Guilherme Boulos, do MTST: “A nossa cor é a cor vermelha”
Anna Beatriz Anjos e Igor CarvalhoRevista Fórum
Em entrevista exclusiva, coordenador
nacional do MTST ressalta que luta do movimento sempre foi por moradia e
nunca contra a Copa do Mundo, rechaça setor da mídia que “tentou
seduzir” o movimento e critica a tática black bloc: “Achamos que ela não
contribui para o acúmulo de forças e para o avanço das lutas
populares”.
Desde o último dia 3 de maio, quando
coordenou a ocupação de um terreno a quatro quilômetros da Arena
Corinthians, em Itaquera, zona leste de São Paulo, o Movimento dos
Trabalhadores Sem-Teto (MTST) se tornou peça importante dentro do
cenário político paulista. Chegou a ser alvo da atenção da presidenta
Dilma Rousseff (PT), que os recebeu para uma reunião sobre moradia.
coordenou a ocupação de um terreno a quatro quilômetros da Arena
Corinthians, em Itaquera, zona leste de São Paulo, o Movimento dos
Trabalhadores Sem-Teto (MTST) se tornou peça importante dentro do
cenário político paulista. Chegou a ser alvo da atenção da presidenta
Dilma Rousseff (PT), que os recebeu para uma reunião sobre moradia.
Desde então, o movimento impressionou ao
colocar cerca de 20 mil pessoas nas ruas em suas manifestações. A luta
por moradia passou a ganhar destaque na mídia. Boa parte dessa imprensa
tentou de todas as formas classificar o MTST como “anti-Copa”.
colocar cerca de 20 mil pessoas nas ruas em suas manifestações. A luta
por moradia passou a ganhar destaque na mídia. Boa parte dessa imprensa
tentou de todas as formas classificar o MTST como “anti-Copa”.
“A mídia tentou seduzir o MTST. Ela viu no
MTST, pela capacidade de mobilização e organização, uma oportunidade de
repetir os aspectos negativos que junho de 2013 teve. E aí fazer isso em
ano eleitoral, a poucos meses da eleição, de modo a jogar uma pá de cal
na Dilma”, analisa Guilherme Boulos, coordenador nacional do movimento,
para quem não há dúvida sobre a tentativa da imprensa em politizar as
manifestações do grupo. “Na nossa avaliação, a mídia pretendeu
conscientemente utilizar o MTST para essa finalidade e não conseguiu,
porque o MTST se colocou de forma muito clara em relação ao seu
discurso, que não é o discurso de ‘não vai ter Copa’, expressando que o
nosso problema é outro.”
MTST, pela capacidade de mobilização e organização, uma oportunidade de
repetir os aspectos negativos que junho de 2013 teve. E aí fazer isso em
ano eleitoral, a poucos meses da eleição, de modo a jogar uma pá de cal
na Dilma”, analisa Guilherme Boulos, coordenador nacional do movimento,
para quem não há dúvida sobre a tentativa da imprensa em politizar as
manifestações do grupo. “Na nossa avaliação, a mídia pretendeu
conscientemente utilizar o MTST para essa finalidade e não conseguiu,
porque o MTST se colocou de forma muito clara em relação ao seu
discurso, que não é o discurso de ‘não vai ter Copa’, expressando que o
nosso problema é outro.”
O MTST já atua em sete estados do país, mas
integra a Frente de Resistência Urbana, o que amplia essa presença para
outros estados. Ao todo, só em São Paulo, 20 mil famílias seguem o
movimento, de acordo com Boulos. Confira a entrevista a seguir.
integra a Frente de Resistência Urbana, o que amplia essa presença para
outros estados. Ao todo, só em São Paulo, 20 mil famílias seguem o
movimento, de acordo com Boulos. Confira a entrevista a seguir.
Fórum – A atuação mais contundente do MTST tem sido em São Paulo. Por quê?
Guilherme Boulos – Eu
destacaria São Paulo e Brasília. É que São Paulo é uma caixa de
ressonância, o que acontece aqui é nacional. Brasília, apesar de ser a
capital do país, não é tanto caixa de ressonância. O MTST tem feito
ocupações enormes em Brasília, mobilizado muita gente, travado uma luta
dura contra o governo do Distrito Federal. Há uma atuação intensa do
MTST em Brasília, marcada por repressão dura do governo do Distrito
Federal. Ameaças de prisão, prisão, tentativa de homicídio de
dirigentes, o negócio é meio terrível por lá. Voltando aqui para São
Paulo, aqui é o lugar onde o MTST é mais antigo e mais articulado, onde o
movimento teve tempo e condições para construir um trabalho de base,
contínuo e intenso, de modo a acumular mais força social. Além do que,
São Paulo, por ser a grande metrópole do país, concentra as
contradições, o que tem de mais rico e de mais pobre no país também. São
Paulo tem alguns bolsões de miséria na sua região metropolitana,
enormes “cidades-favela” que criam as condições para uma atuação mais
intensa do MTST.
