de Janeiro, em março de 2010. Disponível em: .
7 Mapa da violência 2011, Instituto Sangari e Ministério da Justiça.
8 Marcelo Paixão et al. (orgs.), Relatório anual das desigualdades raciais no Brasil; 2009-2010, Laeser/Garamond, Rio de Janeiro, 2011.
9 Esta se deve a situações bastante específicas, que, por razões de foco e espaço, não temos condições de discutir aqui.
10 Cf. Sylvia Amanda da Silva Leandro, O que matar (não) quer dizer nas práticas e discursos da justiça criminal: o tratamento judiciário dos “homicídios por auto de resistência” no Rio de Janeiro, dissertação de mestrado, PPGD/UFRJ, 2012.
11 Ministério da Saúde, Programa estratégico de ações afirmativas: população negra e aids, Brasília, 2006.
12 Iná Meireles, Saúde da população negra: um histórico de vitórias e uma realidade que exige muita luta contra a faxina étnica, mimeo, 2011.
13 Marcelo Paixão et al (orgs.), op. cit.
14 Cf. Kazuo Nakano, “A produção social de vulnerabilidade urbana”, Le Monde Diplomatique Brasil, abr. 2011.
15 Para a análise do processo de reestruturação e mercantilização de nossas grandes cidades enquanto produção de novas fronteiras urbanas para a expansão da acumulação, cf. Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro e Orlando Alves Santos Junior, “Desafios da questão urbana”, Le Monde Diplomatique Brasil, abr. 2011.
16 Piramba examina esse processo enquanto expressão de racismo ambiental, isto é, das “injustiças sociais e ambientais [que] atingem etnias e populações vulneráveis”. Cf. Paulo Piramba, Anotações sobre o racismo ambiental, mimeo, 2011, p.1.
17 Ver, para a distinção entre integração social e inserção social, no sentido apontado aqui, Robert Castel, As metamorfoses da questão social, Vozes, Petrópolis, 1998.

Tariq Ali: Venezuela é a única alternativa ao capitalismo

  Por Vermelho

Segundo declarações dadas na última quinta-feira (26) para a Agência Venezuelana de Notícias o escritor Tariq Ali afirmou que a Venezuela é uma alternativa ao capitalismo moderno, por utilizar o Estado em favor dos pobres.
Para o paquistanês, autor de mais de uma dezena de livros sobre história e política internacional, a política seguida por Hugo Chávez na Venezuela é a única alternativa que existe, atualmente, no mundo ao sistema capitalista hegemônico. “Em nenhuma outra parte do mundo se observa o que temos aqui”, disse ele que enfatizou a importância da América do Sul no cenário internacional.
Tariq Ali, que participa nesta sexta-feira (27) de uma conferência sobre o papel político da mídia ocidental na Universidade Bolivariana da Venezuela, em Caracas, também destacou a importância que a rede estatal venezuelana Telesur tem em construir uma consciência latino-americana.
A iniciativa, segundo o intelectual, é fundamental na luta contra as ideias dominantes do império estadounidense que promove, inclusive, o pensamento de que não existe uma democracia na Venezuela. “A única democracia que é permitida é a democracia em que eles ditam o que deve ser feito”, explicou Ali.
“É chocante como as pessoas falam da Venezuela em outros países, dizem que Chávez é um ditador, embora Chávez tenha ganhado mais eleições e mais eleições do que ninguém nenhuma outra pessoa. Mas, os países capitalistas não enxergam assim porque a democracia oficial está se tornando mais restritiva. Esse é o mundo que nos faz lutar hoje “, disse o filósofo.

Fonte: Opera Mundi

domingo, 29 de julho de 2012

Como tudo no Brasil, a liberdade de expressão é privilégio dos ricos!

Rafael Castilho

A crescente participação dos blogs e das redes sociais na difusão de conteúdo jornalístico e de opinião, democratizando o debate político para além dos meios de comunicação tradicionais vem causando arrepios na classe conservadora.

A cada dia, os brasileiros adquirem o habito de buscar fontes alternativas de informação e de reflexão sobre as grandes questões políticas nacionais, ou mesmo sobre a nossa vida cotidiana.

Isso sem falar nos conteúdos de diversão e entretenimento.

A população jovem aprendeu rápido a buscar conteúdo na internet, deixando de depender da programação das tradicionais empresas de comunicação.

