domingo, 6 de dezembro de 2009

FESTIVAL INTERNACIONAL DO NOVO CINEMA LATINO-AMERICANO


O segredo de muitos olhos

Mireya Castañeda

O segredo dos seus olhos, o mais recente filme do argentino Juan José Campanella, protagonizado pelos muito reconhecidos Ricardo Darín, Guillermo, Francella, e Soledad Villamil, foi escolhido para inaugurar o 31º Festival Internacional do Novo Cinema Latino-Americano. Chegou a Havana com muitos avais, entre eles, ter sido indicado pela Academia das Artes e Ciências Cinematográficas da Argentina para o Oscar.
O filme fez sucesso na Argentina, o qual sempre é um aspecto importante: que os filmes da região tenham distribuição, presença nas telas e no espectador. O segredo dos seus olhos esteve a ponto de bater o recorde histórico de bilheteria de mais dois milhões de espectadores que o filme icônico de María Luisa Bemberg, Camila, em 1984, interpretado por Susú Pecoraro.
Campanella, além de diretor, foi o roteirista de quatro filmes muito conhecidos: O Mesmo Amor, a Mesma Chuva, O Filho da noiva (indicado para o Oscar em 2001 como o Melhor filme de fala não-inglesa), Clube da Lua e agora também O segredo dos seus olhos.
Este novo filme, no concurso pelo Prêmio Coral do Festival de Havana, conta a história de um homem recém-aposentado, Benjamín Chaparro, que depois de trabalhar a vida toda como empregado num Tribunal Penal, resolve escrever uma novela, um thriller que decorre em Buenos Aires, em 1974, baseada numa história real, da qual foi testemunha e protagonista. É, aparentemente, a história de um assassinato.
Com essa história, Juan José Campanella fala dos caminhos que transitou a sociedade argentina, da impunidade à repressão na década de 1970, o restabelecimento da justiça e da democracia nos últimos anos.
"ERNESTO GUEVARA"
Outro filme argentino, que é exibida fora de concurso, em estreia mundial, é o documentário Ernesto Guevara, do reconhecido cineasta Tristán Bauer, do qual Alfredo Guevara, fundador do Icaic e do festival, disse que tenta mostrar uma faceta mais humana do guerrilheiro.
Em entrevista coletiva, o presidente do encontro cinematográfico argumentou que o documentário mostra gravações inéditas da vida íntima e amorosa do Che que guardava a viúva, Aleida March, e —assinalou— "os que fomos amigos do Che, sabemos o que ele era: o guerrilheiro, o exigente — às vezes, azedo, isso nunca foi dito — mas ao mesmo tempo, com uma imensa humanidade".
Tristán Bauer trabalhou no projeto durante mais de uma década e teve acesso a arquivos secretos do exército da Bolívia — que executou o Che em outubro de 1967 — e aos do Centro de Estudos "Che Guevara", de Cuba.
Entre os sete filmes que fez sobressai o muito premiado Iluminados pelo Fogo (2005), que inaugurou o Festival de Havana em 2006 e o meia-metragem Evita, o Túmulo Sem Paz (1997).
DAWSON ILHA 10
Fora do concurso, exibe-se também o novo filme de Miguel Littín, Dawson Ilha 10, do Chile, que participa da concorrência aos prêmios das academias norte-americana e espanhola, ou seja, ao Oscar e ao Goya.
Protagonizada por Benjamín Vicuña, o filme narra fatos reais acontecidos após o golpe de Estado de Pinochet, quando os colaboradores diretos do presidente Salvador Allende foram presos e desterrados a uma ilha do Pacífico, situada a uma centena de quilômetros do continente.
Dawson Ilha 10 baseia-se no relato autobiográfico de Sergio Bitar, que fez parte do grupo de altos funcionários constitucionais enviados para esse campo de concentração cercado de mar, quando foi ministro de Minas de Allende (depois, ministro de Obras Públicas com a atual presidente Michelle Bachelet).
