Algumas declarações históricas
Não pretendo aqui fazer uma história da origem e desenvolvimento do sionismo, enquanto corrente de opinião de caráter racista, cujo objetivo principal é a construção de um estado judeu em terras históricas pertencentes aos palestinos. Tal processo, como sabemos, inicia-se na segunda metade do século 19 e se intensifica com a ajuda da Inglaterra desde que esta recebeu da Liga das Nações o Mandato sobre a palestina, quando facilitava imensamente a migração judaica para a região.
Já tratamos desse assunto ao longo de anos nesta coluna. Assim como mostramos que Israel não é e nunca foi um estado democrático como a mídia insiste em propagar aos quatro ventos. Ao contrário. É um estado racista, discriminador, que usa a força para impor sua vontade às minorias, que faz dos árabe-palestinos cidadãos de segunda classe, que penaliza quem não professa a religião judaica. Enfim, um estado – único na comunidade das nações que integram a ONU – a não possuir uma constituição e uma fronteira reconhecida internacionalmente, além de ocupar ilegalmente milhares de quilômetros quadrados de terras que a própria ONU destinou aos palestinos em 1947 na fatídica sessão de 29 de novembro.
Quero, antes de entrar nas análises sobre a questão sionista hoje e os impasses que as eleições israelenses de 10 de fevereiro levaram o país, apresentar aos nossos leitores, quase que lhes prestando um serviço, em especial aos estudiosos e apoiadores da causa palestina, um conjunto de declarações de sionistas históricos. Como a história comprovou, tais sionistas, que realizaram atividades bárbaras, que perpetraram massacres em aldeias palestinas, nunca falaram em “Estado de Israel”, mas falavam em Palestina, como aquela região é milenarmente conhecida.
Sempre houve um grande endeusamento na mídia a algumas figuras históricas desse movimento sionista que, nada mais é, do que um projeto de colonização da Palestina, cujos líderes judeus estabeleceram amplas alianças políticas, ora com a potência inglesa, ora com os americanos, de acordo com o sabor de seus interesses estratégicos. Pode parecer incrível, mas até certas alianças e acordos com o Partido Nacional Socialista da Alemanha nazista foram feitos acordos que estimulassem a migração judaica para a Palestina, mas isso é assunto para outro momento.
Vejamos aqui algumas das principais declarações de renomados judeus sionistas. Todas elas foram selecionadas por Ralph Schoenman, que, na juventude, chegou a ser secretário particular do prêmio Nobel da Paz, Bertrand Russel (1). As referências indiretas em suas respectivas páginas são dessa obra.
Chaim Weizmann – ex-presidente da Organização Sionista Mundial
“É bastante aceitável dizer que, se a Palestina cair na esfera de influência britânica e a Grã Bretanha estimular o estabelecimento dos judeus lá, com uma dependência britânica, em 20 ou 3 anos poderemos ter lá um milhão de judeus. Eles desenvolveriam o país, restituiriam a civilização e formariam uma guarda muito, mais efetiva para o Canal de Suez” (Trial and error: the autobiography of Chaim Weizmann, Nova York, Harper, 1949, página 149).
Meus comentários: aqui dois aspectos importantes. A prova de que os sionistas só se referiam à região como “Palestina” e a clara e estratégica aliança com os ingleses, a favor dos sionistas e seu projeto colonial. Destaca-se a quase premonitória cifra de um milhão de judeus migrantes, atingida alguns anos depois da sua previsão.
“As esperanças de seis milhões de judeus da Europa estão nas centradas na imigração. Alguém me perguntou: ‘você pode levar seis milhões de judeus para a Palestina?’. Eu respondi ‘não’. Dos abismos da tragédia eu quero salvar os jovens da Palestina. Os velhos desaparecerão. Eles aguentarão a sorte ou não. Eles são pó, pó econômico e moral num mundo cruel (...). Somente o ramo dos jovens sobreviverá. Eles têm de aceitar isso” (relato ao Congresso Sionista de 1937, sobre seu testemunho junto à Comissão Peel; citado em Yahya, página 55).
Meus comentários: aqui, de forma fria e calculista, Weizmann deixa claro que não defende todo o povo judeu, mas quer salvar apenas os mais jovens, que poderiam migrar para a Palestina e lá estabelecerem colônias e aderirem aos bandos terroristas para matar e expulsar palestinos. Os velhos ficariam à sua sorte. Isso nos lembra uma famosa frase de efeito de Gurion, quando ele afirmou que se tivesse que escolher salvar todas as crianças judiais da Alemanha e Europa, enviando-as para vários países e se só pudesse salvar metade deles, enviando-as para a Palestina, ele afirmou taxativamente que ficaria com a segunda hipótese.
Wladimir Jabotinsky – ideólogo do sionismo
“Todas as pessoas bem intencionadas, salvo os cegos de nascimento, compreenderam há muito a completa impossibilidade de se chegar a um acordo voluntário com os árabes da Palestina para transformar a Palestina de um país árabe em um país de maioria judia. Cada um de vocês tem uma ideia geral da história das colonizações. Tente achar pelo menos um exemplo de colonização de um país que aconteceu com o acordo da população nativa. Tal coisa nunca ocorreu. Os nativos sempre lutaram obstinadamente contra os colonizadores – e não importa que eles tenham cultura ou não. Os companheiros de armas de Hernán Cortez e Francisco Pizarro comportaram-se como bandidos. Os peles-vermelhas lutaram com ardor inflexível contra os colonizadores de bom e de mau coração. Os nativos lutaram porque qualquer tipo de colonização, em qualquer parte, em qualquer época, é inadmissível para qualquer povo nativo. Qualquer povo nativo considera seu país como seu lar nacional, do qual devem ser donos absolutos. Nunca aceitarão outro mestre voluntariamente. Assim ocorre com os árabes. Conciliadores entre nós tentam nos convencer de que os árabes são uma espécie de tolos que serão enganados com formulações que ocultem nossos objetivos básicos. Nego-me redondamente a aceitar essa visão dos árabe-palestinos. Eles têm a mesma psicologia que nós. Olham a Palestina com o mesmo amor instintivo e o mesmo autêntico fervor com que qualquer asteca olhava seu México ou qualquer sioux contemplava a sua pradaria. Qualquer povo lutará contra os colonizadores enquanto lhe reste um fio de esperança de que eles possam evitar o perigo da conquista e da colonização. Os palestinos lutarão dessa forma até que não haja o menor lampejo de esperança. Não importam as palavras com que expliquemos nossa colonização. A colonização tem seu próprio significado, pleno e imprescindível, compreendido por qualquer judeu e por qualquer árabe. A colonização tem um só objetivo. Tal é a natureza das coisas. E tentar mudar seu caráter é impossível. Foi necessário desenvolver a colonização contra a vontade dos árabes palestinos e a mesma situação se dá hoje. Inclusive um acordo com os não palestinos representa o mesmo tipo de fantasia. Para que os nacionalistas árabes de Bagdá, de Meca e de Damasco aceitassem pagar um preço tão alto, eles teriam de negar-se a manter o caráter árabe da Palestina. Não podemos dar nenhuma compensação pela Palestina, nem aos palestinos nem aos demais árabes. Portanto, é inconcebível um acordo voluntário. Qualquer colonização, ainda que a mais restrita deve-se desenvolver desafiando a vontade da população nativa. Portanto, a colonização somente pode continuar e desenvolver-se sob um escudo de força que inclua uma muralha de ferro que jamais possa ser penetrada pela população local. Essa é a política árabe. Formulá-la de qualquer outro modo seria hipocrisia... A censura estúpida de que esse ponto de vista não é ético, respondo: ‘totalmente falso’. Essa é a nossa ética. Não há outra ética. Enquanto os árabes tiverem a menor esperança de impedir-nos, eles não venderão essas esperanças por nenhuma palavra doce nem nenhum bocado apetitoso, porque não nos enfrentaremos com gentalha e som com um povo, um povo vivo. E nenhum povo faz concessões grandes sobre questões tão decisivas, a não ser quando não lhes resta nenhuma esperança, até que tenhamos tampado qualquer brecha na muralha de ferro” (The Iron Wall – O Zheleznoi Stene, Rassvet, 4 de novembro de 1923).
Meus comentários: aqui o reforço de que a região era mesmo “Palestina” e a palavra Israel nunca era dita. Um segundo aspecto, a frieza da confissão aberta de sua “ética” de negar qualquer acordo com os árabes e seguir abertamente com seus ideais colonizadores. Por fim, o desmascaramento de um dos mitos, uma das maiores mentiras que os sionistas contam ao mundo de que aquela terra era uma terra “sem povo”. Esse cidadão é considerado um dos maiores intelectuais do povo judeu.