Fórum – Em entrevistas recentes, você disse que a capacidade destacaria São Paulo e Brasília. É que São Paulo é uma caixa de
ressonância, o que acontece aqui é nacional. Brasília, apesar de ser a
capital do país, não é tanto caixa de ressonância. O MTST tem feito
ocupações enormes em Brasília, mobilizado muita gente, travado uma luta
dura contra o governo do Distrito Federal. Há uma atuação intensa do
MTST em Brasília, marcada por repressão dura do governo do Distrito
Federal. Ameaças de prisão, prisão, tentativa de homicídio de
dirigentes, o negócio é meio terrível por lá. Voltando aqui para São
Paulo, aqui é o lugar onde o MTST é mais antigo e mais articulado, onde o
movimento teve tempo e condições para construir um trabalho de base,
contínuo e intenso, de modo a acumular mais força social. Além do que,
São Paulo, por ser a grande metrópole do país, concentra as
contradições, o que tem de mais rico e de mais pobre no país também. São
Paulo tem alguns bolsões de miséria na sua região metropolitana,
enormes “cidades-favela” que criam as condições para uma atuação mais
intensa do MTST.
combativa e questionadora do capitalismo dos movimentos sociais está
muito aquém do que poderia ser. De que forma o MTST age diferente nesse
aspecto? Você poderia falar um pouco sobre a tática de acúmulo de
forças?
Boulos – O MTST não é um movimento de moradia, nós
não nos definimos como um movimento de moradia. Somos um movimento
territorial, que atua nas periferias urbanas, com muita referência do
que foi o movimento dos piqueteiros, na Argentina; os movimentos
comunitários, na Bolívia; vários movimentos que surgiram nos últimos 20
anos na América Latina e que são resultados do fato da segregação
territorial mais profunda nos grandes centros urbanos. Podemos fazer uma
analogia: do mesmo jeito que o capitalismo concentrou, no século XIX,
os trabalhadores na grande indústria e criou condições para o surgimento
do movimento operário, no século XX, o capitalismo concentrou os
trabalhadores nas periferias urbanas e criou condições para um movimento
territorial de novo tipo, que é o que tem surgido nos últimos anos. Por
isso – e é nesse sentido que não nos colocamos como movimento de
moradia, o MTST toma a pauta da moradia como seu foco, seu centro, mas é
um movimento que tem uma proposta mais ampla de conquista de direitos
sociais, de reforma urbana e de construção de poder popular. Isso nós
expressamos na nossa prática. Não que outros não expressem; não achamos
que somos a única coisa que presta nos movimentos sociais brasileiros,
ao contrário. Há muitas experiências interessantes ocorrendo de
movimento urbano no Brasil. O MTST talvez seja aquela que conseguiu se
consolidar de forma mais unitária e com maior visibilidade. A nossa
crítica – e aí entra a tática de acúmulo de forças do movimento – vai no
seguinte sentido: nós temos a clareza de que os grandes problemas que a
maior parte da população trabalhadora vive não serão resolvidos nas
atuais relações sociais, econômicas e de poder político. É preciso ter
uma mudança estrutural na sociedade para construir uma vida digna. Nesse
sentido, a nossa luta não é pautada por um avanço determinado. Ontem [9 de julho],
nós conseguimos uma grande conquista – muito bem, o pessoal da Copa do
Povo vai ter moradia, fortaleceu o “Minha Casa, Minha Vida Entidades”,
conseguimos avanços até para a própria política habitacional no país.
Mas isso não basta, é um passo importante, mas isso é mais um passo no
acúmulo de forças. Nós temos que chegar ao momento – e é nisso que o
movimento acredita, e para isso que trabalha – em que a força do poder
popular vai poder lidar de igual para igual com a força do capital. Aí
nós vamos tratar conquistas em um outro nível. Só que não adianta ter
posições radicais sem ter condições para ter ações radicais, isso é
gigante com pé de barro. Não adianta ter ideias muito revolucionárias,
muito socialistas, se você não cria as condições na base, do ponto de
vista de força social, para que isso se efetive.
Fórum – E sem receio de admitir o socialismo?
Boulos – Não temos receio nenhum. O MTST é um
movimento que, na sua estratégia, entende que o capitalismo não vai
resolver o problema dos trabalhadores, e que é preciso uma nova forma de
sociedade, que nós não temos vergonha alguma de chamar de socialista.
Fórum – Qual a relação entre as pessoas que chegam ao movimento e a especulação imobiliária?
Boulos – Nos últimos três, quatro anos, esse efeito
se fez sentir de forma mais forte. Se formos pegar do ponto de vista dos
dados, é anterior, mas até o dado se fazer sentir na ponta, há um
tempo. A partir de 2007, 2008, ocorre um processo de recrudescimento da
especulação imobiliária no país. Não que isso não acontecesse antes, mas
há um recrudescimento. Isso tem a ver com os efeitos do crescimento
econômico lulista; o segundo mandato do Lula, a partir de 2006, 2007, é o
período de maior crescimento econômico em relação ao primeiro mandato. O
crescimento econômico brasileiro nos últimos anos foi centrado
essencialmente na construção civil. O nível de subsídio, de dinheiro –
seja subsídio ao crédito através BNDES -, que o governo federal deu para
a construção civil depois de 2009, ainda mais em uma política
anticíclica para reverter os efeitos da bolha dos Estados Unidos em
2008, foi uma coisa incrível. Esse setor cresceu muito. Se pegarmos os
níveis de crescimento do patrimônio da Odebrecht nos últimos dez anos, é
algo enorme. Camargo Correia, as grandes empreiteiras cresceram isso,
injetando recurso público, principalmente por meio do BNDES. Qual é o
resultado disso para chegarmos ao ponto da especulação? Essas
construtoras, também para somar, tomaram a opção, entre 2006 e 2007, de
abertura de capital na bolsa de valores. Abriu o capital, vendeu ação;
vendeu ação, fez caixa. O que elas fizeram com esse dinheiro? Compraram
terra nos grandes centros urbanos brasileiros. Se você tem a terra, tem o
controle da política urbana. Tinha demanda, porque tinha crédito mais
amplo pros trabalhadores, tinha mais gente demandando produto
habitacional – habitação como mercadoria. A partir dessa lógica do
endividamento, as construtoras foram produzindo para a chamada classe C
em regiões que antes eram periféricas – Campo Limpo, Itaquera, Pirituba.
Ou seja, regiões que não eram centrais, que não eram alvo do capital
imobiliário, passaram a ser. Alguns podem pensar: “poxa, que bom, vai
valorizar a periferia”. Porém, se esquecem de que boa parte dos
trabalhadores que vive na periferia mora de aluguel. Eu moro em Campo
Limpo. Lá, um aluguel, em 2006, de uma casa de dois cômodos era 300
reais. Hoje, um aluguel de dois cômodos no Campo Limpo, 8 anos depois,
não sai por menos do que 700 reais. O cara que morava de aluguel no
Campo Limpo já era, porque o salário dele não aumentou nessa proporção.
Ele foi pra Taboão da Serra, Itapecerica, Embu. A periferia da
periferia: é isso que se criou.
“Para nós, a Copa do Povo é um exemplo do que queremos continuar
construindo. Se um imbecil de um Reinaldo Azevedo ler esta entrevista,
ele vai escrever um artigo dizendo: ‘É, não falei, eles vão invadir
mais’. É isso. É exatamente isso. Estamos em lados opostos e é isso que
vamos fazer.”
Fórum – Estamos novamente em ano de eleições. Hoje, a atual
situação política do Brasil se deve muito a essas empreiteiras. A
Constituinte pela reforma política será uma bandeira do MTST? Se sim, em
que momento?
Boulos – O MTST entende que uma reforma política é
um ponto básico. O debate da Constituinte, principalmente em relação ao
financiamento público de campanha, é um ponto elementar, basilar, não
digo para resolver os problemas, mas para, de algum modo, apresentar uma
inibição da apropriação do Estado pelo capital privado, para a
privatização do poder do Estado – que é o que acontece hoje por meio do
financiamento privado das campanhas eleitorais. Para o MTST, isso é uma
bandeira. Não houve uma articulação adequada do MTST com os movimentos
que estão puxando isso por uma série de razões circunstanciais, mas o
MTST pretender levar essa bandeira adiante, antes do dia 1º de setembro.
Nossa ideia é: havendo um entendimento com as entidades que estão
construindo isso, queremos encampar o plebiscito e levar isso adiante.
Essa é uma bandeira essencial para nós.
Fórum – Como você pensa que o Estado deveria regular o preço dos alugueis?
Boulos – Queremos uma nova lei do inquilinato no
país. Mesmo com a diminuição do crescimento econômico, os alugueis
continuam aumentando muito. A “Ocupação Copa do Povo”, em Itaquera, é
emblemática, porque lá a especulação tem muito a ver com a Copa e com o
estádio. Todo mundo fala a mesma coisa. Parece que foi combinado, parece
que o MTST orientou em assembleia: “olha, falem isso”, mas não foi. Foi
o que aconteceu, um processo real. As pessoas vão dizer: “não consigo
mais pagar aluguel, eu pagava 300, estou pagando 600”. Essa é a situação
geral. O que nós entendemos como uma forma de se contrapor a isso – é
claro que essa medida não resolve todos os problemas nem vai acabar com a
especulação imobiliária no país -, é que se uma nova lei do inquilinato
é aprovada, nessa lei você estabelece um teto para reajuste de aluguel.
E diz o seguinte: nenhum contrato de aluguel pode ser reajustado acima
do índice anual de inflação. Isso, por mais que possa parecer uma coisa
estranha e até subversiva, comunista, não é nada disso; é só regulação
de mercado. Isso ocorre em outros países, se não me engano, no Uruguai
há uma lei dessa natureza, aqui mesmo na América Latina. Isso ocorreu no
Brasil em 1917; uma das bandeiras das greves de 17 era o controle do
valor dos alugueis no Rio de Janeiro e em São Paulo e foi vitoriosa.
Esse controle ocorreu durante toda a década de 20. Na década de 30,
Getúlio Vargas fez três decretos de inquilinato. Governo Dutra,
Juscelino, todos eles mantiveram leis de inquilinato. Quem acabou com
isso foram os militares, e aí se manteve. É uma questão de regular
mercado. Hoje o mercado imobiliário, que incide na vida de milhões de
pessoas por meio do preço do aluguel, faz o que quer, não tem nenhum
controle público, é a lei da oferta e procura. Isso é inconcebível. Por
isso, a proposta de uma lei nova lei de inquilinato.
