Relatório divulgado nesta sexta (1o), pela Organização Internacional
do Trabalho (OIT), aponta que 20,9 milhões de pessoas são vítimas de
trabalho forçado em todo o mundo, sujeitas a emprego impostos através de
coação ou de fraude, dos quais elas não podem sair. Do total, 11,4
milhões são mulheres e meninas e 9,5 milhões são homens e meninos. Cerca
de 5,5 milhões possuem menos de 18 anos;
A organização, ligada às Nações Unidas, não divulga o cálculo por
país mas por macrorregiões. A margem de erro é de 7%, ou seja, a
estimativa – considerada conservadora por seus realizadores – vai de
19,5 milhões a 22,3 milhões. Alguns dados do estudo:
- Do total, 18,7 milhões (90%) são explorados no setor privado.
Destes, 4,5 milhões (22%) são vítimas de exploração sexual forçada e
14,2 milhões (68%) de exploração do trabalho forçado em atividades
econômicas, como agricultura, construção civil, trabalho doméstico ou
industrial;
- Outros 2,2 milhões (10%) estão sujeitos a formas de trabalho
forçado impostas pelo Estado, como o que ocorrem em algumas prisões ou
em forças armadas rebeldes ou exércitos nacionais;
- A incidência por mil habitantes é maior na Europa Central, no Leste
Europeu e na região da Comunidade de Estados Independentes (ex-União
Soviética), com 4,2 casos/mil habitantes e na África, com 4/mil. É mais
baixa nos países com economias desenvolvidas e na União Européia
(1,5/mil);
- Em termos absolutos, a região da Ásia e Pacífico apresenta o número
mais alto de trabalhadores forçados no mundo: 11,7 milhões (56% do
total). O segundo maior número é registrado na África, com 3,7 milhões
(18%), seguido pela América Latina, com 1,8 milhão de vítimas (9%). Nas
economias desenvolvidas e na União Européia existem 1,5 milhão (7%) de
trabalhadores forçados, enquanto que nos países da Europa Central e
Leste Europeu e na Comunidade de Estados Independentes são registrados
1,6 milhão (7%) de pessoas. No Oriente Médio, o número de vítimas é
estimado em 600.000 (3%);
- Há 9,1 milhões de vítimas (44%) que se deslocaram, seja dentro de
seus países ou para o exterior. A maioria, 11,8 milhões (56%), está
submetida a trabalho forçado em seus países de origem ou residência. Os
deslocamentos entre fronteiras estão estreitamente vinculados com a
exploração para fins sexuais.
Em nota divulgada pela OIT, a diretora do Programa Especial de Ação
para Combater o Trabalho Forçado, Beate Andrees, afirma que “tivemos
progresso ao assegurar que a maioria dos países tenha uma legislação que
penalize o trabalho forçado, o tráfico de seres humanos e as práticas
análogas à escravidão”. Contudo, segundo ela, “ainda é complicado ter
êxito em processos judiciais contra indivíduos que causam tal sofrimento
a tantas pessoas”.
Para ilustrar, no Brasil, há cerca de quatro dezenas de casos que
resultaram em condenações criminais por conta de trabalho escravo
contemporâneo em um universo de mais de 3 mil fazendas fiscalizadas por
denúncias relativas a esse crime e 42 mil trabalhadores libertados desde
1995. Não há informação de empregador que tenha cumprido pena na cadeia
após sentença transitada em julgado.
De acordo com a OIT, a metodologia utilizada pela instituição, em
2005, para estimar que o mundo tinha, ao menos, 12,3 milhões de pessoas
submetidas ao trabalho forçado foi revista e melhorada. O dado anterior
por exemplo, tinha margem de erro de 20%, em comparação aos 7% da
estimativa divulgada hoje. Por isso, não é possível afirmar que o número
de escravos aumentou.
“Produzimos estas novas estatísticas em nível regional e mundial
utilizando uma grande variedade de fontes secundárias, complementadas
pelos resultados de nossos estudos nacionais realizados em colaboração
com contrapartes locais, o que nos permite extrapolar dados provenientes
de meios de comunicação ou de outras fontes indiretas. No entanto,
ainda estamos longe de uma situação ideal na qual os países possam
realizar suas próprias medições. A OIT poderá apoiar o fortalecimento
das capacidades necessárias para cumprir esta difícil tarefa”, afirma
Andrees.
Em 2001, a Comissão Pastoral da Terra, organização ligada à Igreja
Católica e uma das mais importantes no combate ao trabalho escravo no
país, propôs 25 mil como o número mínimo de trabalhadores rurais que,
anualmente, eram submetidos à escravidão na Amazônia brasileira. Essa
estimativa resultava de interações entre os números anuais de pessoas
encontradas pela fiscalização, a observação do fluxo de trabalhadores
migrantes e a uma análise da instituição de que para cada pessoa
libertada outras três continuariam em cativeiro. A preocupação da CPT
foi de alertar a sociedade com um número que sinalizasse a relevância
numérica do problema sem cair num exagero insustentável cientificamente.
Na falta de outra, a estimativa foi aceita e utilizada por várias
entidades. Em 2003, o governo brasileiro endossou o número ao colocá-lo
no Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo. Em 2004, uma
delegação brasileira nas Nações Unidas reconheceu também o número de 25
mil como estimativa mínima e, posteriormente, a própria Organização
Internacional do Trabalho. Outra estimativas apareceram, como a de 40
mil ou 100 mil trabalhadores nessas condições, mas nenhuma delas foi
utilizado pelas principais entidades estatais ou da sociedade civil que
atuam no combate a esse crime.
Apesar do esforço estatístico trazido pela Comissão Pastoral da
Terra, ele não seguiu normas científicas ou passou por uma atualização. A
Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae),
que reúne instituições públicas e da sociedade civil para monitorar as
políticas públicas contra esse crime no país, parou de utilizar a
estimativa da CPT e qualquer outra em 2007.
No ano passado, a OIT ofereceu ao Brasil apoio técnico para o
desevolvimento de uma estimativa do número de escravos no país. Os
custos de tal levantamento estão sendo analisados pela Conatrae e o
governo brasileiro.
Por outro lado, devido às informações dos trabalhadores colhidas pelo
Ministério do Trabalho e Emprego no momento do resgate, há um perfil
traçado de quem é a vítima no Brasil. Por exemplo, no caso de exploração
econômica, entre 2003 e 2009, os libertos foram homens (95%), entre 18 e
44 anos (82%), analfabetos ou com até quatro anos de estudo (68%),
oriundos de Estados como o Maranhão e o Pará.
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