segunda-feira, 27 de agosto de 2007

Altamiro Borges: "Cansei" da Hebe e da Regina Duarte


Sem conseguir retirar das suas mansões a “elite branca” e as “madames enfadadas”, segundo a ironia mordaz do insuspeito Cláudio Lembro, o movimento golpista “Cansei” resolveu apelar a alguns artistas para ludibriar os incautos e garantir público nas suas minguadas manifestações. O sofisticado folheto de convocatória do protesto na capital paulista, na semana passada, trouxe as imagens das animadoras de televisão Hebe Camargo e Ana Maria Braga, da atriz global Regina Duarte e da cantora Ivete Sangalo. A escolha destas figurinhas carimbadas, conhecidas por seus antigos laços de amizade com ricaços exibicionistas e notórios tucanos, não poderia ser pior.
Por Altamiro Borges*



Revista trás musas do Cansei na semana do dia 17

Para baratear os altos custos das agências de publicidade, o “Cansei” até poderia ter aproveitado a foto de capa de uma edição recente da revista Caras, especializada em bajular os bilionários e fazer futrica com as celebridades do meio artístico. Na foto aparecem, sorridentes e servis, Hebe Camargo, Ana Maria Braga e Regina Duarte no luxuoso casamento da filha de Geraldo Alckmin, ex-governador e candidato tucano rechaçado nas eleições presidenciais. Elas devem ter adquirido seus modelitos no paraíso de consumo das elites, a butique Daslu, onde a badalada noiva Sophia Alckmin foi gerente e deu uma mãozinha para intermediar negócios junto ao governo do seu pai.

“Perua assumida” e reacionária

A apresentadora Hebe Camargo já é famosa nos meios políticos. Ela se projetou na televisão nos anos de chumbo da ditadura militar e depois virou cabo-eleitoral de luxo do ex-governador Paulo Maluf, aparecendo “gratuitamente” nas suas propagandas eleitorais. Na sucessão presidencial de 2006, ela abandonou seu antigo protegido e fez campanha aberta para o tucano Geraldo Alckmin. As suas opiniões reacionárias também são conhecidas. Hebe usa a sua exposição na telinha para defender as piores causas. Em 2003, declarou ao vivo na SBT que mataria um menor acusado do assassinato de um casal de jovens. As fitas foram requisitadas pelo Ministério Público, taxadas de “incitamento ao crime”, e a apresentadora recuou: “Se me excedi, peço desculpas”. Também foi ativa militante da campanha contra o desarmamento. “Possuir arma é um direito do cidadão”.

Além de direitista e reacionária, Hebe Camargo é a expressão grotesca da “madame enfadada”, que está “cansada” de tanto luxo e ostentação. Segundo edição especial da revista Veja dedicada à “moda&estilo”, de maio de 2005, “certa vez ela fez um balanço de todas suas jóias. Depois de cobrir o chão de um cômodo inteiro com um tapete de brilhantes, pérolas, esmeraldas e outras pedras, chegou à conclusão de que não deveria comprar mais nenhuma peça. Durou pouco a sua decisão. Para o bem de seu humor e alegria da fila de joalheiros que a abastecem. Para Hebe, em se tratando de jóias, tamanho é documento. ‘Quando as pessoas vêm me mostra uma joinha, um anelzinho, digo logo que não combina comigo... Sou perua assumida e com muito orgulho’, diz”.

A “perua assumida” também gosta de colecionar Mercedes, que chegam a cinco na sua garagem. “Com rendimento mensal estimado em 1,2 milhão de reais, entre salário e merchandising, Hebe pode se entregar de corpo, alma e talão de cheque à paixão das jóias... ‘É difícil ter em São Paulo uma mulher que vença a Hebe Camargo em quantidade de jóias. Ela chega a comprar três peças por mês’, avalia um especialista do ramo... Como nenhuma mulher aparece na televisão com os seus tesouros – ou talvez nem saia de casa com eles –, Hebe Camargo permanece como a rainha dos quilates”, conclui a bajuladora reportagem da Veja. Ela realmente deve estar “cansada”!

De namoradinha à tucana

Já a atriz global Regina Duarte tem uma trajetória política errática. Durante a ditadura militar, ela foi a “namoradinha do Brasil”, participando de novelas que ajudaram a entorpecer a sociedade e a esconder os horrores das torturas e assassinatos. Posteriormente, como ela própria confessou, fez autocrítica e teve participação destacada na luta pela redemocratização, como na campanha das Diretas-Já. Nos anos da avalanche neoliberal, porém, converteu-se numa ativa militante do PSDB, ajudando nas duas campanhas de FHC e nas derrotadas empreitadas de Serra e Alckmin.

Na eleição presidencial de 2002, ela ficou famosa por aparecer no programa eleitoral tucano com a fisionomia apavorada e o bordão “eu tenho medo”, contra o risco da vitória de Lula. De forma hipócrita, ela agora engrossa o “Cansei”. Quando da chacina de Eldorado do Carajás, em abril de 1996, ela não surgiu na telinha para se solidarizar com as famílias dos camponeses mortos e para dizer que estava “cansada” da violência do amigo FHC. Em janeiro último, quando um acidente no Metrô abriu uma cratera num bairro central da capital e matou várias pessoas, a atriz global também não pintou na telinha para dizer que estava “cansada” do atual e do ex-governador. Pelo contrário. Pouco tempo depois foi um dos destaques do casamento da filha de Geraldo Alckmin.

“Ana ameba brega” e ACM

As duas outras estrelas que emprestaram suas imagens à campanha do “Cansei” são mais novatas na “política”. Ana Maria Braga, que o sarcástico José Simão apelidou de “Ana ameba brega”, só recentemente resolveu arriscar comentários políticos, entre uma receita culinária e uma fofoca no seu programa da TV Globo. Após o acidente da TAM, ela extravasou seu ódio ao atual governo. Após mostrar imagens da tragédia, dos “sinais obscenos” de Marco Aurélio Garcia, assessor do presidente, e da frase infeliz da ex-prefeita Marta Suplicy, concluiu em tom melodramático que Lula era culpado pelo acidente e convocou seus telespectadores para os protestos do “Cansei”.

Já Ivete Sangalo, presença obrigatória nos programas da TV Globo, preferiu nada falar durante o protesto do “Cansei”. Segundo alguns observadores, ela parecia envergonhada por ter cedido sua imagem. Já seu irmão, o publicitário Jesus Sangalo, é um dos mentores deste movimento golpista – o que pode ter influenciado a cantora. Isto não quer dizer que ela não tenha opiniões próprias e controvertidas. Em 2001, por exemplo, aderiu ao abaixo-assinado em apoio ao falecido coronel Antonio Carlos Magalhães – “um homem digno, coerente e honrado” e “um dos maiores políticos brasileiros de todos os tempos” –, quando este violou o painel de votação do Senado.

* Altamiro Borges é jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB, editor da revista Debate Sindical e autor do livro “As encruzilhadas do sindicalismo” (Editora Anita Garibaldi).



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