Miguel Littín é um cineasta muito conhecido, fundador do novo Cinema Latino-Americano, ganhador de numerosos prêmios por filmes como A Viúva de Montiel e O Recurso do Método. Atas de Marusia e Alsino e o Condor foram indicados para o Oscar em 1976 e 1983, respectivamente, como melhores filmes estrangeiros. A sua carreira cinematográfica começou em 1969, com O Chacal de Nahueltoro, filme que fez sucesso de bilheteria e que teve também impacto no âmbito social e político.
Após o golpe de Estado e o estabelecimento da ditadura de Augusto Pinochet, teve que se exilar em 1973, domiciliando-se no México e mais tarde, na Espanha. Em 1985, teve a chance de voltar de maneira clandestina ao Chile e executar um temerário projeto de filmagem sobre a realidade política do seu país, intitulado Ata Geral do Chile. Quando voltou à Espanha e terminou seu trabalho, o Prêmio Nobel de Literatura Gabriel Garcia Márquez propôs-lhe escrever a história do seu filme, publicada sob o título Aventura de Miguel Littín clandestino no Chile.
Retornou à temática latino-americana com Sandino, de 1991, dirigiu Náufragos em 1994 e retomou o estilo de epopeia popular com Terra do fogo em 2000.
Que trouxe Coppola?
Francis Ford Coppola, que noutras ocasiões esteve no Festival de Havana, agora enviou o seu filme Tetro, filmado na Argentina, e considera-se uma nova viagem do diretor de O Poderoso Chefão pelo tema habitual da família vista como uma versão reduzida da sociedade com todos seus conflitos e suas reconciliações.
O filme, em preto e branco, conta a história de dois irmãos afastados há anos, que se reencontram em Buenos Aires para encarar um segredo que mudará para sempre o modo da sua relação.
A lista do elenco é impressionante: Vincent Gallo, o estreante Alden Ehrenreich, as espanholas Maribel Verdú e Carmen Maura, o austríaco Klaus Maria Brandauer e os argentinos Rodrigo de la Serna, Letícia Brédice e Mike Amigorena.
Quando Tetro foi exibido em Cannes, o público que lotou a sala gostou muito dele, mas não convenceu a crítica, a qual assinalou que o roteiro dedicou muito tempo às peripécias, até chegar a duas horas e sete minutos de duração, uma atuação desigual, e algumas passagens coreográficas gratuitas.
Parece que o mais convincente de todos os atores é a espanhola Maribel Verdú, que sabe chegar ao espectador com sua figura sofrida de amante sacrificada do protagonista, Tetro, encarnado por Vincent Gallo.
Coppola, a quem devemos muitos títulos, como a trilogia de O Poderoso Chefão e Drácula, fez recentemente 70 anos e sua carreira conta tanto com sucessos quanto com fracassos. Tetro é o primeiro filme baseado numa história original sua, desde A Conversação, ganhador da primeira Palma de Ouro em 1974 no Festival de Cannes, a segunda foi há 30 anos com Apocalypse Now.
Quanto a Drácula, há mais. O Festival fará uma Exibição Especial da versão de Drácula de George Melford, a versão latinizada do filme feita em 1931 por Tod Browning, com Bela Lugosi como protagonista.
Alfredo Guevara salientou que essa versão foi encontrada nas abóbadas da Cinemateca de Cuba e a considerou melhor que a original.
Anunciou que agora será projetada, mas com o violonista e compositor Gary Lucas tocando ao vivo, em estreia mundial, sua partitura para o Drácula latino.
Muitas pessoas estão assistindo filmes em Havana: os filmes em concurso, fora de concurso, as mostras, os panoramas, Latino-Americano e Contemporâneo e as homenagens (neste ano, exclusivamente para o cinquentenário do Icaic). Qual será o segredo? •

Nenhum comentário: