EUA viram saco de pancadas em reunião no Brasil
Os líderes latino-americanos deram um novo passo distanciando-se de décadas de órbita em torno dos Estados Unidos, num encontro aqui na Costa do Sauípe, Brasil, que reuniu praticamente todos os países da América latina e Caribe, mas excluiu os EUA e a Europa. No processo de convocação dos líderes dos 31 países, o Brasil mais uma vez exibiu suas credenciais como líder incontestável da América Latina.
Por Alexei Barrionuevo, enviado especial do New York Times*
Evo, Chávez, Raúl e Lula na foto que o NYT escolheu
O popularíssimo presidente do país anfitrião, Luiz Inácio Lula da Silva, um aliado dos EUA, não impediu os líderes de comemorarem a inclusão de Raúl Castro, presidente de Cuba, e usarem a ocasião para atacar os EUA e a Europa por terem provocado a crise econômica mundial, que perturba igualmente esta região.
Três dias de pancadas nos EUA
"Cuba está voltando para onde sempre deveria ter estado", disse aos jornalistas Hugo Chávez, o presidente da Venezuela:. "Nós estamos completos."
Os EUA converteram-se em saco de pancadas durante os três dias da conferência, que termina quarta-feira (17) neste paraíso turístico no estado brasileiro da Bahia. Raúl Castro certamente não estava sozinho ao investir contra os EUA e o que ele chamou o seu modelo "neoliberal" para a crise do crédito, que está afetando muitas outras economias.
"Em meio a uma crise internacional sem precedentes, nossos países não são parte do problema, podem e devem ser parte da solução", disse Lula.
Cúpula Latino-Americana X Cúpula das Américas
O momento escolhido para o encontro, apenas quatro meses antes da próxima Cúpula das Américas, em Trinidad e Tobago, foi significativo, disseram analistas. Essa reunião, realizada pela primeira vez em Miami em 1994, convocada pelo presidente Clinton, incluirá os EUA e o Canadá, mas excluirá Cuba.
Lula fez sua parte para desviar as atenções da Cúpula das Américas, até enviando aviões da Força Aérea do Brasil para garantir a presença dos presidentes dos países mais pobres da América Central e Caríbe. Os presidentes do Peru, Alan García, e da Colômbia, Álvaro Uribe, foram os únicos chefes de Estado que não compareceram. O vice-presidente colombiano, Francisco Santos disse que Uribe, um fiel aliado dos EUA, ficou em casa às voltas com as conseqüências de fatídicas inundações.
A reunião congregou diferentes coalizões de países da região, incluindo a recém-formada União de Nações Sul-Americanas, ou Unasul, um agrupamento que tem realizado reuniões nos últimos meses que também excluíram os EUA.
"Não há dúvida de que se trata de uma exclusão, de excluírem os EUA", disse Peter Hakim, presidente do Inter-American Dialogue, um grupo de investigação política sediado em Washington. "O Brasil está demonstrando o seu enorme poder de convocação", agregou.
Esforços anti-Cuba dos EUA se frustraram
Com a ascensão da China como principal destino das exportações regionais, e à visita no mês passado do presidente da Rússia, Dmitri Medvedev, visando cortejar líderes latino-americanos, há mais freqüentes indicativos de que os EUA estão se tornando um ator cada vez mais distante dos assuntos da região, disse Riordan Riordan Roett, diretor do programa de Estudos Latino-Americanos da Johns Hopkins University. "Os EUA não são mais, nem serão nunca mais, o principal interlocutor dos países da região", disse ele.
Um a um, os presidentes saudaram a inclusão de Cuba na reunião, numa expressão de que se frustraram os esforços dos EUA para excluir Cuba semelhantes fóruns hemisféricos, disse Michael Shifter, vice-presidente Inter-American Dialogue.
Muitos dos líderes, inclusive Lula pediram a suspensão do embargo dos EUA contra Cuba. "Este é mais um passo no processo de garantir que Cuba ocupe o lugar seu justo e digno lugar na região e em todo o mundo", disse Bruce Golding, o primeiro ministro da Jamaica.
Tensões regionais
Mas mesmo que os líderes latino-americanos tenham se referido a sua crescente unidade e poder coletivo, tensões regionais ficaram evidentes.
Na Bolívia, Oscar Ortiz, presidente do Senado um proeminente crítico do presidente Evo Morales, pediu à Unasul, o novo organismo regional, que faça mais investigações sobre os recentes assassinatos no norte da Bolívia, que uma comissão da Unasul descreveu como um inequívoco massacre.
Os governantes da região continuam a luta para escolher um líder para Unasul. Tabaré Vásquez, presidente do Uruguai, disse em outubro que se opõe à nomeação do ex-presidente da Argentina Néstor Kirchner, uma atitude que reflete as tensas relações entre os dois países no ano passado.
Também tem sido crescente a tensão entre Equador e Brasil, com o presidente equatoriano Rafael Correa expulsando executivos da Odebrecht, uma grande empreiteira brasileira, e questionando um empréstimo por parte do poderoso banco de desenvolvimento nacional brasileiro, que financia projetos de obras públicas em toda a América Latina.
Mas estas disputas podem ter mais a ver com a ascensão do Brasil, com seu perfil regional e suas corporações multinacionais competindo mais agressivamente por negócios além das fronteiras nacionais. Em Lula, o Brasil tem um líder que tem sido adepto de aliviar as tensões através da diplomacia; enquanto a diplomacia de Washgton tornou-se largamente inoperante em grande parte da região.
"Lula é um líder que pratica a 'política do abraço de urso', pensando que todos os problemas podem ser resolvidos por um caloroso abraço", disse Larry Birns, diretor do Conselho de Assuntos Hemisféricos, um grupo de investigação sediado em Washington.
* Fonte: The New York Times; intertítulos do Vermelho
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