Professores protestam contra fim da estabilidade
Lei sancionada por Alan García obriga docentes a passarem por três avaliações; caso sejam reprovados, o vínculo empregatício com o Estado é rompido
Danielle Almeida Pereira,
de Cusco (Peru)
Naquela segunda-feira (9), não tinha idéia do que acontecia quando desci do ônibus e me deparei com um êxodo de peruanos de um lado da estrada e um engarrafamento de carros, caminhões e ônibus de outro. Perguntei o que se passava a uma das transeuntes. Apesar da pressa, ela foi gentil em me explicar que a rodovia estava bloqueada: “Não se passa. Os professores protestam contra a lei”.
A ley de Carrera Pública Magisterial sancionada pelo presidente do Peru, Alan García, determina, dentre outras coisas, que os professores passem por três avaliações anuais. Se não forem aprovados nestas três etapas, será rompido o vínculo empregatício com o funcionário.
As pedras espalhadas pela estrada que liga Cusco à Puno, na beira do famoso lago Titicaca, já eram um indício do movimento que se formava mais à frente. O bloqueio não era grande, menos de cem professores estavam reunidos perto das fileiras de pedras que fechavam os dois sentidos da rodovia. Genaro alimentava a fogueira improvisada com palha e pneu. A fumaça escura se misturava à neblina das bonitas montanhas a mais de 3 mil metros de altitude.
“Para que és?”, pergunta-me com uma simpática desconfiança. Genaro, segundo ele mesmo afirma, é um dos 18 mil professores de Cusco. Passadas as suspeitas, ele conta o que pensa da lei: “Vai tirar nossa estabilidade no trabalho”.
O arquivamento da Lei de Carrera Pública Magisterial é a principal reivindicação do Sindicato Único dos Trabalhadores na Educação (SUTE). “A lei tira a estabilidade no trabalho e, em parte, busca a privatização da educação”, defende Oscar Urviola Ramos, dirigente do Sute em Puno. De acordo com ele, a lei segue um modelo imposto pelo Banco Mundial que exige do estado a privatização dos serviços de saúde e educação.
Mesmo sendo essa a principal luta da categoria, o professor Genaro reclama dos baixos salários. “Deveríamos receber 3 mil soles, mas ganhamos cerca de 900 soles”, desabafa. O dirigente do Sute em Puno reconhece a importância desta questão, mas garante: “Neste momento, não pedimos aumento de salário, mas sim estabilidade e que a educação siga à cargo do estado”.
Precariedade
Entre os 300 mil professores de todo o Peru, 22 mil estão em Puno, cidade peruana que é ponto de partida para quem quer conhecer o mais alto lago navegável do mundo. De acordo com o dirigente do Sute em Puno, a maior parte dos professores deste município trabalha em escolas rurais onde não há infra-estrutura necessária: “Sem teto, sem cadeiras, sem quadros. O Estado se esqueceu da zona rural”. Oscar Ramos se lamenta ao dizer que “apenas 3% de todo o Produto Interno Bruto do Peru vai para a educação”.
Os protestos contra a lei de Carrera Pública Magisterial se espalham há dias por todo o país, através especialmente de bloqueios nas estradas. As mobilizações parecem ter transformado o Sindicato Único dos Trabalhadores na Educaçáo em personas non gratas para o estado peruano. Tanto que o Poder Executivo reforçou o poderio da Policia Nacional com a adição das Forças Armadas que irão, por trinta dias, “proteger” portos, aeroportos, centrais elétricas, e outros “pontos estratégicos para o desenvolvimento dos serviços básicos do país”, segundo publicou um jornal de grande circulação do Peru.Mas a intenção dos professores, que também aderiram à greve nacional decretada nesta quarta-feira, é persistir nos protestos contra a lei do governo de Alan García, como bem lembra Oscar Ramos: “Queremos que nos capacitem, que nos avaliem para servimos bem na educação, mas que não seja uma forma de nos demitir”.
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