Ainda que a velha mídia tenha imensa importância na formação de opinião, a internet (em especial as redes sociais), surgem como fonte alternativa.

Entre outras coisas, as pessoas perceberam que a vida real não se resume à "versão oficial" dos jornais.

Enquanto as redes sociais eram meras concorrentes na geração de entretenimento, os grandes grupos de comunicação se prepararam para a disputa de mercado.

Mas quando as questões políticas  nacionais passaram a ser discutidas, contradizendo as grandes manchetes midiáticas, a disputa passou a ser questão de sobrevivência.

Nas últimas eleições, as redes foram responsáveis por "inverter o roteiro" de uma novela que deveria ter um final diferente, caso o debate político eleitoral estivesse ainda entregue aos grandes grupos de comunicação.

Agora, a disputa é pelo poder.

Os grandes interesses da oligarquia estão em jogo.

Para os ricos, a democracia atendia ao propósito de legitimar o poder dos grandes grupos econômicos, porém, acomodando sanha por representação e participação política na sociedade brasileira.

Tampouco interessava à oligarquia governos autoritários e intervencionistas que viessem a limitar as grandes negociatas.

A democracia desenhada pela oligarquia era um grande teatro. O cenário ideal para a manutenção dos velhos privilégios. E a mídia dirigia o espetáculo com maestria, cabendo ao povo o papel de referendar nas urnas o que já estava decidido.

O Brasil ainda não fez mais do que algumas reformas sociais e tênues correções de rumos. Mas isso já foi suficiente para o estresse dos conservadores.

A democratização nos meios de comunicação, pode a médio e longo prazo dissolver a capacidade dos grandes grupos de comunicação "pautarem" a agenda do executivo e do legislativo.

A possibilidade de o Estado criar instrumentos sérios de regulação da mídia é tratada pelos magnatas como um atentado contra a liberdade de imprensa.

Mas ao que parece, a liberdade de expressão deve ser um privilegio apenas dos grandes e ricos grupos de comunicação.

Sem menor pudor, a velha imprensa vem atacando a "blogosfera" e exigindo que o poder público controle as redes sociais, inibindo seu potencial de comunicação com a sociedade.

Não são poucos os editoriais em que os grandes jornais acusam os blogueiros de serem militantes contratados pelo PT.

Muito curioso este protesto.

Ao menos este blogueiro que vos fala, jamais foi filiado ao Partido dos Trabalhadores e sequer militou em suas prestigiosas fileiras.

Além do mais, seria razoável que os grandes órgãos de imprensa fossem também denunciados por apoiarem de maneira escandalosa, desde sempre, o partido que condenou o Brasil à chaga do neoliberalismo.

E por falar em neoliberalismo, a velha imprensa festejou a abertura escancarada da economia brasileira à especulação internacional. Regozijou-se gostosamente defendendo a dilapidação do patrimônio público para empresas gringas que sucatearam os serviços ao consumidor, enquanto recheavam seus cofres. Deu de ombros para a quebradeira da industria nacional que ficou sem condições de competir no mercado internacional.

Mas o interessante, é que este apego às regras de ouro do livre mercado globalizado não se reflete quando  o assunto é a concorrência das empresas de comunicação brasileiras com empresas estrangeiras.

Os grandes jornais e televisões se manifestam com veemência em defesa da soberania nacional quando vêem a possibilidade de serem obrigados a concorrer com os grandes grupos estrangeiros.

É pena que não tenha sido da mesma forma quando eles defenderam a quebra do monopólio estatal do petróleo, das telecomunicações e a venda a preço de banana das nossas grandes empresas estratégicas ao interesse especulativo internacional.

E as contradições não param por aí.  Os magnatas das comunicações querem impedir uns poucos blogs de receberem publicidade institucional.

Mas a hipocrisia moralizadora da velha mídia, ao tratar dos gastos públicos, omite os bilhões de reais gastos com o dinheiro do contribuinte, por meio de publicidade governamental, para pagar o arrego dos grandes grupos que desde sempre conspiram contra o Brasil.

A liberdade de expressão não pode ser, como tantas coisas no Brasil, privilegio da oligarquia. 

Ensaia-se uma ofensiva contra os blogs e a sociedade deve estar consciente deste verdadeiro atentado contra a democracia.