Fórum – Qual foi a contribuição das
manifestações de junho e da Copa do Mundo para esse quadro que, depois
do anúncio de que serão construídas 2 mil habitações na ocupação Copa do
Povo e o programa Minha Casa Minha Vida será modificado, se tornou
vitorioso na trajetória do MTST?
manifestações de junho e da Copa do Mundo para esse quadro que, depois
do anúncio de que serão construídas 2 mil habitações na ocupação Copa do
Povo e o programa Minha Casa Minha Vida será modificado, se tornou
vitorioso na trajetória do MTST?
Boulos – Junho de 2013 para
nós foi um grande marco, aliás para a luta social no Brasil. Talvez
muito mais pelo que significou do que pelo que foi. É claro que foi algo
muito importante; em nenhum momento podem ser tirados os méritos do
Movimento Passe Livre por ter protagonizado, criado uma luta, mobilizado
milhares de pessoas e ter sido vitorioso na sua pauta de
reivindicações. No entanto, junho, nós sabemos, depois tomou uma direção
– e à revelia do MPL, não por opção – muito preocupante, que foi
apropriada por setores conservadores, por uma classe média que está
descontente porque aeroporto virou rodoviária, pelo pessoal que defende
redução da maioridade penal. Em uma das manifestações, eu vi um rapaz
com um cartaz que dizia “redução da maioridade penal já”, “militares no
poder”. A maior parte dos trabalhadores mais pobres do país não foi às
ruas em junho, particularmente em São Paulo. No entanto, junho deixou um
significado muito importante para os trabalhadores de periferia. Depois
de 20 anos de estancamento e criminalização das lutas sociais, de um
ideário de que quem vai para a rua lutar é vagabundo e não tem o que
fazer, houve a ideia de que o povo, quando vai para a rua, é vitorioso. E
essa ideia incidiu, gerou impacto na consciência popular, de modo que,
se pegarmos a luta pela moradia, que foi talvez a que mais recebeu
destaque depois de junho, no segundo semestre de 2013, em São Paulo,
ocorreram mais de cem ocupações de terra, a maioria delas, espontânea.
Fórum – Nos atos do MTST, normalmente não há a presença dos nós foi um grande marco, aliás para a luta social no Brasil. Talvez
muito mais pelo que significou do que pelo que foi. É claro que foi algo
muito importante; em nenhum momento podem ser tirados os méritos do
Movimento Passe Livre por ter protagonizado, criado uma luta, mobilizado
milhares de pessoas e ter sido vitorioso na sua pauta de
reivindicações. No entanto, junho, nós sabemos, depois tomou uma direção
– e à revelia do MPL, não por opção – muito preocupante, que foi
apropriada por setores conservadores, por uma classe média que está
descontente porque aeroporto virou rodoviária, pelo pessoal que defende
redução da maioridade penal. Em uma das manifestações, eu vi um rapaz
com um cartaz que dizia “redução da maioridade penal já”, “militares no
poder”. A maior parte dos trabalhadores mais pobres do país não foi às
ruas em junho, particularmente em São Paulo. No entanto, junho deixou um
significado muito importante para os trabalhadores de periferia. Depois
de 20 anos de estancamento e criminalização das lutas sociais, de um
ideário de que quem vai para a rua lutar é vagabundo e não tem o que
fazer, houve a ideia de que o povo, quando vai para a rua, é vitorioso. E
essa ideia incidiu, gerou impacto na consciência popular, de modo que,
se pegarmos a luta pela moradia, que foi talvez a que mais recebeu
destaque depois de junho, no segundo semestre de 2013, em São Paulo,
ocorreram mais de cem ocupações de terra, a maioria delas, espontânea.
black blocs. Por quê? Os praticantes dessa tática já procuraram vocês,
houve alguma discordância?
Boulos – Primeiro, em relação aos black blocs: com
todo o respeito que quem está na luta merece, somos críticos dessa
tática. Achamos que ela não contribui para o acúmulo de forças e para o
avanço das lutas populares. Quebrar um banco pode parecer muito radical,
mas é muito fácil. Quebrar uma vitrine de banco, podemos sair daqui e
quebrar. Isso não vai fazer do Santander ou do Bradesco mais pobres.
Isso pode resolver meu problema psicológico, mas não radicalizar as
lutas sociais. Vai isolar as lutas populares no país. Não concordamos
com essa tática e não a aceitamos nas nossas manifestações. Não
aceitamos que uma minoria queira impor ao MTST, um movimento organizado,
nas manifestações puxadas pelo MTST, formas de luta que tiram da sua
cartola sem discutir em nenhum espaço. Prezamos por definição coletiva.
Nesse sentido, deixamos isso claro para os black blocs e acho que eles
compreenderam e respeitaram, não é que não apareceram nas nossas
mobilizações.
Fórum – Você sente que parte da mídia tenta colocar no MTST um adesivo de anti-Copa do Mundo?
