A análise é de Idelber Avelar, professor titular de literatura latino-americana e teoria literária em Tulane University (EUA). O artigo foi publicado em seu blog, nesta terça-feira (5). Leia abaixo sua íntegra:
A decadência da Fox News: uma lição para a Veja?
Há uma história nesta campanha eleitoral americana que eu ainda não vi discutida no Brasil - e que os fãs da revista Veja deveriam acompanhar com atenção. É o declínio paulatino da relevância e da audiência da Fox News, a outrora temida cadeia de televisão que redefiniu não só o jornalismo, mas a própria política norte-americana.
A Fox conseguiu o que em 1996 parecia impossível: desbancar a CNN no negócio de notícias via TV a cabo, enquanto realizava a proeza de transformar o extremismo de ultra-direita em suposto centro do espectro político, com um slogan que era o troféu óleo de peroba do século: fair and balanced. Funcionou durante muito tempo e foi decisivo para o roubo de uma eleição presidencial americana (2000) e para o resultado da seguinte (2004). Parece não estar funcionando mais.
A partir de um chamado ao boicote liderado pelo site Fox Attacks e por vários blogueiros e ativistas progressistas, os candidatos democratas tomaram a difícil – mas, viu-se depois, acertada – decisão de ignorar o canal e não aceitar debater lá. Tratá-la como o que ela é, um canal de manipulação e doutrinação extremistas, não um veículo de notícias. Este ano, foi tudo morro abaixo para a Fox. O candidato queridinho da Fox, Rudy Giuliani, amargou uma humilhação atrás da outra nas primárias, perdendo até para o azarão Ron Paul. Teve que abandonar a corrida antes de ser esmagado dentro do seu próprio estado de Nova York, apesar de todos os esforços do canal.
A estrela da Fox, o histriônico Bill O'Reilly, chegou a trocar empurrões com agentes do serviço secreto para tentar se aproximar de Barack Obama, humilhação impensável dois anos atrás. Depois da Fox excluir do seu debate o candidato anti-guerra Ron Paul, mesmo depois de Paul ter conseguido 10% dos votos em Iowa (quase o dobro do queridinho Guiliani), o todo-poderoso âncora da Fox, Sean Hannity, foi perseguido pelos seguidores de Paul aos gritos de Fox News sucks!.
Para piorar a situação, o ex-executivo da Fox, Dan Cooper, vem publicando trechos do livro em que conta toda a lama por trás do projeto do canal de notícias liderado por Robert Ailes, um sujeito capaz de ameaçar uma criança de três anos cujo único crime é ser filha de um jornalista que fez um retrato crítico do seu amado radialista de ultra-direta Rush Limbaugh.
O que os Democratas entenderam, finalmente, é que em alguns terrenos não vale a pena lutar. O resultado do jogo já está dado de antemão, como sabem os que já presenciaram os massacres manipulados que são as “entrevistas” da Fox com qualquer um que não compartilhe o extremismo bélico do canal. Que isso sirva de lição para os que acham válido conversar com determinados veículos, ao invés de seguir o exemplo dos incontáveis brasileiros que já tivemos o gostinho de um dia dizer ao telefone: Você é da Veja? Desculpe, com a Veja eu não falo.
Nas primárias de New Hampshire em 2004, mesmo sem qualquer oposição a Bush, a Fox teve 200.000 telespectadores a mais que a CNN na noite da primária democrata. Em 2008, com um campo de candidatos competitivos entre os Republicanos, a CNN teve 250.000 a mais. Dos dez debates mais assistidos desta campanha, cinco foram na CNN, só dois na Fox. O debate democrata da Carolina do Sul, transmitido pela CNN, bateu o recorde: foi o mais assistido da história das primárias americanas.
O canal de negócios da corporação Fox, o Fox Business Network, que estreava com o intuito de fazer com a CNBC o que a Fox News fizera com a CNN, não consegue mais que ínfimos 6.300 telespectadores, ou 0,05% do mercado, bem longe dos 265.000 da CNBC. A lição me parece clara: Fox subiu com Bush e está caindo com ele.
Fonte: Instituto Humanistas
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