“É impossível que alguém seja assimilado por outro povo que tenha sangue diferente do seu. Para que seja assimilado, esse alguém tem que trocar de corpo, tem de converter-se em um deles, no sangue. Não pode existir assimilação. Nunca poderemos permitir coisas como o matrimônio misto porque a preservação da integridade nacional só é possível mediante a pureza racial e, para tal, temos de ter esse território onde nosso povo constituirá os habitantes racialmente puros... A fonte do sentimento nacional (...) reside no sangue das pessoas (...) em seu tipo físico e somente nisso (...). a perspectiva espiritual de um homem é determinada previamente pela sua estrutura física. Por isso, não acreditamos na assimilação espiritual. É impossível, do ponto de vista físico, que um judeu nascido de família de sangue puramente judeu possa se adaptar à estrutura espiritual de um alemão ou de um francês. Essa pessoa pode ser totalmente imbuída de fluidos alemães, porém o núcleo de sua estrutura espiritual permanecerá sempre judeu.” (citado por Lenni Brenner em The Iron Wall: revisionism from Jabotinsky to Shamir, Londres, Zed Books, 1984, página 29).
Meus comentários: aqui uma versão clara e aberta do que Hitler viria a definir como a “raça pura”,a ariana. Condena os casamentos multi-étnicos e usa o termo “raça”, definindo árabes como raça inferior, que nunca poderiam casar-se com judeus, os “mais preparados”.
Joseph Weitz – Chefe do Departamento de Colonização da Agência Judaica em 1940
“Entre nós temos que ter claro que não há espaço algum para que os dois povos permaneçam juntos neste país. Nós não atingiremos nosso objetivo se os árabes permanecerem neste pequeno país. Não há outra maneira a não ser transferir os árabes daqui para os países vizinhos. Todos eles. Nem um único vilarejo, nem uma única tribo deve restar” (A solution to the refugee problem, Davar, 29 de setembro de 1967, encontrada em Uri Davis e Norton Mezvinsky, Editor, Documents from Israel, 1967-1973, página 21).
Meus comentários: aqui a confissão clara e aberta da completa impossibilidade da convivência dos dois povos, da defesa da transferência compulsória dos palestinos para países vivinhos. De fato, dados de 1948 mostram que dos 475 vilarejos e aldeias palestinas existentes nessa época, 358 foram completamente arrasados pelos sionistas e seus bandos terroristas, reduzidos à pó. Apenas uns 90 permaneceram em pé.
Relatório Koening
“Devemos usar o terror, o assassinato, a intimidação, o confisco de terras e o corte de todos os serviços sociais para libertar a Galileia de sua população árabe” (Al Hamishmar, 7 de setembro de 1976).
Heilbrun, presidente do Comitê Pró-Reeleição do general Shlomo Lahat, prefeito de Tel Aviv
“Devemos matar todos os palestinos, a não ser que se resignem a viver aqui como escravos” (Citado por Fouzi El-Asmar e Salih Baransi durante debates ocorridos com Ralph Schoenman em 1983, publicado em seu livro na página 75).
Uri Lubrai – conselheiro para assuntos árabes de Ben Gurion
“Vamos reduzir a população árabe a uma comunidade de lenhadores e garçons” (Sabry Jiris, The arabs in Israel, Monthly Review Press, Nova York, 1976).
Raphael Eitan – Ex-chefe do Estado Maior das Forças Armadas de Israel
“Manifestemos abertamente que os árabes não têm direito algum a ocupar sequer um centímetro do Grande Israel (...). A única coisa que eles entendem e entenderão é a força. Nós utilizaremos a força mais decisiva até que os palestinos venham até nós, engatinhando, de joelhos (...). Quando tivermos ocupado as terras, os árabes não poderão fazer nada mais do que se revolver como baratas drogadas dentro de uma garrafa”. (Gad Becker, Yediot Ahronot de 13 de abril de 1983; The New York Times de 14 de abril de 1983).
Meus comentários: aqui, de forma clara e cristalina, em várias passagens, vemos o sentimento que sempre nutriu a liderança sionista, qual seja, a eliminação física e completa da população palestina e árabe em geral de toda a Palestina. Ou, no mínimo a subjugação física e moral, a completa humilhação e escravização. Compara-se a baratas os palestinos. Agora mesmo nas eleições de 10 de fevereiro, onde venceu a direita, Ehud Barak, o grande derrotado do Partido Trabalhista, ministro d Defesa de Israel, fez campanha pedindo votos e atacando o direitista Avigdor Liebermann, que será o provável chanceler do governo de Bibi, afirmando abertamente na sua propaganda na TV: “Quantos palestinos ele já matou?”, ao criticar a inexperiência em guerra do fascista do Partido Israel Beitenu.
