Time de mulheres tenta recuperar esporte feminino e treina em base de helicópteros da Otan, único local seguro na capital Cabul
Na primeira terça-feira de dezembro, a seleção feminina de futebol
do Afeganistão tinha apenas mais dois dias para treinar antes de partir
para sua primeira competição internacional.
Elas se revezaram nos chutes de longa distância ao gol, praticaram o
bloqueio de pênaltis e driblaram a bola entre si em torno de um círculo.
Em seguida, soldados armados irromperam através de um portão na lateral
ordenando-lhes - educadamente – que fossem para um canto. Ouviu-se o
barulho e vários helicópteros chegaram de uma vez, levantando poeira e
detritos sobre seus rostos.
Foto: The New York Times
Integrantes do time de futebol feminimo afegão, antes de treinamento em Cabul
Mais uma vez, a Otan fazia uso de seu heliporto e as
mulheres tiveram de desocupar o único local na capital onde podem jogar
em segurança. "Eu odeio os helicópteros, mas em qualquer outro lugar nós
não poderíamos jogar em público. Nós seríamos atacadas", disse Khalida
Popal, oficial da confederação de futebol feminino e uma das jogadoras
mais antigas da equipe.
Ela joga como zagueira na seleção, mas é uma atacante incansável
quando se trata de promover o futebol feminino. "É assim que eu luto",
disse ela. "Queremos enviar uma mensagem ao mundo para mostrar que as
mulheres podem jogar futebol, estudar e trabalhar".
Nenhuma dessas atividades tem sido fácil para as mulheres do
Afeganistão, mas o esporte tem sido particularmente difícil.
Completamente proibidos durante o regime Taleban, os esportes femininos
estão voltando aos poucos, prejudicados por baixos orçamentos e pela
falta de segurança, mas principalmente pela falta de lugares para jogar
em uma sociedade onde até mesmo modestas exposições do corpo são muitas
vezes tratadas como um crime social.
"Onde quer que vamos as pessoas nos dizem: 'Por que vocês jogam futebol? Este jogo não é para mulheres'", disse Khalida.
Esforços
Embora o país tenha algum tipo de equipe feminina em 22 esportes,
esses esforços estão apenas começando. Nas Olimpíadas de 2008, apenas
uma mulher afegã competiu, em atletismo, enquanto duas competiram em
2004, de acordo com Shukaria Hikmat, chefe do Comitê Olímpico Afegão.
Os homens esportistas, por outro lado, têm conquistado bastante
espaço apesar da guerra. Seus jogadores de críquete são heróis
nacionais, principalmente depois que derrotaram a Escócia recentemente, e
sua equipe de tae kwon do é uma potência asiática.
Foto: The New York Times
Chegada de helicóptero da Otan faz mulheres desocuparem único local na capital onde podem jogar em segurança
A equipe feminina de futebol voou para Bangladesh para sua primeira
competição internacional oficial, um torneio promovido pela Federação de
Futebol do Sul da Ásia. "Competir internacionalmente já será uma
vitória", disse a técnica da equipe, Wahidullah Wahidi, especialmente
porque as mulheres afegãs estarão jogando contra equipes provenientes de
países onde o futebol feminino está bem estabelecido.
A equipe afegã tem muitas deficiências. A seleção pode usar o campo
de futebol localizado dentro de uma base da Otan em Cabul apenas três
vezes por semana – caso os desembarques dos helicópteros não atrapalhem.
O presidente Hamid Karzai ordenou que o campo fosse colocado à sua
disposição depois de uma performance inesperadamente forte em um
amistoso contra o Paquistão.
Costumes
A capitã é uma estudante de 16 anos de idade, Roya Noori, uma
atacante baixa com um chute feroz. Quatro das melhores jogadoras vivem
na América e não tiveram oportunidade de treinar com a equipe antes do
campeonato em Bangladesh. Mesmo suas roupas e sapatos esportivos são uma
miscelânea de origem variada – calções ou mangas curtas não fazem parte
do conjunto.
A maioria das jogadoras, no entanto, não usa lenços na cabeça –
vestimenta obrigatória em público para as mulheres do país – por ser
pouco prático. "Pode ser perigoso", disse Khalida. "Outra jogadora pode
agarrá-la e estrangulá-la".
Khalida, 23 anos, é uma estudante de engenharia que vem de uma
conservadora família pashtun. Quando ela demonstrou aptidão para o jogo,
na escola, seu pai e irmãos se opuseram à ideia. Quase todos os 21
clubes femininos do Afeganistão ficam na capital.
Foto: The New York Times
País vem retomando esportes femininos, proibidos durante a época do regime talibã
"Eu consegui convencê-los demonstrando o meu amor pelo futebol e eles
finalmente concordaram", disse ela. Isso foi há cinco anos. "Agora eles
estão muito orgulhosos". Eles também estão preocupados. Como porta-voz
do futebol feminino ela recebeu ameaças de morte e é muitas vezes
insultada na rua, disse.
"Este é o direito civil de cada mulher", disse Wahidullah. "O esporte
não deve ser apenas para os homens. O problema com o nosso país é que
há tantos analfabetos, cerca de 85% do nosso povo, e as pessoas não
conhecem nada melhor".
Em outubro, a equipe afegã teve um jogo amistoso com a equipe
feminina das forças da Otan. "Nós queríamos mostrar-lhes que os afegãos
são um povo amigável, não como as pessoas estúpidas com quem estão
lutando", disse Popal.
A capitã da equipe da Otan era a sargento da Marinha Danielle
Figueroa. "Eu percebi que menosprezo até mesmo a minha capacidade de
jogar qualquer esporte", disse ela. "Não me dei conta, até semana
passada, quando nós tivemos uma chance de conversar sobre como isso é
novo para elas".
Sem interrupções de pousos de helicópteros, as mulheres do Afeganistão venceram a Otan por 1-0.
Tradução: no portal IG não havia créditos para o tradutor
Nenhum comentário:
Postar um comentário