Boulos - Claro. A mídia
tentou seduzir o MTST. Ela viu no MTST, pela capacidade de mobilização e
organização, uma oportunidade de repetir os aspectos negativos que
junho de 2013 teve. E aí fazer isso em ano eleitoral, a poucos meses da
eleição, de modo a jogar uma pá de cal na Dilma. Na nossa avaliação, a
mídia pretendeu conscientemente utilizar o MTST para essa finalidade. E
não conseguiu, porque o MTST se colocou de forma muito clara em relação
ao seu discurso, que não é o discurso de “não vai ter Copa”, expressando
que o nosso problema é outro. Esses efeitos perversos urbanos
decorrentes da Copa não são nem sequer essencialmente por conta dos
gastos públicos. Não que nós sejamos a favor dos 30 bilhões gastos na
Copa, ao contrário, somos contra; mas, cá entre nós, se a mídia tivesse
dedicado um décimo do tempo que dedicou a esses 30 bilhões para falar
dos 718 bilhões gastos só ano passado com o pagamento da dívida pública,
que é a verdadeira torneira do recurso público, as coisas seriam
outras. Trinta bilhões equivalem a quinze dias do pagamento da dívida
pública no Brasil. O cerne dos problemas da Copa são essas contradições
urbanas, a cronificação e avanço da especulação imobiliária, e por isso
construímos uma pauta nesse campo. Fomos muito claros em caracterizar a
posição do MTST como uma posição de classe, a nossa cor é a cor
vermelha, o nosso discurso é um discurso político, que tem lado. E isso,
de algum modo, afastou a mídia, tanto que, já nas últimas semanas, a
visibilidade que o MTST tem ganho é menor. A visibilidade que tivemos
quarta-feira passada [dia 4 de junho] ao botar 20 mil no
Itaquerão não foi nem um terço da visibilidade que tivemos duas semanas
antes ao botar 20 mil na Ponte Estaiada. Porque eles já haviam percebido
que ali não valia a pena apostar. O MTST não vai cumprir esse papel que
queriam que cumprisse, e começaram a tirar o pé do acelerador. Para nós
foi bom. Deixamos claro que não vamos trocar posição política por 15
minutos de fama. O MTST tem um lado político claro e contrário às
corporações da mídia privada, a quem os financia, e ao Estado
capitalista.
tentou seduzir o MTST. Ela viu no MTST, pela capacidade de mobilização e
organização, uma oportunidade de repetir os aspectos negativos que
junho de 2013 teve. E aí fazer isso em ano eleitoral, a poucos meses da
eleição, de modo a jogar uma pá de cal na Dilma. Na nossa avaliação, a
mídia pretendeu conscientemente utilizar o MTST para essa finalidade. E
não conseguiu, porque o MTST se colocou de forma muito clara em relação
ao seu discurso, que não é o discurso de “não vai ter Copa”, expressando
que o nosso problema é outro. Esses efeitos perversos urbanos
decorrentes da Copa não são nem sequer essencialmente por conta dos
gastos públicos. Não que nós sejamos a favor dos 30 bilhões gastos na
Copa, ao contrário, somos contra; mas, cá entre nós, se a mídia tivesse
dedicado um décimo do tempo que dedicou a esses 30 bilhões para falar
dos 718 bilhões gastos só ano passado com o pagamento da dívida pública,
que é a verdadeira torneira do recurso público, as coisas seriam
outras. Trinta bilhões equivalem a quinze dias do pagamento da dívida
pública no Brasil. O cerne dos problemas da Copa são essas contradições
urbanas, a cronificação e avanço da especulação imobiliária, e por isso
construímos uma pauta nesse campo. Fomos muito claros em caracterizar a
posição do MTST como uma posição de classe, a nossa cor é a cor
vermelha, o nosso discurso é um discurso político, que tem lado. E isso,
de algum modo, afastou a mídia, tanto que, já nas últimas semanas, a
visibilidade que o MTST tem ganho é menor. A visibilidade que tivemos
quarta-feira passada [dia 4 de junho] ao botar 20 mil no
Itaquerão não foi nem um terço da visibilidade que tivemos duas semanas
antes ao botar 20 mil na Ponte Estaiada. Porque eles já haviam percebido
que ali não valia a pena apostar. O MTST não vai cumprir esse papel que
queriam que cumprisse, e começaram a tirar o pé do acelerador. Para nós
foi bom. Deixamos claro que não vamos trocar posição política por 15
minutos de fama. O MTST tem um lado político claro e contrário às
corporações da mídia privada, a quem os financia, e ao Estado
capitalista.
Fórum – O Judiciário parece que joga
contra os movimentos, embora o direito à moradia esteja garantido pela
Constituição. Como lidar com essa situação?
contra os movimentos, embora o direito à moradia esteja garantido pela
Constituição. Como lidar com essa situação?