Ben Gurion – Fundador do Estado Judeu, em declaração de 1936
“Nós não propomos que proclamemos agora nosso objetivo final, que é de grande alcance – principalmente em relação aos revisionistas que se opõe à partilha. Eu me nego a renunciar a uma grande visão, à visão final que é um componente orgânico, espiritual e ideológico de minhas aspirações sionistas (...). Um estado judeu parcial não é o final, senão somente o princípio. Estou convencido de que nada pode nos impedir de nos estabelecermos em outras partes do país e da região (...). As fronteiras e as aspirações sionistas são de interesse do povo judeu e nenhum fator externo poderá limitá-las (...)”.(Memoirs, Volume III, página 467).
“As fronteiras da aspiração sionista incluem o sul do Líbano, o sul da Síria,a atual Jordânia, toda a Cisjordânia e o Sinai”. (“Report to the World Council of Poale Zion” – antecessor do Partido Trabalhista – em Tel Aviv em 1938, encontrado em Israel Shahak, journal of Palestine Studies, 1981).
“Quando nos convertermos em uma força com peso, como resultado da criação de um estado, aboliremos a partilha e nos expandiremos por toda a Palestina. O Estado será somente uma etapa na realização do sionismo e sua tarefa é preparar terreno para nossa expansão. O estado terá de preservar a ordem, não através da pregação, mas sim com as metralhadoras” (Discurso pronunciado em 1938, do Livro Memórias).
“Deveríamos nos preparar para avançar em uma ofensiva. Nosso objetivo é esmagar o Líbano, a Transjordânia e a Síria. O ponto débil é o Líbano, porque o regime muçulmano é artificial e fácil de ser minado. Teremos de implantar um estado cristão ali e então derrotaremos a Legião Árabe, eliminaremos a Transjordânia; a Síria cairá em nossas mãos. Então nós bombardearemos e ocuparemos Port Said, Alexandria e o Sinai, no Egito” (Michel bar Zoha, Ben Gurion: a Biography, Nova York, Delacorte, 1978).
Meus comentários: aqui também de forma cristalina, o fundador de Israel confessa, nessas várias passagens e discursos, que o plano de partilha da ONU seria apenas o começo para a tomada de toda a Palestina e quiçá, com foi com a guerra de 1967, o Eretz Israel (em hebraico “Grande Israel”, do Tigre, no Iraque ao Nilo, no Egito). O projeto colonialista, aliado com as potências ocidentais era muito grande, incluía quase todo o Oriente Médio. E tudo isso com a força da bala, dos massacres, dos genocídios, amplamente registrados desde 1947, como o de Der Yassim.
Como queríamos demonstrar...
Nas ciências chamadas “exatas”, em especial a física e a matemática, quando terminamos a demonstração de uma equação, quando resolvemos um problema, escrevemos ao final a sigla CQD, “como queríamos demonstrar”. As citações acima compiladas, extraídas de Schoenman, demonstram de maneira cabal pelo menos o seguinte:
1. O projeto sionista é um movimento de colonização, que se articulou com as potências imperialistas do século 20;
2. O objetivo final sempre foi a tomada de todas as terras da Palestina histórica, de forma que a partilha seria apenas uma mera etapa, um passo para a construção de um estado em terras palestinas, quando o grande objetivo seria ampliar o controle territorial, expandindo-o para países como o Líbano, a Jordânia, a Síria e o Egito. Quem sabe até ao Iraque;
3. Sionismo é racismo. As declarações de todos os grandes líderes árabes sempre foram racistas, no sentido de discriminar os árabes e palestinos como cidadãos de segunda classe;
4. Em vários momentos fica claro que o objetivo seria até a eliminação física dos palestinos ou, no mínimo, subjugá-los, humilhá-los e transformá-los em cidadãos de segunda classe.
Essas frases falam por si só. Por isso, esta semana, em véspera do governo fascista de Bibi ser formado em Israel, quando um fascista e racista declarado como Avigdor pode vir a ser ministro das Relações Exteriores, estas frases reforçam, entre nós, lutadores pela causa palestina, a convicção de que estamos certos em nosso caminho e Israel vai se tornando a cada dia um país mais inviável, pelo que vem fazendo há mais de 60 anos contra os palestinos.
(1) Ver livro A História Oculta do Sionismo, da Editora Sundermann, São Paulo, 2008, 243 páginas.