Por Caio Zinet na CAROS AMIGOS
Durante os últimos quatro meses, os estudantes chilenos estão mobilizados em uma forte luta pela educação pública, gratuita e de qualidade. São cerca de 700 colégios e universidades ocupados por todo o país e até o momento foram realizadas, pelo menos, seis manifestações que reuniram em torno de 500 mil pessoas nas ruas de várias cidades do país. A maior delas, realizada no dia 18/9, reuniu um milhão de pessoas em Santiago.
A popularidade do governo Piñera despencou desde o começo do ano, e o apoio às pautas estudantis aumentou vertiginosamente desde o início dos protestos. Nesse período, também foram realizadas duas grandes greves gerais que paralisaram o país e colocaram a necessidade de se discutir também as leis trabalhistas herdadas da ditadura.
As mobilizações no Chile, e o imenso apoio popular que vem recebendo, apontam para o esgotamento de um modelo de educação gestado a partir de 11 de setembro de 1973, quando um golpe militar derrubou o governo socialista de Salvador Allende, e conduziu o general Augusto Pinochet ao poder.
Junto a Pinochet vieram as ideias dos teóricos neoclássicos (ou neoliberais, como preferir), como Milton Friedman, Hayek entre outros. Os “chicago boys”, como ficaram conhecidos, fizeram do Chile umas das primeiras experiências neoliberais da história contemporânea.
O Estado, dentro dessa concepção, é um grande e pesado ator social que deve preparar a economia do país para as empresas, retirando barreiras para o mercado financeiro, transformando os países em grandes fantoches do capital financeiro internacional.
Dentro dessa visão, o Chile transformou quase toda a sua educação em privada, e a parte que não é privada é subvencionada pelo Estado. Dessa forma, todo o chileno que quiser estudar terá que arcar com altos gastos de mensalidades, e pesados juros. As dívidas acompanham os estudantes chilenos por muitos anos. Estima-se que 40% dos estudantes deixem a universidade com dívidas.
A educação brasileira caminha para o mesmo rumo. Em 1995, cerca de 60% dos estudantes do ensino superior estavam matriculados no ensino privado, em 2007 essa proporção saltou para 74,6%.
A educação brasileira caminha para o mesmo rumo. Em 1995, cerca de 60% dos estudantes do ensino superior estavam matriculados no ensino privado, em 2007 essa proporção saltou para 74,6%.
As políticas estatais que propiciaram essa inversão foram gestadas durante os dois governos do presidente Fernando Henrique Cardoso, e se tornaram ainda mais concretas com o governo Lula, consolidando programas como o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) e criando o Programa Universidade Para Todos (ProUni) e o que tiram verbas da educação pública e remetem para os grandes grupos de educação brasileira. Ao mesmo tempo, a educação pública vem sendo sucateada, e a qualidade de ensino é deixada em segundo plano.
Ao contrário do que sustenta o governo federal, o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação das Universidades Federais (Reuni), não melhorou a qualidade do ensino público no país, pelo contrário. Aumenta-se o número de alunos por sala de aula e os recursos permanecem praticamente os mesmos.
Na prática o que se nota é que a educação pública está sendo aos poucos sucateada. Prova disso são as mais de dez ocupações de universidades federais e estaduais que estão acontecendo ou aconteceram por todo o país nesse segundo semestre, e tem entre suas principais pautas infraestrutura e qualidade de ensino. Os estudantes entraram em universidades públicas, mas não tem salas de aula, laboratórios adequados, faltam restaurantes universitários a todos, muitas vezes nem mesmo os prédios que abrigaram os cursos estão prontos.
A luta dos estudantes chilenos reflete ao que a educação chilena foi submetida, e mostra que o caminho que vem sendo trilhado pelo Brasil na educação leva ao fortalecimento do modelo privatista de educação, e a destruição do ensino público, gratuito, de qualidade e acessível a todos e a todas sem distinção de classe.
Aos estudantes e a sociedade brasileira que não esperem que a educação brasileira chegar a uma crise tão profunda como a chilena para se levantar contra esse modelo de educação. Aos estudantes brasileiros que se revoltem agora, que lutem para que 10% do Produto Interno Bruto (PIB) sejam destinados à educação pública.
O modelo chileno que deve nos guiar é o dos estudantes nas ruas dizendo que "educação não é mercadoria", e não o modelo neoliberal de educação, herança de Pinochet, que se mostra cada vez mais insustável.
Caio Zinet é jornalista
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