Boulos – É emblemático que
os poderes mais conservadores do país hoje – tão conservadores que
consideram de esquerda o governo do PT – são o judiciário e a mídia. São
os únicos, dos quatro, que não são eleitos. O Judiciário é meio que uma
capitania hereditária da grande burguesia, da oligarquia. Um poder que
vai passando de família em família, das elites urbanas tomando conta, se
tornando juízes, tomando o Ministério Público e levando para dentro
dessas instituições toda a sua visão de classe, preconceituosa e
atrasada. O Judiciário é isso, não tem nenhum controle público no
Brasil. É muito engraçado que quando se fala em controle público do
Judiciário é amordaçar, em relação à mídia, é censura. Agora, o
Executivo e o Legislativo têm controle público a cada quatro anos. E
deveria ser muito maior, deveria ser um controle público permanente, por
meio de mecanismos de exercício do poder popular, conselhos e tudo
mais. Mas, ainda que precário e dominado pelas grandes corporações como é
o sistema eleitoral hoje, há algum grau de controle. O Judiciário e a
mídia não têm nenhum, por isso são os poderes mais conservadores e
atrasados do país. O advogado pode ganhar uma causa, mas a estrutura
está toda carcomida.
os poderes mais conservadores do país hoje – tão conservadores que
consideram de esquerda o governo do PT – são o judiciário e a mídia. São
os únicos, dos quatro, que não são eleitos. O Judiciário é meio que uma
capitania hereditária da grande burguesia, da oligarquia. Um poder que
vai passando de família em família, das elites urbanas tomando conta, se
tornando juízes, tomando o Ministério Público e levando para dentro
dessas instituições toda a sua visão de classe, preconceituosa e
atrasada. O Judiciário é isso, não tem nenhum controle público no
Brasil. É muito engraçado que quando se fala em controle público do
Judiciário é amordaçar, em relação à mídia, é censura. Agora, o
Executivo e o Legislativo têm controle público a cada quatro anos. E
deveria ser muito maior, deveria ser um controle público permanente, por
meio de mecanismos de exercício do poder popular, conselhos e tudo
mais. Mas, ainda que precário e dominado pelas grandes corporações como é
o sistema eleitoral hoje, há algum grau de controle. O Judiciário e a
mídia não têm nenhum, por isso são os poderes mais conservadores e
atrasados do país. O advogado pode ganhar uma causa, mas a estrutura
está toda carcomida.
Sobre os black blocs: “Quebrar um banco pode
parecer muito radical, mas é muito fácil. Quebrar uma vitrine de banco,
podemos sair daqui e quebrar. Isso não vai fazer do Santander ou do
Bradesco mais pobres. Isso pode resolver meu problema psicológico, mas
não radicalizar as lutas sociais.”
Fórum - Em relação à Copa do Povo,
há quanto tempo o MTST monitorava aquele terreno e em que momento a
decisão de ocupá-lo foi tomada?
há quanto tempo o MTST monitorava aquele terreno e em que momento a
decisão de ocupá-lo foi tomada?
Boulos – Há muito tempo o
MTST tinha a intenção de atuar mais firmemente na zona leste, estávamos
mapeando o terreno, porque o movimento já havia sido demandado em
Itaquera, por conta do avanço brutal da especulação imobiliária.
Mapeamos alguns terrenos, fizemos o levantamento de todos e vimos que
aquele era interessante para pensar construção de moradia popular, por
uma série de razões específicas. O movimento começou a fazer reuniões
naquela região, levou reforço de ocupações de outros lugares, o que foi
escandaloso para alguns – “Denúncia: pessoas da Nova Palestina foram
ocupar”. Foram sim. Foram fortalecer a construção do movimento, e isso
foi muito importante. Essas pessoas não foram obrigadas a nada, foram
conscientemente. Não temos nenhum problema em dizer que pessoas de outra
ocupação foram se solidarizar e fortalecer uma outra ocupação até que
ela se consolidasse. A Copa do Povo nasceu desse processo. É claro que a
decisão de ocupar teve uma relação com o processo da Copa do Mundo, é
natural. Isso é inegável. Ocupar um terreno em Itaquera a um mês e pouco
da Copa não foi por acaso. Seria subestimar a inteligência das pessoas
se a gente negasse isso. Mas não foi também simplesmente uma ação
abstrata anti-Copa, foi resultado de um processo que a Copa ajudou a
produzir, que foi a especulação brutal em Itaquera.
MTST tinha a intenção de atuar mais firmemente na zona leste, estávamos
mapeando o terreno, porque o movimento já havia sido demandado em
Itaquera, por conta do avanço brutal da especulação imobiliária.
Mapeamos alguns terrenos, fizemos o levantamento de todos e vimos que
aquele era interessante para pensar construção de moradia popular, por
uma série de razões específicas. O movimento começou a fazer reuniões
naquela região, levou reforço de ocupações de outros lugares, o que foi
escandaloso para alguns – “Denúncia: pessoas da Nova Palestina foram
ocupar”. Foram sim. Foram fortalecer a construção do movimento, e isso
foi muito importante. Essas pessoas não foram obrigadas a nada, foram
conscientemente. Não temos nenhum problema em dizer que pessoas de outra
ocupação foram se solidarizar e fortalecer uma outra ocupação até que
ela se consolidasse. A Copa do Povo nasceu desse processo. É claro que a
decisão de ocupar teve uma relação com o processo da Copa do Mundo, é
natural. Isso é inegável. Ocupar um terreno em Itaquera a um mês e pouco
da Copa não foi por acaso. Seria subestimar a inteligência das pessoas
se a gente negasse isso. Mas não foi também simplesmente uma ação
abstrata anti-Copa, foi resultado de um processo que a Copa ajudou a
produzir, que foi a especulação brutal em Itaquera.
Fórum – Qual é o papel do programa Minha Casa, Minha Vida no acesso à moradia? Você diz que ele enxuga gelo. Por quê?
Boulos – Primeiro, tem a
discussão da ausência da política urbana. Essa especulação imobiliária
brutal produz novos sem-teto. Começo argumentando com um dado: o Minha
Casa, Minha Vida produziu dois milhões de moradias nos últimos cinco
anos, desde que o programa existe. O déficit habitacional brasileiro
nesse período aumentou. Como se justifica? Porque, por outro lado,
subterraneamente, há essa política da especulação imobiliária criando
novos sem-teto. Afinal, um dos critérios para definição do déficit
habitacional de sem-teto no país é o comprometimento de mais de 30% da
renda familiar com aluguel. Esse quesito aumentou brutalmente nos
últimos anos, aumentando o déficit, mesmo com a construção de novas
moradias. Por isso nós dizemos que enxuga gelo, é uma política
habitacional que está girando em falso. Agora, a questão é: ela está
girando em falso conscientemente. Não está resolvendo o déficit porque
seu objetivo nunca foi esse. O Minha Casa, Minha Vida foi criado em
2009, seis meses depois do estouro da bolha imobiliária nos Estados
Unidos, não para resolver o déficit habitacional, mas para dar liquidez
às grandes empresas do setor da construção, que estavam à beira da
falência, por conta de seus investimentos absurdos e irresponsáveis no
mercado financeiro. Essa mesma turma, que financia campanha eleitoral no
Brasil desde sempre, bateu na porta do Planalto e disse: “Presidente
Lula, nós financiamos sua campanha, agora precisamos de ajuda.” E, em
abril de 2009, o Lula lança um pacote de 39 bilhões de reais de
subsídio, sendo que, desse total, 38 bilhões foram para as empreiteiras,
500 milhões para habitação rural e 500 milhões para entidades. Foi uma
política de emergência, anticíclica, para injetar dinheiro público no
setor da construção civil, no setor imobiliário. O programa foi
concebido para isso e funciona dentro dessa lógica. Ele acaba, na
verdade, sendo parte da lógica de fortalecimento do setor imobiliário,
de especulação, de uma anti-política urbana no país. Por isso que temos
essa posição em relação ao Minha Casa, Minha Vida. Mas não queremos ser
injustos com o programa. É sempre importante dizer isso porque senão a
nossa crítica pode ser apropriada por uma visão ainda mais atrasada.
Essa turma da direita gosta quando a gente critica o Minha Casa, Minha
Vida, mas porque eles são contra o programa por aquilo que ele tem de
bom. Primeiro, é o fato de que, em 30 anos, desde o fim do BNH [Banco Nacional de Habitação]
na década de 80, não havia sido criada nenhuma política habitacional no
país. Nenhuma, só as Cohabs, que são políticas fragmentadas, não
federais. Segundo: o Minha Casa, Minha Vida incorporou uma reivindicação
histórica das lutas sociais por moradia no país, que é subsídio. Não se
resolve o problema habitacional dentro da lógica de mercado de
financiamento, porque moradia é uma mercadoria cara. 70% das famílias
que compõe o déficit habitacional no país ganham menos que três salários
mínimos de renda mensal. Quem está nessa situação, não tem como
comprovar condição de pagamento de um crédito imobiliário, então não
entra. Todos os programas habitacionais, inclusive o BNH, sempre foram
pensados por uma lógica de financiamento. O BNH era um banco. O Minha
Casa, Minha Vida não fugiu inteiramente disso, tanto que quem o opera é
um banco – a Caixa Econômica Federal. Mas, para a faixa 1, que é a de 0 a
3 salários, o programa deu uma quantidade considerável, que pode chegar
até 90%, de subsídio. Isso permitiu que ele atendesse uma parcela da
faixa que mais precisa. Essa, na nossa avaliação, é uma virtude do Minha
Casa, Minha Vida. Mas, no geral, é um programa vicioso.
Fórum – Você acredita que o precedente aberto para a Copa do discussão da ausência da política urbana. Essa especulação imobiliária
brutal produz novos sem-teto. Começo argumentando com um dado: o Minha
Casa, Minha Vida produziu dois milhões de moradias nos últimos cinco
anos, desde que o programa existe. O déficit habitacional brasileiro
nesse período aumentou. Como se justifica? Porque, por outro lado,
subterraneamente, há essa política da especulação imobiliária criando
novos sem-teto. Afinal, um dos critérios para definição do déficit
habitacional de sem-teto no país é o comprometimento de mais de 30% da
renda familiar com aluguel. Esse quesito aumentou brutalmente nos
últimos anos, aumentando o déficit, mesmo com a construção de novas
moradias. Por isso nós dizemos que enxuga gelo, é uma política
habitacional que está girando em falso. Agora, a questão é: ela está
girando em falso conscientemente. Não está resolvendo o déficit porque
seu objetivo nunca foi esse. O Minha Casa, Minha Vida foi criado em
2009, seis meses depois do estouro da bolha imobiliária nos Estados
Unidos, não para resolver o déficit habitacional, mas para dar liquidez
às grandes empresas do setor da construção, que estavam à beira da
falência, por conta de seus investimentos absurdos e irresponsáveis no
mercado financeiro. Essa mesma turma, que financia campanha eleitoral no
Brasil desde sempre, bateu na porta do Planalto e disse: “Presidente
Lula, nós financiamos sua campanha, agora precisamos de ajuda.” E, em
abril de 2009, o Lula lança um pacote de 39 bilhões de reais de
subsídio, sendo que, desse total, 38 bilhões foram para as empreiteiras,
500 milhões para habitação rural e 500 milhões para entidades. Foi uma
política de emergência, anticíclica, para injetar dinheiro público no
setor da construção civil, no setor imobiliário. O programa foi
concebido para isso e funciona dentro dessa lógica. Ele acaba, na
verdade, sendo parte da lógica de fortalecimento do setor imobiliário,
de especulação, de uma anti-política urbana no país. Por isso que temos
essa posição em relação ao Minha Casa, Minha Vida. Mas não queremos ser
injustos com o programa. É sempre importante dizer isso porque senão a
nossa crítica pode ser apropriada por uma visão ainda mais atrasada.
Essa turma da direita gosta quando a gente critica o Minha Casa, Minha
Vida, mas porque eles são contra o programa por aquilo que ele tem de
bom. Primeiro, é o fato de que, em 30 anos, desde o fim do BNH [Banco Nacional de Habitação]
na década de 80, não havia sido criada nenhuma política habitacional no
país. Nenhuma, só as Cohabs, que são políticas fragmentadas, não
federais. Segundo: o Minha Casa, Minha Vida incorporou uma reivindicação
histórica das lutas sociais por moradia no país, que é subsídio. Não se
resolve o problema habitacional dentro da lógica de mercado de
financiamento, porque moradia é uma mercadoria cara. 70% das famílias
que compõe o déficit habitacional no país ganham menos que três salários
mínimos de renda mensal. Quem está nessa situação, não tem como
comprovar condição de pagamento de um crédito imobiliário, então não
entra. Todos os programas habitacionais, inclusive o BNH, sempre foram
pensados por uma lógica de financiamento. O BNH era um banco. O Minha
Casa, Minha Vida não fugiu inteiramente disso, tanto que quem o opera é
um banco – a Caixa Econômica Federal. Mas, para a faixa 1, que é a de 0 a
3 salários, o programa deu uma quantidade considerável, que pode chegar
até 90%, de subsídio. Isso permitiu que ele atendesse uma parcela da
faixa que mais precisa. Essa, na nossa avaliação, é uma virtude do Minha
Casa, Minha Vida. Mas, no geral, é um programa vicioso.
Povo possa ser expandido para outras ocupações, não só em São Paulo, mas
em todo o Brasil?
Boulos – A vitória de ontem [9 de junho, dia do anúncio de entendimento com o governo federal],
para nós, foi muito simbólica e emblemática. Depois de meses de intensa
mobilização do MTST, com uma pauta nacional definida, o grosso dessa
pauta foi atendido. Conseguimos algumas mudanças no Minha Casa, Minha
Vida para fortalecer aquela gota no oceano que é o Minha Casa, Minha
Vida Entidades, a gestão direta pelos trabalhadores, que produz
habitações com muito mais qualidade e maiores, porque você tira a
empreiteira. Um exemplo disso é o que estamos fazendo em Taboão da
Serra, na região metropolitana: com o mesmo dinheiro que os caras estão
construindo apartamentos de 39m², estamos fazendo 63m², com três
dormitórios. Conseguimos também medidas para fortalecer o Minha Casa,
Minha Vida, corrigir algumas de suas distorções, e, o que para nós é
muito importante, a criação de uma Comissão Federal de Prevenção de
Despejos Forçados. Será integrada pelos ministérios das Cidades e
Justiça, Secretaria-Geral da Presidência da República e Secretaria de
Direitos Humanos e vai monitorar e procurar intervir em casos de despejo
conflituoso, violento – buscar inibir novos Pinheirinhos, digamos
assim. Há também a vitória da Copa do Povo. A Copa do Povo, em
particular, é uma sinalização, e nós queremos tratar assim. O governo
morre de tratar assim, deve pensar: “Se a gente ceder para a Copa do
Povo, todo mundo vai querer ocupar.” Que bom. É isso que nós pensamos. É
importante que haja vitórias para que as pessoas percebam que a
organização e a luta popular trazem resultados. É uma forma de nos
contrapormos a essa institucionalidade conservadora que temos no Brasil
hoje. Para nós, a Copa do Povo é um exemplo do que queremos continuar
construindo. Se um imbecil de um Reinaldo Azevedo ler esta entrevista,
ele vai escrever um artigo dizendo: “É, não falei, eles vão invadir
mais”. É isso. É exatamente isso. Estamos em lados opostos e é isso que
vamos fazer. A Copa do Povo é um emblema para continuar e avançar.
Fórum – Você pensa, para o futuro, em uma carreira política atrelada a um projeto eleitoral?
Boulos – Eu já tenho uma carreira política.
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